Um novo começo 10

Da série Um novo começo
Um conto erótico de Muito mais do que apenas sexo
Categoria: Heterossexual
Contém 1814 palavras
Data: 30/07/2025 23:54:52

# Um Novo Começo – Capítulo 10

Dois meses.

Na guerra, dois meses podem ser uma vida inteira ou um piscar de olhos. Aqui, na estranha paz podre da ilha, foram ambos. Uma eternidade de dias longos e silenciosos, que passaram voando como se fossem um só.

Dois meses desde que voltamos da cidade com os remédios. Andrews se recuperou bem, o braço já quase sem a tala, as costelas curadas. Fisicamente, ele estava quase novo. Mas algo mais se quebrou naquela noite, e essa fratura, eu sentia, era permanente.

O silêncio na nossa casa se tornou uma quarta pessoa, sentada à mesa conosco durante o jantar, deitada na rede ao lado da minha durante a noite. Andrews fala comigo, mas é diferente. As piadas são forçadas, os olhos dele não encontram os meus por muito tempo. Ele conversa com os outros pescadores, ri, mas quando se vira pra mim, uma cortina de gelo desce.

Kyle é pior. Ela mal fala. Vive em um mundo próprio de trabalho e cuidados com o Andrews. Às vezes, eu a pego me olhando da cozinha, os lábios entreabertos como se fosse dizer algo... mas as palavras morrem antes de nascer. Ela se vira e volta a lavar um prato, me deixando com o fantasma de uma conversa que nunca acontece. Eu sei que ela está confusa, tentando manter a paz com o Andrews, mas o gelo dela me congela por dentro.

A única coisa que mudou para melhor foi a ausência de Alberto. Ele sumiu do mapa. Ninguém o vê no armazém, no cais. Ninguém sente falta, mas todos estranham. É como a calmaria antes da tempestade, e meu treinamento me ensinou que a calmaria é, muitas vezes, o prenúncio do inferno.

## Casa de Ana e Carla – 07:30h

A luz da manhã entrava pela janela, iluminando a poeira que dançava no ar. Ana observava a mãe organizar alguns frascos de ervas, as mãos inquietas.

“Mãe...”

“Diga, meu amor.”

“Eu... eu vou fazer hoje.”

Carla parou, virando-se para a filha. Um sorriso suave, mas conhecedor, surgiu em seus lábios. “Tem certeza?”

“Tenho,” Ana respondeu, a voz um pouco trêmula, mas firme. “Eu não aguento mais ver ele assim. Perdido. Sozinho, mesmo rodeado de gente. A Kyle e o Andrews o estão empurrando pra longe, e ele tá se afogando na tristeza deles.” Ela respirou fundo. “Ele precisa de algo bom. Algo real. Precisa ver que existe um futuro aqui pra ele. Um futuro... comigo.”

“E você acha que levá-lo à árvore vai mostrar isso a ele?”

“Vai,” Ana disse, os olhos brilhando com uma determinação feroz. “Vai mostrar que eu confio nele. Que eu quero construir a *nossa* história, não viver à sombra da deles. É hoje, mãe. Hoje eu vou levá-lo à árvore.”

Carla se aproximou e abraçou a filha com força. “Então vá, minha menina corajosa. Só... tome cuidado. O coração de um homem ferido é um terreno perigoso.”

## Casa de Andrews, Kyle e Gabriel – 08:15h

Uma batida forte na porta nos encontrou no meio de um café da manhã silencioso.

“Gabriel! Tenho um aviso pra vocês!” a voz de Vitor Luis soou urgente.

Abri a porta. “Opa, Vitor. O que foi?”

“Olha, hoje não é pra ir trabalhar. Vai ter algum tipo de reunião lá na escola, e todos os trabalhadores têm que estar lá às nove em ponto. Avisa ao gringo, ok?”

“Ok, eu aviso,” respondi, a mente já trabalhando. Reunião obrigatória? “Sabe do que se trata? É coisa do Alberto?”

