A proposta da Valentina realmente mexeu comigo. Sem querer, ela usou duas coisas que me atraíam muito: a curiosidade e a Libélula. Sinceramente, eu teria aceitado na hora que ela terminou de explicar, mas a proposta tinha muita semelhança com a mesma que a Donna me fez; era quase tudo idêntico, com algumas diferenças. Isso me deixou bastante insegura em aceitar, por isso pedi um tempo para pensar.
Depois daquela conversa, o final de semana seguiu normalmente e foi bastante agradável. Tive a chance de conversar bastante com a Alexia e conhecer um pouco mais da sua vida. Muitas dessas conversas foram acompanhadas pela Valentina, e ficou claro para mim que elas tinham uma relação além de patroa e empregada. Elas se viam como amigas, e era incrível como falavam bem uma da outra quando eu conversava sozinha com alguma delas. A admiração da Alexia pela Valentina era nítida nas nossas conversas. Acho que Alexia via Valentina como um exemplo a ser seguido, uma mentora.
Eu e Valentina não tocamos mais no assunto do trabalho a não ser quando elas se despediram para ir embora no domingo à tarde. Quando ela me abraçou na despedida, disse ao meu ouvido que era para eu pensar com carinho e que aguardava minha resposta.
Assim que elas saíram, chamei a Milene e minha mãe para conversar. Contei a elas sobre a proposta, e a Milene disse que aceitaria. Apesar de não conhecer a Valentina direito, achava que ela era confiável. Minha mãe, mais uma vez, me deu conselhos, mas deixou para eu resolver. Enfatizou que também achava que a Valentina era uma pessoa boa. Pelo jeito, os elogios da Valentina deram resultado, mas não posso negar que eu também pensava o mesmo. Sinceramente, eu não confiava cegamente nela, mas ela me passava segurança; via sinceridade no olhar dela quando a gente se falava.
Passei três dias pensando sobre isso e discutindo muito o assunto com minha mãe e Milene. Na quarta-feira à noite, cheguei à conclusão de que iria aceitar, mas queria entender direitinho o contrato que a Valentina mencionou. Então, mandei um áudio para ela dizendo que havia decidido aceitar, que era para ela redigir o contrato e me mandar uma cópia em PDF, pois queria estudá-lo. Se não houvesse nada que me fizesse mudar de ideia, no final de semana eu iria a São Paulo para assinar.
Ela me respondeu pouco tempo depois, dizendo que faria isso no dia seguinte, que já tinha toda a base do contrato pronta, então não iria demorar. Ela também disse que, se houvesse algo no contrato que eu não gostasse, poderíamos negociar e tentar entrar em um acordo. A única coisa que ela não abriria mão de forma alguma, era a cláusula de confidencialidade. O resto poderíamos discutir, incluindo os valores. Eu confirmei que tinha entendido e que aguardava o PDF.
Na quinta, no início da noite, recebi o PDF e o encaminhei para a Milena. Mandei um áudio pedindo para ela mostrar o contrato para algum advogado da empresa, ou que ela mesma poderia olhar. Queria uma explicação urgente sobre esse contrato e preferia que ela me ligasse para explicar tudo. Ela respondeu quase na mesma hora, dizendo que olharia o contrato e, se tivesse qualquer dúvida, pediria ajuda ao setor jurídico da empresa. Que me ligaria assim que fizesse isso. Agradeci e achei muito legal que ela não fez perguntas sobre o motivo do meu pedido. Ela era realmente muito discreta e profissional.
Também mostrei a cópia do contrato para minha mãe, que tinha experiência com esses assuntos e provavelmente entenderia já que ela já tinha sido CEO da nossa empresa. Mas ckkk eu queria mais de uma opinião, então pedi ajuda à Milena também. Com as duas me auxiliando, achei que não precisaria me preocupar com essa parte.
Minha mãe leu a cópia do contrato com calma e disse que era simples de entender, que não havia cláusulas confusas, e que era bem claro e específico. Ela disse que o contrato não me prendia; eu poderia deixar o trabalho se discordasse de algo, assim como a Valentina poderia me dispensar, caso não quisesse que eu continuasse. Porém, os cem mil eu receberia antes de assinar o contrato; minha assinatura nele seria a prova de que recebi o dinheiro. Os outros cem eu só receberia depois de um ano e meio, e apenas se o contrato não fosse quebrado.
Ou seja, se eu deixasse o trabalho ou a Valentina me demitisse, perderia o direito a esse dinheiro. A cláusula de confidencialidade tinha uma multa de 100 milhões de reais, e a quebra de contrato não afetaria essa cláusula, que seria válida por 15 anos. Eu não poderia falar nada relativo a esse trabalho por 15 anos; se vazasse qualquer informação, teria que pagar a multa na justiça.
