O CÓDIGO DO PRAZER - EPILOGO 03/03

Um conto erótico de Ryu
Categoria: Heterossexual
Contém 3623 palavras
Data: 17/08/2025 17:43:49

Aquela noite.

Aquela festa.

Quase vinte e um anos atrás.

Foi o ponto de ruptura — para todos os quatro.

Anderson, Sônia e Wilfredo saíram dali com o destino irreversivelmente alterado.

Simone não esteve presente… mas aquela noite também a alcançou.

E mudou tudo.

Wilfredo o convidara com entusiasmo. Era uma daquelas festas cheias, música alta, luzes piscando, a turma toda reunida. Anderson hesitou antes de aceitar, como sempre fazia, mas foi. Sabia, no fundo, que as festas eram o território de Wilfredo. Era lá que ele brilhava.

Wilfredo dançava bem, era engraçado, pegava meninas com facilidade. Sabia o que dizer, como se mover, como existir naquele ambiente que para Anderson sempre fora hostil. Anderson, por outro lado, ficava encostado em alguma parede, observando, inventando sorrisos, esperando que ninguém percebesse o quanto ele se sentia fora do lugar.

E Wilfredo sabia disso. Mesmo sem dizer. Ele o havia chamado, sim, como amigo, mas também como quem busca reafirmação. Era ali, na festa, que Wilfredo se sentia superior — livre das notas, dos boletins, das cobranças dos pais. Era ali que ele podia ser mais.

Mas Anderson tinha um trunfo.

Naquela mesma noite, horas antes da festa, seu pai lhe entregara as chaves do carro novo. Um sedã brilhante, zerado, com plástico nos bancos e cheiro de conquista. Anderson sabia que Wilfredo não tinha nada parecido. Sabia que o pai dele mal emprestava o carro velho, o mesmo que já quebrara na estrada duas vezes. Sabia que ali havia uma vantagem.

E então, ainda com o sol se pondo, antes da festa começar, Anderson passou na casa de Wilfredo para buscá-lo. Fez questão de estacionar com as janelas abaixadas, música ambiente tocando, e dizer com um meio sorriso:

— É novo. Meu pai me deu. Agora tenho meu próprio carro.

Wilfredo olhou. Demorou um pouco demais para responder. Passou a mão na lataria, soltou um “Bonito, hein...” quase seco. E entrou no carro em silêncio.

Anderson sentiu naquele momento uma coisa estranha: uma satisfação amarga. Não era orgulho. Era uma forma envergonhada de compensar a humilhação constante das festas. Se ele era o “parado”, o “introspectivo” — ele era também o cara que tinha um carro. Um bom carro. Um carro só dele.

No fundo, os dois estavam sendo moldados ali. Com as ferramentas que tinham. Com as faltas que carregavam. A rivalidade se refletia até mesmo nos campeonatos de vídeo game, que eram tratados como coisa séria.

Ambos haviam crescido entre espelhos e expectativas. A mãe de Wilfredo sempre dizia: "Devia ser mais estudioso, como o Anderson." E a mãe de Anderson repetia, como um refrão: "Devia se soltar mais, ser como o Wilfredo."

E assim se empurraram, um ao outro, por dentro e por fora, sem perceber. Um virou médico. O outro, executivo. Cada um bem-sucedido à sua maneira. Cada um com invejas que nunca ousou confessar nem para si.

Anderson observa Wilfredo de novo, desta vez com um misto de carinho e pena. Ele já não sabia dizer se admirava ou temia aquele amigo. Só sabia que, sem Wilfredo, ele talvez não fosse quem é. E tinha quase certeza de que o contrário também era verdade.

Eles se olharam, por um instante. Trocaram um sorriso antigo, aquele tipo de sorriso que carrega dentro dele uma adolescência inteira. Nenhum dos dois disse nada. Não precisava.

Anderson se recosta na cadeira de plástico branco, à sombra das bandeirolas de "Alice no País das Maravilhas", e por um instante, apesar da música infantil e do burburinho dos adultos, ele é lançado para trás — para aquela outra festa.

Foi uma noite decisiva.

Ele se lembra perfeitamente quando Sonia apareceu.

