Mamãe Teve Que Ir Sentada No Meu Colo - Parte 4

Um conto erótico de Gil
Categoria: Heterossexual
Contém 6608 palavras
Data: 22/12/2025 11:37:01

Parte 4 - Manhã Seguinte e Café da Manhã)

Acordei quando a luz do sol de domingo, aquela luz agressiva e branca que só existe depois das dez da manhã, invadiu o quarto através da brecha entre as cortinas pesadas, cortando o ar parado como uma lâmina de vidro. Meu corpo reagiu antes da minha mente. Uma onda de calor subiu pela minha espinha e se espalhou pelos membros, mas não era febre. Era vergonha.

Não me mexi imediatamente. Fiquei deitado de costas, os olhos fechados com força, como se a escuridão artificial pudesse manter a realidade do lado de fora das pálpebras por mais alguns segundos. Eu queria que tivesse sido um pesadelo. Um daqueles sonhos febris e lúcidos causados por dormir demais ou por beber cerveja quente no banco de trás de um carro em movimento. Mas meu corpo sabia a verdade. Minhas pernas pareciam feitas de chumbo derretido, pesadas e doloridas, afundadas no colchão que agora parecia estranho, como se não fosse mais a minha cama, o meu refúgio de adolescente, mas um palco onde eu tinha interpretado um papel que não conhecia.

A primeira coisa que registrei de verdade não foi a luz, nem o som distante de pássaros lá fora. Foi o cheiro.

Não era o cheiro de café passado ou de pão na chapa que costumava subir da cozinha nas manhãs de domingo, anunciando um dia preguiçoso de TV e churrasco. Era algo muito mais próximo. Muito mais íntimo. Um cheiro que parecia impregnado na minha pele, nos poros, no travesseiro onde eu tinha afundado o rosto. Estava no lençol que cobria minhas pernas, formando uma segunda pele sobre mim.

Era uma mistura densa, quase palpável, que fazia meu estômago revirar em um nó apertado de náusea e desejo. Suor seco, salgado e acre. O resquício da minha própria colônia barata, agora azeda. E, por cima de tudo isso, dominando o espectro olfativo, aquele aroma inconfundível. Doce. Almiscarado. Profundo como terra úmida depois da chuva.

O cheiro da minha mãe.

Abri os olhos de supetão, ofegante, como se tivesse acordado de um afogamento. Encarei o teto branco, contando as imperfeições na pintura para me ancorar, mas as imagens da madrugada voltaram em flashes desordenados, brutais, sem pedir licença. Eram vívidas demais, coloridas demais.

Lembrei da mão dela puxando meu zíper no escuro do carro, a urgência dos dedos finos, a respiração dela quente e rápida no meu pescoço enquanto a estrada passava lá fora. O som do zíper descendo parecia ter acontecido há cinco minutos. Lembrei do olhar do meu pai no retrovisor, aqueles olhos escuros que não julgavam, não condenavam, apenas devoravam a cena com uma fome fria e calculista. Ele sabia. Ele tinha permitido.

Lembrei da subida silenciosa da escada para o andar de cima. Cada degrau de madeira rangendo sob nossos pés como um aviso, um protesto da casa contra o que estava prestes a acontecer. O silêncio no corredor era tão denso que eu podia ouvir minha própria pulsação martelando nos ouvidos.

E, finalmente, o quarto. Aquele quarto proibido, com cheiro de móveis antigos e segredos de casal. A luz amarela do abajur.

A visão dela nua. Não a minha mãe que fazia bolos ou reclamava da conta de luz. Mas uma mulher, uma fêmea, feroz e desesperada, em cima de mim. A maneira como ela jogou a cabeça para trás, o cabelo loiro caindo como uma cascata sobre os ombros suados. O som gutural que ela fez quando eu entrei nela, rompendo a última barreira de decência que nos separava. A sensação de estar *dentro* dela, envolto por aquele calor úmido e apertado que parecia querer engolir minha alma e nunca mais devolver.

Meu corpo reagiu instantaneamente à memória. Uma ereção matinal dolorosa, confusa e dura como pedra empurrou o lençol para cima, formando uma tenda ridícula e acusadora.

Era um lembrete físico, indesejado e inegável, de que nada daquilo tinha sido um sonho. Tinha acontecido. Eu tinha cruzado a linha. Eu tinha fodido a minha mãe. E eu tinha gostado.

Rolei para o lado na cama, sentindo uma pontada aguda de dor muscular na virilha e na parte interna das coxas, resultado do esforço físico não habitual e da tensão extrema. Eu estava exausto, drenado fisicamente, como se tivesse corrido uma maratona. Mas, ao mesmo tempo, sentia uma eletricidade estranha correndo pelas minhas veias, uma vibração que me deixava inquieto. Era como se eu tivesse colocado o dedo em uma tomada exposta e o choque ainda estivesse reverberando, recusando-se a dissipar.

Olhei em volta do meu quarto. Os pôsteres antigos de bandas de rock na parede, desbotados pelo tempo. O notebook fechado na escrivaninha bagunçada, coberto de adesivos. As roupas jogadas na cadeira, jeans e camisetas que cheiravam a amaciante.