Vitor coçou a cabeça, parecendo tão perdido quanto eu. “Sendo bem sincero, até eu estou no escuro. Fui pego de surpresa também. Não tenho detalhes. Mas vamos ver, né?”

## Escola Nova Esperança – 09:12h

O pátio da escola estava lotado. O ar pesado de umidade e apreensão.

“Estranho... Tá praticamente toda a comunidade aqui,” eu disse para Andrews, que estava ao meu lado, desconfortavelmente perto e, ao mesmo tempo, a um milhão de quilômetros de distância.

“Sim. A última vez que vi isso foi quando o marido da Carla morreu...” ele respondeu, a voz baixa.

A multidão cochichava, nervosa. O medo era de que Alberto tivesse inventado uma nova forma de nos foder. Então, a porta da direção se abriu.

O silêncio foi imediato.

A mulher que saiu não andava, ela deslizava. Vestida com uma calça de linho branca e uma blusa de seda azul-claro, Isabela parecia uma aparição. O cabelo preso num coque perfeito, o rosto sereno, quase angelical. Ela não pertencia àquele lugar de suor, lama e desespero. Era como uma santa descendo para andar entre os pecadores, e isso, de alguma forma, era mais intimidante do que qualquer arma.

“Olá. Bom dia a todos.” A voz dela era suave, mas cortou o ar como uma lâmina, alcançando cada canto do pátio. “Eu vejo alguns rostos conhecidos, mas sei que muitos não me conhecem. Eu sou Isabela Ferreira. Pelo meu sobrenome, vocês devem saber que sou da família dona do armazém. Mas não só isso. Eu sou filha do governador e a responsável direta pela distribuição de provisões para esta comunidade.”

Um murmúrio chocado percorreu a multidão. Filha do governador. Olhei para um canto e vi Alberto, encolhido perto de uma parede, a cara fechada, parecendo um cão chutado.

“Eu já fui muito mais presente aqui,” ela continuou, o tom carregado de um arrependimento perfeitamente ensaiado. “Mas, há alguns anos, tive uma doença de pele que me forçou a me afastar. Eu passei o controle ao meu marido, Alberto. Admito que me acomodei e não retomei meu lugar. Por essa negligência, eu peço perdão a vocês.”

As pessoas se olharam, atônitas. Um Ferreira. Pedindo perdão.

“Eu tive informações de que a comunidade tem sido mal gerida...” Nesse momento, ela lançou um olhar rápido e gélido na direção de Alberto, que se encolheu ainda mais. “...e que coisas terríveis têm acontecido aqui. Coisas que não eram do meu conhecimento. Mas tudo isso irá mudar. A partir de hoje, eu estou retomando a gestão de tudo. E garanto a vocês que as coisas irão melhorar.”

Ela parecia sincera. Mas meu treinamento me ensinou que discursos perfeitos são para os manipuladores ou para os mortos.

“Em tempos de mudança, quero formar uma nova equipe,” ela anunciou. “Quero que venham aqui na frente a professora Kyle, o pescador Andrews, e a médica Carla.”

Meu coração deu um pulo. Andrews me olhou, completamente confuso. Kyle, perto de Carla, parecia aterrorizada. Hesitantes, os três foram até a frente.

“A professora Kyle será a nova diretora da Escola Nova Esperança. O pescador Andrews, o novo gerente do armazém e dos pescadores, substituindo o senhor Vitor Luis, a quem agradecemos. E a médica Carla continuará responsável pela saúde, mas ganhará um local de trabalho adequado, como antigamente. As obras começam imediatamente.”

O queixo de Kyle caiu. Andrews estava pálido, de boca aberta. O povo, após um segundo de choque, explodiu em uma comemoração confusa.

“E mais,” Isabela disse, erguendo a mão. “Todos os presentes aqui ganharão três cestas básicas, das completas. Este, agora, será o padrão.”

