Bernardo [55] ~ 20 anos

Um conto erótico de Bernardo
Categoria: Gay
Contém 2361 palavras
Data: 05/12/2023 16:24:00
Assuntos: Gay, Início, Sexo, Traição

Paris é conhecida por ser belíssima na primavera. Sendo assim, quando abril chegou, vimos a cidade ser inundada de turistas. Lógico que se tratava de uma cidade que recebia milhões de turistas o ano todo, mas a primavera era especial. O céu se abria, a temperatura se estabilizava em torno dos vinte graus, e o verde voltava a colorir os parques e boulevards da Cidade-Luz.

Eu e Ricardo aproveitávamos aquela bela época deitados nos jardins de Luxemburgo. Ele sentado na grama e eu deitado no seu colo. De vez em quando trocávamos selinhos rápidos, mas na maior parte do tempo nos contentávamos em ficar naquela posição trocando carícias. Ninguém ligava para o que estávamos fazendo, afinal, tinha tantos outros casais de diversas sexualidades, idades e nacionalidades ali. Parecia um sonho.

Um sonho que estava prestes a acabar. Em menos de três meses, estaríamos de volta ao Brasil. Eu seguiria para Belo Horizonte e Ricardo seguiria para São Paulo. Não tínhamos ideia de como seria nos separar depois de todo aquele ano juntos. Eu tinha que lidar com Rafael ainda. Assim, fizemos uma opção silenciosa por não conversar sobre o futuro. Tudo o que faríamos era aproveitar o momento. Planos? Só a curto prazo.

_Como quer comemorar seu aniversário semana que vem?_ ele perguntou.

_Ah, não sei. Alguma chance de você deixar a data passar em branco?

_Nenhuma! Por que faria isso?

_Ah, sei lá. Estou ficando velho.

_Você vai fazer vinte anos, para de drama!

_Estou entrando na terceira década da minha vida!

A gente ria com aquele papo. Por mais que fosse brincadeira, eu realmente me sentia ficando mais velho. Não era como os outros anos. Agora havia uma mudança de década. Era estranho, era como se aquela leve sensação de imortalidade fosse nos deixando

A gente podia passar só nós dois, no quarto, sem roupa..._ falei passando o dedo de leve pelas suas pernas.

_Ah, vai rolar isso, com certeza, mas vai haver um antes também.

Suspirei desanimado. Não era desânimo com Ricardo, era um desânimo de pura preguiça de comemorar meu aniversário. Meu namorado ignorou meu protesto silencioso e continuou:

_Eu fiz uma reserva pra dois num restaurante Deuxième Arrondissement e...

_Mas os restaurantes lá são caros, não precisa disso tudo...

_Tem uma banda de jazz que toca no salão principal._ continuou sem se importar com minha interferência _Você vai adorar!

_Se você diz...

_Você VAI adorar!_ falou me dando um beliscão que me arrancou risos.

[...]

Ele marcou o jantar pra noite anterior ao meu aniversário. Ele falou que assim seria o primeiro a me dar feliz aniversário quando virasse meia-noite. Sabendo que ele estava me levando a um restaurante mais chique, eu fiz questão de sair pra comprar roupas mais apresentáveis, afinal, não poderia ir com meu habitual uniforme: jeans, camiseta e casaco. Comprei uma calça mais séria de brim preta e uma camisa em tom cinza escuro. Ainda passei numa barbearia e fiz a barba e cortei cabelo. Meu cabelo estava mais cheio, apesar de não tão grande. Não houve surpresa pra Ricardo porque nos trocávamos no mesmo quarto, mas ele parou um minuto pra me admirar, o que me constrangeu.

_Tudo pra mim?

_Só depois da meia-noite._ respondi.

Ele também estava elegante. Usava um jeans bem escuro com camisa social branca. O que em outro pareceria sem graça, nele caía incrivelmente bem.

_Vamos?