A música pulsava no ar, misturada ao burburinho de conversas e risadas. Anderson, encostado discretamente perto de uma das paredes, observava o movimento, um copo quase intacto na mão. Não era de se destacar — preferia a segurança das sombras, onde podia apenas ver.

Foi então que ela entrou. Sonia.

Jovem, linda, envolta numa aura difícil de explicar. Os cabelos caíam livres sobre os ombros, e o sorriso — não escancarado, mas suave, misterioso — lembrava a Mona Lisa, como se escondesse segredos que ninguém ali jamais decifraria.

Ela não estava sozinha; veio acompanhada das amigas, que riam e se empurravam com leveza, indo direto para a pista. Sonia se deixou levar pela música, movendo-se com naturalidade e graça.

Anderson sentiu algo mudar dentro dele. O barulho da festa pareceu se afastar, ficando abafado, enquanto os olhos dele se prendiam a cada gesto dela. Queria falar com ela. Queria ouvir sua voz, descobrir o que havia por trás daquele olhar sereno e daquele meio-sorriso enigmático.

Mas ficou parado. A timidez segurava seus pés no chão, e o medo de dizer a primeira palavra pesava tanto quanto o desejo de se aproximar. Ainda assim, continuou olhando — como se, naquele momento, Sonia fosse a única coisa realmente viva naquela festa

Anderson se apaixonou. Não daquele jeito bobo de adolescência — foi um tipo de desejo novo, paralisante, que o deixou sem saber o que fazer com as mãos.

Foi até Wilfredo.

— Viu aquela menina? — perguntou, tentando soar casual, mas a voz saiu tremida.

Wilfredo seguiu o olhar do amigo e entendeu na hora. Sonia.

Anderson pediu ajuda. Algo como: "Fala com ela por mim, vê se ela tá sozinha..." E Wilfredo, com aquele velho ar de cumplicidade, assentiu com um sorriso.

Mas algo estava diferente naquela noite.

Wilfredo também havia percebido o carro. O sedã zero, estacionado de frente para todos, como um troféu. Sentiu o tom de exibição nos gestos de Anderson, na forma como deixava a chave à mostra, como fazia questão de dizer: “Meu pai me deu. É só meu.”

Wilfredo estava ferido. Sabia que nunca teria um carro como aquele — pelo menos não naquela época. O carro do pai vivia falhando. Ele o dirigia com medo de que não ligasse na volta. E agora via o amigo — o mesmo que sempre fora mais elogiado na escola, o queridinho dos professores — desfilando status.

E então, numa decisão rápida, talvez cruel, talvez instintiva, Wilfredo resolveu revidar.

Foi até Sonia. Conversou. Riu. Dançou com ela. E ela, deslumbrada com a energia dele, caiu fácil. Ela não conhecia Anderson. Não sabia de nada. Só viu um rapaz confiante, engraçado, bonito.

Mais tarde naquela noite, Wilfredo voltou até Anderson.

— Me empresta a chave do carro? Quero dar uma volta com ela.

Anderson hesitou, mas entregou. Não queria parecer inseguro, infantil. Achava que era só um gesto, uma gentileza entre amigos. Não imaginava o que viria.

Wilfredo dirigia o sedã como se fosse dele, uma mão firme no volante, a outra descansando no câmbio. Sonia, no banco do carona, sorria com aquela mistura de curiosidade e expectativa que ele já sabia ler tão bem.

As ruas iluminadas foram cedendo lugar a trechos mais escuros e silenciosos. O som do motor preenchia o espaço entre eles. Ele escolheu um ponto afastado, quase deserto, onde só se ouvia o vento passando pelas árvores.

Estacionou.

Olhou para ela.

Sonia devolveu o olhar, como se estivesse esperando que algo acontecesse — e aconteceu.

Wilfredo se inclinou e a beijou. Primeiro devagar, medindo a resposta. Ela correspondeu, e logo o beijo ganhou calor. Ele sentia o perfume dela, o toque da pele, mas por trás de tudo havia outra coisa: Anderson.

Cada vez que os lábios se encontravam, ele pensava no amigo parado na festa, encostado em alguma parede, segurando um copo e observando de longe. Imaginava o rosto de Anderson quando descobrisse. O peso da humilhação. A impotência. A dor silenciosa.