Tudo parecia igual. Cada objeto estava no seu lugar. E, no entanto, tudo parecia pertencer a outra pessoa. Parecia o quarto do Fernando de ontem de manhã. Aquele garoto ingênuo que saiu para caçar javalis com o pai e o primo, preocupado apenas em não errar o tiro e em impressionar o tio. Aquele garoto tinha morrido em algum lugar na BR-116, entre uma curva fechada e um buraco na estrada. Ou talvez tivesse deixado de existir no tapete persa do quarto dos meus pais, esmagado sob o peso da luxúria e da manipulação.

O Fernando que acordou hoje era outra coisa. Uma versão alterada, distorcida. Algo que eu ainda não sabia definir, e isso me aterrorizava mais do que qualquer punição que pudesse vir.

Fiquei deitado, encarando o teto, tentando regular minha respiração, que saía curta e rápida. *Inspira. Expira.* Tentei focar no som dos carros passando na rua lá longe. Tentei lembrar de alguma música. Qualquer coisa para abafar o eco dos gemidos dela na minha cabeça.

Foi então que ouvi. Vozes.

Vozes abafadas, vindas do andar de baixo. O som viajava pela estrutura da casa, distorcido pelas paredes e pelo piso de madeira, chegando até mim como um sussurro fantasmagórico.

Reconheci o tom grave do meu pai. Monocórdico. Calmo. A voz de quem está no comando, de quem acorda sem peso na consciência. Ele falava algo indistingüível, mas o tom era casual, quase banal.

Ouvi o tinido de louça sendo lavada. Talheres batendo contra pratos de cerâmica. O som da torneira abrindo e fechando. A normalidade doméstica em seu estado mais puro e cristalino.

Mas não ouvi a voz dela. Não ouvi a minha mãe cantarolando baixinho como ela sempre fazia enquanto preparava o café. Não ouvi a risada dela, nem comentários sobre o tempo ou sobre o que faríamos no almoço. Apenas o silêncio dela, intercalado pelos sons mecânicos da casa funcionando.

A normalidade daqueles sons era a coisa mais assustadora do mundo naquele momento. Era uma violência silenciosa.

Como eles podiam estar lá embaixo? Como podiam estar fazendo café, seguindo a rotina de domingo, depois do que fizemos? Depois de termos quebrado o maior de todos os tabus da humanidade? Depois de termos reescrito as regras daquela família em fluidos, suor e gemidos proibidos?

Será que eles estavam fingindo que nada aconteceu? Será que eu deveria fingir também? Ou será que eles estavam lá embaixo discutindo o que fazer comigo? Me expulsar? Me internar?

Forcei-me a levantar. Minhas pernas pareciam de chumbo quando toquei o chão frio com os pés descalços.

Caminhei até o banheiro do corredor como um prisioneiro caminhando para a execução. Evitei olhar para a porta do quarto deles, que estava fechada no final do corredor escuro. A madeira da porta parecia vibrar com uma energia residual, como se o que aconteceu lá dentro tivesse deixado uma marca radioativa.

Entrei no banheiro e tranquei a porta, girando a chave duas vezes, precisando desesperadamente de privacidade, de uma barreira física entre mim e o resto da casa.

O espelho acima da pia me devolveu a imagem de um estranho. Meus olhos estavam inchados, vermelhos nas bordas. O cabelo, amassado e oleoso. A pele pálida, doentia. Eu parecia alguém de ressaca, alguém que tinha passado a noite bebendo veneno.

Então eu vi.

Bem no pescoço, perto da clavícula, escondido pela sombra do queixo e pela gola da camiseta de dormir. Uma pequena marca avermelhada, do tamanho de uma moeda.

Inclinei-me para perto do espelho, quase encostando o nariz no vidro frio, tocando a pele sensível com a ponta dos dedos trêmulos.

Não era um chupão óbvio, daqueles roxos e vulgares de adolescente. Era uma marca de pressão. A marca onde a boca dela tinha se apoiado com força, mordendo o próprio lábio ou a minha pele, tentando abafar um grito durante o orgasmo.

Era um selo. Uma marca de propriedade. Ela tinha me marcado, como nós marcamos o gado na fazenda com ferro quente. Eu era dela agora. De um jeito que nenhum filho deveria ser.

Liguei o chuveiro na temperatura mais fria possível. A água gelada atingiu minhas costas como agulhas de gelo, me fazendo arfar. Entrei debaixo do jato, deixando a água escorrer pelo rosto, pelos ombros, pelo peito.

Esfreguei a pele com força, usando a bucha vegetal até a pele ficar vermelha e ardendo. Usei o sabonete até fazer espuma demais, tentando tirar o cheiro. Tentando apagar a memória tátil do suor dela, a sensação fantasma das unhas dela nas minhas costas.

Mas não adiantou. A água lavava o suor, mas não lavava a memória.

A sensação de ter estado *dentro* dela. Aquele calor úmido, apertado, que parecia engolir minha alma e apertar meu pau com uma força sobrenatural... aquilo estava gravado na minha memória muscular, nos meus nervos, no meu DNA. Nenhuma quantidade de sabonete tiraria aquilo de mim.

Desliguei o chuveiro, tremendo de frio e de adrenalina residual. Sequei-me rápido com a toalha áspera.

Vesti uma camiseta qualquer, preta, larga, e uma bermuda jeans velha. Precisava me vestir. Precisava de armadura. Precisava cobrir a marca no pescoço.

