O Escolhido de Eldoria ☆ Capítulo 35

Um conto erótico de Tiago e Lucas
Categoria: Homossexual
Contém 2180 palavras
Data: 18/09/2025 09:03:41
Assuntos: Fantasia, Gay, Homossexual

✧ A Caverna da Morte ✧

(Tiago)

O beijo terminou, mas sua essência permaneceu, uma promessa silenciosa que vibrava no ar entre nós como a nota persistente de uma harpa celestial. Lucas me segurava com uma urgência terna, seus braços um bastião contra um mundo que, até aquele momento, eu sentira ser feito de sombras e obrigações. Em seu abraço, pela primeira vez em anos, o peso esmagador do meu “destino” se metamorfoseou. Deixou de ser uma corrente e tornou-se uma estrada, e eu não a percorreria mais sozinho.

Foi então, nesse interlúdio de paz, que um calor familiar pulsou contra nós dois. O mapa em minha mochila, o pergaminho mágico, começou a brilhar. Sua luz dourada era intensa. Relutantemente, quebrei o feitiço do momento e o peguei. Sobre o papel envelhecido, uma nova linha de luz serpenteava, um rio de prata líquida que desaguava em um ponto marcado com runas ásperas e agourentas.

“Caverna da Morte”, li em voz alta, o som das palavras profanando a santidade do nosso silêncio.

Um bufo de escárnio escapou dos meus lábios, uma defesa frágil contra o calafrio que a alcunha me causava.

“Que falta de criatividade! Todos os lugares que visitamos até agora têm nomes melhores.”

(Lucas)

Eu observei a luz do mapa dançar como fogo-fátuo sobre as feições de Tiago, refletindo em seus olhos a cor de uma magia antiga e perigosa. Mas o som de sua zombaria, aquele tom de desdém que era tão intrinsecamente seu, foi a música mais reconfortante que eu poderia ouvir. Ele estava de volta. O meu Tiago, afiado e irreverente, não a concha vazia que o desespero quase criou. O medo que me paralisara antes, um gelo nas veias, agora era apenas um eco distante, um fantasma sem poder. Aproximei-me, minha mão cobrindo a sua sobre o pergaminho, e tracei a linha brilhante com o dedo, sentindo um zumbido sutil sob a pele.

“A ‘Caverna da Morte’ fica na ‘Floresta Negra’, Tiago”, raciocinei, deixando a disciplina do guerreiro assumir o controle, organizando o caos em estratégia. “As lendas dizem que as raízes das árvores milenares de lá são tão profundas que absorvem a magia negra da terra, tornando seus frutos venenosos.”

Ergui o olhar para meu amado, sentindo um sorriso genuíno brotar em meus meus lábios, um que vinha de um lugar de força renovada.

“Pronto para uma aventura em um lugar com o nome mais clichê do reino?”

Ele sorriu de volta, um brilho de desafio em seus olhos e, sem uma palavra, saltou para as minhas costas.

“Sempre preguiçoso”, murmurei, o insulto afetuoso morrendo em um riso baixo.

Ajustei-o com cuidado, seu peso familiar e bem-vindo, uma âncora que me firmava no mundo. Então, disparei em direção às montanhas, sentindo-me mais forte e completo do que jamais estive.

(Tiago)

A viagem foi um borrão de verde e marrom, com Lucas movendo-se pela floresta com a graça predatória de uma pantera, seus passos mal sussurrando sobre a folhagem. Mas à medida que a floresta exuberante dava lugar a árvores retorcidas e a um solo rochoso e estéril, o ar mudava. Um calafrio percorreu minha espinha, um frio que não vinha do vento da montanha, mas de dentro para fora. Era uma sensação de vazio, de uma fome antiga e abissal que parecia sugar não apenas o calor, mas a própria cor e vida da paisagem.

A entrada da caverna era uma ferida na face da floresta, uma boca escancarada e desdentada, emoldurada por estalagmites que se projetavam do chão e do teto como as presas fossilizadas de uma criatura colossal. O vento que soprava de seu interior carregava um cheiro de terra úmida, ozônio e algo mais… um odor metálico de decadência milenar.

“Sinto algo… faminto vindo de lá”, sussurrei, minha voz um murmúrio frágil contra a pele de seu pescoço.

Lucas me colocou no chão com uma delicadeza que contrastava com a força de nossa jornada. Sua mão, calejada e quente, encontrou a minha, entrelaçando nossos dedos.

“Juntos”, ele disse. E essa única palavra, proferida com uma convicção inabalável, tornou-se um escudo mais poderoso que qualquer encantamento que eu pudesse conjurar.

