No trote do peão - 15

Um conto erótico de Hollister
Categoria: Gay
Contém 4431 palavras
Data: 11/08/2025 19:19:56
Assuntos: Amor, Fazenda, Gay, peão, Romance

Eu não fazia ideia do quanto minha vida podia mudar em tão pouco tempo.

Depois daquela noite com o Francisco — a suíte, os toques, as promessas sussurradas entre um beijo e outro — eu pensei que o mundo tinha finalmente parado de girar descompassado. Acordar ao lado dele, ver aquele sorriso meio amassado de sono e sentir a aliança ainda fresca no meu dedo… foi como respirar fundo depois de semanas prendendo o ar.

Mas o universo tem um senso de humor peculiar. Nem bem voltamos pra casa e já dava pra sentir a tensão reaparecendo nas entrelinhas.

A surpresa do Rafael no meu aniversário, a chegada do Francisco com um carro e uma aliança, a reação do Antônio… tudo ainda fervilhava na minha cabeça. Eu não sabia se estava vivendo um sonho ou a introdução de um novo drama.

Mesmo assim, eu tentava me manter firme. Bárbara vivia dizendo que o amor não era pra covardes — e eu me agarrava nessa ideia como um náufrago num pedaço de madeira.

O cheiro de café fresco preenchia a cozinha, misturado ao som da chaleira que ainda apitava baixo no fogão. Eu estava sentado ao lado de Bárbara, ainda com os cabelos úmidos do banho, quando notei que Francisco e Antônio estavam se encarando em silêncio do outro lado da mesa.

Era uma imagem quase surreal.

Pai e filho, frente a frente, compartilhando o mesmo café da manhã depois de anos de silêncio. Mas ali, mais do que o aroma do café, o que pairava no ar era um clima denso, cheio de palavras não ditas e feridas mal cicatrizadas.

Bárbara, sempre impulsiva, sempre verdadeira, foi a primeira a romper aquela tensão:

— Eu tô de saco cheio — disse, colocando a xícara sobre a mesa com firmeza. — Sério. De verdade. Esse clima de merda ronda essa casa faz anos, e agora que as coisas estão começando a melhorar... vocês dois resolvem estragar tudo?

Antônio olhou pra ela com uma expressão cansada, enquanto Francisco desviou os olhos e soltou um suspiro abafado.

— Eu só queria tomar meu café em paz, filha — o pai murmurou, num tom ríspido.

— Não é só café, pai — ela rebateu. — É o jeito como você olha pro Francisco como se ele fosse um estranho. E você, Francisco — virou o rosto para o irmão —, com esse orgulho todo entalado na garganta, fingindo que não liga. Mas liga. E muito.

Eu me mantive calado, mas sentia o coração disparado. Ver minha amiga, minha quase-irmã, ali entre os dois, tentando costurar uma ponte com as mãos nuas, me fazia perceber o quanto aquela família precisava mais de afeto do que razão.

— Eu nunca quis esse afastamento — disse Francisco, num tom mais baixo. — Mas também não sou mais um moleque. Não vou implorar por espaço.

— E eu nunca quis um filho gay — Antônio retrucou, com a voz firme, mas com os olhos marejando. — Mas ele continua sendo meu filho.

Francisco o encarou de novo, dessa vez sem abaixar os olhos. E havia dor ali, mas também uma pontinha de esperança. Como se aquele momento, por mais tenso que fosse, estivesse prestes a desmontar o muro de anos entre os dois.

— E eu continuo sendo — ele disse. — Só não tô mais disposto a ser invisível pra você.

Bárbara se levantou, puxando minha mochila da cadeira:

— Vambora, Samuca. Antes que eu jogue esse café na cara dos dois.

Tentei conter o riso, mas confesso que foi um alívio seguir com ela até a porta. Antes de sairmos, dei um beijo no Francisco. Antônio encarava a xícara, como se tentasse encontrar nela as palavras que sempre teve medo de dizer.

