17 de Março (Segunda Feira)
11:00 AM
Sempre pensei que boa noite cinderela era um remédio mesmo, mas o médico me explicou que na verdade se trata de um conjunto de remédios, tipo eles podem ser feitos com medicamentos para ansiedade, depressão, em alguns casos até com medicamentos de uso veterinário. Mano isso é muito louco, tipo sempre bebi com a galera e nunca imaginei que algo assim pudesse acontecer comigo.
Só no hospital foi que fui entender o que me aconteceu, no caso eles não têm cem por cento de certeza do que eu de fato ingeri, mas é certo que fui drogado pelo que chamam de boa noite cinderela — nome muito escroto para uma droga, mas tudo bem — basicamente meu corpo sofreu uma reação alérgica a alguma coisa que tinha na droga que me deram e eu tive sorte por não ter ido dessa pra melhor. Na verdade tive sorte duas vezes, pois meu corpo resistiu até que eu tivesse em “segurança” se eu tivesse apagado na praia temo acreditar que além de passar mal pelo remédio possivelmente eu teria sido abusado também.
Eu tenho certeza que foi o Nicolas quem me drogou, mas não tenho provas para isso, isso é muito frustrante. Rick foi meu salvador, eu certamente não teria voltado para o médico se ele não tivesse aparecido nem quero pensar no que poderia ter acontecido comigo, Dan iria me matar com certeza, ele me ressusitaria só para me matar depois. Por falar no meu namorado ele ficou tão preocupado que até agradeceu ao Rick por ter ido me socorrer.
Eu falei para o Rick que já estava bem, mas o médico que me atendeu falou que tenho mais uns exames pra fazer — vou precisar marcar, ainda bem que tenho plano de saúde, obrigado vovô! — Por causa da minha condição, meu melhor amigo resolveu que vai ficar comigo, pelo menos por mais uns dias. Bem meu amigo e meu namorado não foram os únicos a ficarem preocupados comigo, Claudia quase ficou louca quando soube e agora está aqui arrumando meu apartamento e fazendo um almoço com minha comida favorita para mim, acho que nunca fui tão paparicado.
— Ciço, tá na hora do seu remédio — Rick me entrega o comprimido e um copo com água.
— Nossa, eu vou ficar muito mal acostumado com dois enfermeiros — digo rindo.
— Cicinho era para você estar na casa dos seus pais — Claudia quer por que quer que eu volte para cuidar de mim, agradeço, mas quero ficar na minha casa.
— Ele é um menino muito birrento Claudia — Rick diz sabendo que não vou querer ir para casa dos meus pais.
— Sério, gente, eu posso ficar só, o médico disse que o pior já passou.
— É e ele também disse que você tem que ficar uma semana de molho — Nunca vi o Rick tão autoritário, tá parecendo até o meu namorado.
Depois do almoço Claudia tem que voltar para casa dos meus pais então pedi ao Rick que a levasse ela. Ainda estou sem celular — de novo para variar — é foda, então pego o computador para ver minhas mensagens e também para falar com Dan, ele ainda está muito preocupado e querendo largar tudo lá para vir cuidar de mim. Eu ligo para ele para tranquilizá-lo quem sabe se ele falar comigo ele pode ficar mais de boas vendo que estou melhor.
— Oi amor — digo quando o rosto dele aparece na tela do meu computador.
— Oi amor, como você está, seus olhos estão fundos.
— Calma, estou bem, só é efeito colateral do remédio — digo.
— Que susto você me deu Ciço puta merda cara — Dan está variando entre a raiva e a preocupação comigo.
— Desculpa amor.
— Sempre te falei para tomar cuidado com essas coisas — ele meio que fazia essa parte de vigiar meu copo, talvez eu tenha que começar a aprender a vigiar meu próprio copo nas festas daqui para frente.
— Isso nunca aconteceu antes amor.
— Eu sei Ciço, mas não quer dizer que não vá acontecer, não quero nem pensar no que que teria acontecido se você estivesse sozinho nessa festa!
— Tô bem amor, vamos só esquecer isso por favor?
— Esquecer é uma pinoia Ciço, a gente tem que denunciar esse filho da puta!
— O Mauro ficou de passar aqui mais tarde, ele vai me explicar como tem que ser feito, eu já fiz o B.O. no hospital, parece que quando eles descobrem que a pessoa foi drogada tem que avisar a policia ou algo assim, não entendi direito quem me ajudou com isso foi o Guigo quando fui mais cedo pro hospital.
— Entendi, cadê o Ricardo já foi embora.
— Não — o rosto dele muda no mesmo instante — ele vai ficar uns dias só por garantia.
— Pensei que você estivesse bem! — Sabia que o Dan não ia gostar da ideia.
