Bernardo [40] ~ Trote!

Um conto erótico de Bernardo
Categoria: Gay
Contém 2718 palavras
Data: 05/12/2023 13:33:54
Assuntos: Gay, Início, Sexo, Traição

Aquele menino não saiu da minha cabeça pelo resto do dia. Quando voltamos para aula, não consegui prestar atenção em nada do que estava sendo dito. Não, não era paixão à primeira vista, ou muito menos amor. Era tesão. Eu queria demais aquele menino. Desde a morte de Eric, ele tinha sido o primeiro cara que tinha despertado alguma coisa em mim. A melhor definição que eu tenho para ele é “fofo”. Diferente de Eric e Rafael, aquele garoto não exalava uma sensualidade nata. O fato dele ser baixinho, magrinho, branquinho, olhos verdes e tal lhe dava um aspecto quase infantil, no bom sentido. A vontade que ele dava era de colocar ele no colo e morder ele todo. Não sei explicar bem, ele não era o meu “tipo”, mas alguma coisa nele me arrebatou. Só que eu não sabia nem seu nome. Presumi que eu teria que esperar até o trote para descobrir.

[...]

No dia seguinte, além do tal garoto, quem dominava meus pensamentos era Pedro. Ele não iria faltar dois dias seguidos. Com certeza eu teria que encará-lo e ter uma conversa séria com ele. Eu não sabia o que falar e muito menos o que ele ia falar. A ansiedade me corria vivo.

Eu tinha todo um plano para chamá-lo para conversar na hora do intervalo, mas o destino não gostava quando eu fazia planos. Ao chegar à faculdade, senti vontade de usar o banheiro. Entrei, usei a cabine e quando saí, Pedro tinha acabado de entrar. Nós dois nos encaramos sem reação. Meu coração pareceu ter parado por alguns segundos. Ele me olhava com olhos indecisos. Por fim, se virou para sair, mas eu o chamei:

_Espera.

Ele esperou, mas não se virou para mim. Como ele não pareceu que ia fazer isso, eu decidi que ia ser melhor começar a falar, mesmo sem ter um discurso ensaiado.

_Eu quero te pedir desculpas, Pedro.

Eu não tinha mentido sobre uma vírgula do que tinha dito a ele na noite de ano novo. Aliás, eu ainda não tinha engolido sua ofensa a Eric. Mas alguém tinha que dar o braço a torcer primeiro.

_Eu não devia ter mentido pra você e não devia ter falado com você daquele jeito.

Ele não me respondeu, apenas saiu do banheiro como se nada tivesse acontecido. Eu conhecia Pedro. Ele estava com muita raiva. Ele é falante, elétrico e passional, se ele ficou em silêncio, é porque ele estava com raiva de mim. E não posso dizer que aquilo não me machucou. Apesar de todos os defeitos que ele tinha, e eu tinha consciência da gravidade deles, eu gostava dele. Ele era uma boa pessoa, só que andou com as companhias erradas por boa parte da vida e acabou formando uma mente muito estreita. Ele só precisava de alguém ao seu lado para mostrá-lo um novo mundo. E é por isso que eu sempre insisti no seu caso com Alice, porque ela era a pessoa ideal para essa tarefa.

Quando cheguei na sala, ele estava sentado no canto oposto ao meu, em vez de perto de mim. Ali eu percebi que não tinha mais volta. Nossa amizade sempre foi muito frágil devido à rede de mentiras que eu nos envolvi. Era como um vaso da mais deliciada porcelana que caiu no chão e se dissolveu em mil pedaços. Apesar de tudo, eu o considerava um amigo. Só que ele não me considerava mais um amigo.

[...]

Na sexta-feira daquela semana, aconteceu o nosso trote. Eu não estava muito animado para aquele tipo de coisa por vários motivos. Primeiro, eu tinha péssimas lembranças do meu trote. Segundo, eu acho uma tradição idiota. E, terceiro, eu ainda não estava no clima. Certo, eu não estava mais de luto pelo Eric, mas tampouco eu tinha superado tudo o que aconteceu. Estava longe disso. Acho até que nunca superei totalmente. Enfim, só tinha uma coisa que me animava no trote: me aproximar daquele garoto que tanto mexia comigo.