E nós saímos de mãos dadas pela noite parisiense. A noite estava quente, então havia vários casais nos fazendo companhia no metrô. Em poucos minutos chegamos a uma das regiões mais ricas da cidade, conhecida pelos seus restaurantes caros, pelos antigos palácios que agora serviam como órgãos de governo e pelo famoso museu do Louvre.

O restaurante que Ricardo tinha escolhido tinha aparência de caro, o que me constrangeu um pouco no início, mas ele soube guiar bem a situação e me deixou mais à vontade. Uma banda de jazz e uma cantora negra de meia idade tocavam e cantavam em tom bem baixo, de modo que não atrapalhava as conversas nas mesas. Estávamos sentados num canto do salão e percebi algumas pessoas nos olhando, mas logo desviaram a atenção. Um casal gay jantando juntos não era mais uma novidade digna de nota. Então, deu-se início a todo aquele ritual ao qual nunca me acostumei: primeiro a entrada, então salada, um caldo ou sopa, e só então a refeição principal. Era alguma coisa de cordeiro, não me lembro muito bem, mas estava delicioso e combinava muito bem com o vinho que o garçom tinha nos recomendado.

Alegres pelas circunstâncias e pelo álcool, conversávamos animados.

_Sabe qual a grande novidade do dia?_ perguntei.

_Qual?

_Alice terminou o namoro.

_Não!

_Sim!

_Pedro?

_Ela não confessou, mas com certeza tem uma mão dele nessa história. E ela proibiu ele de me dar detalhes, porque ele estava todo inquieto quando conversamos mais cedo no MSN.

_Você enfim conseguiu, hein? Está juntando os dois!

_Você tem que ver a química entre eles. Me daria razão na hora!

O garçom se aproximou da mesa.

_Dessert? (Sobremesa)

_Oui.(Sim)_ respondeu Ricardo _Mais j’ai un commande à les musiciens. (Mas eu tenho um pedido aos músicos)

Olhei desconfiado pra Ricardo. O garçom lhe emprestou caneta e papel, onde ele escreveu alguma coisa e o garçom levou para a banda.

_O que você está aprontando, seu Ricardo?

_A noite tem que ser perfeita._ falou sorrindo e me fazendo cócegas nas costas da mão por cima da mesa.

Reconheci a música nos primeiros acordes e sorri para o meu namorado. Não havia música que se encaixava melhor para aquele momento delicioso das nossas vidas que estávamos passando.

Sem nenhuma vergonha ou medo de represálias, me inclinei sobre a mesa e dei um selinho demorado em Ricardo. Ele era o cara perfeito. Ele era aquela cara com quem meninos e meninas sonham acordados na esperança que apareça em suas vidas. Ele era um verdadeiro príncipe encantado. Ele é aquela pessoa que apenas um idiota deixaria escapar. Se eu pudesse ao menos amá-lo o quanto amava Rafael... Mas eu não podia pensar naquilo! Não naquele momento. Aquele era o nosso momento, o nosso presente, e era tudo o que importava.

Assim que acabamos a sobremesa, pedimos a conta. Ricardo pagou e não quis nem mesmo me deixar ver o valor. Ele alegava que era um presente dele e não teve como eu argumentar muito. Eu pensei em recompensá-lo no seu aniversário, mas me lembrei que seu aniversário era em julho e que já estaríamos no Brasil a quase seiscentos quilômetros de distância. Isso me entristeceu um pouco, mas não deixei que ele percebesse.

Decidimos voltar pra casa a pé, numa caminhada que não devia dar mais do que uma hora. Eu deixava ele me guiar, então não percebi de cara que ele estava desviando um pouco do caminho. Só entendi quando chegamos à mais famosa ponte que cruzava o Sena: a Pont des Arts. Mais conhecida pelos brasileiros como ponte dos amantes, era uma ponte no centro geográfico de Paris que atravessava o rio Sena. A grande fama da ponte se dava pelos infinitos cadeados que estavam presos nas suas grades de metal. Reza a lenda, que ao colocar um cadeado em nome do seu amor, um casal jamais deixaria de se amar.

