Era sábado à tarde e o grupo tinha combinado juntar-se no café do costume, perto da praia, onde passavam os fins de tarde de verão, entre imperiais, batatas fritas e conversas meio tontas.
Júlio chegou… como Juliana.
Vestia uma blusa solta, translúcida, que deixava entrever a renda delicada do soutien. Uns calções curtos de ganga e sandálias de tiras finas completavam o visual. As pernas, bem cuidadas, cruzavam-se com leveza. O cabelo preso num rabo de cavalo alto, maquilhagem discreta, mas firme: lábios cor-de-vinho, olhos delineados.
Juliana sentia-se ela. Inteira. Vista.
Mário estava sentado ao fundo da mesa. Patrícia do lado oposto. Maria e Ana já tinham chegado, Rafael e Alexandre vinham a caminho. Inês ainda não tinha aparecido — e isso punha um leve nervo nos gestos de Juliana.
Ao aproximar-se da mesa, o grupo silenciou por breves segundos. O som das cadeiras, o tilintar dos copos… e o peso dos olhares.
Foi Maria quem quebrou primeiro:
— Estás linda.
Juliana sorriu, com sinceridade.
— Obrigada.
Ana acenou, um sorriso tímido nos lábios.
— A maquilhagem está incrível. Foste tu?
— Inês ajudou.
Patrícia observava-a. Com os olhos semicerrados, um sorriso que não era bem de aprovação, nem bem de crítica. Algo mais ambíguo. Quente. Desafiante.
Mário não disse nada. Mas também não desviou o olhar. Estava ali. Presente. A aceitar.
Rafael e Alexandre chegaram logo depois.
— Ó Júlio… tás mascarado, é? — atirou Rafael, com riso nervoso.
Alexandre soltou um "epá…" e ficou calado.
Juliana manteve-se serena.
— Não. Estou vestida.
— A sério, meu? — Rafael continuou. — Com soutien e tudo?
Patrícia levantou o sobrolho. Inclinou-se para a frente.
— Se não sabes lidar com beleza, Rafael, podes sempre olhar para a tua cerveja.
Risos contidos. Rafael encostou-se à cadeira, sem resposta.
Juliana agradeceu com o olhar. E continuou sentada. Tranquila. Digna.
Minutos depois, Inês chegou.
Viu Juliana. Sorriu. E, sem hesitar, beijou-a na boca. Um beijo suave. Cheio de pertença.
O grupo ficou em silêncio.
Mas já não havia nada a esconder.
Mais tarde, no pátio das traseiras da casa da Maria, o grupo estava disperso. Música baixa, copos meio vazios, cadeiras em círculo.
Patrícia puxou Juliana para o interior da casa.
Entraram no quarto de hóspedes. A porta fechou-se com um estalo.
— Impressionaste-me hoje — disse Patrícia, encostando-se à parede. — Firme. Linda.
Visível.
— Estava na hora.
— E sentes-te bem?
— Sim.
— Então vamos celebrar isso.
Patrícia aproximou-se, os olhos acesos.
— Sabes que ainda te quero. Não como provocação. Nem por ciúmes. Mas porque… há algo em ti que me puxa.
Como mulher. Como homem. Como Juliana.
Juliana encostou-se à cómoda.
— E o que queres?
— Quero provar que consigo fazer-te gozar com um dedo e meia palavra.
O sorriso dela era puro desafio.
Patrícia avançou, e o beijo foi imediato — selvagem, intenso. As mãos subiram pela blusa de Juliana, os seios apertados com firmeza. A boca desceu pelo pescoço.
Juliana gemeu, arfando.
— Hoje… usas tudo o que és — sussurrou Patrícia.
E fê-lo.
Despiram-se sem pudor. Patrícia ajoelhou-se, tocou, lambeu, provocou.
Juliana gemeu alto, depois tombou-a sobre a cama, puxou-lhe os calções, lambeu-lhe as coxas, penetrou-a com força, com prazer, com orgulho.
Ambas gozaram. Duas vezes. Três.
Depois deitadas, nuas, suadas, sorriram.
