Bom, eu estava assustado com o que tinha acabado de acontecer. Eu sei, sou um cara durão, mas ser sequestrado e quase assassinado a sangue frio, me fez repensar mil vezes em tudo.
Pelo visto, eu teria que me entregar, não teria saída. Será que seria melhor eu me matar? .... Não, isso seria fraqueza... E se eu fugisse? ... Piorou, aquele cara que me ameaçou tinha pinta de não deixar nada barato, ele poderia até não ir atrás de mim, mas na certa, faria pior. Mataria minha família como punição.
Nossa... Imagina, como eu seria tratado ao "confessar" que matei um homem "indefeso". Sei que as leis do país são uma piada, mas, isso seria uma desonra para toda minha família. Bom, pelo menos, é melhor eles me verem preso, do que morto, certo?
Resumindo, de uma forma que não me cause dor por lembrar dos acontecimentos quando tive que falar para o meu pai o que eu iria fazer, e ele se desesperou, chorou e me amaldiçoou por trazer vergonha a família religiosa e correta que ele tinha.
Sabe, matar alguém por legítima defesa, é uma coisa. Agora, matar por "não ter o que fazer", é diferente... Sim, eu não falei da ameaça do tal sujeito para meu pai. Eu contei a versão mentirosa que eu teria que manter, para me proteger e proteger minha família. Contei que matei o cara porque estava entediado. Que merda. Que confusão me meti.
Bom, eu me entreguei. A polícia diferente da primeira vez que acreditou que eu tinha lutado como um herói, agora me via como um psicopatinha de merda, que tinha matado um noiado. E o que mais a mídia ama do que um jovem que matou um cara viciado por puro prazer? É, minha cara saiu em todos os lugares, eu fiquei conhecido como "O Mata Noiado". Apelido com um bom som sonoro, mas que me faria conhecer o pior pesadelo de um homem.
Cara, eu era visto como um monstro, sendo que o drogado que eu matei tinha históricos de crimes pesado. Então, só porque eu matei ele por matar e não porque ele me atacou, agora eu sou um monstro?
Aposto que aquele desgraçado que me ameaçou e me colocou nessa situação, esperava que tudo isso acontecesse.
Espero que o noiado e o pai dele que eram melhores amigos, estejam se comendo no inferno.
- É uma pena garoto, você é bonito. Tinha tudo pela frente. Poderia até ser ator, sei lá. - Falou o policial que me conduzia para a cela.
- É, eu poderia. Se esse país não fosse tão injusto.
- Acho que o que pesa mais, garoto, foi mentir para nós. Contou uma história fudida que fez você parecer um herói, agora tá com a cara estampada em tudo que é jornal.
O policial tava certo, eu "menti" para polícia. E agora, tava indo para cela. Sabe o que é mais doido. Quanto mais eu entrava, mais cheiro de cigarro eu sentia, na verdade, eu tinha a leve sensação desagradável de estar indo literalmente para o inferno.
- Aqui é sua cela, garoto. - Disse o guarda abrindo a cela.
Quando entrei, havia em torno de 15 homens. Me deu um frio na barriga, eles olhavam para mim, parecia que conseguiam ver dentro da minha alma. Aqueles caras, pareciam enxergar dentro de mim.
- Chega junto, garoto. Quero bater um papo firmeza contigo. - Eu olhei e avistei um homem, ele aparentava estar nos 40 anos, mas era muito charmoso. Tipo, alto, sarado, e com um pinta de homem mau, que faria qualquer um cagar nas calças.
Eu cheguei perto dele. Em nenhum momento ele desviou os olhos do meu olhar. Tragou o cigarro e soltou a fumaça pelo nariz.
- Como é teu nome? - Ele perguntou de um jeito mandão.
- Meu nome é Matias, senhor.
Ele riu com desprezo, se levantou e eu vi que ele tinha em torno de 1.95 de altura. Eu era menor, tinha apenas 1.75.
Do nada, ele fez algo que eu não esperava, deu um tapa na minha face que me fez cair no chão, meu rosto ardia. Eu não entendia o que tinha feito de errado.
- Tem certeza que esse é teu nome?! - Ele perguntou.
Eu naquele chão, me vendo impotente. Não consegui me controlar, me levantei bruscamente. Eu tentava manter o controle... Eu sabia que devia.
- SIM, ESSE É MEU NOME, PORRA. FOI O NOME QUE MEU PAI ME DEU. - Gritei bravo.
Ele me olhou surpreso e então... Riu alto. Dessa vez me deu um soco, tão forte, que fez meu nariz sangrar.
- Não entendi, moleque. Por que tá berrando, tá afim de perder os dentes?
Eu fiquei tão indignado. Olhei ao redor, e a maioria dos homens ria. Debochando da minha situação.
