Depois de mais uma noite puxada de trabalho, eu estava de volta à minha casa. Sem dúvida, aquele era o pior dia da semana. Domingo era o dia de curtir a solidão. Sem minha filha, sem Claudia, que era minha companhia diária, e sem nada para fazer. Ou melhor, até tinha a opção de chamar alguém para ir ao shopping e jogar conversa fora, mas não tinha a mínima vontade de sair para me divertir. Eu não vivia chorando pelos cantos e nem me isolava do mundo, mas carregava uma tristeza onde quer que eu fosse. Eu não queria que doesse tanto, mas doía. A falta de Fernanda e a saudade do que tínhamos me causavam uma dor constante; às vezes doía menos, às vezes mais, mas sempre doía.
Joguei-me na cama assim que entrei no quarto de hóspedes, que agora era meu quarto. Até o berço da Sophia ficava ali. Eu ainda não tive coragem de dormir na minha cama sozinha; seria torturante demais para mim. Rezei para dormir rápido e ter uma boa noite de sono. No início da noite, provavelmente eu veria Fernanda e teria minha filha nos meus braços novamente. Essas eram as únicas coisas que realmente me traziam alegria verdadeira.
Dormir rápido foi fácil; na verdade, apaguei rapidinho, mas não dormi por muito tempo. Acordei bem antes da hora do almoço. Meus olhos ardiam de sono, até tentei dormir de novo, mas não consegui. Quando finalmente desisti, levantei e fui tomar um banho para tentar relaxar um pouco.
Depois do banho, arrumei algo para comer e fui para a sala tentar me distrair com a TV. Fui procurar um filme para assistir e acabei encontrando um que eu havia baixado para ver com Fernanda: "Azul é a cor mais quente". Porém, não assistimos porque Fernanda disse que odiava o filme, pois uma das meninas trai a outra e elas terminam separadas. Ela comentou que a traição não fazia sentido, nem foi algo desenvolvido no filme; a garota simplesmente traiu a outra com um cara e isso fez com que terminasse o relacionamento. Fernanda também mencionou que uma das atrizes fez acusações graves contra o diretor do filme após o lançamento, então ela não gostava do filme. Acabou que ele ficou ali, abandonado.
Por mera curiosidade, resolvi assistir. Achei muito legal o desenvolvimento das duas personagens, mas realmente a traição de uma delas não fez o menor sentido. A cena em que a outra descobre e confronta a traiçoeira é triste e bem emocionante. Acabei nem vendo o resto do filme; nessa cena, me identifiquei muito com a garota que traiu. Ela jogou tudo fora por nada, acabou com o relacionamento por algo fútil e perdeu o grande amor da vida dela. Desliguei a TV e nem percebi quando comecei a chorar. O que a garota fez era muito parecido com o que eu fiz; apesar de não ter traído Fernanda, acabei estragando tudo por um motivo idiota.
Dali para frente, a tarde péssima que eu estava vivendo se tornou horrível. A culpa tomou conta de mim e chorei como não fazia desde o dia em que Fernanda se foi. Foi daqueles choros que saem do fundo da alma, que fazem sua respiração falhar, que os soluços tomam conta da sua garganta e, por mais que tentemos parar, se prolongam por muito tempo.
Não sei por quanto tempo chorei, mas acabei adormecendo após algum tempo. Só acordei com alguém batendo à porta. Quando meu cérebro conseguiu funcionar com clareza, olhei a hora no meu celular— eram quase dezenove horas e provavelmente já era Fernanda com minha filha. Ela ainda tinha as chaves dela, sempre abria o portão e entrava, mas, por algum motivo, nunca abria a porta; sempre batia e esperava eu ir abrir. Arrumei meu cabelo meio de qualquer jeito e passei as mãos sobre o meu rosto, mas minhas lágrimas já tinham secado. Levantei e fui até a porta. Quando abri, percebi que algo estava errado.
