O sol do meio-dia estava a pino, banhando o quintal com uma luz dourada que fazia tudo parecer mais vibrante. Enquanto eu acendia o carvão na churrasqueira, o cheiro de fumaça começava a se misturar com o ar quente, e a tranquilidade do domingo parecia perfeita para o momento que estávamos vivendo. Minha mente ainda girava com os acontecimentos da noite anterior e da manhã com Helena, mas o trabalho com o churrasco me mantinha focado, pelo menos por enquanto.
Logo, ouvi risadas vindo da casa, e quando olhei para trás, vi as três descendo as escadas do quintal, cada uma usando um biquíni fio-dental que deixava pouco para a imaginação. Minha mãe, Helena, estava deslumbrante — o biquíni vermelho realçava suas curvas, os seios fartos quase escapando do tecido mínimo, e a tanga destacava seus quadris de forma hipnotizante. Júlia, com um biquíni azul-turquesa, exibia um corpo esguio e bronzeado, a pele brilhando sob o sol, os cabelos castanhos soltos caindo sobre os ombros. Mas foi Safira — ou melhor, Ícaro — quem realmente chamou minha atenção.
Apesar de sua androginia natural, Ícaro, como Safira, havia transformado seu corpo em algo surpreendentemente feminino. O biquíni rosa-choque abraçava uma cintura fina e uma bunda avantajada que parecia desafiar qualquer dúvida sobre sua aparência. Ele havia feito algum truque — talvez uma técnica de maquiagem ou preenchimento — para suavizar os traços e realçar a feminilidade, e com os cabelos loiros soltos e a postura confiante, parecia mesmo uma mocinha loirinha linda, como se tivesse saído de um ensaio de revista. A calcinha do biquíni, estrategicamente posicionada, escondia qualquer traço de sua identidade biológica, e a forma como ele se movia, com graça e segurança, era quase hipnótica.
As três se aproximaram, rindo entre si, e me cumprimentaram com entusiasmo. Helena passou por mim, roçando a mão de leve em meu braço, um gesto sutil que reacendeu o calor da manhã. — Está ficando com cheiro bom, Cauã — disse ela, com um sorriso que misturava provocação e carinho.
— Valeu, mãe — respondi, tentando manter o tom casual, embora meu olhar inevitavelmente percorresse as três. Júlia deu um aceno animado, já se dirigindo para as espreguiçadeiras, e Safira me lançou um olhar brilhante, ainda carregado da emoção que senti na cozinha.
— Não queima a carne, hein, Cauã! — brincou Safira, a voz leve, antes de seguir as outras.
Elas se acomodaram nas espreguiçadeiras que havíamos disposto no gramado, esticando-se sob o sol com uma naturalidade que parecia apagar qualquer traço dos segredos da noite anterior. Pegaram óleos bronzeadores e começaram a conversar, as vozes misturando-se em risadas e comentários que eu não conseguia distinguir claramente dali. O som era um murmúrio animado, pontuado por gargalhadas ocasionais, e eu podia ver os gestos expressivos de Júlia, a calma elegante de Helena e a energia radiante de Safira, que parecia estar vivendo um momento de pura felicidade.
Fiquei na churrasqueira, virando as carnes e controlando o fogo, mas meus olhos voltavam constantemente para elas. O contraste entre a cena idílica — três mulheres lindas tomando sol, rindo e aproveitando o dia — e os segredos que eu carregava era quase surreal. Safira, especialmente, me fascinava. A forma como Ícaro abraçava a persona de Safira com tanta convicção, transformando-se em alguém que parecia tão à vontade em sua pele, era algo que eu ainda tentava compreender. E, ao mesmo tempo, a visão de Helena, com quem eu havia compartilhado algo tão intenso, e Júlia, que agora sabia ser parte do universo secreto de Safira, criava uma teia de emoções que eu não conseguia desenredar.
