(II)
- Está uma delícia dona Marisa.
- Obrigada, - ela respondeu. - Coma mais um pouco, está tão magrinho.
Maurício quis recuar com o prato mas ela alongou o braço e o puxou.
- Mamãe não exagera. Acho até que Maurício está gordinho.
- Cachorro... - Maurício soltou.
- Ai, doeu - Augusto massageou o braço. - Ele faz academia mamãe.
- A faz é? - disse Marisa.
Ignorando e com a concha cheia derramou no prato.
- Está puro sal, - Gilson limpou os lábios. - Eu avisei.
- Esse homem, é meu inimigo Maurício.
- Vocês me envergonham, - Augusto arrota.
- Ah nós que te envergonhamos? Tenha modos menino - Marisa sorri. - Você trabalha com quê mesmo?
A pergunta surge sem prévia espera e Maurício remexe-se na cadeira.
Maurício engole em seco, bebe água, e arranha a garganta para dizer:
- Sou comerciante.
Augusto solta uma gargalhada estridente e sem qualquer vergonha despeja:
- Ele trabalha em um sexy shopping.
Maurício engasga com a água e Augusto tem que bater nas suas costas.
- Sexy o quê? - pergunta Gilson com a sobrancelha para cima.
- Ele vende coisas relacionadas a sexo, - disse Marisa. - Acho interessante.
Ela falou sem olhar para ninguém retirando o garfo da boca.
- Quanta modernidade dona Marisa.
- Ah, obrigada Gilson - responde irônica.
Ele suspira e volta-se para Maurício já refeito do engasgo.
- Como se conheceram mesmo?
Augusto respira e solta sorrindo.
- Na recepção do psicólogo.
Maurício fica com as bochechas e testa em brasa.
- Iam ao mesmo psicólogo? - Gilson continua.
- Não o mesmo mas no mesmo lugar.
- E ainda vamos, - Maurício conseguiu dizer.
Havia uma música baixa vindo da sala.
E a um toque mais romântico, Marisa ergueu-se.
- Deu para isso agora... - Gilson resmunga.
Dona Marisa saiu dançando em direção à sala e Augusto limpando os lábios a seguiu.
- Eles são bem unidos né?
- Ah sempre foram.
- E o senhor aposto que é mais unido a Elisa.
- É, por aí...
Augusto veio em direção a Maurício e o ergueu da cadeira. Eles se uniram.
- Seus pais... - Maurício sussurrou.
- Você ainda não percebeu que eles não ligam...?
A voz de Tim Maia embalava os nossos corpos e eu, Augusto e Marisa dançamos.
Gilson sentou-se no sofá batucando com os pés.
- Augusto... - Maurício sussurrou. - Você está...
- Ahanhan... - confirmou. - Vamos subir.
- Aqui é a casa dos seus pais...
- E daí? Você não para de repetir isso.
- Tá bom.
Eles despediram-se de Gilson e Marisa e subiram para o quarto.
Maurício puxou a camisa de Augusto pela cabeça e beijou seu peitoral.
Augusto fechou a porta e o ergueu no colo eles começaram a se beijar.
Fulminante a imagem de Ícaro derreteu sobre Maurício.
- Espera.
- O quê?
Augusto já estava de barraca armada.
- Vocês dormiam aqui?
- A gente quem? - Augusto suspirou.
- Você e o outro... - Maurício disse.
- Ícaro?
- Que merda isso... - Maurício suspira.
Augusto esfrega a cara nas mãos.
- É claro, a gente viveu nessa casa por um tempo.
Maurício desliza dos braços de Augusto e se senta na cama.
- Eu não consigo... Não dá... - ele diz a Augusto.
- Amor, isso já faz tempo e não tem nada a ver com você, - Augusto argumenta.
- Como não? - suspirou. - A gente só pode não fazer aqui? Custa?
Augusto uniu as sobrancelhas e com os braços em cima da cama sentou-se no chão.
- Tá se é tão importante para você.
Maurício entra no banheiro e sente um pouco do desespero de não poder fugir dessa situação.
"É claro que viveram aqui senão porque teria um banheiro no quarto dele?"
Mas o por quê daquilo incomodá-lo tanto ainda não estava claro.