A noite caía sobre o bairro como um manto pesado, as luzes dos postes piscando fracas enquanto as sombras se alongavam pelas calçadas desertas. Heitor e eu estávamos parados sob a varanda vazia e escura, o ar carregado.
O beijo não foi calmo. Foi um acerto de contas.
Heitor me segurou com firmeza, como quem precisava ter certeza de que eu estava ali, inteiro, de volta. Não havia doçura naquele primeiro gesto, havia urgência, ciúme ainda quente, uma raiva mal resolvida que se transformava em desejo.
Quando finalmente nos afastamos, nós dois estávamos sem fôlego. Foi só o tempo suficiente para que Heitor respirasse fundo e me encarasse por um segundo, os olhos cinzentos e escuros brilhando com uma determinação perigosa. Ele não disse nada. Não havia necessidade. Com um movimento rápido, entrou em casa e saiu segundos depois, com as chaves na mão.
Ele me puxou abaixo pelas escadas, apressadamente, até a garagem escura, até a sua moto estacionada. Eu entendi. O segui sem questionar, o coração batendo tão forte que podia sentir o sangue pulsando nas veias.
— Sobe — Heitor disse, me entregando um capacete, decidido — Agora.
Eu não perguntei para onde íamos. Nem precisava.
A moto rugiu ao dar partida na rua escura, o som engolindo o silêncio da vizinhança e ecoando pelas ruas vazias, o farol lançando um círculo amarelado no asfalto. Eu subi atrás, sentindo o corpo dele tenso, rígido, concentrado. A cidade foi ficando para trás rapidamente: as luzes, as casas, o conhecido.
Heitor acelerava como quem precisava fugir, não de alguém, mas de um pensamento. Ele não esperou. Acelerou de repente, e eu tive que me segurar com força em sua cintura para não cair, o corpo colado nas costas compridas de Heitor.
O vento açoitava nossos corpos, frio e cortante, mas nenhum de nós dois parecia sentir. A velocidade, o perigo, a adrenalina, tudo se misturava ao calor que já ardia entre nós. Eu enterrei o rosto entre as omoplatas de Heitor, inspirando fundo o cheiro inconfundivelmente dele, enquanto as mãos deslizavam para baixo, os dedos traçando o contorno da pele sob a camisa. Heitor não reagiu, mas eu senti o corpo dele tensionar, a respiração ficando mais pesada. Sabia que estava provocando. E adorava isso.
Nós deixamos a cidade para trás, as luzes se apagando aos poucos até que só restasse a escuridão densa da estrada deserta. Desviamos para uma estrada de terra, depois outra, até chegarmos a um ponto afastado, um mirante improvisado que dava para um vale escuro, quase invisível, as luzes da cidade triste lá embaixo, piscando distantes.
Heitor reduziu a velocidade quando avistou um pequeno galpão abandonado, meio escondido entre árvores retorcidas, as paredes de metal enferrujado refletindo a luz prateada da lua. Parou a moto com um solavanco, desligando o motor de repente, o silêncio repentino quase ensurdecedor. O mundo ficou quieto.
Só havia nós.
Heitor desceu primeiro, tirou o capacete, passou a mão pelo cabelo. Eu o observava em silêncio, o coração batendo forte demais para um corpo tão jovem.
— Você me deixou louco essa semana — Heitor disse, sem olhar para mim — Não faz isso comigo.
Eu desci da moto, me aproximei devagar. Fiquei parado ali, olhando para ele, o peito subindo e descendo em ritmo acelerado, os lábios ainda ardendo do beijo.
— Eu não sabia… — comecei.
— Agora sabe — Heitor cortou, virando-se.
Não houve mais palavras. Foi Heitor quem quebrou a tensão. Sem aviso, sem hesitação, ele segurou o meu rosto com uma mão firme, os dedos afundando levemente na pele quente da minha nuca, e me puxou para si.
Nossos lábios se encontraram em um beijo que não era suave, não era tímido, era um choque, uma colisão de desejos reprimidos e saudades não ditas. Eu gemi baixo, minhas costas arqueando levemente enquanto as mãos de Heitor deslizavam para meus ombros, os dedos se fechando com uma posse que não deixava dúvidas: você é meu.
