21 de Março (Sexta Feira)
18:45 PM
A sexta feira chegou e eu já estava maluco de passar tanto tempo em casa, hoje eu precisava fazer alguma coisa, então resolvi vir para aula e depois estou planejando ir jogar no racha com meus amigos — Dan só ficou de boas comigo indo jogar hoje depois que eu mandei uma mensagem pro meu médico perguntando.
Cheguei cedo na faculdade então fui para a cantina, esperando o pessoal, o primeiro a chegar foi o Arthur, mas quando me viu ele só fez um comprimento de cabeça e foi para sala — deve está com vergonha por ter saído vivo com Mauro no outro dia — mesmo assim ele sabe sobre mim e não precisa ficar desse jeito, pelo menos não comigo.
Leonardo provavelmente não sabe, então fico na minha, não quero ser a pessoa a tirar o nosso amigo do armário — Dan já me falou várias vezes o quanto isso pode ser problemático — então o melhor é esperar até ter uma oportunidade de falar com ele sozinho. Quando o intervalo chega, Leonardo nos chama para comer algo na cantina com Kamilla e as amigas dela.
— Eu tenho que ir à biblioteca, encontro vocês lá — Arthur mal fala e já sai com pressa.
— O que deu nele? — Pergunto.
— Não sei, ele estava normal esses dias — Leonardo diz também achando estranho o distanciamento de Arthur.
Ele não encontrou conosco, na verdade ele já está na sala quando voltamos, tem algo de errado rolando, ele não pode está tão envergonhado assim pelo lance do Mauro, a única coisa que penso é que pode ser medo de que eu conte aos outros, ele precisa saber que não tenho intenção de expô-lo de forma alguma. Preciso apenas controlar minha língua para não falar demais e acabar me metendo no lance dele com o ex do meu melhor amigo.
21:50 PM
— Vocês vão jogar hoje? — Pergunto quando o professor enfim encerra a aula.
— Hoje não, eu realmente preciso dormir cedo, estamos fazendo um inventário, estou até zonzo de tanto papel que eu tive que ler essa semana — Leonardo está visivelmente cansado.
— Eu também não vou poder — Arthur responde sem me encarar diretamente.
— Ué, você mudou de ideia? — Leonardo perguntou para ele — você disse que ia de uber direto daqui.
Arthur até tenta desconversar com uma desculpa, mas se enrola todo, normalmente eu não forçaria nada, porém seu comportamento está me deixando muito curioso.
— Você pode ir comigo, não tem problema, a gente deixa o Leonardo e a Kamilla em casa depois vai para o racha — digo.
— Tá bom — Ele aceita, só que qualquer um consegue perceber seu comportamento estranho comigo.
Como ele vai seguir comigo, Leonardo o coloca para sentar na frente comigo, ele por sua vez segue o caminho todo da faculdade até a casa do Leonardo em completo silêncio encarando a janela. Fico na minha conversando só com Kamilla e Leonardo, só que no momento em que nos despedimos deles e ficamos finalmente sozinhos no carro mando a real para tentar ter alguma explicação para sua estranheza.
— Arthur, você está com raiva de mim? — Ele arregala os olhos de susto — eu te fiz alguma coisa?
— Não — sua voz sai quase falhada.
— Então o que você tem, olha eu não tenho nada haver com sua vida amorosa, não sei se esse for seu medo — ele está quase entrando em pânico no banco ao meu lado.
— Não é isso Ciço, quer dizer isso é estranho, mas é outra coisa — a cabeça desse moleque está uma bagunça pelo jeito.
— Tá, só me fala, se você tem um problema comigo vamos resolver.
— É que foi minha culpa, eu sei que você deve está puto comigo.
— Espera Arthur, o que foi sua culpa?
— O Nicolas, ele me usou para te enganar, eu sei que foi ele, mas não tenho como provar — meu amigo diz encarando as próprias pernas.
— Arthur eu não estou com raiva de você, quem me drogou foi ele, e não você — falei o mais sério que consegui para que assim ele acredite em mim.
— Foi mau Cicero.
— Ei mano, relaxa beleza, quer saber pode me chamar de Ciço, é assim que meus amigos me chamam.
— Tá bom! — Esse moleque é gente boa, só que ele pensa demais nas coisas, é incrível ele é igualzinho o Dan.
