Senti que alguém me seguia e, pela primeira vez, temi pela minha vida. Só que, dessa vez, o destino parecia estar do meu lado. Encontrei uma patrulha numa esquina próxima e pedi ajuda. Eles se apiedaram de mim e me levaram até o apartamento da tia Valdete. Cheguei quase ao amanhecer, sozinha. Ela já estava acordada, sentada à mesa da cozinha, o rádio desligado, os olhos, então fixos numa xícara de chá, se voltaram para mim:
- Emilinha!? Por que... Cadê o Léo? - Perguntou, a voz cheia de preocupação.
Eu não respondi. Apenas me joguei em seus braços e chorei, chorei como não chorava desde que era criança pequena em Passa-Vinte. E, naquele choro, havia um pouco de alívio, um pouco de esperança. Talvez eu ainda pudesse encontrar algo da Emilinha do passado que pudesse ser salvo. Talvez, apesar de tudo, eu pudesse ser mais do que a sombra de Leonardo.
[CONTINUANDO]
Ó quão fugaz é a segurança que o coração, em sua tremedeira, acha que encontra! Fazia tempo que eu não me sentia de fato abrigada, até que, num instante de quentura, achei isso nos braços da tia Valdete, essa alma boa, já tão atribulada com suas próprias questões. Ela, com os braços magrinhos, branquinhos e tremelicando, me acolheu, como mais uma carga nas próprias costas. Eu, mesmo desaguando em lágrimas, me achava uma boba por botar mais peso em cima dela. Depois de chorar um tanto, me ajeitei, porque de que adiantava jogar mais desgraça na tia?
- Que se sucede, minha filha? Cadê o Leonardo que não veio contigo? - Perguntou ela, com aquela voz mansinha, fraca, quase cochichando, enquanto fazia um cafuné gostoso nos meus cabelos.
- Ele... ficou lá com uns amigo, tia. Lá no Eclipse... - Respondi, engasgando um tiquinho, trazendo só metade daquela nefasta verdade.
- Sei... Só isso mesmo, é? - Insistiu ela, com aquele mesmo jeitinho de mamãe de quem enxerga até o fundo da alma.
Sim, eu podia ali ter aberto o jogo todo: as juras de amor, as promessa de uma vida diferente que viraram fumaça; as mudança que não vingaram; até a fogueira dos sentidos na qual fui jogada sem o menor cuidado. Mas pra quê? Isso só ia amofinar ela ainda mais, talvez até apressasse a doença que já a comia viva. Resolvi calar a boca e com uma coragem que nem sabia que tinha, pensei que era hora de tomar um rumo na vida, com a ajuda da tia, é verdade, mas não com a verdade nua e crua. Apenas com carinho, proximidade e devoção:
- É sim, tia. Tô com saudade de mamãe e papai, acho... - Falei, com um suspiro que disfarçava o que eu sentia de verdade.
- Uai! Mas isso é fácil de resolver, menina! Liga pra eles! - Retrucou ela, com aquele jeito simples que só ela tem.
- É... vô ligá, sim... mais tarde. - Murmurei, enquanto meu coração, todo dividido, já se preparava para outras brigas.
Leonardo não deu as cara nesse dia. Quer dizer, deu, sim, lá pelo fim da tarde, mas com uma cara esquisita: meio cabisbaixo, meio envergonhado, meio assustado, e muito, mas muito mesmo, fingido. Algo não me cheirava bem. Eu, lavando a louça da janta, sentia um vazio no peito, como se alguma coisa dentro de mim tivesse quebrado de vez:
- Emilinha... eu queria... - Começou ele, meio sem jeito.
- Não! Não quer, não! - Cortei, com uma firmeza que até eu estranhei, vendo ele ficar de boca aberta, como quem não esperava o troco: - Tô ocupada, Leonardo. Tenho um montão de coisa pra fazer e não posso te dar atenção agora. Me desculpe.
- Eu só queria... te chamar pra tomar um sorvete. - Insistiu, com um tom que tentava ser levinho.
- Gradecida, mas não. Tô... com dor de garganta. É. É isso! - Menti, com uma cara lavada que nem eu acreditei.