Abri a porta do banheiro e encarei a escada que descia para a sala. O abismo.

Desci degrau por degrau. A madeira rangia sob meus pés descalços, anunciando minha chegada como um sino fúnebre. *Creeec. Creeec.*

Meu coração batia na garganta, rápido e descompassado, como um pássaro preso numa gaiola pequena demais, batendo as asas contra as grades de osso do meu peito.

A cada passo, o cheiro de café ficava mais forte, substituindo o cheiro de sexo que eu trazia na mente, criando uma dissonância cognitiva nauseante. Café e sexo. Manhã e noite. Mãe e amante.

A cozinha estava clara, banhada pela luz implacável do sol. A janela estava aberta, deixando entrar uma brisa fresca que balançava a cortina de renda branca, projetando sombras rendadas na mesa de fórmica.

Era o oposto exato da penumbra suja, quente, vermelha e excitante do quarto na noite anterior. Era um cenário de pureza doméstica que parecia zombar de nós.

Meu pai estava sentado à cabeceira da mesa. O lugar de sempre. O trono.

Ele lia notícias no tablet, os óculos de leitura na ponta do nariz, a expressão serena e concentrada. Uma caneca de café fumegante repousava perto da mão direita dele, ao lado de um prato com restos de torrada.

Ele usava uma camisa polo azul-marinho, limpa, passada, com o colarinho engomado. O cabelo grisalho penteado para trás, ainda úmido do banho, cheirando a gel barato.

Ele parecia... normal. Assustadoramente normal. O patriarca. O provedor. O homem de família respeitável que pagava as contas e ia à igreja no Natal.

Ele nem levantou os olhos quando entrei. Continuou deslizando o dedo pela tela, imperturbável, como se eu fosse apenas um fantasma passando pela sala.

Minha mãe estava de costas para mim, parada na pia, lavando a louça do café.

Ela usava um vestido de casa simples, de algodão azul claro com pequenas flores brancas, solto no corpo, que ia até os joelhos. O cabelo loiro estava preso num coque frouxo e desleixado, com alguns fios soltos caindo na nuca pálida.

A visão das costas dela me causou um curto-circuito mental imediato.

Horas antes, aquelas mesmas costas estavam arqueadas em um arco perfeito de prazer e dor. Suadas. Nuas. Brilhando na luz amarela do abajur.

Eu tinha visto os músculos daquelas costas se contraírem, desenhando mapas de tensão enquanto ela gritava meu nome, implorando por mais. Eu tinha segurado na cintura dela, deixado marcas dos meus dedos na pele macia.

Agora, ela estava lavando uma frigideira. Esfregando com a esponja amarela em movimentos circulares, domésticos, banais. O contraste era violento demais para processar. Era como ver um ator sair do palco depois de um assassinato e começar a varrer o chão.

"Bom dia," murmurei. A voz saiu rouca, falhada, quase inaudível, arranhando minha garganta seca.

Meu pai parou o dedo na tela do tablet. O movimento cessou. Ele levantou os olhos lentamente por cima dos óculos de leitura.

O olhar dele era indecifrável. Eu procurei por raiva. Procurei por nojo. Procurei por aquele brilho predatório, insano e voyeurístico da noite passada, quando ele me mandou foder a esposa dele.

Não encontrei nada disso.

Encontrei apenas uma calma avaliadora. Fria. Clínica. Como um cientista observando um rato de laboratório que acabou de sobreviver a um experimento arriscado. Ou um general inspecionando suas tropas na manhã seguinte a uma batalha sangrenta, contando as baixas e avaliando a moral.

"Bom dia, garoto," ele respondeu. O tom era casual, leve, mas havia um peso tectônico em cada sílaba. "Dormiu bem?"

A pergunta pairou no ar, pesada, sólida, carregada de subtexto venenoso.

*Dormiu bem? Depois de foder a sua mãe sob o meu comando? Depois de destruir a moralidade desta casa e gostar disso?*

"Normal," respondi, seco, defensivo. Puxei uma cadeira e sentei o mais longe possível deles, na ponta oposta da mesa, criando uma trincheira de madeira e fórmica entre nós.

O som da cadeira arrastando no piso de cerâmica pareceu um trovão, rompendo o silêncio frágil da cozinha.

Minha mãe desligou a torneira bruscamente. A água parou de correr. O silêncio voltou, mais pesado do que antes.

Ela secou as mãos no pano de prato xadrez pendurado na porta do forno. Fez isso devagar, metodicamente, secando dedo por dedo, demorando mais do que o necessário.

Dava para ver a tensão nos ombros dela. A rigidez na postura. Ela estava reunindo coragem. Preparando-se para se virar e encarar o que tinha feito. Encarar o filho que tinha transformado em amante por uma noite.

Quando finalmente girou o corpo, ela evitou meus olhos como se eu fosse o sol e olhar diretamente pudesse cegá-la.

Olhou para a parede. Olhou para o chão. Olhou para a geladeira coberta de ímãs de viagens e listas de compras.

O rosto dela estava limpo, lavado, sem maquiagem. A pele parecia mais pálida do que o normal. Havia olheiras profundas e arroxeadas sob os olhos verdes, denunciando uma noite mal dormida, ou talvez uma noite passada encarando o teto e repassando cada segundo do pecado.