— Olha eu não vou perguntar nada, mas eu quero que você saiba que se precisar falar sobre qualquer coisa comigo vou está aqui beleza? — Arthur me encara finalmente, em seus olhos vejo os neurônios funcionando, ele deve está se perguntando se me conta alguma coisa ou não, por fim ele sorrir de forma tímida e balança a cabeça afirmativamente.
No racha todos vem me perguntar se estou bem, estão todos chocados em como algo assim foi acontecer, o Nicolas que era quem eu mais queria ver hoje não apareceu e não só isso, nenhum dos moleques tem notícias dele desde o domingo. Devia ter imaginado que esse cara iria dar um sumiço até a poeira abaixar, acho que é até melhor assim, preciso esfriar a cabeça antes de pegar ele para saber que merda ele tinha na cabeça quando me drogou.
Bem o Nicolas não apareceu, mas na saída do racha Mauro estava na porta com seu carro, ele foi buscar o Arthur, provavelmente não sabia que eu ia para jogo hoje, Leonardo tinha mesmo falado que ele viria de uber, acho que deve ter marcado do Mauro vir buscá-lo. Nosso amigo policial ainda está fardado dentro do carro, devia está de plantão por isso não veio jogar também.
— Eu vou indo — Arthur diz antes de ir até o carro.
— Tranquilo — não sei porque mais estou com a impressão que isso é mais do que só sexo, afinal o Mauro saiu para comer pizza com ele, só os dois em um lugar público, ele não fazia muito isso com Rick — Arhtur!
— Oi — ele se vira quando o chamo.
— Só tome cuidado e me ligue se precisar de algo, qualquer coisa tá bom?
— Beleza — ele parece confuso, mas pelo seus olhos acredito que ele entendeu que pode contar comigo.
De longe Mauro me cumprimenta com um aceno de cabeça depois os dois segue para onde quer que eles estejam indo. Ainda é um pouco estranho pensar nesses dois juntos, me pergunto quando foi que isso começou a rolar. Dan tem razão quando diz que sou muito desligado e que demoro para pegar as coisas que acontecem ao meu redor — será que eles estavam dando na cara e só eu não vi? — De qualquer forma deve mesmo ser um pouco mais sério, afinal Mauro contou para o Rick.
14 de Abril (Segunda Feira)
16:50 PM
Muitos dias se passaram e a vida voltou ao normal, meu trabalho pelo dia, a noite faculdade, racha nas sextas, só meus fins de semana que passaram a ser um pouco diferentes, comecei a beber menos e consequentemente sair menos. Na delegacia não mudou muita coisa, a falta de provas não me ajudou, o caso já estava praticamente encerrado, Nicolas tinha sumido do mapa, não tinha notícias dele e ninguém parecia ter também — isso meio que foi até uma coisa boa.
— Cicinho, faz o pagamento da quinzena do pessoal hoje logo — meu pai paga seus funcionários por quinzena, todo dias 15 e dia primeiro, mas às vezes quando o movimento está bom e ele tem a grana do pessoal antes ele antecipa um dia ou dois, atrasar nunca, ele tiraria do próprio bolso antes de pensar em atrasar.
— Certo pai — se o senhor quiser eu pego a minha só amanhã mesmo — digo.
— Não, está tranquilo, pode pegar a sua também filho — meu pai ultimamente tem me dado mais responsabilidades, não só pagar os funcionários, tipo cada vez mais ele vem me dando mais tarefas para fazer, só que não são tarefas que me sobrecarregam, na verdade meu velho está dividindo as tarefas quase que igualmente entre mim e ele.
— Valeu pai, vou fazer os pagamentos, depois vou indo, hoje não tem aula, mas vou me reunir com o pessoal para finalizar o projeto que estamos desenvolvendo — fomos liberados hoje para trabalhar no projeto.
Os funcionários amam receber a quinzena ainda mais quando ela vem um dia antes, qualquer antecedência já é motivo de comemoração, de certa forma para mim também, ainda mais que esses dias caseiros me fizeram até criar uma reserva na minha conta, fora minha poupanças para emergências que o Dan me fez fazer, minha vida financeira nunca esteve em risco, mas ultimamente ando bem mais consciente dos meus gastos, tudo isso graças ao Dan, tipo ele sempre organizou minhas coisas, mas tenho notado que estou começando a criar hábitos de me organizar sem ele precisar mandar.