- Vou perguntar mais uma vez, fala teu nome. - Ele repetiu em um tom que me fez gelar.
Eu não sabia o que dizer. Meu nome era Matias, eu não tinha outro. O que ele queria? Que eu inventasse um? Qual é? Isso é serio?
De repente, entrou um homem negro, sarado, com sorriso bem branco, brincos nas orelhas, e do lado dele tinha dois rapazes abraçados, como se fosse namorados. Eu estranhei aquilo de cara. Não esperava ver... Na verdade, eu não tava esperando nada do que tava acontecendo.
- Ele quer o nome que você recebeu, garoto. O nome batizado pela mídia. - Disse o negão sorrindo debochado.
Então, aí, eu me levantei, devagar, olhei para o homem a minha frente e disse.
- Me chamo, mata noiado, senhor.
Ele deu um riso de aprovação.
- Boa, garoto. Tá aprendendo. O Dog ali, vai te mostrar onde você pode dormir. - Ele bateu no meu ombro e passou gentilmente e naturalmente. Foi até o homem negão e cumprimentou ele, e logo em seguida, beijou um dos rapazes que estava do lado do negão.
Eu fiquei imóvel com aquela cena. Era coisa de louco. Primeiro eu apanhava dele, depois, ele simplesmente andava gentilmente e beijava um cara do nada. Tipo, que porra tava acontecendo ali? Onde eu havia me metido?
- EI, EI, Mata noiado, to falando contigo. - Falou um homem de cabelo preto estiloso e brinco de argola. - Chega aqui, vou te mostrar onde você pode dormir.
- Aí, o que tá acontecendo? Por que ele beijou aquele cara? - Perguntei para o sujeito.
- Ih, mano. Bem vindo a nossa prisão, isso é comum. Os chefões são cheios desses caras. Eles meio que são, namorados deles. Pior que esses caras que se sujeitam isso, ganham tudo do bom e do melhor aqui na cadeia. Só não me torno um deles porque com certeza não vou aguentar pica na bunda.
- Sério?!
- É, serião, mas relaxa. Eles não vão obrigar você. No máximo. Não é assim aqui. Você vai porque quer.
- Como assim?
- Aqui quem manda, são caras como o Dragão, o cara que te interrogou e o braço direito dele, o Digão. Eles podem tudo e muito mais. Na verdade, mano, nem sei de onde brota tanto dinheiro. Esses caras podem tudo. Na verdade, a cadeia são deles. E quando você quer alguma coisa, muito mesmo. Eles te dão, mas você tem que dar algo em troca entende?
Que doido. Onde eu me meti? Quem são essas pessoas?
Eu mal tive tempo de assimilar aquilo tudo. Cada palavra do Dog parecia entrar na minha mente como um aviso, mas também como uma provocação. Ele ria, debochado, como se quisesse ver até onde eu aguentaria antes de surtar.
Fui andando atrás dele pelo corredor apertado das celas, onde alguns caras me encaravam com fome nos olhos, outros com desprezo. Cada passo ecoava como um martelo dentro do meu peito. Eu sentia que estava atravessando um território que não era meu — e, pior, não sabia se algum dia seria.
- É aqui, moleque. – Disse Dog, apontando para uma beliche enferrujada, no canto mais escuro da cela. – Vai dividir com o Marreta. Ele não ronca, mas se mexe muito. Só não encosta nele que tá tranquilo.
Olhei para cima e vi um cara enorme, tatuado até o pescoço, deitado sem camisa, só de bermuda. Ele abriu os olhos devagar, me encarou sem piscar e voltou a fechar, como se estivesse avaliando se valia a pena me dar atenção.
Sentei no colchão duro, fedendo a suor e mofo. O clima ali era sufocante. A cada segundo, eu sentia como se estivesse sendo testado.
De repente, ouvi uma voz grossa ecoar no meio da cela:
- Ô, Mata Noiado!
Era o Dragão de novo. Ele tragava o cigarro, rodeado por uns quatro homens que pareciam seus guardas pessoais.
- Quero você aqui na minha mesa no almoço amanhã. – Disse ele, firme, sem rodeios. – Vai sentar do meu lado.
Um silêncio tomou conta da cela. Alguns caras se entreolharam, outros balançaram a cabeça, como se soubessem que aquilo tinha mais significado do que parecia.
Dog me cutucou e cochichou:
- Tá vendo, moleque? Tu chamou a atenção do chefe. Isso pode ser bom... ou pode ser tua sentença de morte. Depende de como tu joga o jogo.
Eu engoli seco. O coração disparado.
Será que aquele tapa, aquele soco e aquela humilhação eram só a forma dele “me testar”? Ou será que eu tinha acabado de ser marcado como o brinquedo novo do Dragão?
Tudo o que eu sabia é que, a partir dali, cada escolha minha seria questão de vida ou morte.