***

A aula parecia se arrastar como se o tempo tivesse preguiça de andar. Eu olhava para o relógio a cada cinco minutos, sentindo as palavras do professor ecoarem sem muito sentido na minha cabeça. Tudo o que eu queria era encontrar a Elisa e tomar um café forte o suficiente pra me trazer de volta à Terra.

Assim que a aula terminou, eu atravessei o corredor apressado, mas fui interceptado pelo professor Celso, aquele que sempre parecia saber das coisas antes mesmo de acontecerem.

— Samuel — ele me chamou, ajustando os óculos no rosto. — Estava mesmo te procurando.

Parei de súbito.

— O que houve, professor?

— Indiquei você para uma vaga na Lumen. É uma agência de publicidade com foco em storytelling e identidade de marca. A coordenadora do curso me pediu nomes e você foi o primeiro que me veio à cabeça.

Meus olhos arregalaram.

— Lumen? A Lumen mesmo? — Quase gaguejei. — Eles trabalham com campanhas nacionais... e até prêmios já ganharam.

Ele assentiu com um pequeno sorriso.

— Acho que a escrita criativa que você mostra nos seus projetos merece espaço além da sala de aula. Eles vão te chamar pra uma entrevista.

— Uau... Obrigado, professor. De verdade. Nem sei o que dizer.

— Diga “sim” quando a oportunidade bater. Só isso.

Segui meu caminho com o coração acelerado. Quando encontrei Elisa perto da saída, ainda sorria como um bobo.

— Que cara é essa? — ela perguntou, erguendo uma sobrancelha. — Ganhou na loteria ou o Francisco te pediu em casamento?

— Quase isso — respondi, com uma risada. — O professor Celso me indicou pra uma vaga na Lumen.

— Aaaah, eu amei! Você vai brilhar ali — ela disse, empolgada. — E vai arrasar com aqueles textos lindos... e com o visual também, né? Porque vamos combinar, Samuel, você é uma graça.

— Boba.

— Mas falando em beleza... — ela se inclinou, abaixando o tom da voz. — O Francisco é um homem, viu? Que cara gato. Sexy daquele jeito, meio brucutu mas com um coração fofo... Se eu não te respeitasse, ia até tentar alguma coisa!

Eu ri alto, tentando conter o sorriso. Elisa era dessas: direta, espontânea e impossível de não gostar.

— Vai com calma, que ele é todo ogro por fora, mas por dentro é mais sensível que poeta romântico.

— Ai, me apaixonei mais agora.

Estávamos prestes a atravessar o portão da faculdade quando uma voz familiar ecoou atrás da gente:

— Vocês dois sempre conspirando alguma coisa? Ou tão falando de mim?

Viramos ao mesmo tempo e lá estava Lucas, com os óculos escuros sobre o rosto e aquele sorriso que parecia saber de tudo.

— Adivinha? — Elisa respondeu, cruzando os braços e sorrindo de volta.

— Se for sobre o Francisco, quero detalhes. Se for sobre o Samuel, aceito fofocas. E se for sobre mim... bom, melhor ainda.

— Era sobre o Francisco, mas com a sua entrada dramática, acho que o foco mudou — brinquei.

— Ótimo. Então vamos tomar esse café e fofocar civilizadamente — Lucas disse, pegando o braço da Elisa com intimidade. — Porque eu sinto que hoje vai render.

O café estava tranquilo naquela tarde. As mesas de madeira ocupadas por grupos ruidosos de estudantes, os raios de sol filtrando pelas janelas altas, e o cheiro de pão na chapa invadindo tudo. Elisa ria de alguma história do Lucas, e eu tentava não me perder entre os três cafés na mesa e meus pensamentos que sempre voltavam pra ele.

Aproveitei que Elisa foi atender a um telefonema fora da mesa pra conversar a sós com o Lucas.

— Posso te perguntar uma coisa?

Ele assentiu, mexendo o canudo no copo gelado.

— Por que você ainda tá criando essas intrigas com o Francisco? — perguntei, direto. — A gente combinou que seríamos amigos. E tem horas que parece que você ainda quer medir forças com ele.

Lucas me olhou por alguns segundos, como se avaliasse se valia a pena dizer o que estava preso.

