Decidi mergulhar de cabeça em meu namoro com Gisele, primeiro pelo que já citei, ela era digna de uma garota dessas de capa de revista da época, segundo porque a dor pelo que Vanessa me fez, ainda me consumia em longos pensamentos que iam até altas horas sozinho em meu quarto. O melhor era aproveitar ao lado da patricinha.
Na sexta seguinte, fomos a um barzinho, o rock nacional estava em alta e tinha uma banda cover do Legião Urbana, que havia feito muito sucesso no ano anterior com o álbum “Dois”. Nós gostávamos e foi nosso 1ª programa como namorados. De lá, novamente motel e toda a loucura da outra vez foi repetida. Mas antes lhe perguntei se ela se prevenia tomando pílula ou usado DIU e a mesma disse que tomava anticoncepcional. Apesar de naquela época já falarem de aids, era algo que poucos se preocupavam.
No motel, Gisele, abandonando seu jeito patricinha, veio me agarrando já querendo começar. Encostou-me na parede, me beijando com desespero, já foi abrindo meu cinto. Eu ri daquela afoiteza toda:
-Gi, calma… a gente tem a noite toda.
-Não quero calma hoje. Quero que você me pegue do jeito como na primeira vez, bem macho. Fiquei doida todos esses dias pensando na hora que seria chupada e quando esse pauzão entraria na minha bocetinha pequena, mas doida para ser arregaçada.
Procurei lhe dar o mesmo tratamento. Trepamos por muito tempo, 3 bem dadas, ambos suando tanto que parecíamos derreter, o cheiro do sexo grudado em nós, até o seu cuzinho rosado chupei e enfiei um dedo, mas não consegui comê-lo, porém, numa das transas a fiz beber minha porra. Num futuro próximo, já estaria castigando seu cuzinho.
Sábado e domingo, voltamos a passear e de lá, tome motel e sexo. Creio que assim como fiquei maravilhado com Vanessa nas primeiras transas, Gisele ficou por mim. Tanto que começou a agir de maneira melosa, me ligava mais de uma vez por dia, queria que nos encontrássemos também às quartas.
No domingo seguinte, levei-a em casa. Minha mãe adorou “que menina educada, que cabelo lindo e o rosto então? – disse depois. Meu pai, milagrosamente, não cometeu nenhuma gafe apenas preferiu contar que ele e o pai de minha namorada tinham história na Vila Antonieta junto com mais alguns empreendedores.
Na outra semana, ela me levou em sua casa, onde conversei com o Dr. Homero e sua esposa Ligia, que era uma mulher muito bonita na faixa dos 40. Ele, certamente, queria que sua filha se envolvesse com um milionário, mas sendo eu, um estudante de Direito na USP, estava bom demais. Uma coisa que me causava gastura era a peruca dele, dava para ver de longe o quanto aquilo era fake e me lembrava sempre um bicho esmagado na estrada.
Meus amigos do bairro, que já brincavam e perguntavam sobre Vanessa, ficaram boquiabertos ao saber do namoro. Claro que houve um ou dois invejosos que meio que torceram o nariz, dizendo para eu ter cuidado, pois Gisele, além de metida era interesseira e poderia me trocar por alguém com mais grana ou um carrão. Mas a maioria, ficou feliz.
Chegamos ao mês de novembro de 87, Gisele e eu estávamos há 3 meses praticamente juntos. Nesse momento, ela passou a desenvolver um certo ciúme por mim. Achei engraçado no começo, mas foi ficando chato depois, bem chato...
Até que houve a Festa das Nações no bairro. Por lá, morarem muitos italianos, portugueses, japoneses, além de pessoas de outras nações ou descendentes, criaram essa festa com muitas comidas típicas de cada local e barracas de jogos.
