Ainda com a piroca firmemente aninhada dentro de mim, uma presença quente e pesada que parecia vibrar até os meus ossos, a respiração irregular e ofegante do nosso esforço compartilhado ecoando no silêncio da manhã, a floresta pareceu reter o fôlego. Não havia som de pássaros, nem farfalhar de folhas, somente o sussurro dos nossos próprios corpos se acalmando. O suor escorria em cascatas pela pele arrepiada, misturando-se ao dele, um rastro salgado e quente que descia pelas minhas têmporas, pescoço e costas. Os meus músculos se contorciam em espasmos dolorosos, uma mistura crua de alívio agonizante e uma exaustão avassaladora que pesava sobre mim como um manto úmido.
Johnny se inclinou, o corpo relaxando sobre o meu, apoiando a testa no meu ombro, e a sensação úmida da sua cabeça colando na minha pele foi mais um choque sensorial. Eu somente consegui balançar a cabeça fracamente sob o peso dele, um pequeno movimento negando a vastidão do que acabara de acontecer, incapaz de processar completamente a entrega, a dor, a submissão que eu acabara de experimentar. Senti o peso do seu corpo sobre o meu, um fardo bem-vindo, apesar de tudo, após a intensidade sufocante e violenta que nos unira, e a dor aguda e profunda na minha retaguarda começou a latejar com uma insistência lancinante, cada pulsação do meu coração acelerado reverberando no ponto dolorido.
“Você é um garoto esperto, Tiago”, ele murmurou contra a minha pele suada, a voz rouca e satisfeita, carregada de uma autoridade que me fez encolher instintivamente. “Soube me obedecer e agora não matarei a sua querida avó.” A exaustão me amordaçava, a boca seca e sem ar; eu mal conseguia reunir forças para piscar os olhos pesados e embaçados, menos ainda para formular uma resposta coerente, uma palavra sequer que pudesse expressar o turbilhão de sensações. Minhas pernas tremiam incontrolavelmente sob mim, e a ardência excruciante no meu interior, a sensação de ter sido rasgado e invadido, era quase insuportável, um fogo que ameaçava me consumir por dentro.
O monstro se afastou ligeiramente, o peso deixando meu quadril, e eu ouvi o tilintar familiar da minha cesta de vime ao ser pega do chão. Para meu espanto e confusão, ele abriu a tampa e, com uma casualidade chocante, retirou um pão de mel. Levou-o à boca e deu uma mordida satisfatória, o som da mastigação preenchendo o silêncio recém-restabelecido. Enquanto ele mastigava calmamente, eu me arrastei penosamente para uma posição semi sentada, cada movimento gerando uma onda de dor lancinante. Apoiei minhas costas doloridas e úmidas no tronco robusto e rugoso do velho carvalho, a superfície áspera da casca proporcionando um contraponto estranho e reconfortante à maciez vulnerável e ferida do meu corpo.
A dor no meu ânus latejava e queimava como fogo vivo, pulsando implacavelmente a cada batida descompassada do meu coração acelerado, um lembrete constante e brutal do que acabara de acontecer. “Passe sempre por aqui a essa hora, Chapeuzinho”, ele disse, as palavras carregadas de um comando disfarçado de sugestão, limpando migalhas do canto da boca com um gesto despreocupado. “Podemos nos encontrar mais algumas vezes. E, puta merda, o pão de mel da sua vozinha é incrível!” O Lobo Mau terminou o pedaço, engolindo com um suspiro de prazer que me revirou o estômago e sorriu para mim com um brilho nos olhos que não consegui decifrar.
Antes que eu pudesse sequer esboçar uma palavra, Johnny foi embora com uma agilidade surpreendente e se dissolveu na densa mata, o verde fechando-se em torno dele, desaparecendo entre as árvores tão rápido quanto havia surgido. Fiquei ali, largado, sozinho, com o eco das suas últimas palavras pairando no ar imóvel e a sensação avassaladora da sua presença ainda impregnada em mim, na minha pele, no meu interior dolorido, a dor e a solidão se misturando sob a vasta indiferença do céu.
Levantei-me com uma dificuldade excruciante. Cada pequeno movimento era um suplício, amplificando a dor latejante e profunda que irradiava sem trégua do meu interior, tornando a simples ação de ficar de pé num esforço monumental. Com passos incertos e trôpegos, movi-me rumo à beira do riacho próximo, atraído pelo som suave da água cristalina fluindo sobre pedras polidas. Inclinei-me sobre a superfície, buscando um vislumbre de mim mesmo, mas meu reflexo, distorcido pela leve ondulação, era irreconhecível.
O rosto pálido e maculado que me encarava de volta não era o que eu esperava ver — não o meu próprio rosto familiar —, mas sim o de alguém que tinha sido violado, esvaziado, completamente dominado. Havia uma vacuidade ali, uma ausência de luz nos olhos que me assustou. Naquele momento exato, uma realização sombria, perturbadora e nauseante me atingiu com a força de um golpe físico: talvez, na essência invisível que eu tentava esconder do mundo, eu sempre tivesse sido essa vadia “perfeita”, somente esperando o momento certo, o homem certo, para ceder, para ser quebrado e tomado. Era um pensamento que me gelava até os ossos, uma autocondenação silenciosa e arrepiante.
Lentamente, com as mãos ainda trêmulas e desajeitadas, comecei a recolher do chão minhas roupas. Vesti-as com um esforço mecânico, cada manga, cada dobra, um obstáculo. Feito isso, permiti-me desabar novamente, descansando por mais alguns minutos, que pareciam preciosos e roubados do tempo, tentando reunir desesperadamente as poucas forças que me restavam — tanto físicas quanto mentais — para a longa e inevitável caminhada de volta àquela coisa estranha e distante chamada realidade.
O percurso para a cidade foi uma tortura silenciosa, uma procissão fúnebre particular. Cada passo era uma pontada aguda no meu interior, um lembrete constante da violação, mas a pesada necessidade de cumprir meu dever, de levar a cesta cheia dos doces da vovó para vender na feira, falava mais alto que a dor e a humilhação. Era o único propósito que restava. Milagrosamente, a jornada até a praça da cidade e a própria venda dos deliciosos quitutes de Dona Adelaide foram um sucesso surpreendente; talvez a intensidade da dor interna e a subsequente dissociação tenham agido como uma estranha distração, tornando-me um vendedor mais eficiente, focado unicamente na tarefa. Ou talvez as pessoas simplesmente estivessem com mais fome do que o normal naquele dia.
Com a cesta, agora vazia, e o dinheiro, dobrado no bolso, virei-me para começar o caminho de volta para casa, seguindo pelo asfalto quente da estrada que parecia tremer sob o sol do entardecer. Suspirava aliviado por estar longe dos segredos funestos da floresta, mas ainda carregava a marca invisível, a ferida interna e indizível do que acontecera, algo que nenhuma lavagem ou tempo parecia capaz de apagar. Foi nesse exato momento, enquanto meus passos se arrastavam pela beira da estrada, que o veículo do xerife Charles parou suavemente ao meu lado, o motor roncando baixo e contido ao reduzir a velocidade, a janela começando a descer lentamente.