A caminhada de volta pela areia fina, depois do mergulho de Edgar, foi silenciosa. O sol já se punha no horizonte, tingindo o mar de tons dourados e avermelhados, mas nenhum dos dois parecia reparar. Elijah andava com passos curtos, chutando grãos de areia, enquanto Edgar seguia ao lado, fechado, o maxilar travado, o olhar perdido.
A poucos metros, a casa à beira-mar surgia imponente, iluminada pela última luz do dia. Mas, diferente das outras vezes, não houve risadas nem corridas inocentes até a varanda. Apenas o silêncio espesso, desconfortável, que os acompanhou até entrarem.
Edgar deixou a toalha sobre uma cadeira e foi direto para a cozinha, fingindo procurar algo nas gavetas. Elijah ficou parado no meio da sala, olhando para ele com uma pontada de dor no peito. Sentia, mais do que sabia, que havia algo errado.
— Edgar… — chamou, baixinho, quase como se tivesse medo da resposta.
Ele não respondeu, apenas continuou com o olhar fixo em qualquer coisa, como se estivesse ocupado demais para ouvir.
Elijah deu dois passos hesitantes até a porta da cozinha. — Você… tá bravo comigo?
Edgar parou por um instante, respirou fundo, mas não se virou. — Não.
— Então por que você não fala nada? — a voz de Elijah vacilava. — Foi por causa daquele rapaz? Eu juro que não fiz nada… ele só veio perguntar meu nome… eu nem… — parou, apertando os próprios dedos nervosamente.
O silêncio de Edgar pesou ainda mais. Ele queria dizer sim, queria admitir o incômodo, o ciúme que queimava por dentro, mas a palavra parecia absurda demais para sair de sua boca. Como poderia, logo ele, um homem treinado para o controle absoluto, perder o equilíbrio por algo tão pequeno?
— Não é nada — murmurou, baixo, ainda de costas. — Esquece.
Elijah mordeu o lábio, sentindo a garganta fechar. Caminhou até o sofá e se sentou encolhido, os joelhos juntos, mexendo nas mãos. Seus olhos azuis estavam marejados, mas ele não queria chorar. Talvez eu não seja o suficiente.Talvez ele já esteja cansado de mim.
Do outro lado, Edgar o observava de relance. Cada gesto tímido e inseguro de Elijah o atravessava como uma faca. Ele queria atravessar a sala, puxá-lo nos braços e dizer a verdade: que o medo de perdê-lo era tão grande que o deixava cego. Mas não conseguia. Não sabia como expor aquilo.
A cozinha se enchia de cheiros simples e aconchegantes: alho dourando, cebola refogando no azeite, o barulho suave da frigideira sibilando. Elijah mexia a colher de pau com cuidado, a língua presa entre os dentes, como se cozinhar fosse uma missão perigosa que exigia toda a sua concentração.
Edgar, encostado na lateral da porta, apenas observava. Os braços cruzados sobre o peito, mas o olhar pesado. O som das ondas lá fora chegava até ali, misturado ao som das panelas e dos passos apressados de Elijah indo e vindo entre o fogão e a bancada.
Era engraçado, pensou Edgar, como um garoto que mal sabia cortar legumes sem se atrapalhar conseguia encher aquele espaço com tanta vida. O cabelo de Elijah caía rebelde sobre a testa, a camiseta larga balançava com seus movimentos, e vez ou outra ele franzia o nariz, como se estivesse brigando com a panela.
Ele é desajeitado, inocente, mas… é meu. Só meu.
Aquela última palavra queimava por dentro. Edgar não queria admitir, mas a imagem do rapaz da praia sorrindo para Elijah ainda o corroía.
Elijah, percebendo o silêncio comprido, mexeu a panela mais devagar, encolhendo um pouco os ombros. Sem coragem de encarar Edgar, falou quase num sussurro:
— V-você… não gosta da comida?
Edgar piscou, saindo do próprio turbilhão. — O quê?
— É que… você tá calado… — Elijah mordeu o lábio, olhando para a panela como se fosse se esconder dentro dela. — Eu pensei… que talvez tivesse feito algo errado.
Edgar sentiu o peito apertar. Se aproximou dois passos, mas ainda hesitou.
— Não é a comida.
Elijah arriscou erguer os olhos por um segundo, depois voltou a baixar a cabeça, mexendo o molho nervoso. — Então… é comigo?
Edgar respirou fundo. O instinto era negar, mas os olhos azuis dele brilhavam de expectativa inocente, e mentir seria impossível.
