A segunda-feira amanheceu com um sol um pouco tímido, mas, durante o caminho até a galeria, ele perdeu a timidez e brilhou forte. Valentina exibia um sorriso discreto, provavelmente ela estava feliz por eu finalmente estar voltando a trabalhar na galeria. Contudo, pelo que eu a conhecia, sabia que ela não estava totalmente confortável com o que estava prestes a acontecer. Porém ela mesma disse que havia chegado ao seu limite e que não iria interferir no que eu faria. Ela até me agradeceu por eu ter tomado a frente para resolver o problema. Mas eu sabia que apesar de tudo, seria algo que a deixaria triste.
Nós duas estávamos atrasadas meia hora em relação ao horário normal, mas era algo que havíamos combinado. Valentina já tinha me enviado os vídeos no whats, se caso eu precisasse deles, eu poderia usar meu próprio celular. Ela avisou Alexia para informar Orlando e Donna que ela precisava falar algo importante com eles. Orlando provavelmente já sabia do que se tratava, ou pelo menos parte da conversa. Já Donna estava completamente por fora; provavelmente achava que Valentina iria avisar sobre o fechamento da galeria.
Donna já sabia que eu e Valentina estávamos juntas, então isso não seria uma surpresa para ela. No entanto, o restante que tínhamos a revelar certamente seria uma enorme surpresa, e não uma agradável. Eu estava ansiosa para ver a expressão dela quando eu revelasse que sabia de tudo ela aprontou.
Quando estávamos quase chegando, Alexia enviou uma mensagem avisando Valentina que todos já estavam esperando por ela. Ela não sabia que eu estava acompanhando Valentina, mas estava a par do que Orlando sabia, então não ficaria muito surpresa com a minha presença. Na verdade, acho que ela ficaria feliz em me ver. Nós nos dávamos muito bem; Alexia se tornou minha melhor amiga, e pedi a Valentina para convidá-la para a reunião. Valentina disse que já havia feito isso, pois Alexia era seu braço direito na galeria. Ela não era apenas uma simples secretária, mas uma peça importante no funcionamento da galeria, assim como Orlando e Donna.
Assim que chegamos na galeria, seguimos direto para o escritório de Valentina. Ela entrou na frente e eu logo atrás. Donna e Orlando estavam sentados em um sofá no canto do escritório, enquanto Alexia estava em pé ao lado da janela. Ela foi a primeira a me ver; fez uma cara de surpresa, mas logo vi um lindo sorriso se formar em seus lábios. Cumprimentei-a e, ao olhar para Donna, percebi sua cara de espanto, que logo se transformou em uma expressão neutra, a famosa cara de paisagem. Era incrível como ela era cara de pau. Fui até Orlando e o cumprimentei, ignorando Donna, e me dirigi a Valentina, que já estava atrás da mesa.
Val— Bom dia, gente. Eu chamei vocês aqui porque tenho uma informação muito importante para passar.
Olhei para a cara de Donna, que fez uma expressão triste. Ela parecia estar ensaiando seu teatro para quando Valentina anunciasse o fechamento da galeria.
Val— Devido a alguns acontecimentos recentes, fui obrigada a tomar uma decisão que não planejei, mas que me agradou bastante. A partir de agora, Nora será minha sócia aqui na galeria.
A expressão de tristeza de Donna se transformou em espanto, e logo em raiva. Vi seu rosto, antes pálido, ficar vermelho como um pimentão, o que sinceramente me trouxe um pouco de felicidade.
Donna— Como assim, sua sócia? Você está ficando maluca, Val? Por quê ela?
Nora— Porque eu comprei o imóvel, Donna. Algo que você não conseguiu.
Donna— Como assim? Do que você está falando? Não estou entendendo nada.
Nora— Para de mentir, já chega! Nós sabemos de tudo. Você quase fez a galeria fechar as portas, sua idiota.
Donna— Eu não faço a mínima ideia do que você está falando e você está me ofendendo. Não vou aceitar isso, não!
Nora— Tudo bem, você quer que a Valentina ligue para a Antônia para confirmar que você foi até a casa dela tentar comprar o imóvel? Ou prefere que eu mostre o vídeo de você ouvindo a conversa da Valentina com o Orlando atrás da porta? Ou o vídeo de você pegando a chave do Orlando para roubar as fotos da Valentina e da Isabel? Não, acho que é melhor mostrar o vídeo em que você entra no escritório e rouba as fotos.
Donna— Valentina, isso é mentira! Eu não fiz nada disso.
