Onde o Sol se Esconde (continuação)
As noites tornaram-se a única hora em que Samuel e Teo podiam ser quem realmente eram. Quando o sino da última oração silenciava e o orfanato mergulhava na penumbra, era como se o mundo se apagasse, deixando apenas o pequeno universo dos dois.
Samuel não sabia exatamente em que momento Teo se tornara mais do que um amigo. Talvez tivesse sido naquela manhã gelada em que encontrou o menino tremendo de frio, o rosto escondido entre os joelhos, e simplesmente se sentou ao lado dele, dividindo o calor do corpo. Ou talvez tenha sido naquelas conversas sussurradas à meia-noite, quando Teo falava dos sonhos que ainda tinha — uma casa pequena, um cachorro, um jardim onde pudesse correr sem medo.
Teo, por sua vez, se agarrava a Samuel como um náufrago se agarra a um pedaço de madeira. Samuel era força. Samuel era promessa. Samuel era tudo o que ele acreditava ter perdido para sempre.
Na terceira semana após o desaparecimento de Elias, os rumores ganharam forma.
Elias, o rapaz de 17 anos, forte e rebelde, sempre inquieto, fora visto pela última vez sendo chamado para "uma conversa" com o padre Buzzi, o mais reservado de todos. Buzzi era um homem de fala mansa e olhos duros — olhos que pareciam despir a alma. Muitos sabiam, mas ninguém falava. O terror era silencioso entre os garotos.
Naquela mesma noite, quando Teo acordou chorando após um pesadelo, Samuel não hesitou. Deitou-se ao lado dele na cama estreita e o abraçou apertado, como se pudesse protegê-lo dos fantasmas que rondavam o orfanato.
— Eu tô aqui, Teo. — sussurrou contra seus cabelos, sentindo a respiração quente e trêmula do outro menino contra seu pescoço. — Não vou deixar nada acontecer com você.
Teo não respondeu de imediato. Ficou ali, ouvindo o coração de Samuel bater forte e ritmado. Quando finalmente ergueu o rosto, seus olhos estavam molhados, mas havia algo novo ali: confiança.
Sem pensar, sem planejar, Teo se inclinou e roçou os lábios nos de Samuel — um toque breve, tremido, como o bater de asas de um pássaro assustado.
Samuel ficou imóvel por um segundo. Depois, lentamente, fechou os olhos e respondeu ao beijo, com ternura, com medo, com todo o amor que seu peito cansado podia carregar.
Foi um beijo inocente, mas carregado de promessas. Promessas que nenhuma palavra conseguiria expressar.
**
No dia seguinte, a rotina seguiu igual — orações, castigos, cochichos apressados nos corredores. Mas algo entre eles mudara.
Um toque de mãos na hora de arrumar as camas. Um sorriso escondido durante o almoço. Um olhar cúmplice na hora da missa.
Teo parecia mais vivo, como se tivesse encontrado um novo motivo para resistir.
Samuel sentia o peito aquecer toda vez que via o sorriso de Teo, como se, finalmente, pudesse acreditar que o amor era possível, mesmo naquele mundo cinzento.
**
Mas o orfanato não esquecia.
Padre Clemente, com sua batina sempre impecável e voz gelada, observava.
Padre Buzzi, com seu sorriso sem alma, rondava os corredores tarde da noite.
E havia algo novo: uma tensão no ar, como a espera de uma tempestade prestes a desabar.
Mateus, um dos garotos menores, confidenciou a Samuel numa tarde chuvosa:
— Elias tentou denunciar... antes de sumir. Falou com o padre reitor... mas depois... — ele calou-se, mordendo os lábios até sangrar.
Samuel sentiu um calafrio percorrer a espinha. Não era só a brutalidade do abandono que os ameaçava naquele lugar. Era algo mais escuro, mais perigoso. Algo que agora, ao se aproximar de Teo, ele sabia que teria que enfrentar.
Ele não ia fugir.
Teo também não.
Eles iam resistir.
Juntos.
**
Naquela noite, Teo encostou a testa na de Samuel e, num fio de voz, disse:
— A gente vai sobreviver... né?
Samuel sorriu, um sorriso pequeno, mas cheio de certeza.
— A gente vai. Eu prometo.
E, naquele quarto gelado, onde o sol raramente entrava, duas almas partidas começaram a se reconstruir.
Com beijos tímidos.
Com abraços demorados.
Com amor.
Continua...