Capítulo 7 — A Bomba e o Eco
O tempo passou como quem caminha com cautela num campo desconhecido. Um mês havia se esvaído desde que Jeffi introduziu os filmes adultos na rotina do casal, e Nayra… bem, Nayra não era mais a mesma mulher da primeira noite. Não que tivesse se tornado outra pessoa, mas já não era aquela que arregalava os olhos, escandalizada, diante de corpos suados e gemidos coreografados. Algo nela havia mudado — devagar, sim, mas era mudança mesmo assim.
Agora, ela assistia com uma naturalidade contida. Não falava muito, mas não desviava os olhos. Não julgava com a mesma veemência. Às vezes, inclinava levemente o corpo, como quem quer entender melhor uma cena. Havia silêncio… mas não o silêncio da repulsa — era o da curiosidade, talvez do desejo.
E o mais simbólico: Nayra começou a comentar.
Nada vulgar. Nada explícito. Mas soltava observações soltas que, para Jeffi, soavam como música:
— “Esse ator tem pegada…”
— “Essa mulher parece que tá mesmo curtindo…”
— “Tem um quê de real nisso aí, né?”
Eram frases rápidas, sem intenção confessa, como quem fala e depois se esquece do que disse. Mas para Jeffi, cada uma era um degrau no monumento que ele vinha construindo. Aquilo ali era a validação de meses de estratégia, paciência e tato. Nayra já não achava sujo. Já não recuava. Estava… dentro.
O fetiche ainda era um continente inexplorado, mas o barco dela já tinha deixado o cais.
Com o tempo, assistir os filmes virou quase um ritual. Eles jantavam, colocavam Isa pra dormir e, vez ou outra, um vídeo era colocado na TV do quarto. Tudo numa atmosfera de cumplicidade quase adolescente.
Quatro meses se passaram. E durante esse período, Jeffi começou a colocar deliberadamente disfarçado, em prática, algumas coisas que viam juntos nos filmes. Não era escancarado. Era uma espécie de inocência ensaiada.
Se a atriz do filme montava no ator com mais domínio, Jeffi sugeria:
— “Sobe em mim hoje, amor…”
Ou
--- Lembra do que aquele ator fez? Agora é minha vez
Tudo isso enquanto a virava de bruços e dizia no ouvido dela.
Se o ator puxava os cabelos da parceira de um jeito específico, ele tentava replicar. Beijos mais longos, pegadas mais ousadas, sussurros mais provocativos no ouvido. Ele tentava replicar e tudo era feito com naturalidade. Afinal, ele precisava que Nayra respondesse a esses estímulos, o sexo é uma importante ferramenta de desconstrução.
E Nayra percebia. É claro que percebia. Mas não questionava. Era como se, no fundo, fizesse sentido. Como se, mesmo sem falar nada, o corpo dela dissesse:
“É… isso aí tá ficando bom.”
E Jeffi sabia: se ela não recuava diante da prática, e se os comentários inocentes durante os filmes estavam se tornando elogios sem culpa, era porque a estrutura mental de Nayra — ainda que travada pelas amarras da moral — começava a se abrir. E com essa abertura… era hora. A hora do movimento mais delicado de todos.
O momento de colocar a bomba sobre a mesa.
No entanto, Jeffi estava calmo.
Era uma calma fria, mesmo o que fosse mostrar, fosse algo tão delicado, que se fosse mal interpretado, poderia destruir tudo. Mas ele estava ali com a granada na mão, o pino entre os dedos, e um único pensamento:
“Ou eu jogo com a maior frieza da minha vida… ou tudo explode.”
Dessa vez ele foi mais cuidadoso. Muito mais. Entrou na conta do Pornhub e selecionou cuidadosa e exclusivamente filmes de temática cuckold — um gênero que misturava desejo, tabu e abismo. Mas, ao contrário do que fizera lá atrás, quando introduziu os filmes adultos de surpresa, agora ele fez diferente. Chegou com jeito. Voz mansa. Curioso, mas sem parecer carente.
— “Amor, selecionei uns filmes novos… são um pouco diferentes. Mais ousados, digamos assim. Queria te mostrar… mas só se você quiser. Se não quiser, tudo bem.”
O tom era perfeito. Nem pressionava, nem se fingia de neutro. Dava o controle a Nayra, mas instigava a curiosidade. A fórmula mágica: a mulher não se sente coagida, mas também não consegue ignorar o mistério.
Nayra hesitou. Olhou pra ele com aquela sobrancelha arqueada que ela fazia sempre que desconfiava de algo.
— “Diferente como?”
— “Você vai ver. Não quero estragar a surpresa. Se for ruim, a gente para na hora.”
Ela topou. Sem muita certeza, mas topou.
Jeffi espelhou o celular na TV e deu play no vídeo.
A cena começa. Um homem sentado na poltrona, assistindo outro homem transar com sua esposa na cama. Sem cortes. Sem metáforas. Era cuckold nu e cru.
Nayra franziu o cenho. O corpo dela endureceu.
— “Quem é esse cara na poltrona?” — ela perguntou, com a testa franzida.
Jeffi respondeu com a voz mais neutra que conseguiu:
— “É o marido dela.”
A explosão veio.
— “O QUÊ?”
Ela se levantou. Olhou pra TV. Depois olhou pra Jeffi como se ele tivesse cuspido na fé dela.
