A tela do celular ainda tremia.
Ketrin me encarava do outro lado da chamada de vídeo, com aquela expressão que misturava provocação e ternura. Os olhos levemente puxados ardiam de malícia. Os cabelos escuros, soltos, escorriam úmidos pelas curvas nuas dos ombros, e parte dos seios escapava pela lateral da toalha frouxa. Ela estava deitada, mas o corpo se movia, inquieto, como se aquela fosse a última noite de distância — e cada músculo soubesse disso.
— "Você tem noção do que vai acontecer quando eu descer desse ônibus, né?" — sussurrou, mordendo o canto da boca.
Ergui o envelope que estava sobre a cama. Dentro, a passagem. Ida Corumbá – Rio. Assento 27. Nome dela impresso, já confirmado.
— "Já te comprei, Ketrin. Essa viagem é mais que sua. É nossa."
Ela riu com o canto dos olhos, aquele riso baixo que me atravessava o peito.
— "Você me quer tanto assim?"
— "Quero você inteira. Aqui. Agora."
Com a outra mão, a que não segurava o celular, ela deixou os dedos deslizarem pelas coxas. Lentamente. A toalha cedeu e caiu. A câmera tremeu, mas o suficiente pra eu ver a pele dela se arrepiando.
— "Espero que seu corpo aguente tudo o que o meu quer dizer..." — ela sibilou, com a voz falhada pelo desejo.
— "Vou te deixar marcado. Vai implorar pra eu nunca mais voltar pra Corumbá."
A ligação caiu no instante em que ela soltou um gemido abafado, trêmulo, como se estivesse me entregando um pedaço do seu prazer antes de partir. Fiquei ali com a respiração presa e os olhos fixos na tela escura, sentindo o gosto do que ainda não havia acontecido.
Dois dias depois, o Rio amanheceu suado.
O relógio da rodoviária marcava 07h42 quando o ônibus da Andorinha estacionou. Era o primeiro da manhã vindo do Mato Grosso do Sul. Meu coração disparou ao vê-lo. Não pelo ônibus em si, mas por saber que ali, entre dezenas de passageiros, vinha ela. Ketrin. Real. Depois de meses de encontros virtuais, de noites ardentes entre telas, ela enfim respiraria o mesmo ar que eu.
O portão lateral se abriu com um estalo. As pessoas começaram a descer, arrastando malas, sonos, cansaços. E então eu a vi.
Ela vestia um vestido longo e solto, florido, que dançava ao redor das pernas como se o vento a reconhecesse. O cabelo preso num coque malfeito, alguns fios caindo. A pele cor de sol, olhos pequenos que procuravam — até que me encontraram.
O mundo parou por um segundo.
Ela não sorriu. Nem eu. Só caminhou na minha direção, decidida. Os passos lentos. A boca entreaberta. O calor do asfalto subia entre nós como se o Rio todo estivesse conspirando para incendiar aquele momento.
Quando parou na minha frente, não disse nada.
Estendi a mão. Ela segurou firme. A mala caiu aos pés dela.
— "Me beija." — sussurrou, sem cerimônia.
— "Aqui mesmo?"
— "Foda-se."
E foi ali, entre ônibus, buzinas e vozes, que nossos lábios se encontraram pela primeira vez. A boca dela era doce, quente, urgente. Nossas línguas se reconheceram como velhas conhecidas de uma guerra que já tinha nome: saudade.
O beijo durou o tempo exato de um sonho — longo o suficiente pra ser lembrado, curto demais pra saciar. Quando nos afastamos, o olhar dela incendiava.
— "Tô há três meses me tocando pra você, toda noite."
— "E eu acordando com seu nome entre os dentes."
Pegamos um táxi direto pro meu apartamento em Botafogo. O silêncio entre nós era denso, elétrico. Não havia mais o que dizer. Os corpos falariam.
Assim que entramos, Ketrin largou a bolsa no chão, virou-se de costas e soltou o cabelo. Me olhou por cima do ombro.
— "Fecha a porta. E vem."
Eu fui.
A encostei na parede da sala. Minhas mãos correram por baixo do vestido, descobriram a ausência de calcinha. Ela gemeu baixo, segurando meu rosto entre as palmas, olhos fixos nos meus.