Enquanto as costelinhas e linguiças douravam na grelha, continuei meu trabalho, deixando-as aproveitar o sol. O calor do fogo e do dia se misturava ao calor que ainda sentia dentro de mim, e eu sabia que aquele almoço, com todos nós reunidos, seria mais um capítulo nessa história que estava apenas começando.
O sol escaldante do domingo continuava a aquecer o quintal enquanto eu finalizava o churrasco, o aroma de carne grelhada e ervas enchendo o ar. As três — Helena, Safira e Júlia — permaneceram nas espreguiçadeiras por um tempo, bronzeando-se e conversando animadamente, os corpos brilhando com o óleo e o calor do dia. Depois de garantir que as carnes estavam no ponto, preparei a mesa ao ar livre, sob a sombra de uma árvore, com pratos, talheres, saladas e bebidas geladas. Chamei-as para almoçar, e elas vieram sorrindo, ainda de biquínis, com a pele levemente avermelhada pelo sol.
— Meninas, o churrasco está na mesa! — anunciei, e elas se levantaram, rindo e comentando sobre o cheiro irresistível.
Sentamo-nos ao redor da mesa, e o almoço fluiu com uma leveza surpreendente, considerando os segredos que cada um de nós carregava. Conversamos sobre assuntos diversos — desde os momentos engraçados da festa até planos para o resto do fim de semana. A comida estava deliciosa, e os elogios ao meu churrasco vieram acompanhados de risadas e provocações amigáveis. Safira, ainda radiante na sua persona, parecia mais à vontade do que nunca, e Júlia, com seu jeito descontraído, mantinha o clima leve. Helena, sempre elegante, conduzia a conversa com um charme natural, mas seus olhares ocasionais para mim traziam um calor que só eu podia entender.
Em um momento, enquanto comíamos, Helena bateu palmas, os olhos brilhando com uma nova ideia. — Que tal aproveitarmos o resto do dia e irmos ao shopping? — sugeriu, olhando para Safira e Júlia. — Ícaro, você pode continuar como Safira, e eu empresto roupas para vocês duas. Assim, Júlia, você não precisa voltar para casa, senão vai ficar muito tarde. O que acham?
Os olhos de Safira se iluminaram imediatamente, e sua expressão era de puro êxtase. — Sério, mãe? — perguntou, a voz tremendo de emoção, como se cada gesto de aceitação de Helena fosse um presente precioso. — Eu posso… continuar assim?
— Claro, minha filha — respondeu Helena, com um sorriso caloroso. — Vamos nos divertir juntas.
Júlia assentiu, animada com a ideia, e o clima ficou ainda mais vibrante. Safira parecia flutuar de felicidade, e eu podia ver o quanto aquele momento significava para Ícaro — ser reconhecido e incluído como Safira, sem questionamentos, era algo que o enchia de vida.
Após o almoço, todos subiram para tomar banho e se arrumar. Eu fui para o meu quarto, tomei um banho rápido e escolhi uma roupa que valorizasse meu corpo, que estava em ótima forma após meses de treino. Vesti uma camiseta preta justa que destacava meu peitoral e braços definidos, combinada com uma calça jeans escura que caía perfeitamente. Finalizei com um perfume amadeirado e me olhei no espelho, satisfeito com o resultado — eu estava atraente, com uma energia confiante que refletia o turbilhão de emoções que sentia.
Desci para a sala e me sentei no sofá, esperando as três. Do andar de cima, vinham risadas e vozes animadas, o som de Helena ajudando Safira e Júlia a escolherem as roupas. Era uma mistura de brincadeiras e comentários sobre estilos, e eu podia imaginar Safira experimentando peças com um sorriso que não saía do rosto. Fiquei ali, mexendo no celular, mas minha curiosidade crescia a cada minuto.
Quando finalmente ouvi os passos descendo as escadas, levantei os olhos e fiquei de queixo caído. As três apareceram como se tivessem saído de um desfile de moda, cada uma com um look sensual e cuidadosamente escolhido que parecia projetado para atrair todos os olhares.