— “Você tá me dizendo que esse homem… tá deixando outro comer a esposa dele NA FRENTE dele???”
Jeffi se mostrou assustado mas por dentro estava calmo:
— “É… é só uma fantasia. Um fetiche. Tem casais que gostam…”
— “Isso é nojento! Isso é DOENTIO! Que tipo de homem ama uma mulher e aceita isso? Que tipo de homem você é por me mostrar essa merda, Jefferson?!”
Era como ver um castelo desmoronando. Mas para Jeffi tudo isso era apenas uma reação esperada da esposa, ele a conhecia. Jeffi engoliu seco. Pensou em tudo que tinha construído até ali. Então, com a paciência de quem sabe jogar, ele abaixou a guarda.
— “Desculpa. Eu achei que a gente estava num ponto onde dava pra explorar isso juntos. Mas errei o timing. Me perdoa, amor.”
— “Você… você pensou o quê? Que eu ia gostar de ver essa porcaria?”
— “Não. Eu só queria dividir algo que me instiga. Só dividir, não forçar.”
— “Você tem esse fetiche, é isso?”
Ele respirou fundo.
— “Tenho curiosidade. Mas nunca te obrigaria a nada. Nunca. Foi só uma ideia mal colocada. Você pode esquecer isso agora mesmo. Tá tudo certo.”
Aos poucos, a tensão foi baixando. Nayra ainda estava indignada, mas já não gritava. Jeffi não contra-atacou, não se justificou demais. Só entregou a rédea de volta pra ela. E isso fez diferença.
A bomba explodiu mas não devastou. Porque no fundo, o vídeo não era pra ser visto até o fim, o impacto estava na exposição. No desconforto. Na imagem que ela carregaria dali pra frente, mesmo que quisesse negar.
Uma semana se passou desde a “crise do vídeo cuckold”.
A rotina voltou ao normal. Nayra não falou mais no assunto. Jeffi também não. Mas o silêncio… ah, o silêncio dizia muita coisa.
Durante o sexo, Nayra estava diferente. O corpo respondia bem — às vezes até com mais tesão que o normal. Mas havia algo no olhar. Um resquício de culpa. Uma inquietação quase imperceptível.
Jeffi notou.
Às vezes, no ápice do prazer, ela apertava os olhos como quem tenta expulsar um pensamento indesejado. Outras vezes, terminava o sexo com um suspiro melancólico. Era como se o corpo estivesse de um lado… e a mente do outro.
Ele sabia: os flashs estavam vindo.
Aquela imagem — do marido na poltrona, o outro homem na cama com a esposa — havia se infiltrado. Mesmo que Nayra negasse com todas as forças… o vírus estava ali. Instalado.
Ela não sabia lidar com aquilo. Era muito fora do que ela conhecia. Mas o cérebro dela — aquele mesmo cérebro que já havia começado a achar beleza na lingerie, prazer no shortinho, e curiosidade nos filmes — estava tentando processar.
Jeffi comemorou calmo e frio. A semente que ele cuidadosamente plantou vinha dando frutos.
Mas não sorriu.
Só observou. Em silêncio.
Porque sabia que, em breve, o pensamento ia vazar.
A noite estava abafada. Nayra saiu do banho com o cabelo preso e o rosto mais tenso do que de costume. Sentou-se na cama. Olhou pra TV. Depois olhou pra Jeffi.
— “Aquele… aquele filme. Do outro dia…”
Jeffi virou devagar.
— “Sim?”
— “Aquele homem. O que ficava assistindo… aquilo… acontece mesmo?”
O coração dele acelerou. Mas ele manteve a voz calma, sorriu por dentro, uma ponta de vitória.
— “Sim. Em alguns casais. É um fetiche chamado cuckold.”
— “E por que alguém sentiria prazer… nisso?”
Jeffi sorriu de leve. Um sorriso gentil. Didático.
— “Cada pessoa tem um gatilho. Alguns sentem prazer em ver a parceira sendo desejada por outro homem. Não tem a ver com amar menos. Às vezes, é justamente o contrário.”
Ela olhou pro chão. Parecia pensar. Depois murmurou:
— “Eu… fiquei com essa cena na cabeça. Achei nojento na hora. Mas depois… sei lá.”
Havia vergonha nos olhos dela. Mas havia também… faísca.
Jeffi respeitou o espaço.
— “Você não precisa gostar. Nem aceitar. Só pensei em dividir. Mas não é uma obrigação.”
— “Você… já pensou nisso? Comigo?”
Silêncio. Ele respondeu:
— “Pensei, sim. Mas sempre respeitarei seu tempo e seu espaço. E se isso for um limite pra você, eu aceito. Não precisa ir por esse caminho.”
Ela ficou quieta. Só balançou a cabeça, como quem ainda estava tentando entender o próprio turbilhão.
Jeffi percebeu: ela não só viu. Ela não só reagiu. Ela voltou ao assunto. Por vontade própria.
Era o começo de um novo marco.
Sim, ainda havia travas. A moral ainda sussurrava ao ouvido dela. Mas agora… o outro lado também sussurrava.
E ela estava começando a ouvir.
A dúvida era o começo da liberdade.
E a liberdade, no mundo de Jeffi, era o maior dos instrumentos para conduzir as decisões.