O evento foi em um domingo, na noite anterior, fodi tanto Gisele que a mesma viveu a experiência de ter múltiplos orgasmos, o que a fez até se assustar, achando que teria um treco. No final, ainda comi seu cuzinho, gozando fartamente. E agora estávamos ali caminhando inocentemente de mãos dadas aos olhos dos outros que nem em suas mentes mais criativas poderiam imaginar o quão malucos éramos na cama
Até que, num dado momento, enquanto caminhávamos entre a barraca mexicana com tacos crocantes e a portuguesa com bolinhos de bacalhau fritos, paramos frente a frente com Vanessa.
Ela estava sozinha, caminhando devagar pela multidão com um ar de melancolia. Linda, como sempre. Usava uma camisa roxa, uma calça jeans clara agarrada, os cabelos jogados para um lado. Nossos olhares se cruzaram e o mundo parou. Congelei ali por sei lá quantos segundos. Vanessa também parou, viu minha namorada e eu de mãos dadas, senti sua tristeza, quando abaixou a cabeça. Gisele sacou tudo na hora, apertou a minha mão, a voz firme, mas baixa, como se quisesse me proteger ou se proteger:
-Vamos, Ricardo. Meu pai vai começar a discursar no palco agora.
Ela me arrastou dali, cortando a multidão, sem olhar para trás. Eu virei o rosto uma última vez, vendo Vanessa ainda parada, os olhos fixos em mim. Fiquei aéreo por alguns minutos, me lembrando do nosso longo caso e do quanto fui feliz. Acho que só voltei a mim quando o Dr. Homero já falava alto e empolado com microfone na mão, terno claro impecável apesar do calor, usava uma nova peruca, gesticulava freneticamente, até simulou se emocionar e enxugou as lágrimas de araque ao falar sobre o amor que tinha pelos moradores. Ele falou da importância da união, de como eventos assim fortaleciam os laços e de como o bairro precisava de gente que “pensasse no coletivo”.
Eu sabia que aquela papagaiada toda era o pontapé inicial para a sua campanha de 88. Ele ia tentar de novo a vereança. Depois do discurso muitos aplausos, foto com as crianças, cumprimento com outras lideranças — Gisele me puxou para dar mais algumas voltas pela festa. Ela falava menos e eu fingia estar bem, enquanto a imagem de Vanessa não saía da cabeça.
Quando finalmente entramos no carro e eu me preparei para dar partida, Gisele virou para mim, braços cruzados e disse claramente emburrada:
-Ricardo, você mudou completamente quando viu aquela mulher. Ficou branco, parado que nem estátua. Bateu saudades, foi?
Suspirei e balancei a cabeça como quem diz: “E mais essa para fechar o dia”.
-Gi, foi só um susto. Faz tempo que a gente não se via de perto.
-Olha, se eu souber que vocês trocaram um bom dia, termino na hora e não adianta vir atrás. Você sabe que se eu estalar os dedos, arrumo caras bonitos e ricos
Sem me abalar, mais do que já tinha sido, respondi:
-Gisele, quando você não quiser mais namorar comigo, é só chegar e dizer. Mas não faz ameaça.
Ela arregalou os olhos verdes, surpresa com minha calma.
-Quer dizer que pra você é assim? Tanto faz, tanto fez?
-Não é isso! - Respirei fundo. - Eu gosto de estar com você. Estamos juntos há três meses, sou totalmente fiel, não tem outra. Por isso mesmo não vejo cabimento nesse papinho de ameaçar, ficar com ciúme.
Ela ficou quieta um segundo, depois perguntou, insegura:
-Mas você gosta mesmo de mim… ou sou só pra umas transinhas?
Fiquei sem graça. No fundo eu gostava dela — de sua beleza e de fazer tudo na cama para me agradar. Mas não era tão intenso como o que eu sentia por Vanessa, mesmo assim, respondi com sinceridade, mas suavizando:
-Claro que gosto, Gi. Eu gostei de você platonicamente várias vezes lá na escola, me esquecia por um tempo, depois voltava a gostar— não só eu, um monte de caras. Hoje estamos juntos, isso é real. Mas é só o começo do namoro, a gente tá começando na universidade… vamos curtir de uma maneira leve, sem estresse.