Helena estava simplesmente maravilhosa, um espetáculo de sensualidade. Ela vestia um vestido justo de tecido leve, em um tom de vinho que abraçava cada curva de seu corpo. O decote em V profundo destacava seus seios fartos, e a saia, que terminava na altura das coxas, revelava suas pernas torneadas. Um cinto dourado marcava a cintura, dando um toque sofisticado, e os saltos altos pretos alongavam ainda mais sua silhueta. O cabelo castanho caía em ondas soltas, e a maquiagem suave, com batom vermelho escuro, completava o visual de uma mulher poderosa e irresistível. Não consegui segurar o comentário.
— Mãe, você está… incrível. Sexy demais — disse, com um tom que misturava admiração e aquele calor proibido que compartilhávamos.
Ela riu, um brilho travesso nos olhos, e fez um gesto de quem aceitava o elogio. — Obrigada, meu querido. Vamos ver se consigo acompanhar essas duas.
Safira — ou Ícaro — estava deslumbrante, mantendo a persona com uma confiança que me deixava impressionado. Ela usava um macacão preto sem mangas, justo no corpo e com um decote generoso que realçava o busto, moldado pelo sutiã que ainda usava. O tecido brilhante abraçava sua cintura fina e a bunda avantajada, e as pernas longas eram destacadas por sandálias de salto alto. O cabelo loiro, agora preso em um rabo de cavalo alto, dava um toque moderno, e a maquiagem — com cílios longos, sombra esfumada e gloss nos lábios — transformava Ícaro em uma mulher que parecia pronta para conquistar o mundo. A androginia natural dele, combinada com esses detalhes, criava uma figura que era ao mesmo tempo delicada e poderosa.
Júlia, por sua vez, estava igualmente linda, com um look que exalava juventude e sensualidade. Ela vestia uma saia curta de couro sintético preta, combinada com um cropped branco que deixava a barriga lisa à mostra. O cropped tinha detalhes rendados nas mangas, adicionando um toque feminino, e a saia realçava suas coxas bronzeadas. Nos pés, ela usava botas de cano curto que davam um ar rebelde, e o cabelo castanho estava solto, com algumas mechas caindo sobre os ombros. A maquiagem leve, com foco nos olhos delineados e um batom coral, completava o visual de uma garota confiante e pronta para aproveitar o dia.
As três pararam na sala, posando quase como se soubessem o impacto que causavam. Safira girou o corpo, brincando com o macacão, e Júlia riu, ajustando o cabelo. Helena apenas me observou, um sorriso satisfeito nos lábios, como se soubesse exatamente o que eu estava pensando.
— E aí, Cauã, o que achou do nosso desfile? — perguntou Júlia, com um tom provocador.
— Vocês estão… sem palavras. Vão fazer o shopping parar — respondi, rindo, mas com um tom genuíno de admiração.
Safira sorriu, os olhos brilhando de felicidade, e Helena bateu palmas, chamando todos para sair. — Vamos, antes que o shopping lote! — disse ela, liderando o grupo.
Enquanto seguíamos para o carro, as vozes delas continuavam a ecoar com risadas e planos para o passeio. Eu dirigia, com Helena ao meu lado no banco do passageiro, e Safira e Júlia conversando animadamente no banco de trás. A energia era contagiante, mas, sob a superfície, os segredos que compartilhávamos — entre mim e Helena, entre Safira e Júlia — pareciam pulsar, prometendo que aquele dia no shopping seria mais um capítulo inesquecível nessa história que só ficava mais complexa.
O trajeto até o shopping foi leve, com o sol brilhando forte e a música tocando baixo no rádio. Safira e Júlia conversavam animadamente no banco de trás, trocando risadas sobre algum detalhe da festa, enquanto eu dirigia, sentindo o calor sutil do olhar de Helena ao meu lado. A energia no carro era vibrante, carregada de uma mistura de excitação e cumplicidade. Em um momento, Helena virou-se para o banco de trás, o tom de voz suave, mas cheio de intenção.