— Amor, ele está preocupado, só isso.
— Você sabe que eu não gosto dessa amizade Ciço — Dan parece cansado.
— Dan que isso cara? Você não confia em mim? Acha que eu faria alguma coisa para te magoar? — Normalmente eu fico calado quando ele começa com suas desconfianças, mas estou tão cansado disso já.
— Eu confio — ele desvia os olhos quando fala.
— Não é o que parece Dan.
— Ciço é que.
— Você ainda sente algo pelo Rick? — Agora consegui cem por cento da sua atenção — Porque às vezes eu acho que você tem ciúmes dele e não de mim.
— Ciço isso não tem nada haver — ele desconversa.
— Tem certeza? — Digo em um tom bem sério.
— Ciço eu só não gosto que o Ricardo ainda faça parte das nossas vidas só isso.
— Eu entendo que você tenha suas razões para não ser amigo dele, de verdade — respiro fundo — mas amor ele é meu amigo, Rick me ajudou muito em momentos muito difíceis para mim e a amizade dele é importante, então por favor não peça para escolher entre vocês, você sabe que eu vou te escolher sempre, só que não vou ficar bem tendo que me afastar dele.
— Tá bom, desculpa.
— Eu te amo Daniel, te amo muito.
— Também te amo Cícero.
19:40 PM
Mauro chegou exatamente no horário em que ele disse que chegaria, ele veio fardado ainda e com uma cara séria, ele tem um jeito diferente quando está trabalhando, era engraçado nota as leves mudanças de postura e comportamento dele. Mesmo se esforçando para não transparecer ele estava nervoso em ver o Rick, já meu amigo parecia mais desconfortável mesmo, não sei porque, acho que Rick já tinha se convencido que não veria mais o Mauro e que a história deles havia acabado, porém vê-lo de novo deve ter reacendido alguns sentimentos, não sei, Rick era um livro aberto, só que às vezes ele simplesmente se fechava e era impossível saber o que ele estava pensando.
Bem Mauro me explicou o que eu precisava fazer e também se comprometeu a me ajudar da forma que ele conseguisse, era um pouco vergonhoso está nessa posição, mas Dan tinha razão precisava fazer algo até porque uma pessoa para ter coragem de fazer isso com outra, nada o impediria de ter outras vítimas, então não era ´só por mim que eu tinha que ir atrás disso. Mesmo que não desse em nada, ninguém poderia me acusar de não ter tentado.
— Ricardo a gente pode conversar só um minuto? — Mauro se arriscou.
— Fala com ele amigo — digo para dar uma ajuda.
— Beleza — Rick concorda e os dois vão juntos até o carro do Mauro.
A conversa deles durou umas meia hora, Rick voltou mais de boas, mas não quis me contar o que tinha conversado com Mauro, só me garantiu que não havia rolado nada entre eles no carro e eu acreditei, Rick não era de ser infiel e o Chico era um cara muito bacana para o meu amigo ser idiota de vacilar com ele, enfim mesmo sem o Rick querendo me contar o que rolou naquele carro eu sabia que uma coisa era certa, eles tinham finalmente terminado, pelo menos era a sensação que eu tinha olhando para o Rick bem menos tenso do que quando ele foi para essa conversa.
Por causa do meu atestado de uma semana meu pai resolveu que eu não iria trabalhar, só na próxima semana, como ainda estou me sentindo um pouco grogue por causa dos remédios resolvi que também não ira para a aula pelo menos por enquanto, meus amigos se prontificaram a pegar todas as anotações para mim então seria tranquilo, não vou perder muitas aulas até o final da semana acredito que vou, provavelmente na quarta já volte até.
18 de Março (Terça Feira)
15:30 PM
Já é a terceira parada que fazemos hoje, fiz um exame de sangue pela manhã, depois do almoço fomos para uma clinica para fazer uma endoscopia, mas a maquina estava quebrada e ninguém me avisou que tinham remarcado meu exame para outro lugar, que extresse, mesmo com plano de saude as coisas são burocraticas, isso é muito foda, não tenho paciencia para isso não.
— Você já vai ser atendido, Ciço! — Rick chama minha atenção pois meu mau humor já está evidente.
— Que saco esse negócio de médico.
— Deixa de ser mimado moleque — Rick diz rindo da minha cara.
Depois de uma eternidade — foram quinze minutos, mas que me pareceram uma eternidade — fomos chamados, ele entrou como meu acompanhante. Fato curioso número um, na endoscopia eles te sedam já que tem que enfiar um cano enorme na sua goela, eu nunca tinha feito esse exame, achei curioso a ideia de enfiar uma câmera pela minha boca até minha barriga, fato curioso número dois, parece que esse exame também pode ser feito pelo rabo, ou seja eles enfiam a câmera lá dentro — se é que você me entende — não é meu caso, ainda bem, não me sentiria muito confortável com um desconhecido enfiando algo em mim assim.