Ele foi até o batente da porta e assuntou na sala, no corredor dos quartos, no banheiro, como quem teme ser pego, e voltou, chegando pertinho, pertinho de mim. Então cochichou no meu ouvido:
- Eu queria... conversar sobre tudo que rolou ontem.
- Não rolou nada! E foi porque eu não quis, né? Porque se dependesse do’cê... - Retruquei, com um tom que misturava raiva e pouco caso: - Esquece. Isso já passou.
- Mas tu tá brava comigo. Tô vendo... - insistiu ele, com cara de quem sabe que pisou na bola.
- Não tô... - Botei força na fala: - Tá, ainda tô, e muito! Sabe, Leonardo, acho que o melhor é me dedicar ao curso que eu faço e seguir ajudando tua mãe. Afinal, foi pra isso que vim, não foi?
- É. Foi... - Resmungou ele, contrariado, mas sem coragem de me peitar: - Mas... e a gente? Como é que fica?
- A gente quem? Ocê e eu? Ou eu, ocê, o Fernando e sei lá mais quantos? - Joguei na cara, com uma ousadia que até me fez crescer.
Ele deu um passo pra trás, os olhos arregalados e uma expressão que beirava a... dor. Parecia que eu tinha dado um chute em suas partes baixas. Aliás, eu, cheia de uma força que nunca senti antes, enxuguei as mãos no pano de prato, o encarei e apontei o dedo bem na cara dele:
- Pensei que era só nóis dois, Leonardo, mas não foi, né? Me entreguei pro’cê, mesmo sem querer de verdade, porque nunca imaginei virar mulher à força, numa cama do teu quarto, daquele jeito, mas... - Parei, segurando o choro, uma decepção que ardia: - Enfim, não foi como eu sonhei. Não tá sendo como imaginei namorar um moço da cidade grande. Só... não deu certo, Leonardo. Ocê me desculpa, mas... Sinceramente? Acho que meu lugar não é aqui.
Ele me olhava, mudo, o corpo duro, como se minhas palavras fossem mamonas arremessadas por um estilingue de tripa de mico. Baixou a cabeça, num gesto que parecia lamento, mas logo me encarou de novo, um olhar decidido, quase assustador, e veio pra cima de mim, me prensando na pia. Tentei empurrá-lo, mas ele segurou meus braços com uma mão e meus cabelos com a outra, me olhando com fogo nos olhos:
- Tu é minha, tá entendendo? Talvez eu tenha exagerado, mas te amo e não vou te perder por nada, pra ninguém.
A voz dele, quase mandona, tinha um quê que, confesso, mexia comigo. Tentou me beijar, mas virei a cara. Não adiantou, porque ele puxou meus cabelos com mais força e forçou um beijo que, por fraqueza minha, deixei acontecer:
- Aquilo... com eles... nunca mais vai acontecer. Prometo! Mas quero uma nova chance de te reconquistar. Eu preciso. Eu exijo, Emilinha.
- Me prendendo assim!? - Retruquei, mostrando que estava sem poder reagir: - Acha que é assim que se conquista alguém, Leonardo?
Ele entendeu de imediato e me soltou, pedindo perdão com as mãos juntas, como se rezasse:
- Por favor... só me dá uma chance?
Hesitei, mas, por fraqueza de gente que perdoa, afinal, errar é humano, não é? Topei, com condições:
- Vai ser um namoro direito, de gente decente. Vamo namorar aqui, na casa da tia Valdete, com respeito e carinho, como sempre devia ter sido desde sempre.
- Mas... não vamos sair mais? Passear, tomar sorvete, ir no cinema? Fazer coisas de casal, sabe? - Perguntou, meio suplicando.
- Vamo, sim. Mas devagar, tá? Sem exagero, sem Eclipse e sem casa do Fernando, pra sempre. Entendeu, Leonardo?
- Nossa! Leonardo... - Resmungou, com um meio sorriso: - Deve tá brava mesmo, nem de Léo me chama mais...
- Não começa! - Falei, cruzando os braços e novamente frisei: - Tamo entendido, Le-o-nar-do?
- Estamos sim, dona Emília. - Respondeu, com um sorriso de quem queria acalmar: - Posso, ao menos, te dar um abraço? Pra saber que vai ficar tudo bem...
Aceitei, afinal, era só um abraço. Mas não foi, pois logo ele me beijou e eu, tola como sempre, dona de um coração inquieto, aceitei.