Era isso que aquecia Wilfredo mais do que qualquer carícia.

Não era apenas desejo — era o gosto da revanche.

Enquanto as mãos exploravam as curvas de Sonia, sua mente estava fixada naquela imagem: o amigo, sozinho, esperando, passando vontade.

Enquanto tirava a roupa de Sonia e beija-lhe os seios, Wilfredo não podia deixar de pensar o quanto Anderson queria estar ali em seu lugar.

E quanto mais Sonia se entregava, mais ele sentia que tinha vencido. O carro, o troféu que Anderson exibira horas antes, agora servia como cenário da sua vitória. Um território inimigo conquistado.

Quando seus dedos penetraram a xoxotinha molhada de Sonia, Wilfredo pensava consigo mesmo, o quão ele era melhor que Anderson para conquistar uma mulher.

Sonia, é claro, não sabia. Para ela, era apenas um momento intenso com um rapaz seguro de si. Mas para Wilfredo, cada beijo, cada vez que socava o pau em Sonia, era um lembrete de que naquele jogo antigo entre os dois, ele acabara de marcar um ponto que Anderson jamais esqueceria.

Wilfredo socou forte, pensando mais na rivalidade com Anderson do que qualquer outra coisa.

- Esta é pra você, Anderson! – Falou Wilfredo socando pela última vez em Sonia.

Tirou o pau pra fora e terminou de ejacular no banco de trás do carro, de propósito.

Quando voltaram para a festa, Wilfredo falou para Anderson que não tinha entendido direito, que tinha bebido. Falou que não sabia que Anderson queria Sonia para ele.

Anderson fingiu que acreditou no amigo. Engoliu seco. Engoliu tudo: a dor, a humilhação, a traição. Fingiu que nada aconteceu. Limpou o banco do carro. Continuaram amigos.

Anderson conseguiu lidar com aquilo da maneira que podia ... com dinheiro!!

Foi até o puteiro e contratou uma menina parecida com a Mona Lisa, e consequentemente parecida com Sonia. Com dinheiro ele sabia lidar com as situações.

Anderson também criou o “Código do Prazer”, um programa com uma namorada virtual

Wilfredo pensou “Agora eu volto para Simone e depois eu apresento Sonia para Anderson. Começo a namorar Simone e ajudo Anderson a namorar Sonia”

Na cabeça de Wilfredo ele namoraria e casaria com Simone, e ajudaria Anderson a namorar Sonia.

Sonia já chegaria para Anderson “marcada”, ele tinha comido Sonia primeiro.

Mas então vieram os enjoos, a suspeita, a confirmação.

Grávida.

Tão nova. Com tantos sonhos.

Os pais, em choque. Os de Wilfredo, furiosos. A pressão foi unânime: casamento. Eles se casaram em poucos meses, sem paixão, sem planos. Mas quando os bebês gêmeos nasceram tudo mudou. Sonia se apaixonou por aqueles seres frágeis e fortes ao mesmo tempo. Wilfredo também. Tornaram-se pais antes de serem um casal. E aprenderam a amar, não um ao outro, mas o que construíram juntos.

Nesse meio-tempo prometeu a Simone que assim que as crianças estivessem maiores, ele iria se separar de Sonia e ficar com ela.

Simone cansou de esperar. Deu-lhe um ultimato. Wilfredo tentou convencê-la de que eles poderiam continuar, de que nada mudaria. Ela recusou.

Os anos passaram, e Sonia se tornou uma mulher de presença discreta, mas intensa. Criava os filhos com dedicação quase devocional, cuidando para que nada faltasse a eles — nem amor, nem disciplina. Para quem via de fora, parecia apenas mais uma mãe que se sacrificara pela família.

Mas havia algo que poucos sabiam: Sonia era bissexual.

Ao longo dos anos, manteve algumas aventuras extraconjugais, tanto com homens quanto com mulheres. Não eram romances longos, mas encontros que reacendiam nela algo que a rotina com Wilfredo jamais conseguira manter. Nunca buscou substituir o papel de mãe ou “fugir” da família — pelo contrário, cada escolha que fazia, cada segredo que guardava, tinha como prioridade não prejudicar os filhos.