— Hoje — disse Patrícia, entre beijos no ombro — vi quem tu és. Toda. E não há volta atrás.
Os dias seguintes foram diferentes.
Juliana começou a sair como ela. Não só à noite, nem apenas entre os mais íntimos. Ia ao café com Inês ao fim da tarde, entrava em lojas com Patrícia, até passeava com Maria e Ana, ouvindo-as rir e perguntar com naturalidade sobre maquilhagem, saltos e, claro… sexo.
— E tu preferes que te tratem no feminino sempre? — perguntou Ana, uma tarde.
Juliana pensou por um instante.
— Gosto quando me tratam como me veem. E gosto que me vejam como me sinto… mesmo que nem sempre saiba explicar.
— Tu és quente. Isso já explica muito — atirou Maria, com um sorriso provocador.
Mas nem tudo era leve.
Na noite anterior à viagem, Mário e Inês tiveram a primeira conversa séria desde… tudo.
Estavam na cozinha, os outros já tinham subido.
— Vamos mesmo ignorar que andamos a partilhar a mesma pessoa? — perguntou Mário, direto.
Inês suspirou, sem surpresa.
— Não andamos a partilhar. Estamos a amar… de formas diferentes.
— Mas é o mesmo corpo. A mesma boca. O mesmo gemido no escuro.
— E a mesma alma. E tu sabes disso, Mário.
Ele encostou-se à bancada. O olhar era carregado.
— Eu nunca te vi assim. Tão… calma.
— Porque eu sei que ela me ama. E isso dá-me paz.
Tu estás apaixonado, Mário?
Silêncio.
— Talvez. Não sei o que é isto. Só sei que, quando ela está por perto… não penso em mais ninguém.
— Então ama-a como ela precisa. Mas não me peças para me afastar. Porque eu… sou a raiz dela. E ela, a minha.
O grupo chegou à casa de campo numa sexta-feira de tarde.
O lugar era lindo: uma antiga casa de pedra, recuperada, junto a um rio calmo. Havia um grande terraço com cadeiras e redes, janelas amplas, e três quartos duplos. A cozinha cheirava a madeira e vinho velho.
As divisões foram feitas com naturalidade... até certo ponto.
— Eu fico com a Inês — disse Juliana, com um sorriso leve, já de top e calções curtos.
— Claro — respondeu Ana, como se fosse óbvio.
Maria ficou com Ana, Rafael com Alexandre. Mário… sozinho.
— Posso dormir no sofá — disse ele, mas ninguém respondeu logo.
— Ou… — começou Patrícia, com um sorriso — dormes connosco.
Os olhos de Juliana e Inês encontraram os dela.
— É só para não te sentires… deslocado — completou Patrícia, maliciosa.
Ao jantar, o vinho fluía. As pernas roçavam-se por baixo da mesa. Os olhares tornavam-se mais demorados. A conversa girava em torno de nada… e de tudo. E os corpos falavam muito mais do que as palavras.
Juliana estava sentada ao lado de Inês, a perna nua colada à dela. Mário, em frente, não desviava o olhar. Patrícia, à esquerda de ambos, soltava gargalhadas baixas e tocava no braço de Juliana sempre que podia.
— Isto parece uma dessas novelas proibidas — comentou Maria, a rir.
— E vocês ainda não viram nada — respondeu Patrícia, levantando o copo.
Mais tarde, no terraço, com o céu cheio de estrelas e os copos quase vazios, a tensão era palpável.
Juliana dançava ao som de um rádio antigo. O vestido fluía-lhe pelo corpo, os saltos batendo levemente na pedra. Inês observava, olhos brilhantes. Mário fumava devagar. Patrícia aproximou-se, com o olhar felino.
— Vais incendiar esta noite?
Juliana parou de dançar. Aproximou-se de Patrícia. Tocou-lhe no rosto.
— Talvez. Ou talvez me deixem arder em conjunto.
— O quarto é grande — disse Patrícia, baixinho, com um sorriso.
— E o desejo também.
No quarto, mais tarde, a porta fechou-se.
Três corpos.
Três vontades.
E uma só certeza:
Nada voltaria a ser o que era.