O pessoal ficou de ir para minha casa, me ofereci para buscá-los, mas Arthur disse que não precisava que ele estava com um “amigo” que o deixaria lá em casa no horário marcado e Leonardo disse que vai aparecer depois do trabalho, como seu trabalho não é tão longe da minha casa disse que não iria precisar de carona. Saindo do trabalho passei em uma padaria, comprei uns salgados e um bolo — só para ter algo pra galera comer, já que ainda não tinha feito mercado em casa.
Estou pagando no caixa quando vejo Nicolas chegando de moto com outro cara, meu coração até acelera um pouco, finalmente estava vendo o cara, peguei as coisas depressa e saí para encontrar com ele antes que ele entrasse na padaria. Ele me viu e ficou pálido no mesmo instante, mas se confiou no amigo grandão dele e fez uma cara de indiferença — ou pelo menos tentou.
— Nicolas quero falar com você — digo em um tom bastante sério.
— Oi Cícero.
— Quem é esse aí? — O cara perguntou bancado o ciumento.
— Não quero confusão, só preciso saber por que?
— Por que o que Cícero? — Ele se fez de sonso e isso só aumentou minha raiva.
— Você sabia que eu quase morri por conta da droga que você colocou no meu copo? — Joguei a real para ele e pude ver que ele perdeu a pose por alguns segundos.
— Que droga, não sei do que você está falando — ele voltou para o seu personagem, mas não adianta mais, eu vi a verdade em seus olhos.
— Que história é essa Nicolas? — O cara perguntou para ele.
— Não tem história, isso claramente é um engano, não fiz nada — ele se defendeu.
— Se você não fez nada errado então porque você sumiu do nada depois daquele dia? — Acho que ele não pensou que eu fosse ter coragem de enfrentá-lo na frente do seu acompanhante, porém o cara começou a encará-lo esperando uma resposta dele também.
— Não queria dizer nada, mas o Arthur ficou no meu pé, ele não entendeu que eu só queria amizade, eu te falei dele lembra — ele diz se explicando para o cara que está com ele.
— O Arthur ficou te perseguindo?
— Foi, ele ficou afim de mim e fica me ligando o tempo todo, por isso troquei de número, não queria perder a amizade, mas achei melhor me afastar.
— Nicolas o Arthur está namorado outra pessoa tem mais ou menos um mês e outra essa é a pior mentira que eu já ouvi alguém contar.
— Ei calma ai parceiro, se ele está dizendo que não fez nada é porque ele não fez tá ligado — o cara fica entre nós dois.
Estou com as sacolas na mão, e o cara é maior do que eu, mas não vou me acovardar, esse filha da puta vai ter que admitir o que ele fez.
— Cícero eu não faço ideia do que você está falando, eu sou inocente.
— É melhor você sair daqui, seu playboy, ou então a coisa vai ficar feia por seu lado — cara além de grande é bem agressivo.
— E quem é que vai me tirar daqui? — Digo sendo insolente.
— Tá pedindo para apanhar, né?
Ele agarrou minha camisa e se prepara para me dar um soco, mas antes que os seguranças da padaria intercedam ou até mesmo eu consiga largar as sacolas que eu estou segurando só vejo um vulto moreno se colocando entre nós dois e metendo um empurrão tão certeiro no grandão que ele tropeça nas próprias pernas e cai quase derrubando a moto dele junto.
— Tá vacilando meu irmão, quer brigar vem para cima — nisso um grupo de antigos colegas meus me cercam prontos para brigar.
— Deu sorte que está com seus amigos mauricinhos — o cara reclama se levantando, mas os seguranças agora estão apartando a briga também.
Já tem muito — muito mesmo — tempo que eu não via o César e de todas as pessoas que eu pensei que pudesse se meter numa briga por mim ele era a última pessoa dessa lista, no fim os caras da padaria viram que foi o cara quem tentou me agredir primeiro então ficaram do meu lado assim como o pessoal que estava com César, nessas Nicolas já tinha aproveitado a confusão é dado no pé, só que o cara só percebeu que estava sozinho agora. Vendo a confusão no seu rosto eu me aproximei para interceder pelo cara, não era justo ele apanhar por um cara como o Nicolas.
— Foi um engano galera, espera, não vamos partir para violência, cara, por favor, olha aí o Nicolas correu e te deixou aqui com os bo dele.
O Max — nome do grandão — resolveu ouvir a voz da razão e saiu sem arrumar mais confusão, como ninguém chegou nas vias de fato tudo acabou razoavelmente bem. Apartar uma briga ao invés de começar uma é um avanço positivo na minha corrida para a maturidade, pelo menos eu acho. César depois do fuzuê todo vem falar comigo.