A celebração se tornou total. Gritos de “Viva a senhora Isabela!” ecoavam. Mas eu não conseguia sorrir. Meus olhos foram de Vitor Luis e Ivone, ambos com expressões chocadas e magoadas, para Kyle and Andrews, assustados e sobrecarregados. *É uma tática de guerra clássica,* minha mente gritou. *Decapitar a liderança antiga e experiente e instalar um governo fantoche, jovem, inexperiente e, acima de tudo, em dívida com você.*

Eu já estava me retirando, o estômago revirado, quando uma mão tocou meu ombro. “Gabriel. Eu não me esqueci de você. Venha comigo, por favor.”

Ela me levou até uma sala de aula vazia e trancou a porta. O som da chave girando foi sinistro.

“A sua *Kyle*,” ela disse, me estendendo a pistola com um sorriso enigmático, “é sua novamente.”

“Agradeço por cumprir sua palavra,” eu disse, pegando a arma, o peso familiar em minha mão.

“É o mínimo. Se não fosse por você, eu não saberia da situação.” Ela se sentou na beira de uma mesa, cruzando as pernas. Uma postura relaxada, mas seus olhos eram como os de um predador. “O que achou das novidades?”

“O povo está feliz...”

“Eu não perguntei do povo. Perguntei da *sua* opinião, Gabriel. Você é um homem que observa. O que você viu lá fora?”

*Ela está me testando.* “Eu vi uma mudança de poder. Rápida. Decisiva.”

“Exato,” ela sorriu. “E por que retirar a Ivone e o Vitor? Eles são competentes.”

“Competência não é o mesmo que lealdade. Ou eficácia,” ela retrucou, friamente. “Kyle tem qualificações superiores e uma paixão que a Ivone perdeu há muito tempo. E Vitor... Vitor viu a corrupção do meu marido por anos e não fez nada. Não quero fracos sob meu comando. A passividade dele não é a imagem que quero inspirar. Eu preciso de pessoas que agem. Como você.”

A forma como ela disse "você" me deu um calafrio.

“E o Andrews?” perguntei. “Ele não tem experiência para gerenciar o armazém.”

“Não. Mas ele tem uma dívida de gratidão comigo agora. E tem você para aconselhá-lo.” Ela se levantou, caminhando lentamente em minha direção. “Eu não preciso de experiência, Gabriel. Eu preciso de controle.”

Ela parou a centímetros de mim, o perfume dela sutil, caro. “Isso é tudo. Você faz parte dessa mudança. Goste ou não.”

Saindo de lá, encontrei Carla no corredor. Ela parecia ter envelhecido dez anos em uma hora.

“Parabéns, Carla! Agora não terá que usar sua casa.”

“É, verdade...” ela disse, o olhar perdido. Ela agarrou meu braço, a mão dela fria como gelo, e me puxou para um canto.

“Tudo bem, Carla? Você não está feliz?”

“Feliz?” ela riu, um som sem alegria. “Gabriel, escuta,” ela sussurrou, olhando para os lados. “Eu conheço o Alberto. Ele é um monstro, mas é um monstro previsível. Essa mulher... ela é diferente. Ela é veneno em uma garrafa de vinho caro.”

“O que você sabe, Carla? Me fala.”

“Eu não posso,” ela disse, os olhos cheios de um medo que eu nunca tinha visto nela. “Só... toma cuidado. Sabe, Gabriel, eu prefiro mil vezes lidar com um cachorro que late e mostra os dentes, do que com um que fica em silêncio, abanando o rabo... até te morder a garganta.”

Ela soltou meu braço e saiu apressada, me deixando com o peso daquele aviso. Eu ia procurar Kyle e Andrews, but antes que pudesse dar um passo, Ana veio correndo em minha direção, um sorriso que era a única coisa genuína naquele dia.

“Ei!” ela disse, me puxando pela mão. “Quero te mostrar um lugar. Agora.”

“Agora? Mas e toda essa confusão?”

“Não tem momento melhor,” ela insistiu, os olhos brilhando com um segredo.

A curiosidade e a necessidade de fugir daquela atmosfera pesada me venceram. Eu a segui. O convite dela era a única coisa que fazia sentido naquele dia caótico.

*Continua no próximo capítulo...*

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