A porta não só bateu. Ela explodiu atrás de mim, como se quisesse deixar claro que eu não era mais bem-vindo ali.
E meu pai, no meio da sala, gritando que “na casa dele não tinha lugar pra viado”, parecia menor do que nunca — ou talvez eu finalmente estivesse enxergando quem ele realmente era.
Mas o pior… o pior não foi ele.
Foi minha mãe.
Ela tremia. Tremia tanto que parecia que ia despencar ali mesmo. Quando ela sussurrou meu nome, “Akio…”, foi como se estivesse me puxando de volta pro colo — mas sem conseguir me alcançar.
Ela trouxe minha mochila, toda amassada, claramente arrumada nas pressas, ou nem arrumada de verdade.
“Me perdoa, meu filho…”, ela disse, com a voz quebrada, quase sumindo.
Quando ela me abraçou, eu senti o cheiro dela, que sempre me acalmou desde pequeno.
Por um segundo, eu realmente acreditei que ela ia dizer pra eu ficar, que ia bater de frente com ele.
Mas não.
Meu pai arrancou ela dos meus braços como se eu fosse algum tipo de ameaça.
A porta se fechou.
E pronto.
Minha casa virou só mais uma parede atrás de mim.
Naquela noite, não tinha pra onde ir.
Acabei dormindo na rua — ou algo parecido com dormir. Mais foi cochilo do que sono, entre o frio que cortava e a cabeça que parecia querer explodir de tanto pensar. Eu estava sujo, cansado, com o coração parecendo um caco de vidro dentro do peito.
Quando o sol nasceu, eu fiquei ali sentado, olhando a rua vazia e pensando em absolutamente nada — porque, se eu pensasse em alguma coisa, eu desabava de novo.
E aí, do nada, bateu uma ideia na minha cabeça: eu preciso ir embora daqui.
De verdade.
A cidade onde eu cresci já não tinha mais espaço pra mim.
A rodoviária da minha cidade só abria mais tarde, então eu fui andando até a cidade vizinha.
Era longe pra caramba.
Mas eu fui do mesmo jeito.
Cada passo doía, parecia mais um lembrete da noite anterior. Mas ao mesmo tempo, andar era melhor do que ficar parado sentindo tudo.
Quando cheguei na rodoviária, eu estava acabado — mas determinado. Comprei a passagem mais barata pra São Paulo.
Eu não sabia exatamente o que ia encontrar lá, mas… era grande. E eu queria me perder um pouco, começar do zero, virar alguém novo, alguém que ninguém precisasse expulsar de lugar nenhum.
Entrei no ônibus, joguei a mochila no banco e sentei na janela.
Coloquei os fones.
Dei play em Chasing Pavements, da Adele.
E aí não teve jeito.
Eu chorei. Chorei de verdade, sem tentar segurar, com o rosto encostado no vidro gelado enquanto a estrada começava a correr ao meu lado.
A letra falava de caminhos que talvez nem levassem pra lugar nenhum — mas, naquele momento, qualquer caminho era melhor do que voltar.
E foi assim que começou meu recomeço:
eu, sozinho num ônibus, Adele na cabeça, e lágrimas caindo sem parar.