Ela baixou a cabeça. Depois tombou devagar no meu peito, encostando no meu ombro:
-Você tem razão… mas eu tenho tanto medo de terminar, Ricardo. Você não sabe o quanto esses meses com você têm me feito bem. O sexo é incrível, mas não é só isso… é a sua companhia, o jeito que me trata, me abraça, me faz rir… tenho medo de isso acabar assim, do nada.
Fiquei sem graça, o coração apertado. Passei o braço ao redor dela, beijei o topo da cabeça, sentindo o cheiro do shampoo.
-Vamos devagar, curtir como tem sido.
Passamos as festas de final de ano juntos, um pouco na minha casa e na dela. Um fato cômico acabou ocorrendo, quando o dr. Homero monopolizava a conversa na sala, gesticulando com um charuto fedorento entre os dedos, até que alguns de seus sobrinhos acabaram passando correndo por trás do sofá e sem querer, um deles se desequilibrou e lhe puxou a peruca, deixando sua careca amostra e fazendo-o sem desesperar, com os olhos arregalados e cara de pânico, como se estivesse nu na frente de todos. Foi uma cena bem constrangedora já que ali quase todos eram familiares, mas eu tive que ir ao banheiro, onde tive uma crise quase que interminável de risos.
No começo de janeiro, avisei meu pai que passaria dez dias no Guarujá e que ele arrumasse um jeito de me cobrir no mercado. Gisele e eu quase nos acabamos de tanto transar. Os biquínis que ela usava somados com a sua beleza faziam os caras a secarem, mas era eu quem aproveitava depois.
Tudo era perfeito, exceto as implicâncias dela que achava que eu tinha olhado para outra, desconfiava se eu demorasse a chegar, etc. E junto vinham as ameaças de que “arrumo outro mais rico e mais bonitos, é só eu querer”. Confesso que isso me deixava puto.
Perto do final de janeiro, recebo uma visita nada esperada no mercado: o velho Evair.
Desde a nossa primeira e única conversa há bem mais de um ano, só o vi de longe, algumas poucas vezes, mas agora de perto, me surpreendi com o quanto ele estava ainda mais acabado, aparentando mais fragilidade, bolsas embaixo dos olhos. Devia estar com 75, creio que perto de 76. Seu famoso olhar — um olho no peixe, outro no gato — parecia menor, meio tampado.
— Preciso falar com você, moleque.
A ousadia dele continuava intacta. Me chamar de moleque me irritou na hora.
— Olha aqui, senhor Lorota, não tenho nada para falar sobre a Vanessa e nem tempo para ouvir suas bobagens de “o grande comedor de atrizes da Era de Ouro do rádio”.
Ele não se abalou. Me olhou firme e perguntou, com a voz mais baixa:
— Mas não pode nem me ouvir num caso de vida ou morte?
Notei pelo tom que, parecia sério. Embora com um mentiroso profissional tudo fosse possível.
— Bem... vamos lá para dentro. Mas já lhe adianto: se vier com ameaças ou xingamentos, vai sair corrido.
Levei-o para um escritório nos fundos, o mesmo que meu pai usava, mas que nos últimos tempos era mais eu quem ocupava. Mandei-o sentar na cadeira de frente para a minha mesa e falei, tentando controlar a impaciência:
— O que o senhor tem de grave a dizer?
Perguntei já preocupado que pudesse ser algo com a Vanessa — uma doença, um acidente, sei lá. Ele respirou fundo, como quem organiza as ideias, e começou:
— Sabe, você sempre me tomou como trouxa. Mas saiba que antes de você, a Vanessa teve outros amantes. Sempre soube de todos, apenas fiz vista grossa.
Aquilo não tinha nada a ver com assunto de “vida ou morte”, mas despertou a minha curiosidade:
— Ué! Mas se o senhor sempre soube disso, por que veio cismar logo comigo aquela vez, me fazendo ameaças e o caralho a quatro? Eu fui só mais um.