Val— Infelizmente, você fez, Donna. Eu também não queria acreditar, mas é a verdade. Eu vi os vídeos; você foi gravada. Meu Deus, por que você fez isso? Quase perdemos a galeria por causa do seu egoísmo. Eu quase perdi tudo; você tem noção de que tentou prejudicar todos aqui, todos os seis amigos?
Donna— Eu... Me perdoa, Valentina!
Val— Desculpe, Donna, mas não posso fazer nada. Das outras vezes, eu te perdoei e deixei você ficar aqui. Porém, desta vez, não depende de mim; é a Nora quem vai resolver, já que ela é a sócia majoritária.
Donna— Como assim?!
Nora— Eu sou dona de 60% da galeria agora, tudo isso graças a você. O correto seria eu chamar a polícia, entregar os vídeos a eles e te denunciar. Contudo, a Valentina pediu que eu não fizesse isso. Então, quero que você se levante e saia daqui. Nunca mais quero te ver na minha galeria e, se por acaso você tentar qualquer coisa contra mim ou qualquer pessoa que eu goste, eu te juro que te coloco na cadeia por roubo.
Donna— Valentina, me ajuda, por favor.
Val— Não posso fazer nada para te ajudar, Donna. Mas vou te dar um conselho de amiga: procure ajuda profissional. Eu sei que você não é uma pessoa ruim por natureza, mas, infelizmente, às vezes você se transforma em uma pessoa horrível.
Nora— Você pode ir pegar suas coisas. Está demitida, sem direito a nada. Não quero te ver mais aqui. E, por favor, mantenha distância de nós, ou eu juro que esqueço o que a Valentina me pediu.
Donna— Por favor, Valentina, me perdoe.
Val— Eu já te perdoei, Donna, mas quanto ao que a Nora falou, não posso fazer nada; está fora do meu alcance.
Donna se levantou do sofá e saiu sem dizer mais nada. Quando ela desceu as escadas, peguei meu celular, desbloqueei o número dela e enviei os três vídeos com a legenda: "Para te provar que não estou blefando." Depois, bloqueei-a novamente assim que os vídeos foram enviados. Notei que Valentina e Alexia estavam com expressões tristes.
Nora— Gente, eu não estou feliz com isso, mas algo tinha que ser feito antes que ela agisse novamente, porque com certeza ela faria, como nas outras vezes em que foi perdoada.
Val— Eu sei, amor, você tem razão. Estou triste porque sei que, no fundo, ela não é uma pessoa ruim. Mas você está certa; algo precisava ser feito, e você fez o que eu deveria ter feito há muito tempo.
Alexia— Estou triste porque, apesar de tudo, gosto da Donna, mas concordo com você, Nora. Não havia como deixá-la continuar aqui. Eu amo este trabalho e este lugar; ela só pensou nela, sem se importar com as consequências para mim ou para os outros que trabalham aqui.
Nora— Só espero que ela mude e não nos cause mais dor de cabeça.
Eu realmente torcia para que Donna mudasse, mas que fizesse isso bem longe da galeria e da Valentina. Não queria ver mais Valentina chorar, não de tristeza, como aconteceu quando ela chorou nos meus braços por causa da idiotice de Donna.
Depois que Donna saiu, eu e Valentina atualizamos Orlando e Alexia sobre os últimos acontecimentos. Mostramos os vídeos para os dois, e Orlando contou que naquele dia, Donna o chamou para olhar uma peça estragada na seção de artesanato. Ele disse que era um estrago pequeno, uma peça de madeira. Donna voltou sozinha, dizendo que tinha uma cola no escritório que poderia ajudar. Ele ficou esperando. Quando ela voltou, afirmou que não tinha encontrado a cola e que compraria no dia seguinte. Ele não imaginava que era apenas uma desculpa para pegar a chave.
Ele se desculpou, mas Valentina disse que não era culpa dele. Eu disse o mesmo que havia dito a Valentina quando ela começou a se culpar. A culpa era de Donna, não deles. Alexia concordou e também me deu um abraço de boas-vindas. Fiquei muito feliz por poder estar ali novamente, agora como sócia da galeria que tanto amava.
Aproveitamos que estávamos todos juntos e planejamos o que faríamos dali para frente. Precisávamos organizar uma exposição e também encontrar alguém para o lugar de Donna, já que nem eu nem Orlando entendíamos o suficiente para ser curadores da parte das esculturas. Valentina disse que conhecia algumas pessoas que poderiam ajudar e que faria algumas ligações para ver se encontrava alguém.
Alexia— Olha, eu entendo bastante de esculturas; comecei a estudar quando namorei com a Donna, e ela me ensinou muitas coisas. Se vocês me derem uma chance, gostaria de tentar cuidar da parte das esculturas.
