Parte 6.
Da série: Maha – esposa e atriz
Enquanto o garçom colocava as travessas com a nossa comida eu fiquei calado. Aproveitei aquela interrupção, para recuperar um pouco do equilíbrio emocional diante do que a Maha acabara de me dizer. As palavras ficaram vívidas na minha mente:
“Eu quero te pedir para me deixar ficar uma noite de sexo com o Gênio. Tem que ser logo. Precisamos nos livrar desse desejo que vem crescendo e atrapalhando tudo. Não sinto amor por ele, sinto uma forte atração sexual e o desejo de matar essa vontade.”
Esperei que o garçom se afastasse e disse:
— Vamos jantar. Eu estava certo desde o princípio, e minhas intuições se provaram corretas. Tudo bem. Primeiro a gente janta, com calma, e depois, vamos resolver isso…
Percebi que a Maha ficou incomodada com aquela minha colocação. Mas entendeu a necessidade de não avançar naquela conversa.
Começamos a comer, em silêncio, mas eu senti que a Maha parecia mais aliviada por ter falado e assumido o problema.
Entendi que aquele momento de pausa, enquanto comíamos, ajudou a ambos a refletirem melhor sobre a questão que estava colocada e eu sabia o que deveria dizer. Minha mente volta e meia se recordava dos momentos deliciosos que eu havia passado no sexo com a Shakira. Aquilo me fazia lembrar a letra de Amor e Sexo, da Rita Lee e do Roberto de Carvalho (com parêntesis meus):
Amor é um livro
Sexo é esporte
Sexo é escolha
Amor é sorte
Amor é pensamento
Teorema
Amor é novela
Sexo é cinema
Sexo é imaginação
Fantasia
Amor é prosa
Sexo é poesia
O amor nos torna
Patéticos
Sexo é uma selva
De epiléticos
Amor é cristão
Sexo é pagão
Amor é latifúndio
Sexo é invasão
Amor é divino
Sexo é animal
Amor é bossa nova
Sexo é carnaval
Oh, oh, uh
Amor é para sempre (e incondicional)
Sexo também (irracional)
Sexo é do bom
Amor é do bem
Amor sem sexo
É amizade
Sexo sem amor
É vontade
Amor é um
Sexo é dois
Sexo antes
Amor depois
Sexo vem dos outros
E vai embora
Amor vem de nós
E demora
Amor é cristão
Sexo é pagão
Amor é latifúndio
Sexo é invasão
Amor é divino
Sexo é animal
Amor é bossa nova
Sexo é carnaval
Oh, oh, uh
Amor é isso
Sexo é aquilo
E coisa e tal
E tal e coisa
Uh, uh, uh
Ai, o amor
Hum… o sexo
Não consegui evitar um sorriso interior ao me lembrar daquela letra, para mim uma das mais perfeitas que eu já vi sobre o tema.
Depois de estarmos comendo, por uns dez minutos, que pareceram meia hora, eu disse:
— Como eu disse, está tudo bem. Estou de acordo. Isso elimina dúvidas, desconfianças e suspeitas, e deixa tudo às claras. Eu prefiro assim.
— Você está de acordo? – Ela perguntou.
— Quero apenas que o Gênio fale comigo antes. Não pode haver nada dissimulado entre nós, e do mesmo modo que você teve a sinceridade de me dizer, eu quero a mesma atitude dele. – Falei.
Maha me olhava, e seu olhar era de surpresa, e até de espanto. Notei que ela estava um pouco pálida e resolvi acalmá-la:
— Fique tranquila, não vou brigar com ele. Entendo perfeitamente tudo, e sei que ele respeitou e foi resistente até onde pode. Mas você é mesmo irresistível e ele também deve ser muito interessante aos olhos de uma mulher.
Maha estava sem palavras. Ficou me observando por alguns segundos e perguntou:
— O que foi que aconteceu? Você mudou muito…
Fui rápido:
— Chegamos ao terreno das verdades, e não das suposições, estamos atingindo o ponto de sermos sinceros, claros e verdadeiros com nossos sentimentos e com os outros. Isso me dá uma grande tranquilidade. Agora, é o momento de viver a vida de verdade.
Senti que ela acusava o golpe. Ligeiros trejeitos de emoção, tensão e tristeza no seu semblante revelavam que ela estava emocionada. Ela disse:
— Querido, eu te amo. Por favor, eu não queria te magoar nem ofender, nem te deixar abalado. Não sei como fazer essas coisas, a única coisa que eu sei é que estou sendo sempre muito sincera e verdadeira.