— Eu não tô tentando te afastar dele, Samuel — respondeu, calmo. — Mas também não vou fingir que ele me convence fácil.

— Isso não é mais problema seu — retruquei, um pouco seco.

Ele ergueu as mãos, como se me pedisse calma.

— Eu sei. Mas eu provoquei o Francisco de propósito. Queria ver até onde ele ia por você. Se ele tava mesmo disposto a bancar o que sente ou se era só fogo do momento.

Fiquei em silêncio, digerindo aquilo. Não esperava uma resposta tão honesta.

— E o que você concluiu?

Ele sorriu de canto.

— Que ele te ama. Que tá tentando. Mas ainda tem medo. E se ele vacilar de novo, não vou estar longe. Mas não pra tomar o lugar dele. Só pra garantir que você vai continuar inteiro.

Suspirei. Lucas sempre teve esse jeito desconcertante de dizer as coisas que me desmontavam aos poucos.

— Eu só quero ver você feliz — ele completou. — Mesmo que seja com o cowboy cabeça-dura.

Deixei escapar um sorriso.

— Ele não é tão cabeça-dura assim. Só... lerdinho emocional.

— Lerdinho com um corpo de parar quarteirão, né? — ele riu.

Soltei uma risada baixa, encostando o cotovelo na mesa e encarando o Lucas com aquele olhar de “você não presta”.

— Ele realmente é um gostoso — confessei, quase como se fosse um segredo. — E na cama… bom, digamos que eu tenho tido ótimos problemas.

Lucas arqueou uma sobrancelha, já abrindo um sorriso maroto.

— Problemas, é? Do tipo insaciável?

— Insaciável e nada pequeno — respondi, tomando um gole do meu café como quem dizia: “tire suas próprias conclusões”.

Lucas deu uma gargalhada gostosa, daquela que chamava atenção de quem estava por perto.

— Sabia! Ele tem muita cara de ser dotado. Quieto, todo misterioso… é sempre os quietos — disse, abanando o rosto, fingindo calor. — Mas fico feliz, de verdade. Você tá com aquele brilho nos olhos, mesmo com os perrengues todos.

Assenti, agora mais sério.

— Tem sido intenso, Lucas. Mas, sim... eu tô feliz. A gente tá construindo alguma coisa real, apesar dos tropeços.

Ele sorriu com sinceridade dessa vez, sem piada.

— Só não deixa ele te sufocar com insegurança. Amor bom é o que te dá espaço, não o que te prende.

— Eu sei — respondi. — Mas dessa vez, ele tá tentando do jeito certo.

Lucas assentiu e levantou o copo de café.

— Então, um brinde silencioso a isso. Ao cowboy gostoso, ao brilho no teu olho e aos problemas que todo mundo aqui queria ter.

Lucas saiu do café com aquele sorriso escondido, dizendo que ia encontrar alguém — e eu nem precisei perguntar quem era.

Fiquei ali por alguns minutos, sozinho, olhando o movimento das pessoas indo e vindo pela calçada. Senti uma vontade súbita de correr até Francisco, de pular no colo dele, de deixar o mundo girar ao redor do nosso abraço. Mas ele não estava ali. E, por mais que a mensagem dissesse que logo estaria em casa, o “logo” demorou mais do que eu queria.

Voltei pra casa e tentei me ocupar. Li alguns textos pra aula da semana, organizei coisas no quarto, me perdi em lembranças. Quando dei por mim, já estava deitado na cama, meio acordado, meio dormindo, o corpo querendo descanso, mas a mente girando em torno daquele silêncio.

Foi quando senti os lábios dele nos meus. Suaves, quentes, como se pedissem licença pra me tirar do torpor. Abri os olhos devagar e vi Francisco ali, iluminado apenas pela luz baixa do abajur.

— Oi, dorminhoco — ele sussurrou, com aquele sorriso que sempre me desmonta.

— achei que tinha ido embora — minha voz saiu rouca, ainda envolta pelo sono e pela saudade acumulada.

— Consegui fechar um novo negócio pra fazenda. Grande.

— Negócio?

