Capítulo 5: A Semente da Conivência
O jogo tinha, de fato, virado. Aquele desejo inicial por mulheres casadas nos contos eróticos havia se transformado em algo muito mais complexo e pessoal: o desejo de ver minha mulher desejada, e mais do que isso, de ver ela cedendo a esse desejo. A confissão dela sobre o entregador foi um terremoto que abriu fissuras por onde um novo tipo de luxúria começou a escorrer.
Minha mente tornou-se uma usina de obsessão. Já não lia contos eróticos apenas por prazer; era uma pesquisa, um estudo aprofundado do meu próprio fetiche. Eu devorava relatos de cornos mansos, de relacionamentos abertos, de mulheres que descobriam o prazer na liberdade com a bênção do parceiro. E eu compartilhava tudo com Fah.
No início, a resposta dela era um misto de curiosidade e repulsa moral. "Isso é traição," ela dizia, franzindo a testa. "Por pior que ele seja, trair é errado." Ela se referia aos personagens dos contos, mas a sombra da nossa própria relação pairava sobre a conversa.
Mas eu era persistente. Comecei a enviar reportagens sérias sobre relacionamentos não-monogâmicos, artigos de psicologia que discutiam o ciúme como uma construção social, vídeos de casais reais que viviam dinâmicas similares. Aos poucos, o discurso dela começou a mudar. A palavra "traição" foi sendo substituída por "combinado". O "é errado" deu lugar a um pensativo "é incomum".
Uma noite, depois de um jantar e um vinho, a conversa chegou ao ápice. Estávamos no sofá, e eu mostrei a ela um conto especialmente bem escrito, onde a mulher, com o consentimento total do marido, tinha um amante fixo.
"E se," eu comecei, escolhendo cada palavra com cuidado, "o que é 'errado' para a sociedade, fosse exatamente o que nos desse mais prazer? E se a 'traição' não existisse, porque eu estaria não apenas ciente, mas desejando que você vivesse isso?"
Fah ficou em silêncio por um tempo, observando a tela. Quando ergueu os olhos, havia uma centelha diferente neles. Não era mais o rubor de excitação de quem se exibe, era algo mais profundo, mais calculista.
"Eu sempre fui uma mulher de um homem só," ela disse, devagar. "Mas... comecei a entender que isso não é um fetiche seu. É um fetiche nosso. Você se excita em imaginar, e eu... bem, depois de tudo que fizemos, comecei a me excitar em ser desejada de verdade, não só em ser vista." Ela fez uma pausa, e um sorriso esperto surgiu em seus lábios. "Seria uma bobagem muito grande da minha parte, não acha? Ter um namorado que não só permite, mas adora a ideia de me ver aproveitando... e eu ficar me prendendo a um conceito que nem é meu?"
O ar saiu dos meus pulmões. Era a abertura que eu tanto esperava.
"E o entregador da pizza?" eu ousei perguntar.
"Foi uma fantasia. Mas... uma fantasia gostosa," ela admitiu. "E se fosse mais do que uma fantasia? Se a gente... combinasse?"
Foi então que o abstrato começou a tomar forma concreta. Naquela mesma semana, durante um happy hour com os amigos do trabalho dela, ela me enviou uma mensagem: "O Ricardo, da contabilidade, não para de me olhar. Ele é bem mais gostoso que o entregador da pizza, haha. E solteiro."
A mensagem foi uma injeção de adrenalina e tesão. Eu não senti o frio na barriga do ciúme, mas o calor radiante da conquista. Ela não estava apenas reportando um fato; ela estava me incluindo na sua descoberta, tornando-me cúmplice.
"E o que você faria se eu dissesse que você tem passe livre?" eu respondi.
A resposta dela demorou alguns minutos, mas quando chegou, mudou tudo: "Talvez eu deixasse ele me levar para dançar. E talvez, se a dança fosse boa o suficiente... eu deixasse ele me beijar no estacionamento. Só se você mandar uma mensagem dizendo 'pode beijar', claro."
Ali, naquele bar, a metros de distância de mim, Fah não estava apenas se exibindo. Ela estava, com a minha permissão explícita e incentivada, negociando a própria infidelidade consentida. E eu, sozinho em casa com o celular na mão, tinha a dura missão de decidir se a fantasia iria, finalmente, se tornar realidade.
O livro da nossa vida tinha um novo vilão, ou talvez um novo herói: o tal Ricardo da contabilidade. E nós éramos coautores de um enigma que só o desejo poderia resolver. A linha que separava a exibição da entrega total estava prestes a ser cruzada, e ambos estávamos ansiosos para ver o que havia do outro lado.