A casa estava mergulhada no silêncio denso das três da manhã. Do lado de fora, apenas o som distante de um cão latindo quebrava a calmaria da rua. Marcos acordou com a boca seca, uma sede que parecia ter arranhado sua garganta. Ele se sentou na cama, o corpo jovem e esguio movendo-se com o cuidado de quem não quer despertar os fantasmas da noite.
Descalço, ele abriu a porta do seu quarto sem fazer ruído e caminhou pelo corredor escuro, iluminado apenas por uma fresta de luz da lua que entrava pela janela da sala. O quarto da mãe, no fim do corredor, estava com a porta entreaberta, algo incomum. E foi ao passar por ela que ele ouviu.
Não era um som alto. Era um murmúrio baixo, um ritmo suave e constante que ele não conseguiu identificar de início. Parecia... o ranger ritmado da velha cama de mogno dela. A curiosidade, mais forte que a sede, o fez parar. Ele prendeu a respiração e se aproximou, espiando pela fresta.
O que ele viu fez seu estômago gelar. À luz fraca do abajur, ele viu as costas de sua mãe, os ombros subindo e descendo. E sob ela, o corpo de um homem. Um homem que ele nunca tinha visto na vida. O rosto dele estava virado para a porta, os olhos fechados, a boca entreaberta. Era um completo estranho.
Marcos recuou como se tivesse tocado em fogo. O ar lhe faltou. O copo d'água foi esquecido. Sua mente, turva de sono e choque, só conseguia formar um pensamento: Joana.
Ele não correu, ele flutuou até o quarto da irmã, no lado oposto do seu. Abriu a porta com um clique que pareceu um trovão e a sacudiu pelo ombro. "Joana. Acorda", ele sussurrou, a voz trêmula.
Ela resmungou, virando-se. "Que foi, Marcos? Me deixa dormir..."
"Joana, é sério. Acorda. Você precisa ver uma coisa."
Havia um pânico contido na voz dele que a fez abrir os olhos. Ela conhecia o irmão. Marcos, sempre na dele, introspectivo, nunca era de dramas. Se ele estava assim, algo muito sério tinha acontecido. Ela se sentou, o cabelo comprido caindo sobre o rosto. "O que foi? Aconteceu alguma coisa com a mãe?"
Marcos não respondeu. Apenas pegou a mão dela, a pele dele fria como gelo, e a puxou para fora do quarto. Ele a guiou em silêncio pelo corredor, parando a uma distância segura da porta entreaberta. Apontou com o queixo e sussurrou: "Escuta."
Ela ouviu. O mesmo ritmo, os mesmos murmúrios abafados. Os olhos de Joana se arregalaram no escuro, primeiro em confusão, depois em compreensão. Ela olhou para Marcos, e ele viu no rosto da irmã o reflexo do seu próprio choque. Naquele instante, no corredor mal iluminado, com os sons do segredo da mãe ecoando no silêncio, eles não eram mais o irmão e a irmã que viviam vidas diferentes. Eram os únicos dois cúmplices de uma mesma descoberta. Um laço invisível, forjado no choque e no tabu, acabava de se formar entre eles.