— Um fornecimento contínuo pra uma rede de mercados daqui. Amanhã vou assinar os contratos depois que os advogados lerem.

Ele me olhou com ternura e passou a mão no meu cabelo.

— Vou tomar um banho rápido e já volto pra me enfiar debaixo desse edredom contigo, tá?

Francisco deixou parte da porta do banheiro aberta e eu ouvi o chuveiro sendo ligado. Estava com bastante sono e entre pequenos cochilos quando ele finalmente saiu do banho e se colocou embaixo do edredom comigo. Suas mãos firmes foram deslizando pelo meu corpo, eu estava somente com um short fino que uso pra dormir e sem cueca.

Francisco passou a beijar meu ombro e meu pescoço enquanto eu suspirava um pouco mais profundo. Seu pau já estava duro, sua mão tirando o meu short devagar enquanto a pica buscava espaço entre as minhas nádegas. Eu senti a glande tocar, cheia de baba, o meu cu.

— Quero te foder, passei o dia com tesão, imaginando esse rabo acolhendo meu pau – Sussurou no meu ouvido, enquanto a pica era forçada — Me deixa entrar, amor.

E eu não precisei responder, meu cuzinho, mesmo sem lubrificante, foi se abrindo a medida em que ele sussurrava as palavras mais doces e obscenas que eu já ouvi, lento e cuidadoso. Mas isso mudou rápido, rápido até demais. Em um minuto eu estava de olhos fechados, de ladinho, abraçado ao meu homem, dando meu cuzinho de forma calma e tranquila. No outro, bom, eu me vi de quatro, com a cabeça enfiada no colchão, o pé dele pressionando meu rosto e a pica entrando fundo.

Os tapas ecoaram no quarto sem medo de que outras pessoas escutassem o que estávamos fazendo. Francisco me fodeu naquela posição por tempo o suficiente pra eu achar que ele estava destruindo todas as minhas pregas.

Ele tirou a rola de dentro e saiu de cima de mim, me puxou até a ponta da cama e me colocou de frango, com as pernas em seus ombros. Ele socou, várias vezes e tão forte quanto na posição anterior. Abriu as minhas pernas e me fodeu, ainda mais fundo e o gemido mais forte denunciou que ele estava gozando, mas não que ele iria parar.

O que não fez.

Francisco me beijou, um beijo apaixonado, um beijo selvagem e cheio de tesão e amor. Ele me pegou no colo, com a pica ainda atolada em mim e sentou na cama, me agarrando com os braços nas minhas costas. Ele estava muito mais fundo do que antes.

— Eu tô me segurando pra não te foder ainda mais forte do que agora a pouco — me beijou — eu te amo, Samuel, e é um sentimento novo pra mim, algo tão grande que eu não me vejo mais sem você do meu lado. Esse cheiro, seu beijo, seu corpo inteiro foi feito pra mim, o jeito como meu pau encaixa dentro de você, como nossas almas se completam — Seu pau pulsava, ele foi falando tudo isso enquanto me ajudava a subir e descer na jeba grossa.

— Eu também te amo, também sinto urgência em ter você dentro de mim e isso significa que estamos na mesma frequência. Eu sou seu, meu amor. Meu cheiro, meu beijo, meu corpo, tudo isso é seu também.

— Eu tô quase gozando de novo com você me olhando assim

— É que você está vendo que eu posso ser, na mesma pessoa, o amor da sua vida e o seu puto. Aquele que vai te dar prazer onde você quiser, quando você quiser e como você quiser. Seja de ladinho ou com seu pé na minha cara — Sorri.

Francisco afundou a boca no meu ombro e levantou comigo, ele me jogou na cama de quatro novamente e, com tapas na bunda e mordidas nas costas eu fui leitado mais uma vez.

***

A noite anterior tinha sido tudo — corpo, desejo, entrega. Ainda sentia o gosto dele na minha boca quando acordei. O cheiro da pele de Francisco ainda morava no travesseiro ao meu lado. Mas ele já tinha saído.