Sabrina— Cadê a Sophia?
Fernanda— Boa noite para você também, Sabrina. Ela está com Laís, não se preocupe.
Sabrina— Desculpe, Fernanda, boa noite. Mas por que ela está com Laís? Eu não estou entendendo.
Fernanda— Tudo bem, eu, no seu lugar, acho que teria a mesma reação. Bom, eu tinha deixado ela lá por um motivo, que agora não é mais importante. Você está bem? Está toda inchada, com os olhos vermelhos; estava chorando?
Sabrina— Eu fui ver aquele filme idiota que você disse que odiava e ele acabou mexendo muito comigo. Chorei um pouco, mas estou bem. Não se preocupe.
Fernanda— Qual filme? Com essa cara, não tem como ter chorado só um pouco, mas tudo bem.
Sabrina— "Azul", você disse que odiava ele, lembra?
Fernanda— Lembro sim, e você tem razão, eu odeio esse filme. A história não faz sentido para mim; a traição da... hum... Acho que entendi o porquê de você ter ficado tão mal.
Sabrina— Eu fiz o mesmo que ela, não da mesma forma, mas no fim deu na mesma.
Fernanda— Talvez não. Nosso filme ainda não acabou; dá para a gente tentar mudar o final. E seus erros são bem menores. Vai tomar um banho e se trocar; vamos sair um pouco para conversar.
Sabrina— Como assim, sair? Você está mesmo me convidando para sair com você?
Fernanda— Sim, estou. Você aceita sair comigo?
Sabrina— Claro que sim. Eu adoraria!
Fernanda— Então vamos entrar para você tomar um banho e melhorar essa cara. Eu te espero na sala, se você deixar.
Sabrina— Claro que eu deixo; a casa é sua também.
Dei passagem a ela e ela foi direto para o sofá. Eu disse que voltava rápido e fui para o meu quarto, ainda meio aérea com tudo aquilo. Eu não estava acreditando que Fernanda tinha me chamado para sair. Eu ainda não sabia o motivo do convite, mas aceitei sem pensar duas vezes. Poderia ser a oportunidade de eu provar para ela que merecia uma chance. Aquela frase que ela falou me deu todos os motivos para acreditar que ela estava disposta a tentar. Se nosso filme ainda não acabou, eu iria fazer o possível para termos nosso final feliz.
Tomei um banho super rápido e, quando saí, fiquei em dúvida sobre qual roupa vestir. Resolvi colocar algo semelhante ao que ela estava vestindo: calça jeans, um top e uma jaqueta curta por cima. Calcei um tênis, passei uma maquiagem leve, fiz um rabo de cavalo no cabelo, passei um perfume básico, um pouco de creme nos braços e mãos, e fui para a sala. Fernanda me recebeu com um sorriso lindo que eu não via há muito tempo.
Sabrina— Eu não faço ideia de onde a gente vai, então vesti algo parecido com o que você está usando.
Fernanda— Também não sei ainda, mas estou com fome. A gente podia ir comer um lanche ou jantar em algum restaurante simples. A roupa está ótima, Sabrina; você fica bem em qualquer roupa.
Sabrina— Obrigada, Fernanda. Não estou reclamando, já quero deixar isso claro, mas por que você quer me levar para sair?
Fernanda— Porque acho que precisamos conversar e tentar resolver nossa situação. Achei que seria bom fazer isso em um lugar neutro e também queria tomar um ar. Tudo bem?
Sabrina— Você está pensando em pedir o divórcio? Se for, eu prefiro não ir; se for qualquer outro assunto, por mim tudo bem.
Fernanda— Não, Sabrina. Na verdade, isso nunca passou pela minha cabeça. Mas também acho que não dá para ficar como está, por isso quero conversar com você; saber o que você pensa sobre tudo. Podemos ir?
Sabrina— Graças a Deus! Sim, podemos.