Ela parecia cansada. Frágil. Quase quebrada. Uma boneca de porcelana que tinha sido jogada contra a parede e colada de qualquer jeito.

Mas então, por um acidente de percurso, o olhar dela varreu a sala e cruzou com o meu. Foi uma fração de segundo. Um milésimo de tempo.

Mas foi o suficiente.

Vi um flash nos olhos dela. Uma faísca elétrica.

Não era apenas vergonha. Havia medo, sim. O terror de ter destruído a família.

Mas havia algo mais. Algo terrível e fascinante.

Havia aquela mesma fome. Aquele desespero silencioso, cru e animal que eu tinha visto no carro antes dela colocar a mão na minha calça. A lembrança do prazer. A memória do meu corpo dentro do dela.

Ela corou violentamente. O rubor subiu do pescoço até as raízes do cabelo loiro, manchando a pele pálida de vermelho vivo. Ela desviou o olhar rapidamente para a toalha de mesa bordada.

"Tem café no bule," ela disse. A voz dela estava baixa, trêmula, quase sumindo. "E fiz ovos mexidos, se você quiser. Com bacon. Do jeito que você gosta."

"Só café, obrigado," respondi. Meu estômago estava embrulhado demais para comida sólida. A ideia de mastigar parecia impossível.

Ela veio até a mesa para pegar o bule de alumínio.

O movimento dela trouxe uma lufada de ar em minha direção, deslocando o ar parado da cozinha. O cheiro dela me atingiu de novo, como um tapa invisível.

Agora estava misturado com sabonete de lavanda, detergente de limão e o cheiro de fritura do bacon. Mas, por baixo disso tudo, bem no fundo, escondido nas camadas mais profundas, eu ainda sentia *aquilo*. O cheiro da noite. O cheiro do nosso segredo.

A proximidade física dela fez os pelos do meu braço arrepiarem involuntariamente. Meu corpo se tencionou, preparado para fugir ou para atacar.

Ela estendeu a mão para servir minha xícara.

Observei a mão dela. Os dedos finos, longos, as unhas curtas e bem cuidadas sem esmalte. Eram mãos de mãe. Mãos que cuidavam.

Mas a mão tremia. Um tremor leve, quase imperceptível, mas estava lá. Uma vibração constante que denunciava o caos interior.

O bico do bule de metal tilintou contra a borda da porcelana da xícara.

*Tlim-tlim-tlim.*

O som ecoou na cozinha silenciosa como um alarme de incêndio, gritando a instabilidade da situação.

Ela serviu o café preto, escuro como piche, e recuou rapidamente. Deu um passo para trás como se tivesse encostado em fogo. Como se a minha proximidade fosse perigosa, radioativa.

Ela não se sentou à mesa conosco. Não puxou a cadeira habitual ao lado do meu pai.

Ela ficou em pé, encostada no balcão da pia, longe, abraçando o próprio corpo com os braços cruzados sobre o peito, protegendo-se. Ela olhava fixamente para a janela que dava para o quintal, para a grama verde e o céu azul, como se quisesse fugir para lá.

O silêncio na cozinha se tornou espesso. Sólido. Ocupava o espaço físico entre nós três como uma quarta pessoa sentada à mesa. Uma presença fantasmagórica feita de tudo o que não estava sendo dito.

Eu podia ouvir o relógio de parede em forma de galinha tiquetaqueando acima da porta. *Tic. Tac. Tic. Tac.*

Cada segundo parecia uma hora. Cada batida marcava o tempo dessa nossa nova realidade distorcida, onde mãe, pai e filho eram papéis que não se encaixavam mais nas definições do dicionário.

Levei a xícara à boca com a mão um pouco trêmula também. Bebi o café quente demais. Senti o líquido escaldante queimar minha língua e descer rasgando pela garganta. Queimei a boca de propósito. Precisava sentir uma dor física real, aguda, para focar a mente, para me ancorar no presente e não ser arrastado de volta para as lembranças da noite.

"A carne dos javalis já está no freezer," meu pai disse de repente.

A voz dele quebrou o silêncio com a sutileza de uma marretada em uma vidraça.

Eu quase derrubei a xícara. O som da voz dele parecia vir de outro mundo, um mundo onde caçar javalis era a coisa mais importante do dia.

"Deu trabalho organizar tudo ontem à noite," ele continuou, casualmente, virando uma página no tablet com um movimento fluido do dedo. Ele não olhou para nós. Falava como se comentasse a previsão do tempo. "Depois que... depois que nós subimos."

Minha mãe estremeceu visivelmente lá no balcão. Eu vi os ombros dela subirem e descerem rápido. Ela apertou os braços com mais força ao redor de si mesma.

Engoli em seco, o café descendo quadrado, misturando-se com a bile na minha garganta.

Ele estava fazendo de propósito. Estava testando o terreno. Cutucando a ferida aberta para ver se ainda sangrava. Para ver como reagiríamos à menção, mesmo que indireta, do que tinha acontecido "depois que subimos".

Ele estava demarcando território. Lembrando-nos de que ele estava lá. De que ele sabia. De que ele tinha orquestrado tudo.

"Sua tia Marina ligou hoje cedo," meu pai soltou a bomba, sem mudar o tom de voz, sem levantar os olhos da tela iluminada do tablet.

