O vazio preenchido por Caius

Um conto erótico de Leandro Gomes
Categoria: Homossexual
Contém 1075 palavras
Data: 07/12/2025 21:49:25

23 de janeiro, A.D. XLVI

Os últimos meses têm sido de silêncio absoluto desde a última vez que Valek me visitou. O vampiro, cuja presença antes parecia acompanhar até meu próprio fôlego, simplesmente deixou de estar comigo. A névoa não se ergue, o vento não muda de direção, e nenhuma sombra se move onde não deveria. Outrora eu dizia a mim mesmo que isso era alívio, ao mesmo tempo em que sentia uma ausência tão profunda que se tornava um vazio em meu peito. Agora, porém, não sinto senão que esse vazio tem sido preenchido por Caius.

Caius Marcellus se aproximou de mim como ninguém antes. Meu melhor soldado – e o mais belo! Homem de postura firme, coragem constante, silêncio honroso, lealdade inquestionável — e olhos azuis que me fitavam com uma leveza que eu não sabia retribuir, mas não conseguia evitar, e me transmitiam uma serenidade que que acalmava a alma atribulada.

Nos exercícios, ele me observava mais do que o necessário. Nas patrulhas, caminhava sempre um passo atrás de mim, como se temesse perder-me. E nas noites mais frias, quando o acampamento dormia, ele vigiava a casa, mesmo quando não era a função dele. Começava a conversar comigo, me elogiava com sinceridade e me oferecia sabedoria para com os demais soldados, ou com a vida em geral. Em pouco tempo, tornamo-nos amigos. Eu sabia tudo sobre ele e, ainda que ele não soubesse muita coisa sobre mim, sua afeição era genuína e incondicional.

Nesses últimos meses, ele tem ganhado espaço na minha vida, derrubando toda muralha que ergui por pertencer a outro, Valek, e por medo de que sucedesse com ele o mesmo que foi com aqueles de quem e aproximei e com quem tive algum contato mais íntimo. Foram dias e dias de uma agonia intensa, mas daquela agonia prazerosa que acompanha os corações enamorados, ainda que no início o medo me fazia manter minha postura e distância. Porém, o olhar doce e sereno de Caius foi mais avassalador do que qualquer força e sentimento que conheci. E os sonhos que tive com ele... Ah, os sonhos! Eles me faziam ceder ao olhar e cuidado de Caius a cada manhã. Durante meus banhos, me lembrava dos sonhos tão nitidamente que era como se as mãos dele deslizassem pelo meu corpo, envolvendo meu membro, e me levavam ao ápice do prazer. Também isso acontecia antes de dormir. Me sentia um jovem novamente, cheio de desejos o tempo todo.

Mas então, os sonhos cessaram quando veio o que é real. Foi na noite de ontem, depois de uma patrulha longa e exaustiva, no dia seguinte à noite em que nos beijamos. Todos dormiam, guardados pelos sentinelas noturnos. Eu estava em meu quarto na fortaleza, deitado mas sem sono, quando dois toques na porta me fizeram levantar. Era Caius. Ao abrir a porta, ele me olhou nos olhos com tanta profundidade e ternura que me desarmou. Senti um nó na garganta, um choro retido há tempos, mas não de tristeza, e sim de alívio e alegria. Meus olhos se encheram de lágrimas quando reconheci que o amava. Meu coração bateu tão forte que parecia querer sair do meu peito.

Caius entrou pela porta e, sem dizer uma só palavra, eu o tomei em meus braços. Nossos lábios se tocaram com paixão avassaladora. Levei-o para a cama e removi suas vestes por completo, e ele removeu minha túnica. Ficamos frente a frente, admirando um ao outro. Nossos membros enrijecidos de paixão, pulsando de desejo, amor, carinho e tudo de melhor que sentíamos um pelo outro. Nos abraçamos e nossos membros se tocaram feito espadas em combate.

O cheiro de seu corpo e seu calor me envolveram como um manto, me fazendo sentir protegido, cuidado, amado. Caius se virou de costas e se entregou a mim. Nos tornamos um quando, dentro dele, eu o amei com todas as minhas forças e derramei dentro dele meu amor em espasmos incontroláveis e, em seguida, minha boca se encheu até a última gota de seu amor por mim. Nos beijamos novamente e então sorrimos ofegantes um para o outro, como um brinde àquele momento. Nos entregamos ao prazer novamente, tão intensamente como da primeira vez, que caímos exaustos no leito.

Porém, foi justamente nesse instante — quando deitados lado a lado, ofegantes, a pele ainda quente e tomada de suor — que eu voltei a sentir a presença. Me assustei, mas não vi nada. Não ouvi nada. A lamparina queimava normalmente. Caius já dormia em meu ombro, alheio. Mas eu senti um peso invisível no ar. Um olhar queimando minha nuca. Uma consciência antiga, densa, envolvente, tão clara e tão próxima que meu corpo inteiro se arrepiou.

“Algo errado, Marco?”, murmurou Caius, meio adormecido.

“Não. Está tudo bem”, menti, embora meu coração batesse como se enfrentasse um inimigo invisível.

Não havia dúvida: ele estava ali me observando. Presente na invisibilidade absoluta. Porém, quando ergui a cabeça, procurando uma sombra, um movimento, qualquer sinal — nada. Nenhuma figura. Nenhuma névoa. Nenhum murmúrio. O vampiro não se mostrou. Apenas observava. Pensei ser coisa da minha cabeça, fruto do medo.

25 de março, A.D. XLVI

Os dias passaram. E, apesar do medo escondido, eu não me afastei de Caius. Não consegui. Seu amor é tudo o que eu preciso. Ele me traz calma, humanidade, calor. E cada vez que caímos um nos braços do outro, eu sinto novamente a presença. Sempre depois. Nunca antes. Nunca durante.

O ar fica mais pesado. A chama da lamparina diminui, mas não se apaga. É como se uma sombra se encoste nas paredes, observando-nos em silêncio profundo. Às vezes eu me viro rapidamente, achando que o verei. Mas não o vejo. Apenas o sinto. O mesmo peso. A mesma respiração silenciosa na escuridão. A mesma certeza de que não estamos sozinhos.

Durante os últimos dois meses isso se repetiu. Todas as vezes que Caius me toca com ternura, todas as vezes em que nos entregamos um ao outro em busca de algo que não encontramos em mais ninguém — a presença surge depois. Mas agora algo em mim sabe: não é mera vigilância. Não é acaso. É ciúme. É posse. É aviso. E temo pela vida de Caius. Temo que não possa continuar com ele. Entretanto, com ele sinto novamente o amor que há muito tempo não sentia.

Nota: Neste trecho do diário, há manchas como círculos irregulares, muito parecidas com manchas feitas por lágrimas.

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Comentários

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Gosto muito da construção da história! E você nos deixando ansiosos soltando essas dicas do que está por vir...

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Tenso. Essa nota, essas lágrimas não são um bom presságio. Cada vez mais ansioso.

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