— Seu acompanhante é seu namorado? — A enfermeira pergunta toda vermelha e tímida.
— É, mas ele não é meu namorado — digo e ela pede desculpas ainda mais envergonhada — relaxa, eu sou gay não me ofendi, ele é só um amigo mesmo.
Para fazer esse exame você tem que ser sedado, ou seja, é obrigatório ter um acompanhante para te levar pra casa depois. O técnico que vai fazer meu exame me disse que não vou lembrar de nada, mas acho que ele está enganado, afinal de contas eu.
19 de Março (Quarta Feira)
2:30 AM
— Onde estou? — Abro os olhos com dificuldade, só tenho flashes do que aconteceu.
— Você está em casa, na sua cama — Rick que esta sentando do meu lado com notebook nas pernas diz suavemente me tranquilizando.
— O que você está fazendo?
— Trabalhando, mais não é nada de mais, você está bem?
— Nossa que horas são?
— Duas e meia.
— Caralho eu apaguei por tanto tempo assim? — Eu preciso parar de ser topado. Eu sei muito cedo, foi mau.
— Você lembra de alguma coisa? — Ele está segurando o riso então devo ter passado vergonha.
— Não — digo com cautela.
— Eu vou esquentar seu jantar, você deve está com fome — ele diz levantando da cama indo para cozinha.
— Seu Ricardo me conta o que eu fiz — peço levantando e indo atrás dele e sim ele tem razão, estou morto de fome.
— Você cantou Flutua ainda na clínica e disse a enfermeira que era a música que você quer que toque no seu casamento.
— É minha música com Dan — fico feliz sem motivo só por pensar nisso — mas isso não é vergonhoso.
— Seu Cícero eu já vi você cantando e tipo dopado ficou ainda mais engraçado, mas não se preocupe, eu fiz um vídeo para você mandar pro Dan depois.
— Ele vai adorar — digo rindo — eu fiz mais alguma coisa?
Rick faz aquilo de se fechar, é sutil, mesmo assim eu percebo, ele se tranca e não consigo mais tirar nada dele, ele sorri e pensa um pouco e por fim continuar seu relato.
— Você queria ficou tentando ligar para o seu pai usando sua mão — tá isso pode ter sindo um pouco engraçado eu admito — e tem mais uma coisa.
— O que?
— Você fez tudo isso falando em inglês.
— Sério? — Isso me pegou de surpresa.
— Eu sei que você tem cidadania e taus, mas realmente não pensei que seu inglês fosse tão bom.
— Claro que é, moleque me respeita, eu falo inglês desde molequinho e o vovô não fala portugués — um pensamento me pega de repente — espera eu tava cantando Flutua em inglês?
Rick começa a rir bastante lembrando e fazendo que sim com a cabeça, tá agora entendi, realmente deve ser engraçado. Enquanto ele coloca o vídeo para mim assistir, não sou de sentir vergonha, mas admito que o video está bem mais engraçado do que ele falou, eu encaminho para o Dan com um pedido que ele não passe para o Raylan, quero que esse vídeo morra com ele.
"What will they say about us?
Your parents, God and things like that
When they hear rumors of our love?"
18:00 AM
Hoje de tarde fomos para o meu retorno com os exames, o médico disse que após o tempo do meu antibiótico acabar vou está zerado de novo, dei muita sorte de não ter ficado com algo mais sério, podia ter sido bem mais grave se eu não tivesse procurado o médico. Até queria voltar para aula hoje, mas o Rick já vai embora amanhã de manhã, então resolvi levá-lo para jantar hoje, como uma forma de agradecer toda a força que ele tem me dado.
Ele queria pizza e tem uma Dominus em frente a igreja da nossa senhora de Fátima, eu amo a pizza de lá, não é tão longe da minha casa e também já me sinto bem para sair de casa, estou me sentindo bem mais forte, só ando com sono, mas até isso é efeito do remédio segundo meu médico. quando a gente estaciona o carro os olhos do Rick vão direto para um Onix estacionado ao lado do nosso.
— O que foi?
— Esse carro é do Mauro — ele diz.
— É igual dele mesmo — agora que ele falou até a cor é igual, os dois são pretos.
— Não, esse é o dele.
— Como você sabe?
— A placa — ele diz estranhamente sério.
— Nossa você decorou a placa do carro do seu ex — isso é engraçado — espera você sabe a placa do meu também?
— Nem preciso né Ciço, seu carro é uma relíquia — ele brinca aliviando um pouco o clima — ABC4D56.
— Caralho, que super poder é esse que eu não sabia que você tinha?