Respondi:.
— Eu fico feliz, pois é isso que eu espero. Demorou para chegarmos neste ponto…
Maha sentiu a cutucada:
— Sempre fui sincera, e digo a verdade. Nunca escondo nada. Mas, as situações mudam, foram mudando, e é sobre isso que estou falando. – Ela disse.
— Está bem, vou considerar que até ontem a situação era uma, e hoje essa situação mudou. Perfeito. Também não altera nada. Eu estou lhe dizendo que sendo sempre sincera, verdadeira e sem omitir nada, estarei sempre disposto a aceitar o que tu desejar. – Respondi.
— Mas, até ontem estava muito indeciso, inseguro, e incomodado. – Ela falou.
Eu sabia que ela temia ter me ferido e magoado. Devolvi quase do mesmo jeito:
— Sempre fui sincero, e falando a verdade. Nunca escondi nada, até como me sentia. Estava mesmo inseguro. Mas, as situações mudam, concordo, e é sobre isso que estou falando. Eu mudei hoje. Entendi que estava lutando conta o inevitável. E por bobagem.
— Acha que o nosso casamento é bobagem? – Ela perguntou.
Maha era esperta, não queria ficar a descoberto, e era ela que estava insegura, agora, pois não estava entendendo o que se passava comigo. Respondi:
— Pelo contrário, tudo o que sempre fiz e falei, e lutei, é pelo nosso casamento se salvar, sem feridas. E reconheço que algumas trincas sempre serão inevitáveis.
Maha parou, parecia confusa, e depois de uns segundos, disse:
— Não sei, sinto que tu ficou diferente mesmo. Mais frio. Será que eu estou cometendo um erro?
Eu reuni toda a coragem que eu tinha, para lhe dar o cheque mate:
— Absolutamente. Não acho. Na verdade, tu está apenas indecisa e ansiosa, também com medo de dar esse passo, com receio de me afetar, de nos afetar, mas eu te digo que não. O caminho está livre.
Dei uma pausa, esperei que ela assimilasse a frase, e falei:
— Minha insegurança acabou hoje, bastou um dia, bons conselhos, uma visão mais equilibrada e experiente do Melga me mostrar as coisas mais claramente, e eu entendi muito melhor tudo isso. E reconheço que o melhor para ambos, é vivenciar mesmo essa tua vontade, ir a fundo, saber o que isso afeta, muda ou provoca, e tu sairá inteira, mais experiente.
Maha me olhava, admirada. Murmurou:
— Você está me assustando. Nunca te vi tão frio e distante.
Falei:
— Não te preocupe. Estou apenas mais seguro. Vamos ao que interessa. Quando quer fazer isso? Hoje? Basta tu ligar para o Gênio e pedir para que ele fale comigo.
Maha ficou mais assustada com a minha atitude tão incisiva.
Ela se serviu de mais um pouco de comida, comeu, calada, remoendo os pensamentos.
Lá longe, ao fundo, no sistema de som do restaurante, eu podia ouvir uma música. Identifiquei na hora. Pela sincronicidade da lei de Murphy, era uma boa trilha sonora do que se passava ali. “Você não entende nada” – do Caetano Veloso.
Quando eu chego em casa nada me consola
Você está sempre aflita
Lágrimas nos olhos, de cortar cebola
Você é tão bonita
Você traz a Coca-Cola eu tomo
Você bota a mesa, eu como, eu como
Eu como, eu como, eu como…
Você… Não está entendendo
Quase nada do que eu digo
Eu quero ir-me embora
Eu quero é dar o fora
E quero que você venha comigo
E quero que você venha comigo
Eu me sento, eu fumo, eu como, eu não aguento
Você está tão curtida
Eu quero tocar fogo neste apartamento
Você não acredita
Traz meu café com suíta, eu tomo
Bota a sobremesa eu como, eu como
Eu como, eu como, eu como…
Você… Tem que saber que eu quero correr mundo
Correr perigo
Eu quero é ir-me embora
Eu quero dar o fora
E quero que você venha comigo
Era incrível como aquelas palavras nos passavam mensagens subliminares conforme a situação que vivemos.