Alice achava que era uma tradição idiota também, por isso preferiu ficar de fora. Assim, eu acompanhei Rafael, Pedro e outros colegas nossos na tarefa. Obviamente, Pedro não me dirigia à palavra ou mesmo chegava perto de mim. Enquanto arrumávamos as coisas que íamos usar, Rafael sentiu o clima pesado.

_Relaxa, ele precisa de um tempo pra digerir tudo. Você soltou muita informação de uma vez._ ele falou.

_Eu sei. Mas acho que não vai ter tempo que basta para ele digerir tudo. Eu não apenas contei tudo pra ele, Rafa, eu o chamei de idiota com todas as letras. Eu o expulsei da minha casa.

_Você não sabe. Talvez ele esteja tentando analisar tudo o que está acontecendo.

_Duvido muito. Eu conheço ele, ele não está fazendo birra. Ele está muito puto da vida comigo.

_Então, não tem nada o que você possa fazer, você já pediu desculpa. Forçar uma conversa agora só iria piorar as coisas. Tenta seguir em frente.

Ele deu um daqueles sorrisos motivadores que ele sempre me dava após um conselho, e eu sorri em resposta. Durante todo esse papo, ele manteve a mão no meu ombro. Era uma coisa que ele fazia com todo mundo, então nunca liguei que alguém fosse fazer uma conexão estranha com aquele gesto seu. Contudo, Pedro agora sabia tudo o que tinha acontecido entre nós dois. Quando eu desviei o olhar para ele, ele nos olhava com uma inconfundível expressão de nojo na cara. Aquilo me machucou de um jeito novo e muito mais doloroso do que qualquer outra vez. Até aquele momento, todas as pessoas que haviam descoberto sobre mim, Alice, Rafael, Eric e minha irmã, tinham se mostrado compreensíveis, no mínimo. Era a primeira vez que eu encontrava o nojo e a repreensão no olhar de alguém por eu ser gay. E era alguém que eu gostava muito. Por reflexo, agitei meu ombro e soltei a mão de Rafael. Ele me olhou confuso e acompanhou o meu olhar até encontrar o de Pedro. Rafa não se intimidou, estufou o peito e o encarou de volta. Os dois não se gostavam, e agora é que não se suportariam mesmo. Pedro saiu da sala como um foguete.

Eu fiz força para segurar o nó que se formou em minha garganta. Era aquilo que eu mais temia. A visão das pessoas sobre mim mudando ao descobrir que eu era gay. Era o meu pior pesadelo se tornando realidade.

_Deixa ele pra lá._ falou Rafael percebendo meu estado _Vamos achar nossos calouros.

E assim eu fiz. Não que por um segundo sequer eu tivesse esquecido o que vi em seus olhos, mas eu não poderia deixar que as pessoas percebessem. Se alguém chegasse a perguntar a Pedro porque eu e ele nos afastamos, eu duvido que ele mentiria pra me proteger. Eu teria que ser extra cuidadoso.

[...]

Antônio. Era esse o nome do menino que dominou meus pensamentos no dia anterior. Como esperado, ele aguardava com o resto da turma pelo seu trote. Assim que eu entrei na sala, nossos olhares se cruzaram e eu senti uma corrente elétrica percorrer meu corpo. Só de vê-lo, eu senti meus pelos se arrepiarem e meu pau dar uma pequena fisgada dentro da calça.

Rafael era quem fazia as honras de escrever apelidos pejorativos na testa de cada um deles. Ironicamente, ele pediu a minha opinião quando chegou a vez do tal Antônio. Confesso que me senti um pouco estranho de ver os dois tão perto. Não tinha lógica, mas o sentimento era um pouco de trair Rafael. Não tínhamos mais nenhum relacionamento romântico e concordamos que não havia espaço para aquele tipo de coisa entre a gente no momento, então eu poderia muito bem me envolver com outras pessoas. Mas a minha cabeça não é tão preto no branco assim. Tive que fazer um esforço redobrado para parecer tranquilo e esperto ao escolher um apelido para ele.

_Hum... Não sei. Ele é baixinho e tem esse cabelo liso. Parece um playmobil.

Rafael riu e não hesitou em escrever “playmobil” na testa do menino. Nós três rimos. Rafael passou para o próximo da fila, e, antes de segui-lo, troquei mais um olhar com aquele garoto. Só que dessa vez, ele sorriu para mim. Ele não mostrava os dentes quando sorria, mas seu sorriso era largo e seus olhos chegavam a se fechar completamente no movimento. Estava claro para mim que ele queria o que eu queria.

