Oi e ai, sou Jonas, você não me conhece, mas se quiser ouvir me história fica aí que eu te conto, sou um cara normal, sem atributos extraordinários ou uma inteligência fora do comum, passaria completamente despercebido se não fosse por um detalhe, sou filho do pastor.
Se você não é da igreja deve pensar que estou exagerando, porém, se você cresceu dentro da igreja vai entender o que eu estou falando, ser um adolescente dentro da igreja é uma coisa, agora ser um adolescente filho do pastor dentro da igreja tudo na sua vida gira em torno dela, não posso ser amigo de pessoas de fora da igreja, não posso ouvir músicas que não sejam gospel, não posso jogar videogames, e tenho que participar de todas as atividades que meu pai me mandar.
Participo da banda, das aulas dominicais, das atividades de caridade e também cuido dos jovens da igreja que meu pai preside, sei que nem todas as igrejas são iguais e que umas são menos rigorosas do que outras, mas a do meu pai é muito tradicional, meu pai é um cara muito duro e rigoroso, ele ainda exige que eu tenha boas notas na escola mesmo não me dando tempo para estudar.
E se você pensa que meus problemas acabam aí você se engana, minha mãe traiu meu pai com o irmão dele, o que não acabou bem, no fim meu pai foi preso por agressão, minha mãe sumiu no mundo com meu tio, meu pai se converteu na igreja e casou de novo com minha madrasta, que é tão fanática religiosa quanto meu pai. Quando meu pai foi solto ele passou a ser conhecido como o pastor que conheceu o caminho e se arrependeu, um exemplo vivo de que a palavra pode curar o homem, não me leve a mal, eu acredito que a religião possa salvar, mas meu pai e minha madrasta com certeza estão fazendo errado.
Quando meu pai estava preso eu morei com minha avó paterna e ela sempre foi muito liberal comigo e foi na adolescência que eu comecei a perceber que não era como os outros garotos da minha idade, não tinha interesse por meninas e me sentia desconfortável perto dos garotos bonitos da minha sala, levou um tempo, mas quando me vi cheirando a cueca de um amigo quando fui dormir na casa dele tive certeza de que era gay.
Quando meu pai apareceu na minha vida dizendo que era pastor e que viveríamos como uma grande família feliz tive que guardar minha recém descoberta bem fundo, pois meu pai é muito preconceituoso e tive medo de sua reação e desde então essa tem sido minha vida, o filho impecável do pastor, baterista da banda, um exemplo pros jovens, um estudante com chances de fazer uma boa faculdade e gay dentro do armário, armário esse que me tranquei e joguei a chave fora.
Durante o primeiro ano isso funcionou bem, porém quando meu pai foi convidado a assumir uma igreja em outra cidade tivemos que nos mudar, a mudança foi difícil, mas imaginei que seria minha chance de ser uma nova pessoa onde ninguém me conhecia bem, seria mais fácil de esconder meu lado secreto, meu pai estava super empolgado com a mudança e ainda mais animado porque eu teria um amigo que ele julgava ser uma ótima influência para mim.
— Pai, não conheço o cara, como o senhor pode ter certeza que seremos amigos. — Falei enquanto arrumava meu quarto tirando meus pertences das caixas.
— Deus me disse que esse lugar seria bom para gente, Isaac é filho do contador da igreja, menino bom, faz parte da banda e ele é muito engajado assim como você meu filho. — Ele realmente esperava que eu ficasse amigo do senhor perfeição.
Para não discutir com meu pai apenas continuei arrumando minhas coisas, estava nas ferias do meio do ano, mesmo mudando de escola, sabia que tinha grandes chances no vestibular, meu objetivo era conseguir cursar uma faculdade longe do meu pai e da minha madrasta, mas para isso precisava estudar bastante e tentar medicina, que era o único curso que meu pai deixaria que eu cursasse longe de sua supervisão — E nem adianta me perguntar, não entendo a logica dele.