Evair me olhou com um ódio misturado a nojo:
— Porque desde o começo do caso de vocês, desconfiei que era diferente. Ela nunca trouxe macho em casa. Nem no apartamento antigo, nem nessa casa atual. Mas o que mais me chamou atenção foi a alegria dela. Com os outros era só sexo. Eu sei que não conseguia dar prazer a ela... se fosse uns 30 anos mais jovem, talvez... Por isso deixava, me fazia de besta. O importante era tê-la duas, três vezes por semana. Até você chegar e foder com tudo.
Resolvi cortar as lamentações do velho antes que virasse um rio de autopiedade:
— Bem, senhor Evair, se o problema era eu, deve saber que não estou mais com a Vanessa. Há meio ano sequer trocamos uma palavra. Então me dê licença, não tem motivo se incomodar comigo.
Ele levantou a voz de repente, o rosto ficando vermelho:
— O problema não é você estar com ela, seu merdinha arrogante! O problema é o estrago emocional que você causou nela. E justamente agora, que descobri...
Ele parou. Baixou a cabeça, os ombros curvados, como se estivesse juntando coragem pra soltar a bomba. Demorou alguns segundos em silêncio.
— Descobriu o quê?
Ele ergueu o olhar devagar, a voz saiu mais baixa, quase um sussurro rouco:
— Que estou fodido. Doença no pulmão. Não vou muito longe.
Fiquei surpreso com a revelação. Por mais que odiasse o sujeito, não consegui ser completamente frio.
— Bem... lamento pelo seu estado. É grave mesmo?
— Muito. Mas não quero a bondade de ninguém. E não pense que vim aqui para fazer como nos filmes ou novelas mal escritos, me arrepender do que fiz e pedir para você ficar com a Vanessa. Não faço esse tipo. E se fosse para escrever, eu que fui um bom escritor de radionovelas, faria algo bem melhor.
Ele deu um sorriso amargo, quase sarcástico, antes de continuar:
— O motivo é para te contar que você fodeu legal com a cabeça da Vanessa. Há meses ela está acabada. Com essa tal de depressão que dizem os mais modernos. Seu tivesse, sei lá uns 40 anos, não haveria homem melhor para ela no mundo, mas quando a conheci já estava perto dos 70, ela me aceitou por uns troquinhos, por ser burrinha e não saber se valorizar, tão tapada, que antes de mim, tomou no cu legal quando veio do Rio para cá, iludida por um gaiato e para comprovar o quanto é uma perfeita imbecil, foi se apaixonar por um garoto, mas a tontice dela sempre é capaz de ir mais fundo, ela me contou do estratagema que teve de transar com outro para ver se conseguia te esquecer -AHAHAHAHAHA- cof cof cof cof (começou a tossir como um condenado), mas aí você descobriu e acabou com tudo AHAHAAHAAHAHA. Depois, passou a chorar pelos cantos e repetir, Play, Play, sei lá que merda é essa. Bem feito para aquela tonta! Tomara que a puta sofra e muito.
Eu queria voar no pescoço daquele velho canalha, mas uma porrada que desse seria o suficiente para mata-lo ou machucá-lo gravemente. Além disso, quis tirar uma dúvida:
-Se o senhor tem essa imagem tão negativa de Vanessa, por que a bancou por todos esses anos, inclusive dando-lhe a casa? Antes que diga que foi pelo sexo, já adianto que não cola, pois poderia fazer com outras e ficaria bem mais em conta.
Com ódio no olhar, o velho me disse:
-Eu gostava de Vanessa, gostava mesmo. Os amantes que teve, danem-se, mas tudo mudou por sua causa. Antes ela me ouvia, me admirava, mas desde que se apaixonou por você, fui notando-a cada vez mais impaciente, eu contava sobre o meu passado, cheio de fatos marcantes e históricos, pois fui importante, e a idiota fazia cara de tédio. Passei a ser um estorvo que só era tolerado por causa da minha grana, foi por isso que fiquei com tanta raiva, mas depois me regozijei ao vê-la se foder. Hoje, eu fui lá e a dispensei, tô fodido mesmo, só indo para hospital, não vou mais bancar a puta mulata. Não dou mais um níquel. Foi bom enquanto durou. Só lamento ter passado a casa para o nome dela, mas tenho certeza que em breve, ela fará um péssimo negócio e ficará com uma mão na frente outra atrás, afinal de contas é a pessoa mais burra que já conheci. – disse esbanjando um otimismo cruel.