_O que estamos fazendo aqui, Ricardo?_ perguntei desconfiado.

Ele sorriu travesso e do seu bolso de trás tirou uma caixinha. Ele abriu e me mostrou: um cadeado pequeno, mas muito bonito, com detalhes em prata e dourado, trazia nossos nomes lado a lado. Meus olhos se encheram de lágrimas. Eu não tinha palavras. Sem me dizer mais nada, ele foi até a ponte e prendeu nosso cadeado na grade. Ele se voltou até mim e me abraçou pela cintura.

_Pronto. Agora você tem a obrigação de me amar pra sempre!

Eu não tinha palavras para lhe responder, tudo o que pude fazer foi beijá-lo com toda força a pude e ele correspondeu. Ricardo não estava nos meus planos. Me apaixonar novamente nunca esteve nos meus planos. Eu sempre tive Rafael na cabeça. Mas quando eu vou aprender a não fazer planos? E que direito eu tinha de reclamar da vida que me deu Ricardo?

_Eu te amo._ ele sussurrou no meu ouvido.

Foi a primeira vez que ele me disse isso, mas eu já sabia. Estava em cada gesto seu, em cada beijo, em cada olhar. Ele me amava. E eu o amava. Sem dúvidas eu o amava. Só que eu não o amava como deveria. O lugar que ele queria no meu coração já estava ocupado. Mais uma vez, alguém me amava e eu não podia amar de volta na mesma intensidade. Me lembrei de Eric e de como a sua história terminou. Mas eu não podia cometer o mesmo erro novamente.

Eu olhei no fundo dos seus olhos e, com algumas lágrimas de emoção ainda descendo, resolvi que eu tinha que ser sincero com ele. Era o mínimo que eu devia àquele cara.

_Se algum dia eu tivesse tido escolha, a minha escolha seria você. Para sempre.

Ele sorriu triste com a minha resposta, mas não me soltou. Ele tinha esperança de ouvir um “eu te amo também”, mas não seria de todo sincero, ainda que não fosse de todo mentira também.

_Ai, esse Rafael..._ ele comentou bem humorado.

_Eu te amo, Ricardo._ falei passando a mão sobre seus cabelos _Foi só uma questão de ordem de chegada. Se eu tivesse te conhecido primeiro, eu nunca teria olhado pra outro cara na minha vida.

Ele sorriu com minha resposta, ainda que não fosse a que ele quisesse ouvir. Eu realmente acreditava na verdade daquelas palavras. Se eu conhecesse Ricardo, eu nunca teria ido até onde cheguei com Eric ou mesmo Rafael.

“Ah, mas você ama Rafael! Você teria o amado de qualquer jeito!”, vocês podem dizer. Não sei. Sem dúvidas, tanto Rafael e Eric mexeram comigo na primeira vez que os vi, ainda que eu não compreendesse bem a natureza dos meus sentimentos. Mas o amor que eu tenho por Rafael, foi construído aos poucos, com a nossa convivência. Se eu já estivesse com Ricardo, eu nunca deixaria ter chegado a esse ponto. Então, sim, eu acho que posso dizer que foi tudo uma questão de ordem de chegada.

Ricardo olhou para o relógio de rua atrás de mim e me sorriu:

_Feliz aniversário, meu amor!

Trocamos mais um beijo apaixonado e continuamos nosso caminho para casa de mãos dadas. Mas o nosso cadeado ficou lá e talvez fique lá para sempre. Talvez esse seja o motivo pelo qual eu continuei amando Ricardo por toda minha vida, longe ou perto.

[...]

