O resto do sábado foi uma performance de normalidade.
O churrasco da tarde começou sob o sol forte, cheio de amigos e o barulho de risadas, mas para Laura, tudo parecia distorcido. Ela se movia em uma névoa, sorrindo e oferecendo salada, enquanto o eco do beijo de Bruno e o pânico da sua chegada mais cedo ainda vibravam em seus ossos.
Lucas agia como o anfitrião perfeito. Mas a desconfiança que ele demonstrara mais cedo havia se transformado em uma vigilância sutil.
Ele não a deixava sozinha. Se Laura ia para a churrasqueira, ele estava lá, virando a picanha. Se ela se sentava para beber água, Lucas estava sentado ao seu lado, o braço casualmente jogado nas costas de sua cadeira. E, o mais importante, ele mantinha Bruno perto de si.
"Bruno, pega essa faca pra mim!", "Bruno, me ajuda com a cerveja!", "Vem cá, cara, me conta a novidade do seu trabalho!".
Lucas usava a amizade como uma algema invisível.
O único alívio de Laura era que Bruno parecia aceitar o jogo. Ele também estava na sua melhor performance de "melhor amigo". Os olhares íntimos eram poucos, mas quando aconteciam, eram carregados de uma promessa perigosa: não acabou.
A noite caiu, e com ela, o frio. Os amigos estavam indo embora. Restavam apenas eles e a bagunça do jardim.
Lucas estava juntando as cadeiras da área externa e Laura recolhia os copos sujos. Bruno estava na sala, procurando o carregador do celular.
"Amor, vou no banheiro", disse Lucas, entrando apressadamente. "Só um minuto."
Era a primeira vez que Laura e Bruno estavam desimpedidos por um tempo desde o meio-dia. O ar na sala se tornou instantaneamente eletrizante.
Laura entrou na sala, fingindo procurar um copo, mas seus olhos estavam fixos na porta do banheiro.
Bruno estava de pé, encostado na estante, o celular na mão. Ele nem olhou para o aparelho. Seus olhos se cravaram nos dela, e o sorriso sumiu. O desejo que ele sentia era palpável, quase como um calor físico no cômodo frio.
"Eu preciso de você", ele sussurrou, a voz tensa, um reconhecimento nu de sua necessidade.
Laura deu um passo em direção a ele. Ela queria se sentir suada de novo, queria a pressa, o risco. A normalidade de Lucas era sufocante.
"Eu também", ela murmurou, a voz quase inaudível, dando mais um passo.
Bruno largou o celular. A mão dele se estendeu, hesitante, mas intencional, em direção à cintura dela. Ele estava prestes a tocá-la, a puxá-la para si, talvez levá-la para o corredor escuro...
Naquele exato momento, a porta do banheiro se abriu.
"Bruno! Cara, você viu minhas chaves de casa? Não estou achando na minha jaqueta!" Lucas perguntou, a voz alta e normal.
O braço de Bruno congelou a centímetros de Laura. Ele olhou para Lucas, depois para Laura.
O momento íntimo, o toque, a escalada de tensão, tudo desmoronou em um milissegundo de pânico.
Bruno piscou, e a máscara de "melhor amigo" voltou. Ele se afastou de Laura com um passo rápido, virando-se para o marido.
"Chaves? Não, Lu, não mexi. Deve estar no casaco que você deixou na cozinha!"
Lucas mal olhou para Bruno enquanto ia em direção à cozinha.
Laura estava parada ali, as mãos cerradas, o coração em frangalhos. Lucas havia entrado exatamente na hora, impedindo o toque que teria levado a tudo de novo. Era como se, mesmo sem saber, ele tivesse sentido o perigo.
Ela olhou para Bruno. Os olhos dele eram um misto de frustração e um desejo ainda mais profundo. Ele havia sido frustrado, mas o jogo de Lucas apenas o deixava mais determinado.
Ela se sentiu aliviada pela segurança de Lucas, mas estava com raiva. Raiva por ter sido salva, raiva por ter sido interrompida, e raiva de si mesma.