Nora— Para mim tudo bem, mas quem decide é a Valentina; eu já voltei a ser sócia minoritária. 🤭
Val— Alexia, eu tenho outros planos para você. Não que eu não acredite na sua capacidade, mas, infelizmente, não posso deixar você largar sua função agora. Vou te dar um aumento, já que agora não preciso pagar aluguel, e vai sobrar mais dinheiro. Mas preciso que você continue me ajudando. Tudo bem?
Alexia— Claro, eu só falei para tentar ajudar e realmente para ganhar um salário melhor, mas se você prefere que eu continue na mesma função, tudo bem.
Não entendi por que Valentina não deu uma oportunidade a Alexia, mas se ela não quis, havia um motivo. Talvez fosse por não querer perder seu braço direito. No fundo, eu entendia Valentina; ter alguém de confiança ao nosso lado é extremamente importante, e além disso, Alexia era uma boa amiga. Pode-se dizer que ela era a secretária perfeita.
Valentina fez questão de convocar uma reunião geral para avisar todos sobre as mudanças. Isso causou alguns sustos, já que, há pouco tempo, eu era apenas uma funcionária que namorava Donna. Agora voltava como sócia e namorada de Valentina. Além disso, Donna foi demitida. Algumas pessoas fizeram caras feias, mas quando Valentina contou que a galeria quase fechou e que isso não aconteceu porque eu comprei o imóvel, as expressões desagradáveis foram desaparecendo. Muitas das meninas com quem eu tinha amizade vieram me parabenizar.
O resto do dia foi uma correria. Eu e Valentina saímos para comprar móveis para meu escritório. Alexia fez várias ligações para tentar encontrar um novo curador, agendar entrevistas para Valentina, divulgar a exposição e confirmar a visita dos especialistas para a autenticação dos quadros. Tínhamos muito o que fazer e eu precisava me adaptar à minha nova função. Seria uma semana corrida, mas estava muito animada com tudo o que estava acontecendo e o que estava por vir.
O final de semana chegou, e no sábado os especialistas em pinturas foram ver os quadros pela primeira vez. Eles ficaram admirados com o que viram; um deles ficou o dia todo e pediu para voltar no domingo para estudar os quadros restantes. Ele disse que era fã da Libélula e tinha certeza de que os quadros tinham partes pintadas por ela. Ele afirmou que na segunda já daria seu parecer, mas que poderíamos ficar tranquilas, pois seria positivo, a menos que visse algo errado nos outros quadros, mas sabia que isso não aconteceria, pois conhecia o caráter de Valentina.
O outro especialista disse que precisaria de uma semana para analisar tudo, mas que até o momento estava tudo correto. Valentina ficou bem animada, já que esperava que o parecer demorasse mais de um mês. Agora ela poderia planejar uma data para a exposição e divulgar nas entrevistas que daria para veículos especializados em arte.
Eu quase larguei a faculdade novamente, mas Valentina me incentivou a continuar. Eu só havia ido dois dias na semana anterior, mas prometi que voltaria a frequentar as aulas na próxima semana. Era meu último ano, e eu estava disposta a me sacrificar para conseguir meu diploma. Mas as aulas eram tediosas, isso era certo. Também queria voltar a pintar, mesmo que fosse apenas nos finais de semana. Comentei isso com Alexia, e ela me deu uma ideia que, a princípio, achei muito interessante.
Alexia sugeriu que eu montasse um mini ateliê na galeria. Ela disse que seria legal se fosse todo de vidro transparente, permitindo que os visitantes vissem uma pintora profissional trabalhando ao vivo. Gostei da ideia, e Valentina também. Então, provavelmente, após a exposição, providenciariamos isso.
Os dias foram passando, e Valentina já havia dado algumas entrevistas, a maioria para revistas e jornais. Ela prometeu revelar a verdadeira identidade da Libélula, o que causou grande alvoroço. Logo começou a receber convites de entrevistas de revistas de outros países e programas de TV. No mundo da pintura, a exposição se tornou o assunto do momento; nos fóruns que eu acessava, só se falava nisso. Com certeza, a exposição seria um sucesso de público e, provavelmente, meus dias de anonimato estavam chegando ao fim.
Os dias estavam voando, e o dia da exposição se aproximava. Eu já sentia aquele frio na barriga, mas estava pronta para ajudar a apresentar Isabel ao mundo e homenageá-la da melhor forma possível.
Continua…
Criação; Forrest_Gump
Revisão; Whisper
(Qualquer erro, incoerência, dica, crítica ou elogio, podem deixar nos comentários 🤝🏻)