Não sei por que falei aquilo, mas realmente fiquei com medo. Sei que não fazia sentido pelo jeito que ela estava me tratando, pelo sorriso no seu rosto, mas mesmo assim, me deu muito medo. Saímos e decidimos ir a uma lanchonete que ficava perto de casa, a uns cinco minutos a pé. Fernanda sugeriu que fôssemos andando, e assim fizemos. Acho que ela notou que eu estava um pouco tensa, porque, do nada, passou o braço dela pelo meu e pediu para eu relaxar. Eu não sabia como reagir com ela agindo daquele jeito, mas assim que senti seu toque, seu cheiro e vi aquele sorriso, relaxei automaticamente.
Ela continuou abraçada comigo até chegarmos à lanchonete. Escolhemos uma mesa mais ao fundo e, como havia poucas pessoas, teríamos privacidade para conversar tranquilamente. Pegamos o cardápio e fizemos nossos pedidos. Assim que a garçonete trouxe uma Coca, Fernanda foi direta comigo.
Fernanda— Se você pudesse resolver nossa situação agora, como você faria?
Sabrina— Não tem como eu responder isso, é impossível porque só depende de você para resolver. Você sabe que só estamos separadas porque você não me perdoou. Não estou te culpando, mas é essa a nossa situação atual.
Fernanda— Eu entendi. Mas se fosse ao contrário? Já parou para pensar?
Sabrina— Na verdade, não, mas não precisa; eu te perdoaria sim. Acho que eu teria reagido pior do que você; provavelmente teríamos uma briga terrível, mas, no máximo em um mês, eu já teria te perdoado. Você sabe como sou; conhece a história que eu e minha mãe vivemos. Sempre a perdoei; não consigo guardar rancor de alguém que amo.
Fernanda— Acho que minha pergunta não foi das melhores. Somos diferentes em muitos aspectos, e nesse, por exemplo, somos muito diferentes. Eu queria ser como você, mas não sou. O que eu mais queria era te perdoar agora e resolver tudo. Infelizmente, não consigo fazer isso. Te perdoar sinceramente, acho que já perdoei desde que resolvi vir ter essa conversa com você; o problema é a confiança. Eu queria, quero muito, mas não consigo confiar em você de novo, não assim de uma hora para outra.
Sabrina— Eu te entendo. Eu queria muito mudar isso, mas não vejo como. Sabe, eu gostaria que você pudesse ler meus pensamentos ou saber o que estou sentindo agora. Tenho certeza de que, se você pudesse, confiaria em mim de novo.
Fernanda— Eu estive pensando hoje depois que sua mãe esteve no meu apartamento e me deu alguns conselhos. Sabe, não tem como você recuperar minha confiança se eu não te der uma chance. Mas eu não quero que voltemos a ser como éramos, tipo eu voltar para casa ou voltarmos a viver como casadas. Você pode achar que é besteira minha, mas não consigo fazer isso agora. Mas você merece uma chance; nós merecemos. Passamos por muita coisa juntas para acabar assim.
Sabrina— Eu não estou te entendendo; já fiquei feliz e triste várias vezes ouvindo o que você acabou de dizer. O que você está pensando em fazer, então?
Fernanda— Te pedir em namoro. Se você topar, a gente começa a namorar hoje e vamos tentando consertar as coisas devagar, sem pressa. O que você acha?
Sabrina— Eu topo!
Fernanda— Tem certeza?
Sabrina— Tenho!
Fernanda— Você não vai nem questionar nada?
Sabrina— Não. Eu errei com você. O que mais quero é ter uma chance de provar que sou confiável, que sou de novo aquela pessoa que você ama. Não tenho direito de questionar nada.
Fernanda— Então está bom para você assim?
Sabrina— Não, mas está justo. Para mim, é o suficiente. Bom seria se a gente voltasse para nossa casa agora e você só saísse para buscar nossa filha e suas coisas. Porém, eu precisava de uma única chance, e você está me dando ela. Para mim é o suficiente por enquanto.