Me arrastei até a faculdade com a cabeça cheia e o corpo pedindo mais umas horas de cama. No intervalo das aulas, encontrei Lucas e Elisa sentados no banco de sempre, perto do jardim central, cada um com um copo de café na mão. Me sentei com eles e, entre um gole e outro, disparei:

— E então... como foi o encontro?

Lucas levantou uma sobrancelha com um sorriso debochado no canto da boca.

— Com Rafael? — ele perguntou, como se quisesse confirmar o que eu já sabia.

— Com o Rafael, claro. Vai me dizer que não foi encontro?

— Hm... foi interessante. Aquele homem tem um beijo que deixa a gente tonto. Mas não aconteceu nada além de uns amassos. — Ele deu uma pausa, olhando pra frente como quem revisita a memória recente. — E antes que você pergunte, não foi por falta de vontade. É que eu não quero mais coisa rasa. Se ele quiser, vai ter que mostrar que também quer algo de verdade.

Elisa soltou um gritinho discreto, batendo palmas com as pontas dos dedos.

— Meu Deus, isso sim é autoestima. E eu aqui... solteira, carente e sem ninguém pra me dar nem um beijo decente.

— Nem um beijo, Elisa? — Lucas riu. — Você precisa sair mais com a gente.

— Com vocês? E correr o risco de ver dois casais perfeitos e eu de vela? Tô fora — ela riu também, exagerando o drama com a mão no peito.

Eu me encostei no banco e soltei uma risada curta.

— Vocês são ótimos. Mas, falando sério, Lucas... você tá certo. Se ele quiser te pegar de verdade, vai ter que mostrar que vale a pena.

Ele sorriu. A cumplicidade no olhar me fez lembrar da noite anterior e do homem que, mesmo com todas as ausências, ainda me fazia sentir como se o mundo ganhasse sentido no toque dele.

Mais tarde, em casa, enquanto folheava um livro sem conseguir focar, ouvi a porta da frente se abrir. Levantei os olhos e encontrei Francisco entrando com um sorriso satisfeito no rosto. Rafael não estava com ele.

— O negócio é legítimo — ele anunciou, como se fosse uma vitória que vinha engasgada há semanas. — A gente vai começar a produzir pra exportação. Vai ser maior do que tudo que a gente já fez na fazenda. Vou precisar aumentar a força de trabalho.

Eu me levantei do sofá, sorrindo e indo até ele. O beijei, sentindo aquele orgulho misturado com alívio.

— Tô feliz por você. De verdade.

Bárbara, que estava por perto com um copo de suco, cruzou os braços com um sorriso orgulhoso.

— Eu tô... sei lá, tão feliz vendo você assim, irmão. Você tá se abrindo, tá amando. É bonito de ver.

Francisco a olhou, meio tímido, e a puxou pra um abraço de lado, sentando com ela no sofá.

— Eu sou fechado, vocês sabem. Mas... é uma mudança boa. Me sinto meio estranho às vezes, mas é como se... eu estivesse vivendo mesmo, pela primeira vez.

Olhei pra ele com carinho. Tinha tanto sentimento ali. Tanta coisa não dita que agora se revelava aos poucos.

— E quando você volta pra fazenda? — perguntei, com o coração já antecipando a resposta.

— Em dois dias. Rafael vai comigo. Agora ele é meu sócio nesse projeto novo. A gente vai precisar montar a estrutura certa. Tem muito trabalho pela frente.

Assenti com a cabeça. Não era surpresa, mas doía um pouco mesmo assim. Ainda assim, agora era diferente. Ele tinha dito que voltava. E eu acreditava.

Segurei a mão dele com firmeza e encostei meu ombro no dele.

— Só não esquece de mim lá.

Ele sorriu e apertou minha mão de volta.

— Esquecer você? Nem se eu quisesse, Samuel.

***

Francisco não me esqueceu. Muito pelo contrário — se fazia presente até quando não era necessário. Quase todo fim de noite, o celular vibrava com uma chamada de vídeo dele. E lá estava ele, descabelado, suado, às vezes com a camisa manchada de terra, mas com um sorriso que me fazia esquecer qualquer distância.