Era uma vida feita de equilíbrios silenciosos: o casamento mantido mais por conveniência e estabilidade do que por paixão; a maternidade que ela colocava acima de qualquer desejo pessoal; e, nos intervalos raros, os momentos roubados em que lembrava que ainda era desejada, ainda era viva.

Wilfredo nunca soube de todos os detalhes. Talvez tivesse suspeitas, talvez preferisse não saber. Para ele, o importante era manter a imagem de família intacta, mesmo que, no fundo, já entendesse que Sonia nunca tinha pertencido totalmente a ele.

Sonia, conheceu Anderson como “o amigo introspectivo de Wilfredo”, mas passou a vê-lo de outra forma. Admirava sua inteligência calma, o jeito como escutava de verdade, como parecia carregar o mundo nas entrelinhas. Era diferente de Wilfredo, não melhor nem pior, mas diferente de um jeito que a atraía.

Ainda assim, refreava qualquer impulso.

Havia um limite ali: ele era amigo do pai de seus filhos. Cruzar essa linha não era algo que ela sequer se permitia imaginar.

Anderson, por sua vez, enterrou o que sentia desde aquela festa distante. Enterrou fundo, como quem fecha um baú e joga a chave no mar. Aprendeu a conviver com a presença dela sem deixar transparecer nada. Falava com ela de forma cordial, às vezes até descontraída, mas no fundo, sempre havia aquela lembrança amarga — o beijo que nunca aconteceu, a chance que nunca teve.

Os dois sabiam que havia algo não dito entre eles. Um respeito mútuo, uma curiosidade silenciosa, talvez até um afeto que nunca ousou crescer.

E, por isso mesmo, continuavam naquela coreografia cuidadosa: um passo para perto, dois passos para trás.

Wilfredo, ainda cheio de culpas e um afeto estranho por ambos, decidiu juntar Simone a Anderson. Apresentou os dois. “Vocês combinam”, disse com aquele ar de arquiteto do destino. E eles de fato combinaram, por um tempo. Simone encontrou em Anderson estabilidade, inteligência, respeito — mas não atenção. Não sentia que era prioridade.

Anderson vivia para a empresa. Simone se recordou do próprio pai, que deixava sua mãe e ela em segundo plano para cuidar do Hospital. Mais uma vez se viu sozinha, mais uma vez desvalorizada.

Da forma como estava se sentindo, não foi difícil se juntar a uma pessoa como Alex, que se vendia.

Jovem, bonito, mas que a olhava nos olhos. Ela sabia exatamente o que estava fazendo. E não se culpava por isso. Não mais.

O tempo passou. E, como tantas vezes, a vida fez seus movimentos em silêncio.

Depois dos tropeços, das traições e dos corpos que se cruzaram sem amor verdadeiro, Simone voltou para Anderson. Não foi um retorno romântico, tampouco impulsivo. Foi ponderado. Ela o encontrou de novo quando ele parecia, enfim, diferente.

Então Simone escolheu.

Beatriz nasceu. Depois, René. A família crescia, como crescem as coisas que são regadas — mesmo com mágoas enterradas no jardim.

Decidiu por Anderson. Pela casa. Pelas crianças. Pelo que, apesar de tudo, havia se transformado em amor — um amor menos intenso, mas confiável. Mais humano. Feito de perdão e esforço.

Desde então, tudo se manteve como está: a festa, os filhos, as máscaras. Simone é fiel, pelo menos agora. Anderson é presente, embora inquieto. Wilfredo sorri, embora carregue um vazio. E Sonia... Sonia vê tudo, sente tudo, mas não diz nada.

No fundo, todos sabem que vivem em um teatro bem armado. Mas aprenderam a viver ali. A amar dentro do possível.

E naquele fim de tarde, na festa de René, sob as cores suaves de "Alice no País das Maravilhas", Anderson olha tudo isso e sente: está em um mundo estranho, cheio de espelhos e personagens disfarçados. Um país de maravilhas e contradições.

Mas é o seu país.

E ele decidiu ficar.

A festa tinha sido um sucesso.