Ainda naquela noite, liguei pra venda do seu Zé Formoso, pedindo pra chamar mamãe e papai que eu ligaria em meia hora. Falei com os dois, e embora não fossem eles o motivo do meu choro, a saudade apertou demais, quase me fazendo querer voltar pra Passa-Vinte. Quase...
Os dias que se sucederam foram de uma calmaria danada de boa. Mas nem tanto... Tia Valdete piorou e precisou ficar internada às pressas. Fiquei do lado dela todos esses dias, acompanhando, cuidando, e aqueles dias, entre estudo de manhã, arrumação da casa à tarde quando sabia que Leonardo não estaria e noitada no hospital, me deram uma paz que eu soube aproveitar bem. Apesar dos pesares, foram dias muito tranquilos para mim.
Passados 15 dias, tia Valdete teve alta e voltou para sua casa. Mamãe, avisada por mim do estado da tia, veio para a capital, e aí foi um alívio danado. Sua presença garantiu ainda mais calmaria em meus dias, porque Leonardo, sabendo que ela estava de olho, não se achegava, e eu, esperta, não largava dela por nada.
Já estávamos quase vinte dias sem namorar, e ele, aposto, estava subindo pelas parede igual calango atrás de mosquito. Eu, pra ser sincera, também já estava sentindo a falta de uma certa coisa. E foi nesse aperto que, num fim de tarde, num passeio pra tomar sorvete, a gente se enroscou de novo, no seu jipe brilhoso, numa pracinha escura da capital. Ele todo sem jeito, me pediu um carinho mais chegado. Cedi, pensando numa coisa simples, só uma punhetinha, mas o desejo, esse traiçoeiro companheiro, deixou tudo algo mais quente:
- Isso, minha putinha... Sabia que tu também estava com saudade. - Disse ele, com uma ousadia que me envergonhava e, ao mesmo tempo, atiçava: - Chupa, vai! Faz teu macho gozar nessa boquinha, faz!?
Eu, tomada por uma saudade que não admitia, segui, enquanto ele, com palavras maledicentes, me forçava a confessar sem dizer uma única, tudo o que eu sentia:
Continuei lambendo, beijando, sugando, fazendo-o gemer como um pé na cova:
- Tu tá cada vez melhor, Emilinha! Porra, que boquinha gostosa...
- É?
- É!? Ô, se é... - Ele forçou minha cabeça, fazendo-me engolir todo o seu pau, mas depois me puxou pelos cabelos, fazendo-me encará-lo: - Tu gosta, né, sua safada? Gosta de chupar o meu pau, não gosta?
Querer dar o braço a torcer, eu não queria, mas a verdade é que eu gostava sim, muito. Sem minha resposta, ele ficou cabreiro e me deu um leve tapa na bochecha, fazendo-me arregalar os olhos:
- Fala tu pra mim, minha putinha. Gosta de chupar o meu pau, hein? Gosta?
Ele esfregava o falo em meu rosto, enquanto eu, toda abobada, tentava abocanhá-lo igual uma traíra atrás da isca viva:
- Responde, piranha! Tu gosta ou não?
- Adoro! - Respondi, enfim, um sorriso malicioso, vindo não sei donde, surgindo em meus lábios.
- Então, chupa, cadela. Chupa até eu gozar e bebe tudo. Se deixar vazar uma gotinha, te dou uma surra nessa bunda gostosa. Tá me entendendo?
Segui dando o meu melhor com mãos e boca. Leonardo estava tão necessitado que não demorou muito a gozar, e foi muito, muito mais que da primeira vez, mas tanta mesmo que não consegui engolir tudo. Estranho não foi isso, mas eu o lambendo todo depois para limpá-lo como se fosse uma gata a seu filhote.
Minha mãe já estava em casa de tia Valdete havia 15 dias quando, numa conversa, um assunto sem importância ganhou vida e forma à mesa:
- Sabia que Paulinho virou administrador nas fazendas do Seu Barnabé, filha? Parece que ele encontrou o caminho.
- Conheço nenhum Barnabé, mamãe... - Resmunguei.
- Ara! Como não? Ele é padrinho de batismo da Rosa, mãe de Paulinho, e um dos maiores fazendeiros lá do Goiás. Ouvi dizer de Dona Mariquinha que se colocassem todas as fazendas dele lado a lado, somadas, teriam o tamanho do nariz de Minas.
