Os próximos dias foram uma correria só. Valentina quase não tinha tempo para ficar na galeria, eram muitas entrevistas e problemas a resolver. Eu assumi seu lugar, e Alexia me ajudou a lidar com todas as situações necessárias. Às vezes eu e Valentina, só nos víamos em casa à noite, e geralmente estávamos exaustas.
Valentina se desculpou por não estar me dando a atenção que eu merecia, mas eu a tranquilizei, dizendo que entendia perfeitamente. Eu disse que depois da exposição, teríamos mais tempo para nós. Ela sorriu, mas era um sorriso um pouco triste, e comentou que, após a exposição, eu é que iria me desculpar por não ter tempo para ela. Valentina disse que eu me tornaria uma pessoa conhecida, com certeza daria muitas entrevistas e talvez até viajasse para o exterior para algum evento importante de arte.
Respondi que isso talvez nem acontecesse e, mesmo que meu sucesso fosse grande, eu não estava interessada em nada disso; só queria pintar meus quadros, ajudar a cuidar da galeria e passar o máximo de tempo possível com ela.
Tudo estava quase pronto para a exposição, faltando apenas alguns detalhes. Os quadros já tinham sido autenticados e estavam todos na galeria. No entanto, Valentina disse que queria mais quadros meus para expor. Eu tinha pintado três durante esse tempo e todos ficaram bons, mas ela achou muito pouco e sugeriu que eu trouxesse mais uns 20 da minha casa. Achei exagero, mas ela explicou que teria uma sala só para meus quadros.
Faltando menos de dez dias para a exposição, sugeri a Valentina que fôssemos para minha casa no final de semana. Poderíamos selecionar os quadros, prepará-los para transporte e, claro, descansar a cabeça um pouco. Ela gostou da ideia e pediu a Alexia que desmarcasse todos os compromissos dela para o final de semana. Assim, no sábado de manhã, fomos para minha casa, ou melhor, minha antiga casa, já que minha residência oficial agora era outra.
Minha mãe adorou nossa visita, já que fazia tempo que eu não a via. Milene reclamou da nossa ausência e eu prometi que isso não iria mais acontecer. Valentina também prometeu que, depois da exposição, faria questão de vir pelo menos uma vez por mês.
Passamos um bom tempo conversando enquanto tomávamos café, contamos em detalhes o que havia acontecido de importante nesse período. Elas já sabiam um pouco do que ocorreu, pois sempre ligo para minha mãe para dar notícias. Mas naquela conversa, conseguimos compartilhar tudo com calma e com detalhes.
Na hora do almoço, fui ajudar minha mãe na cozinha, enquanto Valentina conversava com Milene na sala. Minha mãe queria saber como estava meu relacionamento com Valentina, e eu disse a ela que nunca fui tão feliz. Valentina era uma mulher incrível em todos os sentidos, e eu estava cada vez mais apaixonada por ela. Minha mãe ficou contente por mim, especialmente porque ela gostava bastante da Valentina.
Depois do almoço, escolhemos os quadros e os deixamos prontos para o transporte. Valentina já tinha contratado uma empresa especializada para buscá-los na segunda-feira e levá-los até a galeria. Eu escolhi dez quadros e ela escolheu dez. Quando terminamos, ela me perguntou se eu tinha documentado meus quadros, e eu disse que não. Ela explicou que precisava fazer isso antes de vendê-los. Na segunda-feira, teríamos que correr atrás disso, ou não poderia vender nenhum, caso tivesse essa intenção. Eu mencionei que alguns eu não queria vender, mas a maioria, sim.
Valentina me explicou que só poderia vender os quadros da Isabel porque ela documentou todos e deixou tudo em seu nome. Ela ainda registrou um documento em cartório, dando a ela total controle da sua obra. Sem isso, os pais dela poderiam reivindicar os quadros, já que eram os herdeiros legais. Eu nunca havia pensado nisso; percebi que tinha muito a aprender sobre essas burocracias com Valentina.
Passamos o resto do dia em casa com meu casal favorito. Milene disse que seu próximo livro já estava quase pronto e, quando terminasse, enviaria para mim e para a Valentina ler. Ela queria nossa opinião sincera antes de publicar. Eu disse que, se estivesse no mesmo nível do primeiro, com certeza seria um sucesso.
No domingo, acordamos cedo e, após um café reforçado, fomos à praia. Assim que o sol ficou mais forte, fomos a um quiosque para beber um suco e conversar um pouco.
Val— Você gostaria de voltar a morar aqui, amor?
Nora— Se eu pudesse e você aceitasse vir junto, eu gostaria, sim. Mas sei que isso é algo impossível no momento.