Eu estava pensando que, por mais que gostemos de uma pessoa, e eu adorava minha mulher, quando somos colocados à prova, e confrontados com a possibilidade de sermos trocados, ou substituídos, mesmo que seja por um momento, acontece um processo de autodefesa, que nos desenvolve uma capacidade de competir, de lutar e de superar a situação, de uma forma tão forte, que havia me lavado a ter uma tarde de sexo intenso e delicioso com a Shakira, por puro desejo de assumir meu tesão, sem necessariamente sentir nada mais do que simpatia e tesão por ela, mas eu reconheci que era um impulso de autoafirmação, de superação, para sair da posição fragilizada em que fiquei. Ao mesmo tempo, me deu a dimensão de que eu gostava efetivamente muito da Maha, e nem por isso, deixei de gostar bastante da baianinha. Não tanto como eu gostava de minha esposa, mas se a Maha me desiludisse ou menosprezasse, eu perfeitamente me defenderia, não sem sofrer bastante, mas, mudando meu foco de afeto.
Aqueles pensamentos voavam na minha cabeça em milésimos de segundo, enquanto via a Maha comendo, calada, pensando no que dizer ou fazer. Ela finalmente falou:
— Tu está me empurrando para o precipício?
Sou um publicitário, especialista em marketing, sei muito bem conduzir processos de tomada e decisão. Neguei com a cabeça. Amenizei minha resposta:
— Estou do teu lado, querida. Cúmplice e apoiando teu desejo. Apenas quero que as coisas sejam feitas de forma correta, abertamente, assumidamente, e rapidamente, pois tu mesmo disse que estava levando a um impasse no vosso processo de trabalho. E no nosso também.
Maha estava ficando encantoada, e eu sabia. Talvez, ela sentiu que pela primeira vez eu realmente tivesse perdido a mágica do encantamento que sempre demonstrei com ela. E isso podia tê-la assustado.
Ela não sabia da minha experiência libertadora com a Shakira naquela tarde. E por isso, no fundo, tinha medo de que o cristal da paixão se tivesse quebrado. E eu estava certo pois ela falou:
— Eu queria ficar contigo hoje, senti vontade de estarmos juntos. Estamos num jantar romântico, a dois, pensei em ir contigo para casa. Estou vendo um abismo se abrir entre nós, e estou perdida.
Respondi:
— Acho que você e o Gênio ficaram realmente com desejo, tesão, e não podem continuar sem resolver isso. Pode ser ótimo para os dois. Acredite, eu sei que sexo é bom e ambos são bons amantes. Acho que merecem esse prazer. O que acontece depois, só se sabe depois. Então estou achando que o melhor é resolverem logo.
Maha me olhava meio embaralhada. Nunca esperava aquela resposta.
Eu não precisava tripudiar. Naquele momento, entendi o Melga, profundamente. Eu estava no poder, e não precisava fazer chantagem. Fui bastante sincero:
— Maha, hoje eu confesso que não vou conseguir dormir contigo, nem tenho vontade. Os acontecimentos me deixaram assim. Estou a zero, sem libido alguma. Entenda meu estado. Enquanto tu não fizer o que me disse que está com vontade, enquanto o Gênio não assumir claramente o que ele deseja, falando diretamente comigo, como homem e amigo, eu não vou relaxar mais. Acho que os dois também não. Não quero mais viver sob a sombra desse fantasma. Já me fez mal, mas eu reprocessei tudo.
Fiz uma pausa, respirei fundo e disse:
— Hoje foi um dia libertador. Quero que façam o que querem fazer, e somente depois disso, estaremos em condições de retomar as coisas normalmente.
Notei que a Maha sentia o impacto, ficou lívida, depois endureceu o semblante. Afastou os talheres e encerrou a refeição.
Em seguida, fez um movimento de apertar os lábios, que eu sabia que era sinal de que estava um pouco contrariada. Eu sabia que ela iria fazer o que desejou, até por orgulho e para não ter que desistir de tudo. Vi que ela pegou o telefone celular na pequena bolsinha que levou, e fez uma chamada.
A comida estava a meio, pois havíamos interrompido o jantar. Gênio atendeu e ela falou:
— Estou jantando no Arab da Lagoa, com o “Sa”. Conversamos bastante, falei a ele o que aconteceu, e ele concordou, desde que tu venha dizer a ele pessoalmente o que deseja fazer.
Vi que ele fazia algum comentário, ou alguma pergunta. Maha respondeu:
— Está calmo. Até demais. Admirei. – Ela deu uma pausa, ouvindo.
— Tem que ser hoje, agora, se tu realmente quer. Ou talvez não seja nunca mais.
Ela ouviu o que ele respondeu, e agradeceu:
— Obrigada. Vamos aguardar.
Ao desligar o telefone eu vi que suas mãos tremiam. Eu perguntei:
— Está assustada, com medo do quê? Não era assim mesmo que desejava?