A língua de Heitor invadiu a minha boca com uma fome animal, explorando, reclamando, como se quisesse provar cada canto, cada suspiro rouco que escapava dos meus lábios entreabertos. Eu respondi com a mesma intensidade, meus dedos se enterrando nos cabelos negros de Heitor, o puxando mais para perto, como se temesse que aquele momento pudesse se desvanecer.
Esse segundo beijo era diferente do primeiro: mais fundo, mais lento, carregado de algo novo. Nossas mãos se encontraram com naturalidade, explorando, reconhecendo. Eu sentia tudo com intensidade demais, o toque, o cheiro, a presença firme de Heitor, que parecia conduzir tudo com uma segurança quase perigosa.
Não era só desejo. Era a sensação de pertencimento. Quando nos afastamos, o ar parecia mais rarefeito.
— Isso aqui… — eu comecei, inseguro.
— Vai dar problema — Heitor completou, com um meio sorriso — Mas eu não vou parar.
E eu sabia que também não conseguiria.
Heitor não perdeu tempo. Em dois passos largos, ele me encurralou contra a parede fria do galpão, o metal gelado contrastando com o calor dos nossos corpos colados. As mãos dele foram direto para o meu rosto novamente, me segurando com uma urgência que não deixava espaço para dúvidas.
— Senti sua falta, caralho — rosnou, a voz rouca, quase um gemido, antes de capturar os meus lábios novamente.
Dessa vez, não havia delicadeza. Era pura necessidade, dentes batendo, línguas se enlaçando em uma dança suja e desesperada. Eu gemi, as mãos subindo para agarrar os braços de Heitor, minhas unhas cravando na pele através da camisa dele.
As roupas começaram a ser arrancadas em um frenesi. Heitor puxou a minha camisa para cima com um movimento brusco, o tecido rasgando levemente. Eu não me importei. Arqueei as costas, me oferecendo, enquanto as mãos de Heitor exploravam cada centímetro de pele exposta, os músculos do abdômen, os mamilos já duros sob a passagem dos dedos, a cicatriz antiga perto da costela que eu sempre odiei, mas que Heitor beijava como se fosse algo sagrado.
— Você é meu — murmurou Heitor contra a minha boca, a voz tão baixa que era quase um pensamento, enquanto as mãos desciam para abrir a minha calça, o zíper sendo puxado com um som metálico que ecoou no silêncio.
— Todo seu — respondi, ofegante, as palavras se perdendo em outro beijo.
Nossos corpos se pressionaram ainda mais, pele contra pele, o calor entre nós quase insuportável. Heitor me empurrou com força contra a parede, o impacto fazendo com que eu soltasse um gemido baixo, quase um lamento.
As mãos de Heitor deslizaram para baixo, envolvendo nossos dois membros duros, os dedos se fechando em torno deles com uma pressão firme. Eu arquejei, a cabeça batendo levemente no metal, os olhos se fechando quando Heitor começou a mover a mão, lento no início, mas com uma intensidade que fazia meus joelhos tremularem.
— Assim, porra — sussurrou Heitor, a boca colada ao meu ouvido, a respiração quente fazendo arrepios percorrerem a minha coluna — Me mostra como você se toca quando pensa em mim.
Eu não precisei de mais incentivo. Minhas mãos se juntaram às de Heitor, os dedos se entrelaçando enquanto nós começamos a nos masturbar juntos, os movimentos sincronizados, os quadris se empurrando para frente e para trás em um ritmo que ia ficando cada vez mais rápido, mais desesperado.
Os gemidos se misturavam no ar, abafados apenas pelo som úmido dos lábios se encontrando novamente, os beijos agora sujos, molhados, cheios de uma fome que parecia nunca ter fim. Heitor segurou meu queixo com força, me obrigando a olhar nos seus olhos enquanto a mão dele trabalhava sem parar.
— Vai gozar pra mim, Mateus? — perguntou, a voz um rosnado gutural — Ou você quer me sentir na sua boca primeiro?
A pergunta foi suficiente para me fazer tremer. Com um movimento rápido, mas decidido, eu me ajoelhei na frente de Heitor, minhas mãos deslizando pelas coxas compridas, meus dedos se cravando na carne alva enquanto olhava para cima, meus olhos escuros brilhando com um desejo tão puro que Heitor sentiu o estômago se revirar.