— Ícaro… ou melhor, Safira — começou ela, com um sorriso carinhoso. — Você gostaria de se vestir como Safira mais vezes? De se sentir assim com mais frequência?
O silêncio que se seguiu durou apenas um segundo, mas foi o suficiente para sentir a emoção no ar. Safira, com os olhos brilhando, respondeu imediatamente, a voz carregada de entusiasmo. — Sim, mãe! Eu quero, sim. Muito!
Helena assentiu, como se já esperasse a resposta, e continuou, o tom agora mais decidido. — Então, Safira precisa ter suas próprias coisas. Hoje vamos montar um guarda-roupa para você, algo que seja só seu. O que acha?
Safira ficou visivelmente emocionada, os olhos marejando enquanto assentia vigorosamente. — Sério? Eu… eu nem sei o que dizer. Obrigada, mãe! — disse, a voz tremendo de felicidade. Júlia, ao lado, deu um tapinha carinhoso no ombro dela, sorrindo em apoio, e até eu senti um aperto no peito ao ver o quanto aquele momento significava para Ícaro.
Chegamos ao shopping, e, assim que saímos do carro, ficou claro que éramos o centro das atenções. Homens e mulheres nos olhavam com admiração, alguns com olhares furtivos, outros mais descarados. Helena, com seu vestido vinho que abraçava cada curva, caminhava com uma confiança magnética. Safira, no macacão preto que destacava sua silhueta andrógina e feminina, atraía olhares curiosos e encantados, sua beleza loira e postura graciosa chamando atenção. Júlia, com a saia de couro e o cropped, exibia um ar moderno e sensual que fazia cabeças virarem. Eu, com minha camiseta justa e jeans que valorizavam meu físico, também sentia os olhares, e juntos formávamos um grupo que parecia iluminar o ambiente.
Entramos em várias lojas, e o que se seguiu foi uma verdadeira maratona de compras, liderada por Helena com uma energia contagiante. Ela parecia determinada a transformar Safira em uma realidade completa, escolhendo peças que refletiam tanto a personalidade vibrante de Ícaro quanto a feminilidade que ele abraçava. Começamos com roupas: vestidos justos e esvoaçantes, saias de diferentes comprimentos, blusas com detalhes rendados, calças skinny que realçavam a bunda avantajada de Safira, e até um conjunto de terninho feminino que ela experimentou com um sorriso tímido, mas encantado. Cada peça era escolhida com cuidado, e Safira experimentava tudo, girando diante do espelho e rindo com Júlia, que dava palpites e aplaudia.
Depois, fomos a uma loja de sapatos, onde Helena comprou saltos altos, sapatilhas delicadas e até um par de botas de cano alto que Safira adorou. A seção de lingeries foi um momento particularmente especial — Safira, inicialmente hesitante, deixou-se guiar por Helena, que escolheu sutiãs com enchimento leve para realçar o busto, calcinhas rendadas em tons de rosa, preto e branco, e até uma camisola de seda que fez Safira corar ao experimentar. Júlia, por sua vez, também ganhou algumas peças, e as duas riam enquanto comparavam escolhas, criando uma conexão que parecia fortalecer a cada momento.
O ponto alto, no entanto, veio em uma joalheria. Safira mencionou que usava brincos de pressão para manter a aparência, e Helena, sem hesitar, sugeriu algo que fez o coração de Ícaro disparar. — Por que não furamos suas orelhas? Assim, você pode usar brincos de verdade, como sempre quis.
Safira ficou paralisada por um momento, os olhos arregalados. — Sério? Eu… eu sempre quis, mas nunca tive coragem — confessou, a voz quase um sussurro.