Senti um frio na espinha que desceu até o cóccix, congelando minha medula.

A Tia Marina. A instigadora. A mulher que começou tudo isso.

A imagem dela voltou à minha mente: no banco de trás da caminhonete, apertada contra o primo Matheus, mas com os olhos fixos em mim e na minha mãe. As provocações veladas. A mão boba. A competição silenciosa e venenosa entre as duas irmãs que transformou uma viagem de volta para casa em um catalisador de perversão.

Ela não sabia. Ela não tinha ideia de que tinha acendido um pavio que explodiria a família inteira. Ela achava que era só um jogo. Só uma disputa de ego.

"O que você disse a ela?" perguntei. Tentei manter a voz firme, adulta, mas falhei. Saiu fina, ansiosa, a voz de uma criança que quebrou um vaso caro e tenta esconder os cacos.

"Disse que estávamos cansados da viagem. Que precisávamos... descansar em família."

Ele deu um pequeno sorriso de canto de boca. Um sorriso seco, que não chegou aos olhos. Um sorriso que guardava um segredo sujo.

"Ela disse que achou você meio quieto quando desceu do carro ontem. Perguntou se ela tinha exagerado nas brincadeiras. Se tinha deixado o sobrinho favorito dela constrangido."

Minha mãe soltou um som estranho lá no balcão. Foi meio risada, meio escárnio, um som que arranhou a garganta dela.

"Exagerado," ela murmurou para a janela, a voz pingando uma amargura destilada em anos de rivalidade. "Ela sabe exatamente o que fez. Ela sempre sabe. Ela nunca dá ponto sem nó."

"Ela achou que tinha ganhado o jogo, Ana," meu pai disse suavemente, mas com uma clareza brutal, olhando para as costas da esposa. "Ela saiu daquele carro achando que tinha deixado você para trás. Que tinha o controle dos homens dessa família. Que tinha provado que era a mais desejável, a mais ousada."

Minha mãe virou-se bruscamente. O movimento foi tão rápido que o coque frouxo balançou.

Os olhos dela faiscaram. Aquela competitividade tóxica, aquela necessidade patológica de vencer a irmã mais nova, voltou com força total, queimando a vergonha e o medo que ela sentia segundos antes.

"Ela não ganhou nada, Ricardo," ela sibilou, os dentes cerrados. "Você viu. Você sabe que ela não ganhou. Você sabe quem terminou a noite no comando."

"Eu sei," ele concordou, pousando o tablet na mesa com um clique suave. Finalmente, ele olhou para ela com intensidade total.

O olhar dele era pesado, cheio de significado. "Eu vi quem venceu ontem à noite, Ana. Eu vi quem teve a coragem de fazer o que precisa ser feito para manter a família unida. Eu vi quem é a verdadeira matriarca desta casa."

A troca de olhares entre os dois foi elétrica. Intensa. Quase palpável.

Me senti um intruso, um objeto, mesmo sendo o pivô daquela discussão, o instrumento usado para decidir a vitória.

Havia uma cumplicidade perversa ali entre meus pais. Um entendimento antigo, forjado em anos de casamento e de dinâmicas que eu, como filho, nunca tinha percebido antes. Ia muito além do sexo. Era sobre poder. Sobre hierarquia. E sobre a rivalidade eterna dela com a irmã, uma guerra fria que durava décadas e que ontem tinha esquentado até o ponto de fusão nuclear.

"Fernando," meu pai disse, cortando o contato visual com ela e virando para mim. O nome saiu da boca dele como uma ordem.

A atenção dele pesou sobre mim como uma âncora de navio.

"Termine seu café. Quero falar com você na garagem. Agora."

Ele se levantou. A cadeira raspou no chão com um som agudo.

Ele saiu pela porta da cozinha que dava para a área externa sem esperar resposta, sem olhar para trás. O som da porta batendo ecoou como uma sentença de tribunal, final e irrevogável.

Fiquei sozinho com minha mãe por um momento suspenso no tempo.

Ela ainda estava encostada no balcão, a respiração um pouco acelerada. O peito dela subia e descia visivelmente sob o tecido fino do vestido.

Olhei para ela, tentando desesperadamente encontrar a minha mãe. A mulher que fazia bolos de cenoura. A mulher que me levava na escola e brigava por causa das notas.

Mas ela tinha desaparecido. Ou talvez nunca tivesse existido daquele jeito simples que eu imaginava.

No lugar dela estava essa estranha. Essa mulher complexa, cheia de desejos escuros, ressentimentos antigos e segredos compartilhados que agora incluíam o próprio filho.

"Mãe..." comecei, sem saber o que dizer. As palavras morriam na minha língua. *Desculpa? Obrigado? Eu quero de novo?* Nada parecia certo.

"Vai," ela sussurrou. Não olhou para mim. Manteve os olhos baixos, focados nos próprios pés descalços. "Não deixa ele esperando. Você sabe como ele fica."

Hesitei. Minha mão pairou sobre a mesa, querendo alcançar a dela, mas recuou.

"E Fernando..." ela acrescentou, a voz falhando, quebrando no meio da frase.

Ela mordeu o lábio inferior, num gesto que, ontem à noite, teria sido um convite sexual explícito, uma provocação. Hoje, parecia desespero puro.