Minha mãe explicou cada detalhe e disse que a única coisa que achou que poderia me prejudicar era a cláusula que deixava claro que eu só receberia os últimos cem mil se finalizasse o trabalho. A Valentina poderia me demitir um dia antes de vencer o contrato, e, juridicamente, eu perderia o direito a esses cem mil.
Fazia sentido a preocupação da minha mãe, mas eu não estava preocupada com dinheiro, e a Valentina já tinha me explicado que esse valor eu talvez não pudesse receber. Expliquei isso para minha mãe, e ela disse que, então, não via nada de estranho ou suspeito no contrato. Eu estaria assinando um contrato que sabia exatamente o que tinha, sem surpresas depois de assinar.
Milena me ligou na sexta e falou basicamente o que minha mãe havia dito, também mostrando a mesma preocupação com os últimos cem mil. Agradeci e aproveitei para convidá-la e sua família para nos visitar a qualquer hora. Ela agradeceu e disse que iria ver com o marido para combinarmos algo. Novamente, ela não fez perguntas e nos despedimos.
Depois de conversar com Milena, fiquei um bom tempo pensando se devia mesmo aceitar esse trabalho. Eu realmente queria, mas ainda sentia medo pelo que aconteceu com a Donna. Fui falar com minha mãe, e ela disse que temos que aprender com situações ruins que passamos na vida, mas não podemos deixar que essas situações definam nossa vida e nossas escolhas. Ela tinha razão; a Valentina não era a Donna. Eu iria tomar cuidado dessa vez e iria a trabalho, não viver uma aventura romântica.
Fui para meu quarto e mandei um áudio para a Valentina. Disse que no sábado eu iria a São Paulo e que poderíamos fechar negócio; eu iria fazer o trabalho para ela. Ela respondeu com um áudios basicamente só me agradecendo e pediu minha conta para transferir os cem mil. Eu sugeri que era melhor deixar para quando eu estivesse em São Paulo; era mais garantido. Ela disse que confiava em mim e que minha palavra era uma garantia. Sinceramente, não esperava ouvir aquilo, mas fiquei feliz em saber que ela confiava em mim. Mesmo assim, insisti e deixamos para resolver isso quando eu estivesse em São Paulo.
Na sexta, lá estava eu de novo arrumando minhas malas para viajar para São Paulo. Antes de dormir, mandei uma mensagem para Valentina pedindo seu endereço e avisando que eu sairia de casa às seis da manhã, então provavelmente chegaria em São Paulo depois das nove. Ela me mandou o endereço e pediu para eu não comentar com ninguém ligado à galeria que estava indo para lá, nem mesmo com a Alexia. Que depois ela me explicaria. Eu disse que só contaria para minha mãe e Milene, e que ela poderia ficar tranquila.
Tentei dormir cedo, mas não consegui e acabei dormindo apenas cinco horas naquela noite. Levantei às 5:30 e tomei café com minha mãe, que acordou cedo para se despedir. Depois de dar um abraço apertado nela e ouvir um monte de conselhos, saí em direção a São Paulo. A viagem foi tranquila e, às nove e pouco da manhã, eu estava em frente à casa que provavelmente era da Valentina. Se o endereço estivesse certo e se eu não tivesse cometido nenhum erro, eu estava no lugar certo.
Não consegui ver a casa, pois havia um muro enorme na frente e os portões estavam fechados. Mandei mensagem para Valentina avisando que havia chegado, e logo o portão maior se abriu devagar. Valentina apareceu e fez sinal para eu entrar.
Manobrei o carro, entrei pelo portão e vi uma casa enorme ao fundo. Pelo tipo da casa, percebi que era uma construção antiga, mas provavelmente reformada ao longo dos anos, pois tinha uma aparência muito boa. Estacionei ao lado do carro da Valentina e saí para cumprimentá-la. Ela estava com um sorriso lindo no rosto, provavelmente feliz por eu estar ali. Depois de um longo abraço e de ela me agradecer por ter vindo, convidou-me para entrar. Peguei minha mala no banco de trás e seguimos para dentro. Ela me levou direto para o quarto onde eu ficaria.
Depois, levou-me até ao seu escritório e, de cara, já vi um quadro lindo da Libélula, outro que eu não sabia que existia. Valentina, vendo-me paralisada olhando o quadro, disse para eu ir vê-lo de perto. Era lindo, não tão bonito quanto o que ela tinha no escritório da galeria, mas era realmente muito bonito. Depois de algum tempo admirando o quadro, sentei-me em frente à mesa onde Valentina estava. Ela começou me dando uma notícia que não me agradou nem um pouco.