— Eu só… não gostei do jeito que aquele sujeito na praia olhou pra você. — A voz saiu mais dura do que queria. — E odiei como isso me fez sentir.
Elijah congelou. A colher quase escorregou de sua mão. Ficou vermelho num instante, tentando encontrar as palavras. — M-mas… ele só perguntou meu nome … eu não… eu nem respondi.
Edgar se aproximou de vez, segurando de leve a mão trêmula de Elijah antes que ele derramasse a panela inteira. — Eu sei. Você não fez nada. É comigo que está o problema.
Elijah engoliu em seco, ainda corado, e baixou a voz até quase um sussurro:
— Então… é… ciúme?
Edgar riu de leve, amargo. — É. E eu não sei lidar com isso.
O garoto ficou em silêncio, mordendo o lábio. Depois, com toda a coragem que conseguiu reunir, deixou a colher na borda da panela e se virou para abraçá-lo de leve, encolhido, escondendo o rosto no peito dele.
— Eu… não quero que você fique bravo comigo — murmurou, tímido, as palavras abafadas contra a camisa de Edgar.
Edgar suspirou e passou os braços fortes em volta dele, fechando os olhos. O cheiro do alho queimando os fez rir baixinho, quebrando a tensão.
O cheiro do alho queimado pairava no ar, mas nenhum dos dois se importava. Elijah, ainda escondido no peito de Edgar, estava quente como uma brasa acesa. Ele não sabia o que dizer — as palavras sempre pareciam pequenas perto do silêncio pesado de Edgar. Então só ficou ali, tímido, os braços finos enrolados em volta da cintura do homem.
Edgar o apertou um pouco mais, sentindo a respiração curta do rapaz contra sua camisa. O coração dele batia forte, e por mais que tentasse controlar, aquele contato simples parecia dissolver a raiva e o ciúme que o consumiam minutos antes.
— Eu não quero perder você — deixou escapar, a voz grave, baixa, quase um segredo.
Elijah se mexeu devagar, levantando o rosto com as bochechas vermelhas, os olhos azuis faiscando na luz fraca da cozinha. — P-perder? — repetiu, inocente. — Mas… eu tô aqui. Eu sou seu…
A simplicidade da frase atingiu Edgar como um soco. Ele prendeu a nuca de Elijah com a mão grande, firme, fazendo o garoto suspirar baixinho com o gesto. O contraste era sempre o mesmo: a força dele e a entrega dócil de Elijah, como se tivesse nascido para caber nos braços dele.
— Você fala assim e me desarma — murmurou Edgar, encostando a testa na do garoto.
Elijah sorriu de canto, sem jeito, os dedos brincando nervosos com a barra da própria camiseta.
Edgar riu baixo, um riso rouco que fez o garoto estremecer. — É isso que me mata em você.
O silêncio entre eles agora era diferente. Elijah mordia o lábio, sem saber onde colocar as mãos, até que Edgar o guiou suavemente, erguendo-o e o fazendo sentar no balcão da cozinha. O garoto soltou um suspiro surpreso, apoiando-se nos ombros dele, os olhos arregalados como se fosse a primeira vez que estivesse tão exposto.
— Ed… e o jantar? — tentou argumentar, a voz fina, corado até a raiz dos cabelos.
— Que se dane o jantar — respondeu Edgar, firme, os olhos escuros fixos nos dele. — Eu quero você.
Elijah engoliu em seco, o coração disparado, mas não desviou o olhar. Era tímido, era inocente… mas quando Edgar o tomava assim, todo seu mundo se resumia àquele homem.
E Edgar, enquanto o beijava com fome, sabia que por mais que o ciúme fosse novo e desconfortável, era só a prova cruel e doce de que Elijah já era essencial demais para ele.
O beijo continuou, lento, delicado, mas cheio de tensão e desejo contido. Elijah se encolhia nos braços de Edgar, tímido, corando com cada toque, mas permitindo que ele conduzisse a situação. A inocência do garoto contrastava com a intensidade do homem, tornando cada gesto carregado de significado.
De repente, um som baixo e inesperado interrompeu o momento: o estômago de Elijah roncou alto. Ele se afastou ligeiramente, envergonhado, os olhos azuis brilhando com uma mistura de vergonha e timidez.
— E-esse… — gaguejou, olhando para baixo. — Acho que meu estômago…
Edgar riu baixinho, um riso rouco que fez Elijah corar ainda mais. — Tá bom, tá bom… — disse ele, levantando Elijah nos braços com facilidade, como se pesasse nada. — Vamos resolver isso.