- É nada! - Falei, surpresa.
- É sim! Tô dizendo... Dizem mais: lá, Paulinho é tratado com reverência e respeito por homens, mulheres, até por doutores das leis e pelos homens da igreja. Falou que o chamam de “Coronelzinho”, em referência ao velho Barnabé.
- Coronelzinho, é!? - Resmungou, Leonardo.
Aliás, só aí me lembrei que à mesa também estavam tia Valdete e Leonardo, e ele, mesmo sendo o meu atual namorado, não se parecia nem um pouco incomodado em ouvir o nome de Paulinho. Ao contrário, pareceu-me muito interessado até:
- Mas... que bom que Paulinho se acertou na vida, não é? Gosto muito dele... - Resmungou novamente, Leonardo, chamando a atenção de todas.
- Gosta de Paulinho?... - Repeti, incrédula.
- Uai! Por que a surpresa? Gosto, sô! Ele é boa pessoa e nunca lhe quis mal algum.
Sua entonação era puro veneno e foi impossível não notar que tanto mamãe como tia Valdete o encaravam com olhares de julgamento, talvez sabendo que aquilo não passava da mais deslavada mentira:
- Mas... e esse tal Barnabé? É Barnabé do que mesmo?
Minha mãe pensou um pouco e respondeu:
- Se não me falha a memória, é Barnabé Bustei... Bustamante! Barnabé Bustamante...
- Ah... - Resmungou, Leonardo, dando um meio sorriso escondido por um copo de suco.
Não sei o que foi aquilo, mas aquele sorriso dizia muito mais do que uma Bíblia inteira de más intenções. Gelei. Temia não mais por mim, mas por Paulinho agora.
Dias em paz novamente se sucederam, mais 15 para ser exata. Então, mamãe teve que voltar para casa, pois papai teve um mal súbito, uma queda de pressão, e precisou ser internado. Quis ir com ela, mas a condição de tia Valdete não me autorizava desampara-la. Acabei ficando com promessas de mamãe me ligar assim que lá chegasse. Ela cumpriu o prometido e me tranquilizou, pois a situação de papai realmente não era tão grave, embora inspirasse alguns cuidados.
Por aqui, a situação de tia Valdete piorava cada vez mais, mas eu decidi fazer algo que não sei se foi certo até hoje: menti para mamãe, dizendo que ela também estava melhorando. Tia Valdete foi minha cúmplice. Dizia que não adiantava mamãe voltar para a capital e deixar papai desamparado em Passa-Vinte.
Uma semana depois da partida de mamãe, Leonardo, com um semblante carregado, preocupado, me chamou para uma conversa sigilosa assim que tia Valdete se recolheu para seu quarto:
- Que cara é essa, Léo? O que tá acontecendo?
- Emilinha, eu... - Ele pigarreou, desviando seu olhar, um misto de dor e decepção estampado em seu rosto: - Não sei como te dizer isso, mas... preciso da sua ajuda.
- Ajuda!? Com o quê?
- Fernando, ele... aprontou uma feia comigo, e agora seu nome está correndo o risco de cair na boca do povo.
- Como é que é!?
- O Fernando... Ele filmou algumas daquelas nossas “brincadeiras”. - Ele disse, fazendo aspas com os dedos: - E mostrou para alguns outros amigos. Pior: não apenas mostrou, como deu cópias para eles. Agora todos estão querendo se divertir também com você, ou irão espalhar por Beagá toda...
Eu devo ter tido uma síncope, porque me deu um branco e apaguei. Quando voltei a mim, ele estava me chamando e abanando, com uma legítima cara de preocupação:
- Cê tá brincando? - Resmunguei.
- Pior que não.
- Mas... Mas... E agora?
- Agora... só tem um jeito.
- Que jeito?
- Uai! Você faz uma brincadeira com eles, cobrando que eles deem fim na tal filmagem.
- Cê tá louco, Leonardo!? QUE PALHAÇADA É ESSA?
- Shhhhhh! Fala baixo. Vai acordar minha mãe, Emilinha.