— Tá bem irmão?
— Tô, é que o palhaço que estava com ele me drogou, estava tentando fazer isso filha da puta confessar.
— Te drogou, que porra foi essa mano?
Contei tudo que tinha acontecido para ele, por um momento parecia que César e eu nunca deixamos de nos falar, é estranho, mas foda-se também o cara me ajudou. Ele me ouviu contar toda a história sem me interromper nenhuma vez.
— Que babaca mano — César está revoltado com Nicolas assim como eu.
— Pois é, mas deixa pra lá, esse moleque ainda vai me pagar pelo que me fez — eu acredito em karma.
— Vai dar certo mano.
— É eu tenho que ir, valeu por ter me ajudar — agradeço e ele me abraça.
— Sinto sua falta mano, eu fui um merda de amigo com você e sinto muito de verdade — não sei, mas sinto verdade nas palavras dele.
— Valeu mano, significa muito para mim.
Nos despedimos e ele seguiu seu caminho com os outros caras, eu volto para casa agora um pouco mais calmo, acho melhor não contar pro pessoal que houve esse encontro, isso só vai deixar tanto o Dan como o Rick irritados comigo por ter quase entrado em uma briga sem pensar. O melhor agora é focar no meu projeto de faculdade com Leonardo e Arthur e pronto.
18:55 PM
Leonardo chega quase que junto do Arthur, ele vê o amigo descendo do Onix preto, mas não diz nada, Leonardo também conheceu o Mauro no racha, mas eles não chegaram a interagir muito. Recebo os dois no portão e espero para ver se o Leonardo vai tocar no assunto, mas ele fica na dele, não sou de ficar me metendo e nem fazendo fofoca, mas é que esse lance do Arthur com o Mauro é tão absurdo e aleatório que me despertou o interesse de querer saber quando começou e em que pé está.
Como nosso amigo não tocou no assunto e eu mesmo já prometi para o Rick que não iria me meter fico na minha — só me coçando por dentro — ofereço os lanches que comprei sem dizer sobre o ocorrido com Nicolas e começamos a trabalhar no nosso projeto. A ideia é criar um sistema que otimize meu trabalho no restaurante, com um mesmo sistema eu consiga fazer as demandas do caixa e também dos demais departamentos do restaurante, tudo em um lugar só, no início pareceu uma ótima ideia, mas acabou que essa ideia se mostrou um grande desafio, pois não é coisa para se fazer no início do período, só depois foi que entendemos que a professora não quer necessariamente que ele rode, é mais a construção da ideia que importa para ela.
O lance é que nós três pegamos tanto gosto pelo projeto que começamos a estudar por fora para conseguir viabilizar ele antes de nos formarmos, Leonardo estipulou metas que temos que alcançar dentro de uma progressão planejada e que vai nos garantir o sucesso, enquanto Arthur e eu ficamos com a parte mais bruta da programação, Arthur é quem tem mais tempo de estudar então ele meio que está mais dentro dessa parte do que eu, mas estou me esforçando para não deixar todo o trabalho pesado só para ele.
— Isso já entrega tudo que a professora quer da gente — Leonardo finaliza o que vamos entregar a ela.
— Muito bem, estou achando que vamos conseguir terminar até o final do curso e ganhar uma boa grana com esse programa — falei.
— Tem muito potencial, mas realmente vai dar muito mais trabalho do que pensamos — Arthur se diz empolgado com o desafio.
— A gente se dá conta — Leonardo está tão animado quanto nós.
— Vamos dar uma pausa para terminar de comer? — Sugiro.
— Pode ser — Leonardo fecha o notebook e começa a abrir espaço na mesa para que eu coloque as comidas em cima dela para gente.
— Valeu Ciço — Arthur diz quando entrego um copo com coca cola para ele.
— Arthur, o Mauro foi quem veio te deixar? — Leonardo toca no assunto me pegando de surpresa.
— Foi — ele responde ainda meio desconfiado.
— Vocês estão sendo amigos? — Aproveito a deixa para perguntar.
— Sim, meio que isso — ele responde.
— Arthur, você sabe que somos seus amigos né? — Leonardo diz com um sorriso simpático e amigável.
— Se quiser falar com a gente, pode falar mano.
— Tá bom, eu conheci ele um pouco antes daquele dia no racha…