— Hoje é o dia, minha filha — disse Helena, segurando a mão dela com carinho. Minutos depois, estávamos na loja, e uma funcionária preparou tudo para furar as orelhas de Safira. Ícaro segurou a mão de Júlia, rindo nervosamente, e quando a agulha passou, ele deu um gritinho seguido de uma risada aliviada. Helena comprou vários pares de brincos — argolas douradas, pérolas discretas, e até um par de pendentes brilhantes que Safira colocou imediatamente, girando a cabeça para admirar o reflexo no espelho. O sorriso dela era tão genuíno que contagiava todos ao redor.
Entre as compras, também pegamos acessórios — colares, pulseiras, óculos de sol estilosos e até uma bolsa pequena que Safira carregou com orgulho. Eu ajudava a carregar as sacolas, rindo das brincadeiras e aproveitando o clima divertido. Em certo momento, enquanto Safira experimentava um chapéu, Helena se aproximou de mim, roçando o braço no meu de propósito, e sussurrou: — Está gostando do dia, meu amor? — O tom dela era provocador, e eu apenas sorri, sabendo que aquele jogo secreto entre nós continuava.
No final, exaustos, mas felizes, paramos em uma cafeteria para tomar um café e descansar. Sentamo-nos em uma mesa ao ar livre, as sacolas empilhadas ao nosso redor, e começamos a conversar sobre a experiência. Safira, ainda com os brincos novos brilhando, não parava de sorrir. — Eu nunca imaginei que poderia me sentir assim… tão eu mesma — disse ela, olhando para Helena com gratidão. — Obrigada, mãe, de verdade.
Helena apertou a mão dela, emocionada. — Você é linda, Safira. E vamos fazer isso mais vezes, prometo.
Júlia riu, tomando um gole de cappuccino. — Eu também amei! E essas roupas? Vou querer roubar metade do guarda-roupa da Safira — brincou, arrancando gargalhadas de todos.
— Pode contar comigo para mais passeios assim — acrescentou Helena, lançando um olhar para mim que incluía uma promessa silenciosa de mais momentos juntos, não só como família, mas no nosso segredo particular.
Terminamos o café, pegamos as sacolas e voltamos para o carro. Durante o trajeto para casa, Safira e Júlia continuaram falando sobre as roupas e planejando quando usariam cada peça, enquanto eu dirigia, sentindo uma mistura de orgulho, desejo e fascínio por aquele dia. A casa, agora repleta de novas possibilidades com as roupas e a identidade de Safira, parecia pronta para mais capítulos dessa história que, a cada momento, se tornava mais intensa e inesquecível.
O trajeto de volta para casa foi tranquilo, mas carregado de uma energia introspectiva após deixarmos Júlia em sua casa. Ela se despediu com abraços calorosos, agradecendo pelo dia incrível e prometendo repetir em breve. Safira, ainda com os brincos novos brilhando, parecia flutuar de felicidade, mas também começava a mostrar um traço de melancolia, como se soubesse que o momento mágico do dia estava chegando ao fim. Eu dirigia, com Helena ao meu lado, e trocávamos olhares ocasionais, a cumplicidade entre nós crescendo a cada instante.
Quando chegamos em casa, o sol já estava se pondo, tingindo o céu de laranja. Helena virou-se para Safira com um tom gentil, mas firme. — Safira, meu amor, é melhor você se trocar como Ícaro. Seu pai deve estar chegando, e precisamos evitar qualquer confusão por enquanto.
O rosto de Safira desmoronou. A alegria que a acompanhara durante todo o dia deu lugar a uma tristeza visível, os olhos marejando enquanto ela assentia lentamente. — Tá bom, mãe — murmurou, a voz baixa, antes de subir as escadas em direção ao quarto. A cena partiu meu coração, e pelo olhar de Helena, vi que ela sentia o mesmo.
Com Safira no andar de cima, ficamos apenas eu e Helena na sala. Sentamo-nos no sofá, e a conversa fluiu com uma intimidade que lembrava um casal de namorados, não mãe e filho. Falamos sobre o dia, rimos dos momentos no shopping, e ela confessou o quanto estava orgulhosa de Safira por se abrir tanto. Em certo momento, ela pegou minha mão, os dedos entrelaçando-se com os meus, e me olhou com uma mistura de carinho e desejo.