Val— No momento é, mas poderíamos vir no ano que vem, se você quiser.
Nora— Mas e a galeria, amor?
Val— Lembra que falei que tinha outros planos para a Alexia, quando não deixei que ela assumisse a vaga da Donna?
Nora— Sim, o que tem a ver? Você vai colocar ela no comando da galeria?
Val— É o que planejo, mas preciso treiná-la mais. Porém, a galeria não é só minha, e não tomarei essa decisão sem conversarmos e chegarmos a um acordo. É a sua vida também.
Nora— Você me pegou de surpresa, amor. Me fala exatamente o que você está planejando para nós duas. Até aqui, estou gostando da ideia.
Val— Amor, eu amo esse lugar e realmente quero morar aqui. Se eu vender minha casa, posso te ajudar a comprar uma casa nossa ou até construir uma. Poderíamos levar uma vida mais tranquila, você pintando seus quadros e eu ajudando a Alexia a tocar a galeria. Eu poderia trabalhar em home-office. Também quero me casar e constituir uma família de verdade. Mas sei que você ainda é nova e talvez não pense nisso no momento.
Nora— Não vou mentir para você, tenho pensado nisso ultimamente. Ouvindo você falar, parece perfeito, mas você tem coragem mesmo de vender sua casa? Achei que nunca faria isso.
Val— Eu vivi bons momentos ali, mas também muitos momentos ruins. Aquela casa é como se fosse um capítulo da minha história com Isabel que não finalizou. Não que isso seja um problema, mas quero construir um novo capítulo sem ela, seguir minha vida de verdade. Passei os últimos anos cuidando dos sonhos que eu e ela tivemos juntas. Tentei realizar todos os pedidos que ela me deixou, e consegui. Você terminou os quadros dela, e hoje eu posso dizer com toda certeza que sou feliz. Nunca esquecerei o que vivi com Isabel e sempre a lembrarei com amor. Mas agora quero focar na nossa história, amor. Tenho certeza de que ela ficaria feliz por isso.
Nora— Acho que entendi, amor. Eu adoraria realizar tudo isso que você planeja. Eu amo esse lugar também, e poder viver perto da minha mãe seria incrível. Vamos conversando e planejando isso com calma. Se no ano que vem ainda tivermos as mesmas ideias, podemos vir morar aqui, amor.
Val— Está bem, amor, vamos fazer isso.
Eu não esperava aquela proposta da Valentina; sinceramente, não imaginava que ela pensasse em algo assim. Sabia que ela fazia planos e me incluía neles, mas não pensei que ela cogitasse vir morar na minha cidade tão rapidamente. Ela sempre deixou claro o quanto gosta da cidade e até já havia considerado comprar uma casa ali, mas não esperava que fosse tão rápido.
Passamos o resto do dia na praia, só saímos para almoçar no restaurante de sempre. De resto, estávamos na beira do mar ou sentadas na sombra de um quiosque. À tarde, minha mãe e Milene se juntaram a nós. Quando contei sobre os planos da Valentina, minha mãe ficou extremamente feliz. Ela já gostava da Valentina, e depois de ouvir o que eu disse, com certeza gostou ainda mais.
Partimos de volta para São Paulo no início da noite. Valentina preferiu dormir em casa, pois teríamos muito a fazer durante a semana, e não queria começar a segunda cansada de uma viagem. Chegamos em casa antes das nove da noite e, após um lanche rápido, fomos direto para a cama. Precisávamos descansar, pois seria uma semana corrida.
Desde segunda-feira, a correria foi intensa, principalmente para documentar meus quadros. Mesmo com toda a influência da Valentina e seus contatos, não teríamos tempo hábil para documentar todos, então priorizamos os que eu estaria disposta a vender. No fim, conseguimos documentar quinze quadros até sexta-feira à tarde. Levamos todos para a galeria e os deixamos em seus devidos lugares até as 22 horas. Alexia nos ajudou a preparar tudo, agora tudo estava pronto para a inauguração da exposição no sábado.
Acordamos cedo e seguimos para a galeria. A exposição só seria oficialmente inaugurada às dezenove horas, mas desde a manhã o local estava aberto para visitas. A galeria estava com o dobro de movimento. Logo cedo, vi algumas pessoas da imprensa com câmeras indo para o local tirar fotos dos quadros. Eu fiquei no meu escritório quase o dia todo. Até aquele momento, ninguém sabia quem era a pintora que havia finalizado os quadros da Libélula, então eu ainda teria algumas horas de paz.