"Não... não se arrependa. Por favor. Não faça eu me sentir suja. Não me olhe como se eu fosse um monstro."

Aquelas palavras me atingiram como um soco no estômago, tirando o ar dos meus pulmões.

Ela não estava pedindo desculpas. Ela não estava arrependida do ato em si.

Ela estava pedindo validação. Ela precisava saber que o que fizemos não foi apenas um erro grotesco, um deslize bêbado. Ela precisava que tivesse algum significado, alguma conexão, mesmo que distorcida, para conseguir se olhar no espelho.

Levantei-me sem dizer nada. Não podia prometer o que ela queria. Não sabia se eu mesmo me sentia sujo ou não.

Saí da cozinha e fui para a garagem, seguindo os passos do meu pai.

O ar lá fora estava abafado, úmido, prenunciando chuva de verão. O cheiro de graxa, gasolina velha e terra molhada invadiu meu nariz, limpando o cheiro de café e lavanda da cozinha.

A garagem era o domínio dele. Paredes de concreto nu, prateleiras de metal cheias de ferramentas organizadas obsessivamente por tamanho, caixas de munição, varas de pesca. Um templo da masculinidade tradicional.

Meu pai estava parado diante da bancada de trabalho, de costas para a entrada.

Ele limpava distraidamente uma chave inglesa grande e pesada com um pano sujo de óleo preto. Os movimentos eram lentos, rítmicos.

A Hilux preta estava estacionada ali ao lado. Silenciosa. Imponente. O monstro de metal onde tudo começou. O palco do crime inicial.

Olhar para o vidro escuro do banco de trás me deu um nó no estômago. Eu quase podia ver nossos vultos lá dentro, a silhueta da minha mãe no meu colo, a cabeça dela jogada para trás, a mão da Tia Marina no ombro do Matheus.

Ele não se virou quando me aproximei. Ficou de costas, os ombros largos tensionados sob a camisa polo, a postura rígida.

"Feche a porta," ele ordenou. A voz ecoou no espaço fechado.

Obedeci. Apertei o botão na parede de concreto.

O motor do portão eletrônico zumbiu, um som mecânico e arrastado. A porta de metal desceu lentamente, bloqueando a luz do sol, transformando o dia em crepúsculo.

Ficamos na penumbra da garagem, isolados do mundo lá fora. Um casulo de intimidade masculina sombria, iluminado apenas pela lâmpada fluorescente fraca acima da bancada.

"Você deve estar confuso," ele começou, sem se virar. "Com a cabeça cheia de merda. Culpa. Medo. Tesão. Tudo misturado numa sopa só, fervendo no seu cérebro."

"Eu não sei o que pensar, pai," admiti. Encostei-me na parede fria, precisando de suporte. Minhas pernas ainda tremiam. "O que aconteceu ontem... foi..."

"Foi necessário," ele cortou. A voz dele endureceu, cortante como aço.

Ele se virou lentamente e apoiou os quadris na bancada, cruzando os braços sobre o peito largo. A chave inglesa pendia frouxa em uma das mãos, como uma extensão natural do braço dele.

"Sua tia Marina... ela é uma força da natureza, Fernando. Sempre foi. Você não conhece a história toda. Você vê a tia divertida, a tia bonita."

Ele olhou para o nada, focando em memórias antigas que eu não compartilhava.

"Desde que eram crianças, ela tentava ofuscar sua mãe. Roubar a atenção dos pais. Roubar os brinquedos. Roubar os namorados. Ela sempre teve essa necessidade de provar que era melhor, mais bonita, mais desejada."

Ele focou em mim de novo. O olhar dele era perfurante.

"Ontem, no carro, ela cruzou uma linha perigosa. Ela tentou usar você — o filho da irmã dela, o orgulho da irmã dela — para humilhar sua mãe. Para mostrar que ela podia te excitar mais. Te controlar mais. Fazer você gostar mais dela do que da própria mãe."

"E a resposta para isso foi... aquilo?" Apontei vagamente na direção da casa, na direção do quarto lá em cima. "Transar com ela? Quebrar todas as regras?"

"A resposta foi mostrar quem manda," ele disse, os olhos frios como gelo, sem nenhum traço de arrependimento.

"Sua mãe precisava retomar o controle. Ela precisava sentir, visceralmente, na pele, na carne, que você é dela. Não da irmã. Que o filho dela prefere o colo dela. Que o desejo do filho dela pertence a ela."

"E você... você precisava entender o seu lugar nisso tudo."

"Meu lugar?" Perguntei, sentindo a raiva e a confusão borbulharem. "Que lugar é esse? De brinquedo? De peão nesse jogo maluco de vocês?"

"Você não é mais uma criança, Fernando. Ontem à noite você provou isso naquela cama. Você agiu como homem. Você tomou o que foi oferecido."

Ele deu um passo à frente. Invadiu meu espaço pessoal. Senti o cheiro dele — café, loção pós-barba e óleo de motor. O cheiro de autoridade.

"Mas não se engane," ele sussurrou, a voz baixando para um tom perigoso. "Aqui dentro, nesta casa, nesta família... quem dita as regras sou eu."

"O que aconteceu ontem não foi uma orgia sem sentido. Não foi um acidente de percurso. Foi algo que eu permiti. Que eu dirigi. Que eu orquestrei desde o momento em que mandei vocês subirem a escada."