[...]

A calourada aconteceu no prédio em que estudávamos no dia seguinte. Eu acabava de contar para Alice o que tinha acontecido com Pedro.

_Eu quero ouvir um pedido de desculpas sincero seu por ter me empurrado para esse cara._ ela falou.

_Me desculpa, mas..._ ela me interrompeu.

_Nem ouse tentar arranjar desculpas pelo comportamento dele. Aconteceu o que eu sempre te disse que aconteceria, não? Ele não gosta mais de você.

_Mas o modo como eu falei...

_Sim, você poderia ter escolhido um melhor momento e melhores palavras, mas o resultado seria o mesmo. Ele é homofóbico, Bernardo, ele não gosta de gente como você. Ele te quer morto, eliminado da face da Terra pelo bem dos olhos dele.

_É, eu sei...

Eu tentei me divertir naquela festa, até troquei um olhares com Antônio, mas nada conseguia tirar Pedro da minha cabeça. O modo como ele me olhou, o modo como ele estava me tratando era uma tortura psicológica para mim. Por mais que se pudesse supor que ele reagiria assim ao examinarmos sua personalidade, dentro de mim sempre houve esperança que podia ser esperança. Eu achava que ele gostava tanto de mim, que passado o choque inicial, ele saberia lidar com a questão. Juntos, encontraríamos um equilíbrio para nossa amizade. Mas não, nossa amizade estava acabada.

Aquela noite estava sendo um fracasso para mim. Rafael estava numa roda de conversa com seus novos amigos e não me dava atenção, e eu não podia culpá-lo, porque eu não estava sendo a melhor das companhias aqueles dias. Toda hora meu olhar encontrava o de Pedro, que estava sempre cheio de raiva e nojo. Eu tinha perdido Antônio de vista. Alice conversava animadamente com Marcos, o novo amigo de Rafa, e assim tinha me abandonado. E para coroar a noite, eu não estava bebendo por estar com o carro da minha mãe. Para mim, a festa tinha chegado ao fim.

Sem me despedir de ninguém, fui saindo do prédio, mas acabei esbarrando em Antônio. Sorri para ele, que também sorriu em resposta.

_Antônio, né?_ falei me fingindo de desentendido.

_Pode me chamar de Tom.

_Eu gosto de Tom._ respondi.

Era visível que ele já estava um pouquinho bêbado. Vi ele como um replay do que tinha sido eu na calourada do ano anterior.

_Bernardo._ completei.

_Eu sei, eu perguntei por aí.

Ele sorriu malicioso quando falou isso e eu me enchi de tesão. Naquele momento, Pedro magicamente sumiu da minha cabeça e eu me senti muito bem com aquilo.

_Então, já vai embora?_ perguntou.

_Sim. Tá muito desanimado aqui.

_É, também tava pensando em ir embora.

_Bom, eu tô de carro, você quer uma carona?

Eu não sei como tive coragem de falar aquilo, ainda mais sem nenhuma ajuda do álcool. Foi impossível não lembrar de Eric, e de como tudo tinha começado com a carona que ele me deu no dia do trote. Mas ele pareceu ter gostado do que ouviu, pois voltou a sorrir.

_Eu não vou te atrapalhar?

_De jeito nenhum.

_Então vamos.

Caminhamos lado a lado até o estacionamento enquanto íamos conversando banalidades sobre o curso, as disciplinas e os professores. O estacionamento estava muito escuro, e Tom viu uma oportunidade ali. A sua cara de inocente enganava muito bem. Ele me puxou pela camisa, me jogou contra um o porta-malas de um carro, se agarrou em mim e prendeu sua boca com a minha. Sua língua invadiu a minha boca com pressa e tesão. Passado o susto, eu comecei a corresponder seu beijo. Eu agarrei a sua cintura e nossos paus começaram a se esfregar dentro das nossas calças. Não sei quanto tempo perdemos ali, mal parando para respirar. Eu também não sei quanto da cena Pedro tinha assistido.

_Que merda é essa?!

Eu e Tom nos soltamos imediatamente e olhamos para o dono da voz. Pedro nos encarava com um olhar de raiva e as mãos cerradas. Estava escuro, mas eu conseguia ver que a expressão em seu rosto era de pura raiva e nojo.