Eu poderia esperar muita merda vinda daquele velho canalha, mas rir e desejar um futuro sombrio para Vanessa, admito, que Evair foi mais baixo do que esperava. Resolvi lhe dizer umas boas antes de expulsa-lo. Fiquei em pé, próximo à cadeira dele, numa posição intimidatória, queria ao menos que o ancião sentisse medo. Olhei sério para seus olhos (se bem que cada um estava apontava para um lado) e disse furioso.
Sabe, seu velho patético, tô cursando Direito e me interessei pela parte de entender o comportamento humano pelo seu lado psíquico. Li um bom livro e o senhor se encaixa perfeitamente como exemplo de narcisista. Todas essas histórias que contou a vida toda sempre se engrandecendo, sendo o protagonista, o super comedor, o grande escritor, a voz de ouro, o grande ator de radionovelas, o cara que ensinou o professor do Bruce Lee a lutar, que enfrentou dois dobermans e mais uma infinidade de proezas, todas, todas essas mentiras absurdas, ninguém acreditou! Você pensou que estava enganando as pessoas, mas estava sendo enganado por elas. Você acha que a Vanessa é a pessoa mais burra que já conheceu? Pois bem, saiba que ela nunca acreditou em seus feitos, ela ria de sair lágrimas, e sempre te viu como um fraco, um inseguro, perdedor, covarde e ruim de cama que precisava criar uma persona totalmente diferente da sua para viver. Todo narcisista é no fundo o mais inseguro dos inseguros, lá no fundo da sua mente, onde reside um resquício de sanidade, o senhor sabe que nunca passou de uma piada barata e agora no apagar das luzes da sua vida, tenta um último ato mal ensaiado, onde acha que está saindo de cena por cima, mas saiba, nessa vida, você nunca foi nem o substituto de um reles figurante que dirá protagonista. Agora, pica a mula daqui, antes que eu te dê um peteleco e você tenha uma fratura exposta.
Evair me olhava com a respiração ofegante, os olhos tortos cheios de raiva, pensou em falar algo, mas eu fechei a mão e disse:
-Some daqui, seu filho da puta! – Berrei com todas as minhas forças.
Evair se assustou e se levantou rapidamente, sumindo em segundos. Foi a última vez que tive o desprazer de ver aquele velho. Não sei se morreu logo ou durou mais alguns anos.
Fiquei horas irritado com tudo o que aquele velho patético vomitou. Mas, mais tarde, já em casa, deitado, comecei a pensar no que ele disse sobre Vanessa. Que ela estava acabada, depressiva, que ela se apaixonara por mim. E que, segundo ele, ela mesma admitira a burrada de ter se envolvido com outro quando estávamos juntos. Aquilo mexeu comigo. Uma vontade enorme de ir vê-la surgiu. Lutei contra esse desejo a noite inteira.
No outro dia foi pior, só pensei em Vanessa. Até que, no começo da noite, quando fechei o mercado, inventei uma desculpa para mim mesmo: “Só vou lá para saber se ela está bem depois do que velho fez”.
Bati na porta de madeira pintada de branco. Vanessa abriu e eu quase perdi o fôlego. Vestia camiseta vermelha que deixava sua barriga de fora e um short jeans branco que destacava bem sua bunda. O cabelo estava solto e molhado, como se tivesse acabado de lavar, as coxas grossas de fora e os pés descalços.
Ela me olhou surpresa, a mão ainda na maçaneta, a boca entreaberta.
-Ricardo?
Fiquei sem graça, mas mandei:
-Oi… o Evair me procurou ontem no mercado. Disse um monte de merdas.
Os olhos dela se arregalaram mais, uma mistura de choque e vergonha.
-Ele… ele foi te procurar? Meu Deus…que louco.