Maha ficou calada. Vi que se esforçou para não chorar. Perguntei se havia terminado e se queria alguma sobremesa. Ela agradeceu. Eu pedi a conta e um café, e ela quis também.
Ficamos ali sentados, olhando um para o outro, por uns trinta minutos. Nesse tempo o garçom trouxe a conta e os cafés. Eu paguei com meu cartão. E avisei que esperaria uma pessoa ali na mesa. O garçom disse que ficássemos à vontade. O restaurante não estava muito cheio mesmo. Tomamos o café.
Não satisfeita a Maha perguntou:
— Querido, não estou te reconhecendo. O que aconteceu? Tu está com raiva, está revoltado e disfarçando? Está me detestando por isso?
— Nada disso. Sempre gostei e gosto muito de ti. Acho que realmente eu mudei, perdi o medo, perdi a insegurança. Vou lhe dizer apenas um pouco do que ouvi hoje. Uma lição fundamental.
Fiz um ligeiro suspense e disse:
— Mulheres dormem com quem elas querem, homens dormem com quem eles conseguem, mas homens se casam com quem eles querem, e mulheres se casam com quem elas conseguem”.
Maha me olhava admirada. Tal como eu fiquei na praia de tarde. Eu continuei:
— Uma garota bonita pode fazer sexo quando quer sem nenhum esforço, basta ter vontade, olhares a seguem, desejos a perseguem, portas se abrem.
Fiz uma pausa de respiração:
— Ela se deita com quem ela desejar, basta seu olhar aceitar o interesse e permitir. Mas, quando ela quer um anel, um compromisso, uma parceria, o jogo fica diferente.
Fiquei alguns segundos esperando que ela pensasse naquelas palavras. Retomei:
— Homens querem o acesso ao sexo, e as mulheres controlam esse acesso. Mas, os homens é que controlam o compromisso. E as mulheres no fundo, querem conquistar o compromisso.
Maha era inteligente e rápida. Falou:
— Nem todas. Isso é um modelo meio antigo.
Eu prossegui:
— Muitos ainda pensam assim. Existem muito menos homens decentes que valem a pena um compromisso, do que mulheres insatisfeitas, que são muitas e estão carentes. O compromisso é que é o verdadeiro poder. A mulher, de fato, não precisa do homem, se não quiser, nem do compromisso, mas, se ela quiser ter um compromisso com um homem, depende de ele querer.
— Bem, isso é verdade. Mas muitos querem tanto quanto a mulher. – Ela respondeu.
Eu continuei:
— É o meu caso. Eu quis. Um homem se torna mais valioso após anos de lutas, crescimento, evolução e conquistas. Uma vez que ele se torna um homem dono de poder e recursos, é ele quem pode escolher. Mulheres podem também alcançar isso, independentemente de tudo e de terem ou não um homem. Mas, muitas das mulheres se acostumaram a serem buscadas, e seguidas, e confundem atenção e interesse, com valor.
Maha, rapidamente esclareceu:
— Existem mulheres e mulheres. Não me enquadro.
Eu fiz um sinal de positivo e falei:
— Escute a lição que eu ouvi… Porém, quando o relógio da vida dá o sinal, avisando que elas estão passando da sua metade vital, muitas delas começam a correr atrás, querem um parceiro, para um compromisso.
Parei, respirei e disse:
— Elas não desejam não se sentirem escolhidas, eleitas, e as donas do compromisso. A verdade, é que a mulher pode dormir com cem homens, o que pode ser muito bom e prazeroso, mas, nenhum deles a vai assumir, a menos que ele queira. Enquanto isso, um homem que construiu a si mesmo, antes de tudo, pode escolher uma parceira como um rei, que escolhe sua rainha. Mas ela também pode deixar de querer esse posto, quando menos se espera. Pode ser que um rei não lhe baste. Faz parte.
Maha se mostrava meio incomodada. Disse:
— É uma espécie de ameaça para mim?
— Não, estou contando a lição que eu ouvi hoje, são as regras do jogo, ouvir isso que me ajudou a me sentir seguro, e a ter a coragem de assumir e aceitar aquilo que tu tem vontade. Eu já fiz o compromisso contigo, e escolhi a minha rainha. - Falei.
Naquele momento ouvimos o motor da Moto do Gênio que estacionava na calçada em frente ao restaurante. Vimos que ele trazia dois capacetes. Ele os prendeu na moto e se afastou vindo em nossa direção.
Continua na parte 7.
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