Às dezesseis horas, eu e Valentina saímos e fomos para nossa casa. Tomamos banho, jantamos e nos arrumamos para voltar para à inauguração. Valentina estava linda, eu também caprichei no visual e recebi muitos elogios do meu amor.
Quando chegamos à galeria, percebi que havia muito mais gente do que eu esperava. Faltando dez minutos para a inauguração, fomos para o espaço reservado para exposições. Havia um grande número de pessoas no local. Valentina foi direto para onde apresentaria a nova exposição da galeria. Eu fiquei ao lado, um pouco distante, pois queria ver o painel eletrônico atrás dela. No momento, ele estava coberto por um lençol, mas eu sabia o que ele escondia.
Valentina chamou a atenção de todos e começou a explicar do que se tratava a exposição. Disse que o espaço foi dividido em três salas: uma para os quadros da Libélula, incluindo os inéditos; outra para os quadros inacabados da Libélula que foram finalizados; e a última para os quadros da pintora que finalizou as obras da Libélula. Nesse instante, ela me chamou para se juntar a ela. Fui até ela, e ela me apresentou. Eu não disse nada, apenas sorri e acenei para as pessoas. Nesse momento, quase fiquei cega com tantos flashes na minha direção, mas mantive a calma.
Logo após, Valentina me chamou para ajudar a puxar o lençol que cobria o painel. Quando o puxamos, Alexia ligou o painel, e apareceu uma foto da Isabel pintando um quadro no sótão da casa de Valentina. Ela olhava para trás, com um lindo sorriso no rosto. Valentina voltou ao local onde estava antes, e várias fotos de Isabel foram aparecendo, uma após a outra.
Valentina finalmente explicou quem era a mulher nas fotos e começou a resumir sua história com Isabel. Não demorou muito, e eu vi Antônia entre as muitas pessoas que estavam ali. Notei que ela estava sozinha e já limpava algumas lágrimas do rosto. Valentina parecia conseguir controlar sua emoção, mas estava preocupada em deixá-la sozinha na parte triste da história, pois temia que ela desabasse.
Fiz um sinal discreto para Alexia se aproximar, e ela veio na hora. Pedi que não saísse perto da Valentina e avisei que precisaria sair dali por um tempo. Alexia não questionou; apenas disse que eu poderia ir tranquila, que não sairia dali. Saí andando devagar e vi que Valentina me olhou, mas não parou sua narrativa. Segui em direção a Antônia, que estava bastante emocionada, pelo que pude ver. Assim que me aproximei, ela me viu e forçou um sorriso tímido entre suas lágrimas.
Fui até ela e segurei uma das suas mãos. Ela me agradeceu e segurou a minha mão com força. Valentina continuava sua narrativa, elogiando Isabel em todos os sentidos, não apenas como a talentosa pintora, mas também como a pessoa incrível que ela foi. Quando chegou à parte mais triste, Valentina apenas falou o necessário para que as pessoas entendessem o que havia acontecido. Ela evitou o máximo mencionar os pais de Isabel, provavelmente por saber que Antônia estava ali, ela já havia nos localizado.
Quando Valentina terminou sua narrativa, agradeceu a presença de todos e disse que responderia algumas perguntas. Antônia não estava bem, então a chamei para bebermos água e respirar um pouco, e ela aceitou. Levei-a até a cozinha, mostrando onde ficavam os banheiros, caso quisesse lavar o rosto e retocar a maquiagem. Ela foi até o banheiro, e eu fui pegar um copo de água para ela.
Logo Antônia retornou e bebeu sua água. Ela me agradeceu, dizendo que já estava melhor. Chamei-a para voltarmos ao cômodo da exposição, e ela disse que precisava ir embora, mas queria dar um abraço em Valentina antes. Eu disse que a levaria até ela.
Voltamos e, assim que entramos, Valentina ainda estava respondendo a algumas perguntas. Fiquei com Antônia perto de onde Valentina estava. Logo, ela anunciou que a exposição estava oficialmente inaugurada e agradeceu a presença de todos.
Valentina saiu de onde estava e, apesar de ser chamada por algumas pessoas, ignorou-as e veio até onde estávamos. Assim que se aproximou, Antônia a abraçou. As duas estavam chorando ali, abraçadas, e eu também me emocionei ao ver aquela cena.
Eu sei que aconteceu bem mais tarde do que Isabel desejou, mas ela conseguiu unir em um abraço as duas mulheres que mais amou nesta vida. Com certeza, ela estava com um sorriso estampado no rosto, vendo aquela cena lá de cima.
Continua…
Criação: Forrest_Gump
Revisão: Whisper