(Lucas)

Adentramos a escuridão, e a boca da caverna se fechou atrás de nós com o som final e retumbante de uma lápide caindo sobre um túmulo. O negrume foi absoluto por um instante, denso e sufocante. Então, com um silvo coletivo, tochas presas às paredes se acenderam sozinhas, expelindo uma chama verde-doentia que não aquecia, apenas iluminava, lançando sombras longas e dançantes que pareciam ter vida própria. O corredor revelado era longo, suas paredes cobertas por entalhes complexos e avisos em uma língua morta que se contorciam sob a luz macabra.

Mal demos dez passos quando um gemido profundo de pedra raspando em pedra ecoou das profundezas, e as paredes laterais começaram a se mover, fechando-se sobre nós com uma lentidão inexorável.

“Recue, Tiago!”, gritei, girando nos calcanhares, mas a entrada já estava selada por uma parede de rocha sólida que não existia segundos antes. Instintivamente, o Escolhido ergueu as mãos, uma esfera de luz verde-esmeralda crepitando com poder arcano puro, e a lançou contra a parede que avançava. Em vez da explosão ensurdecedora que eu esperava, a parede de pedra absorveu o feitiço como areia seca bebe água. A energia simplesmente desapareceu, e por um instante fugaz, as chamas verdes das tochas tremeluziram com mais intensidade, como se tivessem sido alimentadas.

(Tiago)

“Não adianta!”, gritei, o pânico como garras geladas apertando minha calma. “Essa caverna… ela não anula a magia, ela a devora! Ela se alimenta dela!”

As paredes estavam perigosamente próximas agora, o espaço vital diminuindo a cada segundo. O ar tornou-se pesado, denso com o cheiro de poeira antiga e da magia ionizada que fora consumida. Foi então, em meio ao desespero crescente, que meus olhos se fixaram nos entalhes. Não eram apenas avisos ou decoração. Eram um manual de instruções. Mostravam a história de um caçador lendário que, para capturar uma besta devoradora de almas, não usou força bruta, mas astúcia, explorando o ambiente ao seu redor.

“Não é um teste de poder, Lucas!”, exclamei, a revelação cortando o ruído do meu medo. “É um enigma! Um teste de inteligência!”

Com as palmas das mãos espalmadas contra a pedra fria e opressiva, comecei a tatear os entalhes, meus dedos correndo freneticamente em busca de qualquer coisa fora do lugar, uma falha no padrão, um mecanismo escondido. Minhas unhas arranharam uma pedra ligeiramente solta na base da parede. Com um esforço que fez meus músculos protestarem, eu a puxei. A pedra cedeu, revelando um botão de obsidiana empoeirado em um recesso. Sem hesitar, eu o pressionei com toda a força do meu corpo. Com um rangido ensurdecedor que pareceu quebrar os próprios ossos da montanha, as paredes pararam, a meros centímetros de nos esmagar.

(Lucas)

Recuperamos o fôlego em arquejos irregulares, o alívio tão avassalador que nos deixou tontos, com as pernas trêmulas. O corredor se abriu em um vasto salão circular, do qual brotavam múltiplas passagens, todas aparentemente idênticas. Escolhemos uma à esquerda e seguimos por um corredor sinuoso, mas depois de vários minutos de caminhada, passamos pela mesma formação rochosa bizarra, um aglomerado de estalagmites que se assemelhava a um crânio deformado. Frustrados, recuamos e tentamos outra passagem, e depois outra, mas o resultado era sempre o mesmo, um ciclo enlouquecedor que nos trazia de volta ao crânio de pedra.

“É um labirinto mágico. Estamos andando em círculos”, disse Tiago, sua voz carregada de frustração.

Parei, ciente de que nossos olhos estavam nos enganando. Fechei-os, silenciando o bombardeio de informações visuais e me concentrando nos meus outros sentidos, como meu antigo mestre me ensinara para lutar no escuro. Filtrei o eco de nossos passos, o gotejar distante da água. O ar. Havia uma corrente sutil, quase imperceptível, um sopro de ar mais frio e fresco que acariciava meu rosto. Mas não vinha de nenhuma das passagens. Vinha da parede sólida entre os arcos do segundo e do terceiro túnel.

“É uma ilusão”, sussurrei, a certeza solidificando-se em meu peito. “O caminho certo é aquele que parece não ser caminho algum.”

Caminhei resolutamente até a parede de pedra e, ao tocá-la, minha mão a atravessou como se fosse fumaça fria, enviando um arrepio por todo o meu braço.

(Tiago)

Assim que atravessamos a parede ilusória, um som estridente de asas coriáceas batendo encheu o novo corredor, um ruído úmido e nauseante. Dezenas, talvez centenas de criaturas disformes se desprenderam do teto, mergulhando em nossa direção. Pareciam morcegos grotescos esculpidos em barro molhado, seus corpos disformes e sem olhos. Em seus lugares, apenas bocas abertas, repletas de lascas de pedra afiadas como dentes. Instintivamente, preparei uma rajada de vento, mas senti a magia ser arrancada de mim antes mesmo de poder moldá-la, sugada pela atmosfera parasita da caverna.

