Conto inspirado no curta-metragem "Eletrodoméstica (2005)", de Kleber Mendonça Filho.
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Pernambuco, 1990.
Dayse trabalhava como doméstica para uma família da classe média de Recife. Ela chegava sempre às seis e meia, quando a casa ainda dormia sob o sol que nascia e guardava dezenas de objetos caros e supérfluos. Sua patroa, uma mulher soberba e com agendas sempre cheias, deixava sobre a pia uma lista com os afazeres do dia. Sempre lia ao chegar, dobrava o papel e guardava no bolso do avental. Só depois tirava os sapatos, calçava os chinelos de pano que trouxera de casa e começava o dia.
Ela já tinha quase quarenta anos, a pele cor de canela queimada, os seios pequenos – mas ainda tão pontudos que marcavam o tecido fino da blusa como duas pequenas lanças teimosas. Usava sempre saias longas e coloridas – herança de uma avó baiana que dizia que mulher sem pano rodado não tinha alma; isso lhe rendeu o apelido “Cigana” entre os mais próximos. O tecido das saias era leve, quase transparente ao sol, e ao menor movimento colava-se aos glúteos redondos e às coxas fortes, revelando uma formosura que resistia ao tempo e à falta de cuidado próprio. Por baixo, só a calcinha branca, sempre branca.
Dayse era uma mulher madura que ainda chamava a atenção dos homens, mas sua rotina exaustiva de trabalho a impedia de pensar no próprio prazer. Ela já não tinha mais seu marido ou nenhum outro homem a quem pudesse entregar seu corpo – cansado, porém, cheio de libido. Já fazia quase três meses desde a última vez que fez sexo. Esta última, fora com o professor de educação física da escola municipal onde a filha dela estudava.
O tal professor era casado, tinha quarenta e dois anos e o corpo de quem ainda jogava futebol regularmente. Chamou Dayse para “conversar sobre o rendimento da filha”. Ela foi. Acabaram na casa dele. A esposa havia saído com as crianças. Ele deitou Dayse de costas em sua cama, beijou-lhe o pescoço com pressa pois cada segundo era valioso. As mãos grandes puxaram as roupas dela e a boca larga chupou seus seios até os mamilos doerem de tão duros. Enfiou o pênis, gemendo baixo, dizendo que aquilo era loucura e que nunca fizera antes. “Sei…”, ela pensou.
Dayse, por sua vez, cravou as unhas nas costas dele, abriu as pernas e pediu que metesse mais fundo. Seu tesão acumulado era tanto que gozou primeiro, mordeu o travesseiro da esposa dele para abafar seus gritos e gemidos de êxtase. Quando ele chegou ao ápice também, apenas se deixou cair sobre ela, tremendo. Assim ficou por alguns segundos, até rolar para o lado.
— Minha mulher chega às seis – disse o professor, já se levantando.
Dayse se vestiu às pressas, ajeitou o cabelo, saiu com o gosto dele ainda na boca e a certeza de que nunca mais repetiria aquilo. Não valia a pena tanto risco por uma trepada daquela. Desde então, seu corpo reclamava por prazer. Mesmo em situações aleatórias de sua rotina, lá estava seus instintos mais primitivos e o corpo seguia suplicando.
* * *
Certo dia quando chegou para mais um expediente na casa, a patroa tinha estreado a máquina nova. Era pequena, porém eficiente. Dayse desceu com o cesto de roupas íntimas da família. Abriu a tampa redonda, jogou sutiãs de renda, cuecas de algodão e meias de seda. Selecionou a opção “Delicado 30°”.
A máquina encheu de água, começou a girar devagar. Dayse encostou o quadril na borda da máquina só para dar uns dois pegas no baseado – era o seu momento. Ela deu um trago e se inclinou um pouco mais, para dispensar a fumaça pelo basculante. Sentiu um toque leve, quase nada, mas a vibração subiu pelas coxas como uma força invisível e quente. Arrepiou-se toda. Sentiu levemente o clitóris inchar contra o tecido da calcinha.
No enxague, a máquina aumentou a velocidade. A vibração virou um rugido abafado. Dayse apertou mais o quadril, só um pouquinho, só para confirmar. Um gemido baixinho escapou. Ela se afastou abruptamente, assustada com a própria reação. Olhou em volta: ninguém. Subiu a escada com as pernas trêmulas e uma leve impressão de que aquilo havia sido estranhamente divertido.