Comecei a andar de um lado para o outro na sala, um calafrio me percorrendo todo o corpo enquanto eu tentava raciocinar, entender como eu havia chegado naquele ponto. Leonardo acompanhava minha caminhada com o olhar, em silêncio, com a maior cara de culpado:
- Eu... não sei. Preciso pensar. Não é possível que não tenha outra saída.
- Eu já pensei em tudo. Infelizmente, não tem.
Fui dormir altas horas nessa noite e... Minto! Não dormi nadica de nada. No dia seguinte, eu era a imagem da desilusão, comigo e com o próprio Leonardo. Olheiras escuras e profundas simbolizavam tudo de ruim que eu havia feito em minha vida comigo mesmo, e essa era uma culpa minha, de mais ninguém. No café, tia Valdete tentou que eu me abrisse e quase fiz isso, para desespero de Leonardo, que numa saída de mestre disse que a televisão estava fazendo uns barulhos estranhos, tirando-a da cozinha. Ele voltou correndo e praticamente se ajoelhou aos meus pés:
- Pelo amor de Deus, Emilinha, se minha mãe sabe de uma coisa dessas, eu temo que se vá de vez. Não faça isso com ela. Tenha piedade, por favor...
Acabei me calando, outra vez... E sem ver saída, aceitei que ele marcasse um encontro com seus amigos para negociarmos a última vez que eu participaria dessas “festinhas”.
Na sexta-feira seguinte, fomos até a Eclipse, aquele lugar que agora simbolizava o antro de perdição que minha vida havia se tornado. O local era totalmente impróprio para o que eu queria: clareza e objetividade. Mas foi ali que combinamos as condições da festinha: eu me entregaria a eles e eles destruiriam o filme na minha frente, enquanto tudo acontecia. Foi ali também que eu tive noção do que me esperava, ou seja, simplesmente todos os “amigos” mais próximos de Leonardo participariam: Fernando, Gustavo e Felipe, também o Toninho e Carlão, aquele que me causava pânico. Eu tentei combinar para o dia seguinte, mas eles disseram que seria naquela noite, ou eu podia esperar pela voz do povo já no dia seguinte.
Por meia hora tentei convencê-los, por mais meia hora eles recusaram, usando-me para se esfregarem enquanto dançavam, apresentando as mais variadas desculpas esfarrapadas. Aceitei meu destino e fomos dali diretamente para a casa de Fernando. Estávamos em 5: Eu, Leonardo, Fernando, Gustavo e Felipe. Não era bom, mas seria menos pior, pois ao menos não teria que encontrar o Toninho ou mesmo aquele tinhoso do Carlão, porque deste eu tinha medo.
Eles tentaram me relaxar, oferecendo uma prosa aparentemente boa e bebida de montão. Mas relaxar como? Eu era uma novilha prestes a ser esfolada viva. Então, a maldita fumacinha começou a inundar o ambiente, trazida por Fernando. Bocas se revezavam e eu, mesmo não tragando, acabei ficando meio “aérea” no meio daquele fumacê todo. Quando eu já imaginava que não passaríamos daquele encontro entre amigos, Carlão chegou, trazendo mais dois que eu nunca havia visto, extremamente grandes, fortes e mal encarados. Minha sentença de perpétua parecia estar se transformando em pena de morte:
- Trouxe uns camaradas, rapazes. Mas fiquem tranquilos, são todos firmeza.
Eles se apresentaram: Joãozinho Marreta e Vicente Meia Noite, negros, pretos mesmo, ambos filhos de um mal que parecia predizer minha ruína:
- Então... Essa é a biscate da noite? - Perguntou o Joãozinho, que de “zinho” não tinha nada.
- Respeita a minha namorada, maluco! - Gritou o Léo, surpreendendo a todos: - Ela só está aqui para resolvermos uma parada, mas será tratada com o máximo de respeito. Estão entendendo?
Carlão e os dois se entreolharam e eles ao Leonardo, todos surpresos. Eles então encararam o Fernando que se aproximou do Carlão e cochichou algo, colhendo uma concordância em forma de meneio de cabeça. Carlão então conversou com os dois amigos rapidamente e pareceram entrar num acordo. Depois disso, os dois e o Carlão foram para cima do Leonardo. Comecei a gritar, mas o Fernando me segurou e tapou a minha boca:
- Para de escândalo! Estamos fazendo isso para o Leonardo não se machucar. Relaxa.