Ele colocou a mão no meu ombro. O aperto era firme, pesado. Uma reivindicação de posse paterna e hierárquica.

"E agora, vamos estabelecer como as coisas funcionam daqui para frente. Porque não vamos fingir que não aconteceu. Isso é coisa de gente fraca. E não vamos voltar atrás, porque o que foi feito não se desfaz."

Engoli em seco, o pomo de adão subindo e descendo dolorosamente. Esperei o pior. Esperei a punição.

"Primeira regra: Sigilo absoluto," ele disse, levantando o dedo indicador, apontando para o meu rosto. "Sua tia Marina não pode saber. O Matheus não pode saber. Ninguém fora dessa casa, ninguém fora destas paredes, pode sequer desconfiar."

"Se isso vazar, destrói nossa vida. Destrói a reputação da sua mãe. Destrói meu nome. E se vazar por sua causa, Fernando... por um deslize seu, por uma conversa bêbada com amigos... eu acabo com você antes que o mundo acabe. Entendeu?"

A ameaça era real. Eu via nos olhos dele. Ele não estava blefando. Ele protegeria a estrutura da família com a mesma ferocidade com que matava os animais no mato. Ele eliminaria a ameaça, mesmo que a ameaça fosse o próprio filho.

"Entendi," sussurrei. "Ninguém vai saber."

"Segunda regra: Controle," ele continuou, baixando o dedo mas mantendo o olhar fixo.

"Isso não é um passe livre para você comer sua mãe quando der na telha. Ela não é sua namorada. Ela não é sua amante de fim de semana. Ela é minha esposa. Antes de ser sua mãe, antes de ser qualquer coisa, ela é minha."

"O que acontece entre vocês, acontece quando eu digo. Onde eu digo. E como eu digo. Se eu disser para parar, você para. Se eu disser para continuar, você continua. Entendeu?"

"Entendi," minha voz sumiu, reduzida a um fio.

"Terceira regra..."

Ele soltou meu ombro e recuou um passo. Cruzou os braços novamente, recostando-se na bancada.

Um sorriso estranho, quase orgulhoso, tocou os lábios dele pela primeira vez. Um sorriso de cumplicidade masculina.

"Não se culpe. Tire esse peso dos ombros."

"O que você sentiu... o prazer... a força... a sensação de poder... isso é natural. Somos animais, Fernando. A civilização, as leis, a moral... isso é só uma casca fina, uma pintura barata que a gente passa por cima dos instintos para conviver em sociedade."

"Ontem a gente rasgou essa casca um pouco. A gente olhou para o abismo. E, convenhamos..."

Ele inclinou a cabeça, me estudando como um espécime.

"Você gostou. Não gostou? De senti-la? De possuí-la?"

A pergunta era uma armadilha. Mas mentir seria inútil. Ele estava lá. Ele viu minha cara. Ele ouviu meus gemidos.

"Gostei," confessei. Baixei a cabeça, envergonhado pela verdade nua e crua. "Gostei muito."

"Ótimo. Honestidade é bom. É o primeiro passo para aceitar quem somos."

Ele se virou para a bancada e jogou a chave inglesa na caixa de ferramentas com um estrépito metálico que me fez pular. *Clang.*

"Sua tia e seu primo vêm aqui mais tarde. Vamos assar aquela carne de porco que caçamos."

Meu coração parou por um segundo. A realidade social invadindo nosso segredo.

"Quero ver como você se comporta," ele disse, de costas para mim, mexendo em alguma coisa na prateleira. "Quero ver se você consegue olhar na cara do Matheus."

"Quero ver se você consegue encará-lo, conversar com ele, rir das piadas dele... sabendo que você fodeu a mulher que é tia dele. A mulher que manda nessa casa. Enquanto ele..."

Ele fez uma pausa dramática, prolongando o suspense.

"...enquanto ele só ficou no quase com a mãe dele."

A menção ao Matheus trouxe uma nova camada de complexidade para o meu cérebro já sobrecarregado.

O primo. O rival involuntário. O espelho distorcido.

"O Matheus..." comecei, hesitante, conectando os pontos. "O que aconteceu com ele ontem? Depois que eles foram embora para a casa de hóspedes?"

Meu pai riu. Um som seco, sem humor, gutural.

"Ah, isso é interessante. Sua tia Marina não gosta de perder, lembra? Eu te disse isso."

"Se ela percebeu — e ela é esperta, ela percebeu — que sua mãe saiu daquele carro com um sorriso de vitória, com aquele brilho no olhar de quem foi satisfeita..."

"Ela não deve ter deixado barato. Ela não aceitaria dormir perdendo. Ela não aceitaria que a irmã puritana tivesse ido mais longe do que ela."

"O Matheus deve estar tão confuso quanto você agora. Talvez até mais. Talvez a Marina tenha cobrado o preço da derrota dele."

Aquilo plantou uma semente na minha cabeça. Uma semente venenosa, escura e fascinante.

Será que a Tia Marina tinha feito o mesmo? Será que ela tinha levado o Matheus para a cama também? Será que eles também tinham cruzado a linha na casa de hóspedes, do outro lado do jardim?

A ideia era perturbadora. Imaginá-los juntos me dava náuseas. Mas, de um jeito doentio, era reconfortante.