Valentina disse que o contrato estava pronto, que eu poderia ler e verificar que nada havia sido alterado em relação à cópia que ela me enviou. Estava pronta para fazer a transferência, e eu poderia assinar, mas não daria tempo de registrá-lo naquele dia; só na segunda. Eu disse que, para mim, não seria um problema, mas então ela explicou que, sem registrar, não poderia me adiantar o que eu iria fazer. Ou seja, eu ficaria dois dias ainda sem saber qual era o tal trabalho que ela queria que eu fizesse. Sinceramente, aquilo me deixou bastante frustrada. Já estava morrendo de curiosidade, mas não havia o que fazer, a não ser esperar.
Pedi à Valentina para ver o contrato, e ela o pegou em uma gaveta e me entregou. Dei uma olhada rápida e realmente era o mesmo da cópia que ela me enviou. Pedi a caneta para assinar, e ela me disse que tinha que fazer a transferência primeiro. Eu disse que não precisava se preocupar com isso, que não estava ali por causa do dinheiro. Aceitei porque ela pediu para eu confiar nela quando disse que eu iria amar o trabalho e que saberia muita coisa sobre a Libélula. Acho que, quando falei aquilo, minha cara de decepção por ter que esperar até segunda ficou bem explícita.
Ela pegou a caneta e me entregou. Eu assinei o contrato e falei que iria descansar um pouco. Ela me pediu o número da conta novamente, e eu disse que depois eu passaria. Virei as costas e saí andando sem olhar para trás. Fui direto para o meu quarto e me joguei na cama. Logo ouvi os passos de Valentina se aproximando. Ela entrou no quarto e se sentou na minha cama.
Val— Está chateada comigo?
Nora— Não, Val. Estou frustrada por ter que esperar até segunda. Mas não é culpa sua não dar tempo de registrar o contrato hoje, nem de eu ser muito curiosa.
Val— Desculpe, Nora, é que eu realmente não posso falar sem o contrato registrado.
Nora— Tudo bem, eu te entendo. Você não me conhece bem o suficiente para confiar em mim.
Val— Não é isso. Olha, eu confio em você, confio a ponto de trazer você para dentro da minha casa. Mas é que isso é algo muito grande; só eu e outra pessoa sabemos disso, e é uma pessoa que conheço há mais de 30 anos. Nem a Alexia, a Geovanna ou a Donna sabem disso. Por favor, tente me entender; não quero que você ache que não confio em você.
Nora— Provavelmente é sobre a Libélula. Para ser um segredo desse porte, só pode ser. Então, acho que te entendo, já que é o maior segredo do mundo das artes no Brasil. Não precisa me responder sobre isso; só estou falando.
Val— Tenho algo para te mostrar agora; talvez isso te anime um pouco e prove que eu confio em você. Espera só um minuto, já volto.
Ela se levantou e saiu do quarto. Depois de um minuto, voltou com um chaveiro nas mãos. Eu me levantei e ela disse para eu segui-la. Saímos andando pelo corredor até chegar a uma porta enorme com três fechaduras antigas. Ela pegou o chaveiro e abriu as três fechaduras, e logo abriu a porta. Assim que entrei, percebi que era um cômodo bem grande, provavelmente um quarto antigo da casa. Ela foi até as duas janelas e abriu as cortinas, e o cômodo ficou bem claro.
Quando olhei ao redor, notei que havia vários quadros cobertos com lençóis. Ela começou a tirar os lençóis de cada um deles, e conforme os quadros iam sendo descobertos, meus olhos se arregalavam e meu queixo caía. Eram todos quadros da Libélula. Eu conhecia todos por fotos; provavelmente eram da coleção particular dela.
Fui olhando um por um, e ela ficou parada perto de um, mas não tirou o lençol. Quando me aproximei, ela foi puxando o lençol devagar. Era um quadro lindo, e esse eu não conhecia.
Val— Por favor, não faça perguntas, porque não vou responder. Esse nunca foi exposto em lugar algum. Foi o último trabalho da Libélula, e estou guardando ele para um momento especial. Você é a primeira pessoa que eu mostro ele.
Eu não sabia o que dizer; era um quadro lindo e eu só queria admirá-lo. Não ia fazer perguntas porque ela pediu, mas eu tinha várias. Porém guardei elas para mim.
Com certeza, tinha valido a pena ter aceitado o trabalho. Porém, mal sabia eu que aquela surpresa enorme se tornaria minúscula perto das que eu teria nos próximos dias.
Continua…
Criação: Forrest_Gump
Revisão: Whisper