Não houve hesitação. Eu levei a boca até o membro de Heitor, a língua saindo para lambê-lo da base até a ponta, lenta, provocante, antes de envolvê-lo completamente, os lábios se fechando em torno da grossura do seu pau, com uma pressão que fez Heitor soltar um gemido rouco, as mãos indo automaticamente para os meus cabelos, os dedos se enterrando nas madeixas castanhas.
— Caralho, assim — Heitor rosnou, os quadris se movendo para frente sem controle, empurrando mais fundo na minha boca quente e úmida.
Eu não resisti. Ao contrário, abri mais a garganta, engolindo até onde conseguia o cacete de Heitor, a saliva escorrendo pelos cantos da boca enquanto as mãos subiam para massagear as bolas dele, os dedos brincando com a pele sensível.
Heitor não aguentou por muito tempo. Com um gemido gutural, as coxas tremendo, ele gozou na minha boca, as jorradas quentes sendo engolidas com avidez, meus lábios se fechando em torno da ponta do seu pau para não perder uma gota, os olhos ainda fixos nos de Heitor, como se o desafiando a olhar para outro lugar.
Quando Heitor finalmente se acalmou, ofegante, ele não deu tempo para eu me recuperar. Com um movimento rápido, me puxou de volta para cima e me empurrou contra a parede novamente, desta vez com mais força, meu corpo batendo no metal com um baque surdo.
— Agora é a minha vez — murmurou, a voz ainda rouca de prazer, antes de se ajoelhar na minha frente, as mãos deslizando pelas minhas coxas trêmulas.
Eu nunca tinha sido chupado antes. Era a minha primeira vez.
Não houve delicadeza. Heitor levou meu membro direto à boca, os lábios se fechando em torno do meu cacete com uma pressão firme, a língua girando em torno da cabecinha sensível antes de começar a chupar com uma intensidade que me fez soltar um gemido alto, minhas mãos indo para a cabeça de Heitor, meus dedos se enterrando nos cabelos negros como se precisasse de algo para me segurar.
Eu estava completamente tomado pela situação de ter outro homem me chupando. Heitor não tinha pressa. Ele explorou cada centímetro, a língua traçando minhas veias saltadas, seus lábios pressionando a minha pele quente enquanto a mão massageava a base da minha vara, os dedos brincando com minhas bolas já tensas.
Eu não conseguia ficar quieto. Os quadris se moviam sem controle, me empurrando para dentro da boca de Heitor em um ritmo cada vez mais desesperado, os gemidos saindo em jorradas incontroláveis.
— Porra, Heitor, eu vou... — comecei, mas não terminei a frase.
O orgasmo me atingiu como uma onda, meu corpo todo se contraindo enquanto jorrava na boca de Heitor, que engoliu tudo sem parar, os lábios ainda pressionados contra a minha pele sensível até que eu tremesse, ofegante, as pernas quase cedendo.
Quando finalmente nos soltamos, foi como se o mundo tivesse parado. Heitor se levantou lentamente, os lábios ainda brilhando com a umidade, e eu o puxei para mim, nossos corpos colados, os corações batendo no mesmo ritmo acelerado. Não trocamos palavras. Não eram necessárias. Os olhos já diziam tudo, o perigo daquilo, a intensidade, a certeza de que não haveria volta.
Com um suspiro, Heitor deslizou até a moto, me sentando no banco, nossos corpos se acomodando em um abraço, as roupas ainda desarrumadas, a pele quente contrastando com o ar gelado da noite. Eu apoiei a cabeça no ombro de Heitor, os dedos traçando padrões distraidamente sobre o peito dele, enquanto Heitor passava os dedos pelos meus cabelos, como se quisesse memorizar cada fio.
O silêncio entre nós era pesado, carregado de coisas não ditas, de promessas perigosas, de um futuro que nenhum de nós dois ousava nomear. Mas, pela primeira vez em muito tempo, não havia medo. Só havia aquilo, o calor dos corpos ainda tremendo de prazer, o gosto um do outro ainda fresco nos lábios, e a certeza de que, não importava o que viesse pela frente, nós enfrentaríamos juntos.
A noite nos envolvia, escura e cheia de possibilidades. E, pela primeira vez, nenhum dos dois quis escapar.