Anderson entrou na sala, sentou-se e quase adormeceu na poltrona, vencido pelo cansaço manso.

Sentiu o toque leve de Beatriz, aninhada com um coelhinho de pelúcia nos braços.

Ela estendeu o coelho branco para ele, com um olhar cúmplice e uma voz suave:

— Está na hora de visitar a toca do coelho.

A toca era quente, abafada, cheia de espelhos que distorciam o tempo. René e Cláudio estavam lá dentro, brincando de futebol, como se o espaço não obedecesse à lógica do mundo real. Corriam, riam, tropeçavam em memórias.

.

Anderson ficou diante de um espelho com Beatriz. René e Cláudio — Como podiam? — se pareciam cada vez mais com ele e Wilfredo quando eram crianças. O mesmo jeito de rir. O mesmo impulso nos pés ao correr.

Diante do espelho, Anderson se preparou para ver Wilfredo.

Mas o vidro lhe devolveu o rosto de Simone.

Ela viera ao mundo cercada de luxo, sem nunca tocar a aspereza da pobreza.

Ele também.

Simone amou Wilfredo… e o perdeu numa noite de festa.

Anderson amou Sônia… e também a perdeu naquela mesma noite.

Ela comprou Alex para ser seu namorado.

Ele comprou Suzy para ser sua namorada.

Alex, um assassino.

Suzy, uma assassina

Para ela, Anderson era o nerd correto.

Para ele, Simone era uma princesa intocável.

Simone tinha sede de sexo sujo.

Anderson também — mas sua sujeira tinha endereço: quartos pagos por hora.

Ela abandonou as aventuras e traições por amor à família e a filha.

Ele, no mesmo dia, deixou o puteiro pelo mesmo motivo.

Simone gerou uma filha fora do casamento, de Alex.

Anderson gerou um filho fora do casamento, de Camila.

Wilfredo falsificou um exame para protegê-la.

Wilfredo falsificou um exame para protegê-lo.

Simone era o reflexo que Anderson fingiu não ver.

Agora, o espelho gritava: ela sempre esteve lá.

E então, sem precisar que ninguém dissesse, ele soube.

Sempre soube.

As palavras que haviam lhe ocorrido no dia em que começou a “namorar” Suzy voltaram, cruas, inteiras: novamente (capítulo 7) :

“Wilfredo sempre foi parte da minha história.

Conheço ele desde que a gente era moleque. A gente se encontrava depois da escola pra jogar bola, inventar campeonato de videogame como se fosse coisa séria. Ele sempre foi mais impulsivo do que eu. Eu era mais calado, mais planejado. E talvez por isso a amizade tenha durado tanto — um completava o outro.

Ele é filho único. Eu tenho uma irmã, mas cresci desejando alguém com quem pudesse dividir as coisas de menino. E o Wilfredo era isso pra mim. O irmão que a vida escolheu me dar.

Teve uma época em que a gente vivia praticamente junto. Minha mãe o tratava como filho, e a mãe dele sempre me dava bronca como se eu fosse da casa. A vida, naquela época, era simples.

Mas aí ela começou a complicar. Primeiro, veio a notícia de que Sonia estava grávida, e de gêmeos. Tinha só dezessete anos. Wilfredo tinha vinte. Ele entrou em pânico, claro — e eu também. Mas ele ficou. Ficou, lutou e cuidou. Sonia ralou muito, enfrentou olhares tortos, comentários sussurrados, mas nunca se vitimizou. Se formou em Direito com os filhos no colo e orgulho nos olhos. E Wilfredo... ralou ainda mais. Trabalhou de noite, estudou de dia, dormia onde dava. No final, se formou em Medicina.

Foi na faculdade que ele conheceu Simone.

Lembro até hoje do dia em que ele me falou dela pela primeira vez. “Você vai gostar dela, Anderson. Ela é diferente.”

E era mesmo. Inteligente, engraçada, cheia de luz. Ele me apresentou a ela como quem apresenta um segredo. E, com o tempo, eu me apaixonei. Ela também — acho. Por um tempo, pelo menos.

Mas às vezes eu me pergunto se não havia algo ali desde o começo. Talvez ele tivesse me apresentado Simone como quem oferece um presente... mas com um pedaço do peito preso naquele laço.