- SOLTA ELE, SEUS MONSTROS! - Gritei, mas fui ignorada.
Pior! Enquanto os dois colocavam o Leonardo sentado à força numa cadeira, o tal Carlão veio na minha direção e esfregou uma arma no meu rosto:
- Melhor tu ficar calminha aí, sua vadia, senão pode sobrar coisa ruim para tu e o teu namoradinho. Quer ser responsável por algo que aconteça a ele?
Calei-me, claro. O Carlão voltou para junto dos dois e passou a amarrar o Leonardo na cadeira com o que me pareceram fios, não sei ao certo. Olhei para o Fernando em pânico:
- Por favor, deixa a gente ir embora?
- Agora não dá mais, Emilinha. Se eu te liberar, o Carlão se estranha comigo. Só cumpre o combinado que ele deixa todo mundo sair inteiro daqui.
Ali, naquele momento, ficou nítido que quem dava as ordens era o tal do Carlão. Assim que ele se certificou que o Leonardo não podia mais se mover, esfregou também a arma na cara dele e cochichou algo que eu não consegui entender, mas provavelmente os mesmos impropérios que me proferiu:
- Agora é que a festa vai ficar boa. - Falou o Carlão pouco depois, jogando uma bolsinha sobre uma mesinha: - Tem te tudo aí, galera: talco, baseado, maconha, até heroína eu trouxe. Tudo por conta do papai aqui. É só aproveitar.
Então ele se aproximou de mim e me pegou pelo queixo, com um gesto firme, mas não rude, de certa forma até carinhosa:
- E tu, princesa, quer o quê?
- Quero ir embora.
- Ihhhh... Isso vai dar não. Pelo menos, não agora. Mas fica tranquila, agora tu tá sob a proteção do Carlão e não vou deixar nada de ruim acontecer contigo.
Eu a encarei confusa, porque tudo o que estava prometido me acontecer, era ruim por demais. Acho que ele entendeu o meu semblante e disparou:
- Naturalmente, tu tem que fazer a tua parte. Cumpra o combinado e te garanto paz e tranquilidade, e até algumas mordomias. Palavra de Carlão da Serra!
O Fernando me soltou e ali eu me vi totalmente desprotegida, vulnerável, sem possibilidade de me socorrer sequer no Leonardo que apenas me observava, em silêncio. Carlão novamente se adiantou:
- Quem coloca uma música? Vamos ver a nossa princesa fazer um strip pra galera. Tu sabe o que é strip-tease, não sabe?
Eu já sabia sim, até já havia feito um bem desengonçado para o Leonardo num motel. Mas ali, para eles, eu não me sentia pronta para nada. Uma música começou a tocar, mas meu corpo seguia duro, teso, sem balanço algum:
- Nandão, enrola um sedoso pra ela, cara! - Mandou o Carlão.
Fernando fez um cigarrinho e ateou fogo, trazendo para mim:
- Dá um tapinha forte, Emilinha. Vai te ajudar a enfrentar a noite.
Peguei o cigarrinho, mas não consegui fazer nada mais do que chorar. O Carlão me abraçou pegou o cigarrinho e deu uma tragada profunda. Depois, me encarou e beijou a boca, soprando a fumaça. Apesar de imaginar que ele iria fazer isso, não me preparei e tossi pra caramba! Depois, ele enfiou o cigarrinho na minha boca e mandou que eu tragasse. Fiz, a primeira vez, rasa, mas a segunda bem profunda. Ele se afastou e o máximo que consegui fazer foi começar a balançar para os lados como um “João Bobo”. Ele começou a se desagradar:
- Vai, princesa! Tira a roupa.
Eu não conseguia. Não havia clima. Nem mesmo o cigarrinho estava conseguindo me aliviar e as lágrimas não paravam de cair. A voz de Carlão ecoou novamente:
- Marreta, Meia Noite! Ajudem a moça... - Comandou Carlão.
Então aqueles dois monstros vieram na minha direção enquanto eu me afastava até encostar numa parede. Eles me puxaram para o meio da sala e vendo que eu me recusava, rasgaram o meu vestido, deixando-me apenas de calcinha. Essa o próprio Carlão fez questão de tirar, puxando-a até os meus pés enquanto eu tentava me debater entre aqueles dois, sem sucesso algum:
- Cara... Tá peludinha demais. Um neném como tu devia ter se raspado pra gente. - Resmungou o Carlão: - Tem um gilete aí, Nandão? Busca uma lá pra mim, maluco, e traz gel de barbear também.