Durante o dia seguinte, recebi ligações e mensagens de toda a minha família e amigos me desejando feliz aniversário. Ainda tentei tirar alguma informação de Pedro e Alice sobre o fim de namoro dela, mas ambos usaram a desculpa do preço da ligação internacional como desculpa para me cortar e desligar.

Estávamos cansados ainda pela noite anterior, então eu e Ricardo fomos dormir cedo. Ele dormia comigo na minha cama, apesar de não fazermos aquilo todo dia, afinal, era uma cama de solteiro. Tínhamos acabado de pegar no sono, não devia ser mais do que onze da noite quando meu celular tocou. Nós dois abrimos os olhos atordoados com o barulho.

_Eles não sabem calcular fuso horário? São cinco horas de diferença!_ reclamou Ricardo cobrindo a cabeça.

Peguei o celular e vi um número desconhecido, mas com prefixo brasileiro. Se eu não tivesse atordoado pelo sono, eu teria reconhecido aquele número tão familiar, e se tivesse reconhecido, não teria atendido. Ao menos perto de Ricardo.

_Alô?_ falei.

_Bernardo?_ chamou a voz tão familiar.

_Rafael?

As palavras me faltaram. Borboletas pareceram tomar conta do meu estômago. Há quanto tempo eu não ouvia aquela voz! Em compensação, senti o corpo de Ricardo se endurecer de tensão ao meu lado na cama.

_Oi._ Rafael falou, claramente sem jeito.

_Oi.

_Tudo bem?

_Tudo. E com você?

_Bem também.

Claramente incomodado com a situação, Ricardo se levantou num pulo e saiu do quarto. Ouvi a porta bater quando ele entrou no banheiro. Fechei os olhos amaldiçoando o péssimo timing de Rafael. Teve um ano pra ligar, tinha que ligar justo agora? Mas eu não podia ficar bravo com ele. Era o primeiro contato que tínhamos em meses.

_Eu só queria te desejar um feliz aniversário.

_Muito obrigado, Rafa.

_E como vão as coisas aí?

_Muito bem, obrigado.

_Se divertindo?_ talvez tivesse um cutucão discreto na sua pergunta, mas não percebi de primeira.

_Sim. Paris é uma cidade fantástica. Você iria adorar isso aqui.

_Sim..._ ele respondeu sem jeito _Um dia, quem sabe.

_Um dia...

Ficamos em silêncio durante um bom tempo, apenas ouvindo a respiração um do outro. Tinha tanta coisa pra ser dita, explicada e discutida. Mas não tínhamos coragem de fazer aquilo. Nossa relação, desde aquela viagem ao lago, passou a ser uma linha muito fina, que qualquer solavanco poderia romper de vez.

_Então, tchau._ falou enfim.

_Tchau.

_Até a volta.

_Até.

Eu desliguei e fiquei encarando a meia luz que entrava pela janela. Talvez eu tenha sido covarde, talvez aquela fosse a hora de conversar com ele sobre Ricardo. Mas não, de algum jeito eu sabia que era o tipo de conversa que se deveria ter cara a cara. E, sem dúvidas, sem Ricardo por perto.

Meu namorado entrou no quarto depois de alguns minutos, fechou a porta com cuidado e se deitou na sua própria cama.

_Estou meio cansando hoje, vou dormir por aqui mesmo. Boa noite, amor.

_Boa noite._ respondi sem jeito.

Não havia agressividade na sua voz, mas tampouco parecíamos tão bem quanto o dia anterior. Eu dormia no mesmo quarto que Ricardo a tempo o suficiente para reconhecer a respiração que ele tinha quando dormia. Ele poderia até estar mesmo cansado, mas não dormiu de imediato. Ficou horas em silêncio rolando pela cama e com seus pensamento secretos, assim como eu.

Três meses. Chegava a hora de dizer adeus. E de partir o coração de Ricardo.

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Ricardo não merecia sofrer. Embora soubesse da existência de Rafael.

E Rafael não pode cobrar fidelidade. Estava namorando Carol.

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