Mostrávamos nossas rotinas. Ele me mostrava o nascer do sol na fazenda, eu mostrava o caos do trânsito e da faculdade. Ele me contava sobre as máquinas que estavam chegando, eu falava da nova metodologia irritante de um professor. E sempre terminávamos com um: “Tô com saudade do seu corpo”, seguido de um riso sem vergonha e alguma descrição indecente do que faríamos um com o outro quando nos víssemos de novo.

E a gente fazia. Francisco passou a aproveitar qualquer ida à cidade pra me ver. Nem sempre dava tempo de vir até minha casa, então nos encontrávamos direto num motel perto da faculdade, um motel que virou nosso refúgio no meio do caos da cidade.

Mas nem tudo era brisa morna no campo.

Um certo incômodo começou a se plantar em mim, meio que sem pedir licença. Tudo começou com uns stories do Rafael. Ele adora fazer vídeos de tudo — churrasco com música alta, pôr do sol, um galo gritando no meio do nada. Até aí, tudo bem. Mas, em determinado dia, o celular dele mostrou um certo “cliente” novo da fazenda — um cara que parecia mais interessado em Francisco do que nas produções da fazenda.

E o pior: Francisco sorria. Aquele sorriso torto que, até então, era só meu.

Comentei por alto com Lucas, no corredor da faculdade. Estávamos nos escondendo do calor numa sombra qualquer, ele tomando uma garrafinha de água e eu remoendo minha neurose.

— Você viu os stories? — perguntei.

Lucas fez uma careta dramática, como quem já sabia aonde aquilo ia dar.

— Vi. E sim, o bofe tava sorrindo demais pro seu homem e pro meu futuro macho. Ou ele fechou o melhor contrato do ano... ou tá querendo pegar mais que a plantação, se é que me entende.

Suspirei fundo, como quem sabe que está sendo meio ridículo, mas mesmo assim continua.

— E o Francisco? Tá sorrindo também, né? Aquele sorriso de canto... aquele de quando ele tá querendo brincar de ser irresistível. Eu sei que ele tá querendo manter o negócio, mas tá me irritando.

Lucas assentiu com um gole de água.

— Se eu não conhecesse ele, diria que é charme de fazendeiro. Mas conhecendo como conheço, acho que é só charme mesmo.

Ficamos em silêncio por uns segundos. Até Elisa aparecer, se enfiando entre a gente com um milkshake enorme na mão.

— Gente? Que cara é essa? O que perdi?

Lucas resumiu tudo em três palavras:

— Ciúmes de macho.

— Machos com sorriso demais — acrescentei, dramático.

Ela soltou uma risada alta e deu um gole no canudo antes de encarar a gente com um olhar irônico.

— Vocês dois estão aqui chorando pelos cantos enquanto os caras de vocês estão lá, no campo, suando sem camisa, sendo seduzidos por gente de botina e calça apertada. Por que ainda não foram atrás?

— Elisa... — comecei.

— Não, sério. Vocês vivem falando de saudade, de tesão acumulado, de medo de perder. A faculdade tá na reta final, vocês já passaram nas primeiras provas. E olha esse calor! É o universo dizendo: ‘Vai pra fazenda, viado!’

Lucas e eu nos encaramos. Era uma ideia estúpida. Era impulsivo. Totalmente sem planejamento.

— Tô dentro — disse ele, num estalo.

— Eu também — respondi, sem nem fingir resistência.

Elisa deu uma piscadela vitoriosa e continuou tomando o milkshake como se tivesse acabado de vencer um reality show.

— Pronto. Agora vão atrás dos seus amores de novela. Só me tragam uma lembrancinha. Ou pelo menos uma foto decente do Francisco sem camisa.

— Você vai vir com a gente — Falei

— Vão pra onde, seus putos? — Bárbara apareceu rindo

— Pra fazenda, atrás dos machos deles — Elisa olhou pra ela com um sorriso irônico

— Graças a Deus, quero ver o meu macho também, não aguentava mais essas aulas malditas. Que dia? Que horas? — todos rimos.

***

A estrada de terra balançava o carro como se quisesse testar nossa decisão. Mas ninguém ali parecia hesitar.