“Adagas!”, Lucas gritou, e o som de suas lâminas gêmeas sendo sacadas foi um assobio metálico e reconfortante.

As armas brilhavam com um fulgor pálido na luz verde. Nós nos colocamos de costas um para o outro em um instante, uma dança de sobrevivência que conhecíamos de cor. Era um balé mortal de aço e agilidade. Cada golpe preciso de Lucas quebrava um morcego em pedaços de argila que se espatifavam no chão com um baque surdo. Mas o horror estava nos fragmentos. Eles começavam a tremer, a se arrastar uns em direção aos outros como vermes, reformando as criaturas com um som repugnante de argila se unindo.

“Eles não param de voltar!”, gritei, esquivando-me de um ataque que passou zunindo pela minha orelha, deixando um rastro de cheiro de terra molhada.

(Lucas)

Estávamos sendo sobrecarregados. A cacofonia de argila se partindo e se reformando com sons úmidos era enlouquecedora, um ciclo sem fim de destruição e renascimento. Foi no meio desse caos que o próprio chão tremeu com uma violência brutal, quase nos derrubando. As paredes do corredor se contorceram como se estivessem vivas. A pedra gemeu e fluiu, unindo-se e se moldando em uma forma humanoide gigantesca.

Um golem, com mais de três metros de altura, arrancou-se da arquitetura da caverna, seus olhos dois cristais de esmeralda que brilhavam com uma inteligência fria e alienígena. Ele me ignorou completamente, como se eu fosse um inseto insignificante. Seu foco, absoluto e predatório, estava inteiramente em Tiago.

Antes que eu pudesse sequer gritar um aviso, um de seus braços maciços se abriu, a pedra se separando para formar uma mandíbula de rocha. Com uma velocidade aterrorizante, ela se fechou sobre Tiago, engolindo-o inteiro com um som úmido e final de rocha se selando hermeticamente. Por uma fração de segundo, eu vi o terror puro e absoluto nos olhos dele antes que a escuridão de pedra o levasse.

(Tiago)

A escuridão foi total, instantânea e sufocante. Um momento eu estava no meio de uma batalha, no instante seguinte, eu estava no túmulo. Fui esmagado pela pressão da pedra, o ar sendo brutalmente espremido dos meus pulmões. O cheiro de terra molhada, de minerais e da magia estagnada e digerida de eras me invadiu, sobrecarregando meus sentidos. O silêncio era absoluto, uma pressão em meus tímpanos, quebrado apenas pelo som abafado e frenético do meu próprio coração martelando contra minhas costelas como um prisioneiro desesperado.

Gritei, um som sem ar que morreu em minha garganta, engolido pela rocha impenetrável. O pânico, frio, puro e absoluto, tomou conta de mim, afogando todo o pensamento racional. Eu não podia usar magia. Não podia me mover. Eu estava completamente e totalmente impotente, enterrado vivo no coração pulsante de um monstro de pedra. E então, através de metros de rocha sólida, ouvi um grito abafado, um som de pura angústia que vibrou através da pedra e rasgou a minha alma. Era a voz de Lucas, quebrada pela dor.

(Lucas)

Um rugido de negação animal e primitiva rasgou minha garganta.

“Tiago!”

O nome ecoou pela caverna, não uma palavra, mas uma súplica desesperada, a materialização sônica de uma alma se partindo. O golem ficou parado, imóvel, uma tumba colossal e silenciosa. Os morcegos de barro, como demônios obedientes, cessaram seu ataque, pairando no ar como espectadores silenciosos de minha agonia. Tudo. Tudo o que eu tinha acabado de reconquistar — a esperança, a promessa de uma casa na floresta, o calor da mão dele na minha, o futuro – foi arrancado de mim e trancado dentro daquela monstruosidade.

O veneno de Malakor, a escuridão que eu pensei ter silenciado com amor e propósito, voltou com a força de um maremoto, sussurrando em minha mente com uma clareza cruel: “Fraco. Patético. Você prometeu protegê-lo e falhou outra vez. Você não serve para nada além de assistir àqueles que ama serem destruídos!”.

A adaga em minha mão tremeu, não de medo, mas de uma raiva tão profunda e fria que incinerou meu desespero, deixando para trás apenas cinzas de fúria. Meus olhos se fixaram nos orbes de esmeralda do golem. O poder negro de meu pai me seduzia, mas não lutei contra a escuridão que subia dentro de mim. Eu a acolhi, abri os braços para ela, e a deixei me preencher.

Continua…

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