Fernanda— Só me promete que você vai ser sincera, mesmo que seja algo que possa atrapalhar a gente voltar a ser como éramos. Promete que vai me contar?
Sabrina— Eu já prometi isso para mim mesma; não tenho problema algum em prometer para você.
Fernanda— Então vamos ver no que isso vai dar, amor. Agora vamos comer.
Ouvir ela me chamar de amor foi algo tão significativo que nem percebi que uma lágrima escorreu pelo meu rosto. Fernanda percebeu e esticou a mão até meu rosto para limpá-la. Eu segurei sua mão e disse um "obrigado" que tenho certeza de que ela entendeu que não era só por limpar minha lágrima.
Nossos sanduíches chegaram e começamos a comer. Ficamos conversando sobre coisas aleatórias enquanto comíamos. Perguntei a ela sobre a visita da minha mãe, e ela me contou tudo. Fiquei feliz por minha mãe ter ido rogar por mim. Fernanda me perguntou como estava a terapia e eu contei a ela. Falei também sobre ter lido a conversa com Robson e o que pensei. Vi que ela ficou meio tensa, mas não iria esconder nada dela, muito menos mentir ou omitir as coisas. Contei sobre como me achei bonita nas fotos grávida e que queria ter tirado algumas depois que comecei a me sentir gorda. Para minha surpresa, ela tinha várias; disse que tirou escondido de mim quando eu proibi de tirar fotos minhas. Ela me entregou seu celular para eu ver as fotos e eu pude ver como estava com aquele barrigão enorme. As fotos não eram nos melhores ângulos, mas deu para matar a curiosidade. Pedi para ela me enviar todas, se pudesse. Ela fez isso assim que devolvi seu celular.
Sabrina— É como se eu estivesse vendo outra pessoa nessas fotos.
Fernanda— Como assim?
Sabrina— Eu não estava feia; tudo bem que eu estava com um barrigão e o corpo um pouco inchado, mas não tem nada de feio em mim. Eu era uma grávida bonita, mas naquela época, eu me achava horrível. Não sei como te explicar, mas é como se fosse uma ilusão de ótica.
Fernanda— Eu sinto muito que você tenha passado por isso e por eu ter feito tão pouco para te ajudar.
Sabrina— Você fez muito; me deu espaço, teve paciência, fez o que podia fazer, amor.
Fernanda— Pode ser, mas depois que a Sophia nasceu, eu continuei fazendo o mesmo e não deveria. Eu tinha que ter insistido com você, até brigado se fosse preciso. Mas não fiz, e me arrependo muito disso.
Sabrina— Já passou. Vamos gastar energia com o que podemos fazer agora; não adianta a gente ficar remoendo isso. Eu sei que vou conseguir conquistar sua confiança de novo; a gente vai ficar bem.
Fernanda— É o que mais quero. Estou cansada de sofrer e saber que você também está sofrendo. Na verdade, eu queria resolver isso de vez. Sinto muito por ter que ser assim, amor. Só tenha um pouco de paciência comigo e a gente vai consertando as coisas devagar.
Sabrina— Desde que você esteja comigo, eu não tenho pressa. Claro que queria que fosse diferente, mas só de saber que estamos juntas de novo, já me sinto muito feliz, amor.
Terminamos de comer e continuamos conversando. Depois que Fernanda pagou a conta, seguimos rumo à minha casa, agora abraçadas, devidamente como namoradas. Eu estava louca para dar um beijo nela, mas estava com medo de fazer qualquer coisa que pudesse de alguma forma estragar as coisas.
Para um dia que tinha tudo para ser horrível, meu domingo estava se tornando um dos melhores dias da minha vida. O dia em que ganhei a chance de trazer meu amor de volta para mim por inteiro. Era apenas o início, mas eu estava pronta para dar tudo de mim para isso acontecer.
Continua…
Criação: Forrest_gump
Revisão: Whisper