Mesmo assim, como posso não amar o Wilfredo?

Ele é meu irmão. O irmão que cresceu comigo, que me defendeu de brigas, que chorou comigo quando precisei dele. Ele foi o primeiro a me incentivar com a empresa, mesmo quando ninguém acreditava. Sempre esteve ali.

E talvez por isso tudo doa tanto.”

Houve um silêncio.

— Então, Anderson, você conclui que já sabia tudo. Mas sente que dói muito? — perguntou uma voz que parecia vir de algum lugar além dos espelhos.

— Sim. Como comentei, é como naquele filme Amnésia: o personagem já sabe tudo, mas mente para si mesmo para evitar a dor.

— Os filmes ajudam a expressar o que sentimos de formas que às vezes nem percebemos. Mas você está evoluindo, Anderson — concluiu a voz.

Ele respirou fundo.

— Meus filhos me transformaram. Hoje me valorizo mais. Sei que tenho algo de bom a oferecer. Tenho valor por mim mesmo... não só pelo dinheiro.

— Ao dar valor a si mesmo, passou a dar mais valor aos outros, como no caso da Alicinha. A mensagem de Suzy sobre a possibilidade de Gabriel ser teu filho, te abalou?

— Sim... Acho que tudo está interligado. Mas também tenho algumas questões morais para resolver: escolhi Madalena como sócia, mesmo com seu caráter duvidoso.

— Isso fica para a próxima sessão. Por hoje, encerramos. Estou satisfeito com seu progresso — disse Dr. Mauro Feus. — Confirme a data com minha secretária, Natalie.

Anderson olhou ao redor. A sala era branca. Neutra. Sem espelhos. Mas havia algo... como se linhas de código rolassem em paredes invisíveis.

— Vou marcar a próxima sessão, doutor. A terapia... parece estar compilando.

— Excelente. E o que aprendeu nesse último patch?

— Que a perfeição é um bug de design. Mas... pelo menos eu parei de travar.

O terapeuta sorriu.

— return true; — disse, piscando.

— O que disse?

— return true. A condição foi verificada como verdadeira — respondeu Mauro. — No entanto, você mantém Sonia na memória... em um setor escondido, de difícil acesso.

— Quer dizer... no meu subconsciente?

— Não. Quero dizer que você nunca deletou o Código do Prazer. A namorada virtual baseada em Sonia ainda está ativa.

Anderson franziu o cenho.

Como você sabe que Sonia também não seria apenas uma idealização sua? Assim como você fez com Simone no principio? – Continuou o psicólogo

— Como você sabe disso? Eu nunca falei... e você não tem acesso aos meus arquivos.

A imagem do terapeuta começou a tremer... pixelar... distorcer, como se o mundo estivesse perdendo resolução.

Talvez fosse a pressão arterial de Anderson caindo.

Talvez fosse um problema nos drivers de vídeo.

Ou talvez... um erro fatal no próprio sistema

FIM

AGRADECIMENTO :

Chegamos ao fim desta jornada, e não poderia encerrar sem agradecer aos leitores que acompanharam cada capítulo, aos que deixaram suas estrelas, e aos que tiraram um tempinho para comentar e compartilhar suas impressões — muito obrigado!

Escrever esta série foi uma experiência incrível.

Espero que tenham aproveitado tanto a leitura quanto eu aproveitei ao escrever. E que possamos nos encontrar em muitas outras histórias no futuro!

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 15 estrelas.
Incentive Ryu a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.

Comentários

Foto de perfil de Letícia99

Esta série me surpreendeu do começo ao fim. Parabéns.

Vi no último capítulo que vc pretende fazer uma segunda temporada. Algumas coisas ficaram sem resposta.

Mas a série ficou muito boa.

0 0
Foto de perfil de Ryu

Eu vou ficar um tempo sem publicar agora. Depois eu tenho uma "fila'. Tem 3 séries pequenas que quero escrever - de 4 a 6 capítulos cada uma.

Depois, no ano q vem pretendo ver se consigo escrever uma espécie de segunda temporada para o código do prazer.

Se for algo com um mínimo de qualidade, que faça sentido eu irei publicar

0 0