Se ele também tivesse feito, eu não estava sozinho no inferno. Estávamos juntos na lama. Éramos cúmplices sem saber.

"Aja naturalmente," meu pai instruiu, virando-se para me encarar uma última vez. "Mas observe. Abra os olhos. Observe sua tia. Observe seu primo. Veja como eles se tocam. Veja como eles se olham."

"E lembre-se: você agora tem um segredo. Um segredo poderoso. E segredos dão poder, Fernando. Use isso. Sinta-se superior. Você sabe de algo que eles não sabem."

Ele acenou com a mão, num gesto dispensivo. A audiência estava encerrada.

"Agora vai lá pra dentro. Ajude sua mãe com o almoço. Descasque as batatas. Faça o papel do bom filho."

Caminhei até a porta da garagem, sentindo as pernas bambas, como se estivesse aprendendo a andar de novo.

Coloquei a mão na maçaneta fria de metal.

"E Fernando..." ele chamou, a voz parando meu movimento.

Parei. Olhei para trás. Ele estava parado na penumbra, uma figura de autoridade absoluta.

"Sim, pai?"

"Não toque nela hoje. Nem um dedo. Nem um beijo escondido. Nada."

Ele sorriu de novo. O sorriso do diretor que controla a cena.

"Quero que vocês dois fiquem só na vontade. Quero que a tensão acumule. Quero que vocês olhem um para o outro e sofram querendo."

"A expectativa é o melhor tempero. E eu quero o prato bem temperado para a próxima vez."

Saí da garagem piscando na luz forte do meio-dia, sentindo o sol queimar minha pele fria.

Voltei para a cozinha como um sonâmbulo, atravessando o quintal gramado.

Minha mãe estava cortando legumes na bancada. O som da faca batendo na tábua de madeira era rítmico, quase musical. *Toc. Toc. Toc. Toc.*

Ela levantou os olhos quando entrei. Os olhos verdes estavam arregalados, ansiosos.

Havia uma interrogação silenciosa e desesperada no rosto dela. *O que ele disse? Estamos encrencados? Vai acabar? Ele vai nos separar?*

Fui até a geladeira pegar água, precisando molhar a garganta seca. O espaço na cozinha era estreito entre a mesa e a bancada onde ela trabalhava.

Eu tinha que passar perto dela. Invadir a zona de conforto dela.

Nossos corpos quase se tocaram. Senti o calor que emanava dela, um calor humano, vivo. Senti a gravidade puxando meu corpo em direção ao dela como um ímã puxa a limalha de ferro.

Minha mãe parou de cortar. A faca ficou suspensa no ar, brilhando. Ela prendeu a respiração. O peito dela parou de subir e descer.

Lembrei da regra do meu pai. *Não toque nela.*

Parei a centímetros dela. Tão perto que podia ver os poros da pele dela, podia sentir o cheiro do cabelo dela.

Olhei para o pescoço dela. Para aquela pequena marca vermelha, agora quase escondida sob a gola do vestido azul.

Minha mão formigou. Os dedos coçaram com a vontade física, dolorosa, de tocar ali. De passar o polegar na marca. De reivindicar de novo. De provar que era real e que ela era minha.

Nossos olhos se encontraram. As pupilas dela dilataram instantaneamente, engolindo o verde da íris, transformando os olhos em poços negros de desejo e medo.

Ela sabia. Ela sentia a mesma eletricidade. Ela sabia que eu queria. E ela sabia que eu não podia.

"Ele disse..." sussurrei, a voz arranhada, baixa para que só nós dois ouvíssemos. "Ele disse que a Tia Marina vem almoçar."

Ela soltou o ar devagar, um suspiro trêmulo. Os ombros relaxaram um milímetro, aliviados por não ser uma sentença de morte, mas tensionados pela nova ameaça.

Mas a tensão sexual entre nós era tão densa, tão palpável, que parecia preencher a cozinha inteira, deslocando o ar. Poderia ser cortada com a faca que ela segurava.

"Então é melhor a gente se preparar," ela disse. A voz dela tremeu na última sílaba, denunciando o nervosismo. "Não podemos deixar ela perceber nada. Ela tem olhos de águia."

"Não," concordei. Dei um passo para trás, criando uma distância segura, forçada. Obedecendo ao comando invisível do meu pai que pairava sobre nós. "Não podemos."

Mas enquanto eu subia as escadas para o meu quarto para esperar a chegada dos parentes, sentindo o olhar dela queimar minhas costas, uma certeza fria e excitante se instalou no meu peito.

As regras tinham sido estabelecidas, sim. O pai tinha falado. O contrato estava assinado.

Mas regras foram feitas para serem testadas. Limites foram feitos para serem empurrados.

E com a Tia Marina chegando em breve, trazendo sua própria bagagem de provocações, ciúmes, roupas curtas e segredos com o Matheus, o jogo estava apenas começando.

A casa estava calma agora, banhada na luz inocente de domingo. Mas era a calma enganosa antes de um furacão muito pior.

E pela primeira vez na vida, eu não queria fugir da tempestade. Eu não queria me esconder. Eu queria ficar. Eu queria ver até onde a chuva podia nos molhar. Eu queria ver se o Matheus tinha a mesma marca no pescoço que eu. E, se tivesse... então o jogo seria muito mais interessante.

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PARTE 5 - EM BREVE!

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