— "Você vai me comer aqui? Agora?"
— "Aqui. Agora. Por inteiro."
Nossos corpos colidiram sem cerimônia. Minha boca deslizou por seu pescoço, pelos ombros, pelos seios que já escapavam do vestido. Ela se arqueava contra mim, as pernas em volta da minha cintura, o quadril procurando o encaixe. A cada movimento, um novo suspiro, uma nova promessa.
Levei-a pro quarto com a pressa dos famintos. Joguei-a sobre os lençóis. Tirei a roupa sem desviar o olhar. Ela se abriu como uma tempestade. Os dedos dela me puxaram, me guiaram, me prenderam. E quando entrei nela, o tempo deixou de existir.
Os gemidos de Ketrin não eram sons — eram feitiços. Ela dizia meu nome como se o reinventasse.
A respiração dela ainda pesava sobre meu peito.
O silêncio do quarto era só aparente — porque dentro de mim tudo gritava. As lembranças recentes do seu corpo se arqueando sob o meu, do suor escorrendo entre nossas peles, do gosto dela na minha língua... tudo pulsava como se o tempo não tivesse pausado.
Ela se virou de lado, apoiou a cabeça na mão e me olhou.
— "Tá diferente de me gozar pela tela..."
— "Isso aqui é realidade. Calor, pele, cheiro. Não tem delay."
— "Não tem botão de desligar..." — ela completou, sorrindo.
Ficamos em silêncio por alguns segundos, só trocando olhares. Ketrin deslizou os dedos pela minha barriga, traçando caminhos invisíveis, até descer lentamente... brincando, provocando. Meu corpo reagiu de imediato.
— "De novo?"
— "Com você aqui... é sempre 'de novo'."
Ela montou sobre mim com uma naturalidade ancestral, como se nossos corpos tivessem se amado em outras vidas. Desceu devagar, rebolando com uma lentidão deliciosa, as mãos firmes no meu peito. Os olhos fechados, a boca entreaberta. Era arte viva. Um ritual.
Movia-se com domínio, com uma sensualidade que beirava o sagrado. E quando abriu os olhos, me encarou com aquele olhar de mulher que sabe exatamente o que está fazendo.
— "Vai lembrar disso quando eu não estiver por perto."
— "Você nunca mais vai transar sem pensar em mim."
E tinha razão. Aquilo não era só sexo. Era presença. Era poder. Era uma dança em que só ela sabia os passos, e eu me deixava levar.
Horas depois, o sol já ia se pondo sobre os prédios do bairro quando ouvimos meu estômago se manifestar. Ketrin riu alto, ainda nua, e foi até a cozinha vestindo apenas uma das minhas camisas.
— "Vou fazer café. Não tô pronta pra sair por aí ainda... tô molhada por dentro."
— "Molhada?" — perguntei, levantando uma sobrancelha.
— "Não é suor... é lembrança."
Sentamos na varanda. O Rio diante de nós parecia preguiçoso, dourado, ofegante como a gente. Ela cruzou as pernas, acendeu um cigarro e olhou o céu em silêncio. Por um instante, parecia que Ketrin sempre esteve ali. Como se o tempo entre nossas chamadas e aquela varanda tivesse sido apenas um lapso de espera.
— "Você me quer só hoje?" — ela perguntou, sem olhar.
— "Te quero até quando você deixar."
— "Cuidado. Eu deixo fácil..."
Terminamos o café com os pés encostando sob a mesa. Cada toque era um convite. Cada silêncio, uma promessa.
Mais tarde, saímos pra caminhar até a orla. A cidade parecia nos observar. Ketrin andava ao meu lado como quem domina o mundo — vestido curto, olhar firme, aquele cheiro de mato e desejo que ela trazia de Corumbá. Passamos por bares, por risadas, por olhares curiosos. Mas só existíamos nós dois.
— "Quero conhecer o Rio por dentro..." — disse ela.
— "O mar, os becos, os bares, a cama, o seu corpo de novo..."
E naquela noite, quando voltamos e o mundo já dormia, ela me fez ver estrelas sem precisar olhar pro céu.