A partir daquele dia, algo mudou. Nós passamos a nos ver com mais frequência, sempre escondidos, sempre com o cuidado de quem sabe que está atravessando uma linha invisível. Às vezes era um passeio curto de moto, às vezes uma tarde inteira dentro do quarto de Heitor, com a porta trancada, música baixa, conversas longas intercaladas por silêncios cheios de significado.
Heitor se mostrava cada vez mais intenso, mais presente. Tinha um jeito protetor, quase possessivo, que me fazia me sentir desejado e, ao mesmo tempo, pequeno diante da experiência dele.
Eu, por minha vez, me entregava com uma confiança que assustava até a mim mesmo, ainda me recuperando do baque emocional que tinha sido o meu “relacionamento” com Leandro. Eu idealizava Heitor sem perceber. Via nele tudo o que sempre quis ser: livre, admirado, seguro de si.
E isso tornava tudo mais perigoso.
Entretanto, Júlia não era boba.
Ela começou a notar os olhares que demoravam demais. As ausências repentinas de Heitor. O meu jeito esquivo, que nunca estava totalmente disponível para ela.
— Vocês andam muito juntos, né? — comentou um dia, fingindo leveza.
Eu sorri sem responder.
Ela observava. Guardava. E se incomodava.
Não por Heitor, nunca por ele, o irmão mais velho que ela tanto adorava e também idealizava. Mas por mim.
Ela sentia que estava me perdendo para algo que não entendia.
As outras pessoas ou não estavam prestando atenção suficiente ou realmente não se interessavam. Meus pais ficavam ansiosos e contentes por saber que eu estava fazendo amigos e até tinha uma “namorada”. Eles sabiam que nos últimos anos eu tinha tido vários problemas para conseguir me relacionar bem com as pessoas, então consideravam um grande avanço eu estar indo a festas e tudo o mais. Assim, não se importavam que eu passasse tempo fora na casa dos meus novos amigos.
A mãe de Heitor e Julia não se importava muito com os filhos. Com exceção de Julia, todos já eram maiores de idade e ela estava mais focada no seu novo casamento e nos seus negócios. Ela estava investindo em um salão de beleza, que inaugurara recentemente na cidade.
O padrasto mal conversava com os enteados e nem se preocupava com o que estavam fazendo ou deixando de fazer, a bem da verdade.
Miguel estava namorando uma moça linda do bairro e só tinha olhos para ela.
Já Rafael, por outro lado, não perguntava nada. Ele apenas via.
Ele me via entrando e saindo demais da casa. Via Heitor voltar para casa com o olhar distante. Via gestos pequenos demais para chamar atenção, mas grandes demais para passar despercebidos.
Rafael sempre foi o invisível da família. O que não se destacava. O que ninguém notava direito. E, talvez por isso, notasse tudo.
Era uma tarde comum quando a campainha tocou na minha casa.
Meus pais ainda estavam no trabalho. A faxineira já tinha ido embora. Eu estava sozinho, de bermuda e camiseta, lendo no sofá.
Abri a porta e estranhei.
Rafael.
— Oi — ele disse, simples — Posso entrar?
Eu hesitei, mas abri passagem. Eu não era especialmente próximo de Rafael, sempre havíamos conversado amistosamente nas festas na casa dele, mas nunca tínhamos tido aquela proximidade.
Rafael entrou, atravessou a varanda, entrou na minha casa, olhou a sala com calma, como quem avalia um território. Sentou-se sem ser convidado.
— Fica tranquilo — disse, se esticando no encosto do sofá — Eu vim de boa.
Eu senti um frio estranho na barriga. Não entendia o que estava acontecendo.
— Então… por que você veio?
Rafael sorriu de canto. Um sorriso lento, desconfortável.
— Porque alguém precisava dizer isso em voz alta — respondeu —Porque eu sei muito bem o que tá acontecendo entre você e o Heitor.
O silêncio caiu pesado. Eu senti o rosto esquentar, o corpo inteiro ficar alerta.
— Você não sabe de nada — tentei responder.
Rafael inclinou a cabeça.
— Sei mais do que você imagina — disse, calmo demais — E mais do que você gostaria.
O perigo, agora, não era mais abstrato.
Tinha nome. Tinha rosto. E estava sentado no sofá da minha sala.