— Quando eu era menor jogava um jogo de placas de carro com meus amigos, daí ficou a mania de olhar para as placas.
— Você tem noção que nem eu sei minha placa de cabeça, tipo agora que você falou eu sei que é a minha, mas sempre preciso verificar quando preciso dela — estou rindo, queria ter essa memória, mas acho que no meu caso é mais falta de atenção mesmo — Você quer ir para outro lugar?
— Não, quer dizer, você se importa se a gente pegar para entregar?
— Não, mas tipo pensei que vocês tinham se resolvido — será que me enganei?
— Tá, eu falei que não ia te contar, então só vou dizer uma coisa, o Mauro me falou que está saindo com outra pessoa.
— Oxe, em que momento isso aconteceu, até pouco tempo ele estava chorando por você — Dan tem razão, sou o cara muito desligado.
— Pelo que ele me contou é recente, ele disse que ainda sente algo por mim, mas que viu nesse cara uma chance de ser melhor do que ele foi comigo.
— Nossa, como você se sente sobre isso?
— Na real não sei, ele não cogitava se assumir e ainda acho que ele não vai fazer isso, só espero que esse cara não passe pelo que eu passei.
— Que foda, vamos pedir para entraga então — acho que é o melhor a fazer.
Entramos, dou uma rápida olhada e vejo o Mauro, mas meus olhos parecem me enganar quando vejo quem está com ele. Deixo Rick fazer nosso pedido e vou até a mesa do Mauro, quando ele me ver fica visivelmente desconfortável, talvez eu não devesse ir falar com eles, mas é que estou tão chocado que não resisto ao impulso de saber se esse é o novo cara dele.
— E aí gente boa noite! — Digo sendo o mais simpático que consigo.
— Boa noite — Mauro me responde.
— Boa noite — Arthur responde olhando para mim muito rápido e desviando os olhos para seu prato.
— A gente veio pedir uma pizza, o Rick vai embora amanhã e resolvemos comer pizza hoje — explico.
— Ah massa, sobre o processo estamos vendo para chamar algumas das pessoas que estava lá para prestar depoimento depois você precisa me dar uma lista de pessoas que podem ir falar — Mauro diz casualmente, acho que em uma tentativa de não falar sobre ele e o Arthur sozinhos comendo uma pizza em uma quarta a noite, meu amigo faltou aula pra comer uma pizza com alguém que eu tenho certeza que ele não conhecia, pois os dois já tinham se visto no racha e não se falam como amigos.
— Beleza, vou te mandar de hoje para amanhã.
— Certo.
— Bem, vou indo, passei só para dar um oi, a gente se fala, valeu Arthur!
— Falou Cícero — Arthur está muito envergonhado e estranho, isso meio que confirma para mim que ele é o novo cara, agora faz sentido Mauro não queria que o Rick me contasse por que eu conheço o Arthur.
Pegamos nossa pizza e saímos, na volta para casa uma coisa começa a martela na minha cabeça, Rick que consegue me ler muito bem já se antecipa a minha pergunta e responde negativamente.
— Não, você não vai se meter
— Mas Rick, se o Mauro magoar ele?
— Isso não é da nossa conta Ciço, me prometa que vai ficar na sua — Rick diz sério.
— Tá bom, mas estou preocupado, tipo eu nem sabia que o Arthur era gay, quer dizer ele parecia hetero, alias eu tenho quase certeza que ele tinha dito que era hetero.
— Ciço!
— Eu sei, é só que porra o Arhtur é o muleque mais ingenuo que eu conheço, não quero que o Mauro destrua o caração do cara — estou real preocupado agora.
— Talvez esse cara não seja tão frágil e pelo que eu conheço do Mauro ele não faz promessas Ciço, você sabe disso, ele não vai enganar o moleque.
— Acho que você tem razão, mesmo assim é loucura pensar neles juntos.
— Ciço por favor estou pedindo, não se mete!
— Não vou, eu prometo, mas se o Mauro foder com outro amigo meu — paro para rir um pouco do duplo sentido dessa frase, depois volto ao meu ponto — você entendeu, é se ele ferrar com outro amigo meu dessa vez não vou perdoar ele, mesmo ele sendo gente boa comigo.
— Tudo bem, mas espera para ver antes de fazer qualquer coisa beleza.
— Você parece até que está torcendo para que eles deem certo — digo observando Rick se fechar de novo.
— É eu tenho esse costume.
— O que? — Não entendi o que ele quis dizer.
— Nada, vamos comer pizza e falar de outra coisa beleza?
— Tranquilo — ele não quer mais falar sobre isso então respeito e puxo um assunto de futebol que eu sei que ambos gostamos, em casa o assunto já foi dado como esquecido.