Meio gaguejando, ela perguntou:
-Quer… quer entrar?
-Tá. Só um segundo.
Tudo estava como antes. Olhei para a estante e vi o videocassete, lembrei que nossa história começou graças a ele.
-Conta o que ele disse.
Contei quase tudo, poupando-a das ofensas mais pesadas do velho e de dizer que tinha se apaixonado por mim, procurei focar na questão de que ele não a ajudaria mais.
-Ele… ele me desejou as piores coisas pro futuro, Play...quer dizer, Ricardo. Disse que que merecia sofrer, que quem mandou me apaixonar por um ‘moleque’ e que no futuro, eu só transaria com indigentes. Foi cruel. Eu sabia que no fundo ele era mesquinho, mas nunca imaginei que chegasse a esse ponto. Fiquei surpresa com tanta maldade.
-Ele é um imbecil, sempre foi e agora que sabe que está mal de saúde, decidiu mostrar ainda mais o quanto é escroto, mas...e sobre a ajuda que ele te dava...como fará agora?
-Isso não é problema. Arrumo um emprego em qualquer salão e não faltarão clientes, só não trabalhava antes porque ele não permitia.
-Ah, sim. Tinha me esquecido disso. Agora, você pode trabalhar e tocar a vida. Bem, vou indo.
Vanessa ficou inquieta e disse:
-Espera...o que mais ele te falou? Tenho certeza que não foi só isso.
Enrolei, mas acabei dizendo uma parte:
-Falou que você não estava legal, andava triste...
-Contei tudo a ele, há meses. Disse que te amava, mas que tinha feito uma grande burrada, que estava sofrendo demais, tudo não escondi nada. O Evair ficou com ódio por saber que o que eu sentia por ele não era uma migalha perto do que senti...sinto por você. O cachorro ainda ficou mais uns meses vindo aqui, já nem tentava mais nada em termos de sexo, porque sabia que não ia conseguir, mas agora que o médico falou que seu problema é muito grave, decidiu revelar seu lado ainda mais podre.
-Espero que ele não venha mais me encher o saco, só não lhe dei umas porradas porque o pateta mal está se aguentando em pé. Bem, vou indo. Espero que dê tudo certo e você arrume logo um emprego, com o talento que tem, fará sucesso. – disse isso e já me levantei, pois senti que não aguentaria ficar mais tempo tão perto de Vanessa.
Já na pequena varanda do lado de fora, Vanessa disse:
-Você nunca sentiu a minha falta nesses meses todos?
Olhei para ela, como era linda, que boca, que rosto, os seios fartos marcados na camisetinha, os quadris largos, as coxonas. Acabei gaguejando:
-Sim...sim, mas agora tenho uma namorada e estou bem.
Vanessa adotou um tom decidido e jogou sua cartada:
-É...eu vi naquela festa e chorei muito naquele dia, aliás só naquele não, perdi as contas. Sabe, Play, eu te amo, mas te deixei em paz porque você exigiu, mas já que está aqui, vou te fazer uma última proposta: pensa com carinho se não sente algo por mim e quer voltar, só que agora só nós dois, seja pelo tempo que for, a gente passa uma borracha no que passou e recomeça. Só não demora muito para me responder, porque um lado meu ainda quer ficar na Vila, mas outro está me tentando a vender essa casa e voltar para o Rio.
Fiquei congelado por alguns segundos, pensei em agarrá-la ali mesmo, levá-la para dentro e fodê-la como no passado, mas tive um rasgo de lucidez e me virei em direção à calçada sem falar nada.
Já em casa, fiquei repetindo mentalmente por horas. “Ela me ama e se eu quiser posso tê-la ainda hoje, fodê-la por horas e horas”. Começou a cair uma chuva torrencial e como que hipnotizado, caminhei lentamente até à casa de Vanessa, bati na porta, ela abriu só de baby doll branco, se espantou ao me ver todo molhado e me trouxe para dentro.
-Vem...eu vou cuidar de você.
Minha vida estava prestes a dar um novo giro de 360º