— A única que sabe é a dona Marlene, né? — Elisa perguntou, esticando o pescoço pra ver a curva à frente.

— Sim — respondi. — E vai continuar sendo só ela. Quero ver a cara do Francisco me vendo chegar sem aviso.

— Vai ser a mesma cara que ele fez quando ouviu teus gemidos semana passada — provocou Bárbara, rindo alto. — Aquela parede é fina, viu, querido? Fina como a paciência que a gente tem quando vocês resolvem se amar às três da manhã.

— Eu não vou nem negar — confessei, rindo com a cara enfiada no volante, vermelho. — Mas pelo menos agora a gente vai ter mais espaço pra... enfim, vocês entenderam.

— Ai, não começa — disse Lucas. — Eu quero paz. E, quem sabe, um peãozinho sem camisa me oferecendo café.

— Ou Rafael te oferecendo algo mais que café, né? — completou Elisa, tirando gargalhadas do carro inteiro.

Foram pouco mais de cinco horas até chegarmos. Quando avistei a porteira e os contornos familiares da casa grande, senti meu peito apertar. Não era só saudade do lugar — era dele.

Estacionei o carro bem na entrada e dona Marlene apareceu, com o sorriso doce de sempre.

— Achei que iam desistir, menino. Chegaram cedo.

— Surpresa, né? Cadê o Francisco?

— Tá lá nos fundos, no novo galpão. Tá com o cliente novo.

Cliente novo.

Assenti e fui até lá, deixando os outros ajeitando as coisas com Marlene. Atravessei o pátio de terra batida e escutei vozes ao longe, vindo de dentro da estrutura recém-construída. Cheguei devagar, parando antes da porta escancarada.

Foi aí que vi.

Francisco estava em pé, ao lado de algumas ferramentas, conversando com um homem que nitidamente não era dali. Alto, bem vestido demais praquele ambiente, uma camisa social branca que deveria custar o triplo do que custava o meu tênis. Cabelos bem penteados, barba feita e um ar pretensioso no jeito de inclinar o corpo um pouco demais em direção ao meu namorado.

— Você devia pensar com mais carinho nessa ideia — ele dizia, com um sorriso que tinha veneno. — Se eu estivesse no seu lugar, não deixaria escapar uma oportunidade como essa.

Francisco sorriu, tenso. E aí, me viu.

Foi como se o tempo congelasse por um segundo. Ele se endireitou, surpreso. O outro homem me notou logo depois, virando com o mesmo sorriso que provavelmente usava pra seduzir garçons e investidores.

— Opa... — ele disse. — Temos companhia.

Me aproximei devagar, engolindo a vontade de jogar uma enxada em alguém. Respirei fundo e estendi a mão.

— Samuel. Noivo do Francisco.

Falei devagar, deixando a palavra noivo escorrer com um toque de provocação. Francisco tossiu disfarçadamente e mordeu um sorriso. Eu vi o brilho nos olhos dele. Ele tinha entendido o recado.

— Breno — o homem respondeu, me medindo com os olhos como se eu fosse um cavalo de leilão. — Prazer.

— Todo meu — respondi, sem tirar o sorriso. — Mas, com licença, vou precisar roubar meu noivo por uns minutinhos.

Toquei o braço de Francisco, que veio comigo sem hesitar. Breno nos acompanhou com o olhar até a porta, depois se virou com cara de quem queria morder uma cerca elétrica.

Assim que viramos a esquina do galpão, Francisco deu uma risada abafada.

— Noivo?

— Achei que precisava deixar claro — respondi. — Já vi aquele olhar antes. Só que, dessa vez, ele não vai passar nem do portão.

— Tá com ciúmes? — ele perguntou, me puxando pela cintura.

— Tô — admiti. — E não me orgulho, mas se aquele cara encostar mais um centímetro em você, eu viro um espantalho armado.

Ele riu e me beijou devagar, como quem agradece sem palavras. O gosto do campo e do reencontro.

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Comentários

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Um ciuminho bobo de vez em quando apimenta as coisas! 😜

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