— Você foi incrível hoje, Cauã. Não só com o churrasco, mas… com tudo — disse ela, a voz suave, mas carregada de subtexto. Inclinei-me e a beijei, um beijo lento e cheio de emoção, que ela retribuiu com igual intensidade. Por um momento, o mundo lá fora deixou de existir.
A magia foi interrompida quando Ícaro desceu as escadas, agora sem a maquiagem, os brincos ou as roupas de Safira. Ele vestia uma camiseta larga e um short masculino, o cabelo loiro preso em um coque desleixado. Seu semblante era visivelmente triste, os olhos vermelhos como se tivesse segurado o choro. Helena se levantou imediatamente, aproximando-se dele com uma expressão preocupada.
— Ícaro, meu filho… o que está sentindo? — perguntou, colocando a mão em seu ombro.
Ele hesitou, olhando para o chão antes de erguer os olhos, a voz tremendo. — Eu… eu queria ser Safira. Não só hoje, não só às vezes. Quero ser ela sempre.
O silêncio que se seguiu foi pesado, mas cheio de entendimento. Helena puxou Ícaro para um abraço, e ele se deixou envolver, os ombros relaxando ligeiramente. — Tudo bem, meu amor. Se é isso que você quer, vamos fazer acontecer — disse ela, com uma determinação que me fez admirá-la ainda mais. — Amanhã mesmo vamos procurar um psicólogo para te acompanhar, e também um médico para conversar sobre a transição, se for o que você deseja. Vamos dar um passo de cada vez, juntos.
Ícaro assentiu, um leve sorriso surgindo em meio às lágrimas. — Obrigado, mãe. Obrigado por… me entender.
Eu me aproximei, colocando a mão no ombro dele. — Você é incrível, cara. Safira ou Ícaro, você sempre vai ser meu irmão. Conta comigo — disse, tentando transmitir apoio, mesmo que ainda estivesse processando tudo.
A conversa então mudou para algo mais prático: a janta. Decidimos pedir pizza, algo simples que agradaria a todos. Enquanto Helena procurava o cardápio no celular, o clima parecia se estabilizar, com Ícaro um pouco mais leve após a conversa. Mas então, ouvimos o barulho da porta da frente se abrindo, seguido de passos pesados. Meu pai entrou, visivelmente bêbado, o rosto vermelho e os olhos injetados. Ele trazia consigo o cheiro forte de uísque, e seu humor estava claramente péssimo.
Ele olhou para nós, os três na sala, e franziu a testa. — Cadê a janta? — perguntou, a voz arrastada, mas com um tom de exigência.
Helena se levantou, mantendo a calma, mas com uma firmeza no olhar. — Vamos pedir pizza, querido. O dia foi cheio, e achamos que seria mais prático — respondeu, tentando apaziguar.
Ele a encarou, e então seus olhos desceram para o vestido vinho que ela ainda usava, justo e sensual. A expressão dele mudou para uma mistura de desprezo e fúria. — Pizza? Você não faz nada, Helena! Uma inútil, é isso que você é! E ainda por cima vestida como uma prostituta — cuspiu as palavras, a voz subindo de tom.
Antes que pudéssemos reagir, ele avançou sobre ela, e, num movimento rápido que mal percebemos, deu um tapa no rosto dela. Vagabunda. O som ecoou na sala, e Helena cambaleou, levando a mão ao rosto, os olhos arregalados de choque e dor. Ele virou as costas e subiu as escadas, murmurando algo ininteligível, indo direto para o quarto.
Fiquei paralisado por uma fração de segundo antes que a raiva tomasse conta de mim. Meu sangue ferveu, e dei um passo em direção às escadas, os punhos cerrados. — Eu vou acabar com ele! — rosnei, a voz tremendo de ódio.