_Olha, cara, não é nada disso que você está pensando. A gente só tava..._ Tom começou a falar, atropelando palavras no desespero.

_Deixa que eu cuido disso, vai embora._ falei.

Ele não pensou duas vezes e sumiu na escuridão. Eu e Pedro nos encaramos no escuro. Eu estava com muito medo, mas tentava não deixa transparecer.

_Você não vai contar sobre isso pra ninguém._ falei reunindo coragem.

Naquele momento, meu maior medo era que ele saísse por aí espalhando que eu era gay. Eu achava que passaria a ser desprezado e ignorado pelos meus colegas, assim como fizeram com Eric, embora hoje saiba que tratavam ele assim não por causa da sua sexualidade, mas da sua personalidade. Eu não sabia se aguentaria se isso acontecesse.

_Por que eu não deveria?_ ele perguntou com raiva na voz.

_Porque se você contar, você vai ter que se explicar como nós dois éramos tão próximos durante um ano. As pessoas vão fazer conexões...

Ameaçá-lo assim não era a melhor estratégia, mas era tudo o que vinha a minha mente para me proteger. Ele não reagiu nada bem, partiu pra cima de mim e eu recuei com medo. Eu parei espremido entre um carro e ele a poucos centímetros.

_Você tem coragem de me ameaçar?!

_Eu faço o possível para me proteger.

_Sua bicha nojenta!

Eu só vi o momento em que ele levantou o braço e punho desceu com força em minha direção. Só deu tempo de desviar um pouco do soco endereçado ao meu rosto, que acabou pegando no meu ombro. Com o impacto, eu bati as costas num carro e caí sentado no chão. Doeu muito, ele era bem forte, mas era a surpresa do seu ataque que me tirava o ar. Eu nunca imaginei que Pedro chegaria àquele ponto, de me bater. Ele realmente não era a boa pessoa que eu achava que ele era. Meus olhos se encheram de lágrimas ao pensar naquilo. Mesmo no escuro, eu pude notar que seu olhar vacilou, como se só então ele tivesse se dado conta do que tinha feito.

_Eu menti pra você sobre muita coisa, Pedro._ eu falei com a voz embargada _Mas sobre uma coisa eu sempre fui sincero: eu sempre te considerei um amigo. Eu te ajudei em todas as vezes que pude. Eu coloquei você na frente de muita gente que me queria muito melhor, como o Eric. Eu briguei quando as pessoas falavam mal de você pelas costas. Por mais que Alice e Rafael me falassem para me afastar de você, porque você reagiria muito mal quando descobrisse, eu temei e insistia que você era uma boa pessoa. Mas eu estava errado, Pedro. Você não é uma boa pessoa. E você não é meu amigo. Vai embora, por favor.

Ele esperou por mais alguns segundos. Naquele ângulo que eu estava, com ele acima de mim, eu não conseguia ver seu rosto no escuro, então não sei exatamente como ele reagiu àquilo. Só consegui ver seus ombros abaixarem, como se desfizessem a guarda. Ele se virou e foi embora, enfim.

Eu fiquei por mais algum tempo ali, caído naquele estacionamento escuro e chorando baixinho. Mais do que por Pedro, eu chorava por mim mesmo. Pedro tinha nojo de mim, do que eu era, e eu tinha também. Minutos antes, eu me agarrava com um cara que tinha acabado de conhecer num local público, onde qualquer um poderia nos pegar. Eu me senti imundo, do mesmo jeito que me senti na primeira vez que transei com Eric. O soco de Pedro doía na minha alma. Era o soco de um amigo. Aquilo era tão forte, tão pesado para mim.

E assim foi mais uma porrada que a vida me dava, me arrastando cada vez para mais fundo daquele poço sem fim.

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 6 estrelas.
Incentive Contosdolukas a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.
Foto de perfil de ContosdolukasContosdolukasContos: 330Seguidores: 72Seguindo: 30Mensagem Jovem escritor! Meu email para contato ou trocar alguma ideia (contosdelukas@gmail.com)

Comentários

Foto de perfil genérica

Não senti uma energia boa nesse Tom, espero estar errado. Também não achei que Pedro partiria para agressão e espero que ele mude.

0 0
Foto de perfil genérica

Bernardo vai ter que aprender a se defender. E acho que Pedro é enrustido.

0 0