- O quê!? Não! Não precisa...
- Cê tá muito rebelde, princesa. Acho melhor preparar um negócio mais forte pra tu. - Disse o Carlão indo até a sua bolsinha, já aberta e exposta sobre a mesa.
Ali, enquanto os dois ainda me seguravam, não conseguia ver direito o que ele fazia, mas não demorou muito para o Fernando retornar com o pedido do Carlão que disse:
- Deixa aí. Vou dar um sossega na vadia.
Eu tentava me soltar, mas não conseguia. Um dos negões, aproveitava para amassar a minha bunda com uma mão imensa, enquanto o outro me dava leves beliscões no mamilo. Logo, o Carlão voltou com uma seringa:
- Agora se acalma, princesa. Vai ser só uma picadinha e tudo vai ficar tranquilo.
- NÃO! NÃO! NÃÃÃÃO! - Gritei em vão, enquanto sentia a agulha me queimar a pele.
Eu não conseguia sequer respirar direito com aqueles monstros me segurando. Quando o Carlão terminou, olhou para mim sorrindo, mas logo comecei a ficar mole, com a visão turva, uma sensação de leveza, de moleza. Enfim, acho que apaguei, porque não me lembro do que aconteceu por um tempão.
Acordei, ou comecei a despertar sentido solavancos no meu corpo. Comecei a piscar e tentar a focar no que estava acontecendo, mas não foi fácil. Mas tive alguns lampejos, do Fernando enfiando o pau na minha boca, ou o Gustavo, não sei. Parece que me lembro do Carlão com meus pés no seu ombro e me comendo atrás. Até o Leonardo tive a impressão de ter visto me comendo, mas não era possível, afinal, ele estava amarrado. Apaguei novamente. Depois de não sei quanto tempo, senti que estavam me sufocando, um peso absurdo que não me deixava respirar direito. Abri os olhos e vi que estava deitada sobre um daqueles negros monstruosos, com o pau dele na minha xereca, enquanto o outro me comia o cu, com uma violência absurda. Parecia que eu havia trabalhado num cafezal, debaixo de um sol escaldante por um dia inteiro. Meu corpo estava todo dolorido. A minha xereca e o meu cu queimavam enquanto eles seguiam me fodendo. Comecei a chorar:
- Chega! Por favor...
- Cala a boca, piranha! Tô quase gozando. Não me atrapalha! - Disse o negão que me violava por trás.
Ainda foram bons minutos e muitos solavancos até ele urrar como um urso, despejando seu leite dentro de mim. Eu sentia os espasmos do pau do que estava na minha buceta, porque o de trás eu já não sentia nada. Olhei de lado e vi que praticamente todos estavam nus ou só de cueca, mas todos insensíveis ao que me faziam. Os dois me deixaram jogada ali sobre um colchão fino e fétido, e se afastaram. Permaneci deitada, morta por fora, a alma dilacerada por dentro. Procurei olhar para o Leonardo e vi sua cadeira vazia. Temi por ele e comecei a procurá-lo, encontrando-o nu sentando ao lado do Carlão, fumando um cigarro. Aliás, foi o Carlão que indicou para ele que eu já estava acordada, fazendo ele vir até onde eu estava:
- Cê... não tava... preso? - Perguntei.
- Já me entendi com o Carlão. Ele me soltou e eu brinquei rapidinho com você. Só para não ficar feio com os irmão, entende?
- Me leva embora? - Pedi.
- Que jeito!? Tu precisa descansar, tomar um banho, se ajeitar. Se tu chega assim em casa, mamãe morre e me mata depois. - Disse e sorriu: - Mas pode ficar calma. O Fernando já arrumou um quarto pra tu. Ninguém mais vai te incomodar. Amanhã tu toma um banho e a gente vai. Tudo bem?
Eu não tinha forças para nada, nem mesmo para recusar aquela proposta. Ele me levou para o tal quarto e me ajudou a deitar, e ali dormi, profundamente, consternada e esgotada.
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