No dia seguinte, eram quase quatro horas da tarde, Dayse desceu novamente com o cesto de roupas. Dessa vez, as roupas claras.
A casa estava um pandemônio, mais que o normal. Três crianças, dois cachorros, o avô tomando café e reclamando na varanda, o patrão andando de um lado para o outro com o telefone no ouvido e a patroa mal humorada em seu escritório particular. Dayse circulava entre o caos deles como um peixe num aquário pequeno, sentia-se quase invisível algumas vezes. Por um instante pensou que, se o dia anterior fora estressante, aquele estava ainda mais.
A lavanderia era sua fuga pois, lá, ela abria o basculante, fumava sua erva sem ninguém notar e, agora, tinha a máquina que a esperava, brilhando como um altar. Ela abriu a tampa, jogou as camisas, o sabão, o amaciante de lavanda que a patroa tanto gostava e, depois, fechou. Programou em “Algodão 60°”. A máquina processou por um segundo, acendeu as luzes internas e começou a fazer aquele trabalho que antes era de Dayse.
Dayse já ia no terceiro trago, eis que um calor veio imediatamente, entre as coxas, como se alguém tivesse acendido uma chama ali dentro. Era seu corpo reclamando por prazer mais uma vez. Ela olhou para o corredor. Ninguém. No andar de cima, as crianças gritavam por causa de algum desenho. Então Dayse olhou para aquele eletrodoméstico por alguns segundos lembrando da vibração do dia anterior.
— Só mais uma vez, só mais um pouco daquilo... – ela falou pra si mesma, baixinho. Sentia-se meio ridícula, mas o instinto não queria saber disso.
Bastava aguardar o momento certo e então, sentiria aquilo de novo.
Chegava o momento, Dayse respirou fundo e encostou a testa da boceta no metal ainda frio da máquina. Sentiu um leve choque – o tecido da saia era fino e o da calcinha era tanto quanto. A vibração começou suave, quase como um carinho. Depois aumentou, aumentou e aumentou. Era como um trovão que subia pelas pernas procurando o seu sexo, carente e úmido.
Sentindo aquilo, Dayse não pôde mais resistir. Ergueu a saia, desceu a calcinha branca até pegá-la pelos pés e abriu as pernas. Estava toda molhada. Encaixou-se na máquina, deslizando os lábios da boceta pela borda até parar na quina, exatamente onde a vibração era mais forte. Deixou escapar um gemido baixo e apertou os olhos, tornou-se uma só com aquele eletrodoméstico vibrante.
Enquanto isso, lá em cima, o mundo caótico da família seguia seu curso.
O saco de pipoca girava no micro-ondas. Faltavam dois minutos e cinquenta segundos. As crianças disputavam quem ia apertar o “stop” quando o aparelho apitasse. O cachorro menor latia para o próprio reflexo no vidro. O avô pedia água a um dos netos. A empregada temporária derrubou uma colher e xingou baixinho.
Na lavanderia, Dayse já não ouvia nada disso. Nem mesmo se quisesse.
A máquina entrou no ciclo de enxague. A vibração era mais intensa, ritmada e implacável. Dayse pressionava o clitóris contra o metal – que agora estava quentinho entre suas pernas. Os quadris dela faziam um movimento circular, em um rebolado sensualmente cadenciado e instintivo. Subira a saia até a cintura, deixando as nádegas expostas, que balançavam em um ritmo hipnótico. Os seios tinham escapado da blusa fina, ela roçava as pontas dos dedos nos mamilos duros, intercalando com beliscões. O ambiente parecia arder em sua volta, Dayse estava dominada pela lascívia.
Na cozinha, faltava um minuto e dezenove segundos para a pipoca estourar. Na lavanderia, Dayse, parecendo um animal, mordia o braço para não gritar.
Uma das crianças desceu correndo, gritando que queria ver se a roupa da boneca já tinha secado. Dayse ouviu os passos, mas não parou. O prazer havia sido potencializado pelo efeito da maconha, era como uma onda que ameaçava engolir tudo. Ela abriu ainda mais as pernas, ajustando-se o melhor que podia, apoiou as mãos na máquina e jogou a cabeça para baixo, pressionando o queixo contra o pescoço enquanto tremia no ritmo do eletrodoméstico. O coque quase se desfez, os cachos pretos estavam úmidos de suor.
“00:44” no micro-ondas. O cachorro maior latiu para o carteiro que chegava. O patrão gritou pelo jornal. A patroa, em uma chamada de vídeo, pediu silêncio do seu escritório particular. Uma das crianças derrubou um copo de refrigerante. O alarme do portão eletrônico tocou três vezes. A casa estava um caos e ninguém, ninguém mesmo, imaginava o que Dayse fazia na lavanderia.
O orgasmo se aproximava como um trem sem freio sobre Dayse. As coxas dela tremiam, os músculos da barriga se contraíam em espasmos brutais. Ela deslizou uma mão entre as pernas, abriu os lábios inchados da boceta, expôs o clitóris diretamente na vibração. Prendeu um grito. Os olhos reviraram.
“00:09” no micro-ondas.
A máquina entrou na centrifugação final. Mil e seiscentas rotações. A vibração era violenta. Um rugido que parecia o fim do mundo. Dayse entrou em júbilo. Gozou com força, com raiva e com alívio. Hás meses não sabia o que era aquilo. Seu mel escorreu pelas coxas e pingou no chão, misturando-se às gotas de amaciante. Ela tremia inteira, as pernas cedendo, o corpo desabando contra a máquina que ainda girava e vibrava abaixo dela.
No exato segundo em que o micro-ondas apitou três bips longos, a criança ouviu e voltou correndo para a cozinha, enquanto Dayse soltava o último gemido, abafado, mordendo a própria calcinha.
A pipoca estava pronta. As crianças gritaram de alegria. Passos para a cozinha. No fim, ninguém desceu.
Dayse ficou ali, ofegante, com a calcinha entre os dentes. Até que a máquina desacelerou e parou. “00:00” em verde. Agora o único som na lavanderia era o da respiração pesada dela. Tentou se recompor o mais rápido possível, ajeitou a saia e limpou o chão às pressas. Pensou ter ouvido passos vindos da escada e, no desespero, limpou as pernas com a sua calcinha – não a vestiu de novo, apenas a empurrou no bolso do avental. Em seguida abriu a máquina, o cheiro de lavanda invadiu o ambiente. Pegou as roupas úmidas e foi estendê-las.
Topou com o patrão no corredor, cumprimentaram-se rapidamente com um aceno de cabeça. Ela desconfiada, subiu a escada como se nada tivesse acontecido.
Na cozinha, as crianças devoravam a pipoca quando ela ouviu a patroa chamá-la.
— Dayse, a roupa branca já está no varal? – perguntou, sem tirar os olhos do laptop.
— Já, senhora. Acabei de estender.
Ela sorriu, um sorriso curto que guardava seu segredo. No bolso do avental, a calcinha branca estava úmida com os resquícios do seu gozo e saliva, o tecido ainda quente e com o cheiro denso de sexo. Guardou-a ali, no avental, junto com a lista de afazeres do dia. O prazer e as obrigações.
Nos dias que se seguiram, sempre que a casa mergulhava no seu caos habitual – crianças gritando, cachorros latindo, aparelhos eletrônicos apitando, telefone tocando –, Dayse descia à lavanderia com qualquer pretexto para aliviar o estresse da rotina. Algumas toalhas esquecidas, meias perdidas, uma leva de camisas que precisavam de novo enxague.
Aquela máquina jamais fora tão usada por alguém quanto por Dayse. Ela programava o ciclo mais longo, encostava o corpo na máquina, fechava os olhos e deixava que o trovão mecânico a atingisse.
Dayse gozava em silêncio, enquanto lá em cima o mundo seguia sem notar que, no subsolo daquela casa de classe média, uma mulher simples e invisível descobrira o seu pequeno paraíso particular.
Nem nos seus sonhos mais febris, nem nas noites em que se tocava sozinha, Dayse poderia ter imaginado que um eletrodoméstico como aquele, faria o que nenhum homem da sua vida jamais fizera: lavava as roupas para ela e, de quebra, fazia-a gozar intensamente. E enquanto esse ritual devasso durou, ninguém jamais desconfiou da sua pequena e deliciosa diversão alternativa.
[ FIM!!! ]