O senhor perfeição — apelido que dei para o Isaac — também estava no terceiro ano e graças a meu pai estudávamos na mesma escola e como era “sortudo” tinha certeza que seríamos da mesma sala, não o tinha visto ainda, mas o conhecia bem de tanto o pastor enaltecer, o cara parecia não ter defeitos, até a bruxa da minha madrasta amava o garoto, ela dizia que ele era educado e muito responsável, claro que a família do senhor perfeição não era diferente, o pai era contador da igreja e trabalhava na contabilidade de uma grande fábrica, sua mãe era o exemplo para as outras irmãs casadas da igreja, e o príncipe encantado era filho único.
— Jonas, preciso que vá até a igreja pegar as chaves para mim, Marcos (pai do Isaac) deixou com o Isaac, ele está ensaiando com a banda, bom que você já se apresenta.
— Tenho que terminar de arrumar meu quarto pai. — Não queria ir.
— Não estou pedindo Jonas. — Disse ele com sua voz severa.
— Sim, senhor! — Respondi aceitando minha derrota.
Peguei minha bicicleta, coloquei meus fones de ouvido, ouvindo uma música que meu pai não aceitaria e fui para a igreja, a igreja era maior que a antiga, o prédio era bonito e dá entra consegui ouvir a música lá dentro, fui entrando no salão e vi a banda no altar ensaiando, tinha uma menina cantando, sua voz era linda assim como sua aparência, um cara meio gordinho no teclado e o que imaginei ser o senhor perfeição tocando guitarra, o cara parecia tao arrogante, era negro, alto e seu corpo parecia bem forte, Isaac era o oposto de mim, eu um branco mais puxado para o pálido e magricelo.
Assim que me viram Isaac pediu um tempo no ensaio e veio falar comigo, normalmente ficava desconfortável falando com homens bonitos e com certeza Isaac era um cara bonito, mas a raiva que já sentia dele me fez ficar firme.
— Oi, você deve ser o Jonas. — Sua voz era grossa e combinava com ele.
— Vim pegar as chaves do pastor. — Não fui muito educado, mas queria ir embora logo.
— Claro, o pastor disse que você toca bateria. — O cara queria mesmo puxar assunto.
— Toco sim. — Respondi ainda sendo um pouco ríspido, entretanto Isaac pareceu não se importar e continuou.
— Estamos precisando de um baterista, porque não ensaia com a gente. — Disse isso enquanto os outros confirmavam com a cabeça.
— Tá posso tentar. — Queria recusar, mas se o pastor soubesse ouvira um sermão que duraria fácil uma semana.
— Pessoal esse é o Jonas filho do pastor, Jonas essa é a Raabe e o Gabriel. — Isaac me apresentou aos outros.
Eu gosto de música, mesmo não me considerando um bom baterista tive sorte de conhecer as músicas que eles ensaiavam e pude acompanhá los, quando acabamos fui elogiado pela Raabe e pelo Gabriel, Isaac foi buscar as chaves na sua mochila e eu pude conversar com os dois, descobri que Raabe era namorada do senhor perfeição, claro que ele namora alguém do coral da igreja, assim que peguei as chaves do meu pai sai de lá, não estava mais aguentando ficar perto do Isaac, acho que por meu pai me encher tanto por causa dele, simplesmente peguei um ranço do cara.
Como estava de ferias não iria precisar olhar muito para a cara dele, pelo menos era o que eu pensava, em casa falei para meu pai que tinha demorado porque estava ensaiando e ele me revelou uma informação que não me agradou em nada.
— Por que não ofereceu uma carona para o Isaac. — Fiquei confuso com sua pergunta.
— Não sei onde ele mora pai.
— Ué, eu te falei Isaac mora na casa em frente. — Disse meu pai me lembrando que ele havia falado e eu não prestara atenção.
— Em frente à nossa casa, aqui. — Perguntei com uma cara confusa.
— E Jonas, um dos motivos de termos escolhido essa casa é justo por ser perto da igreja e perto da família do irmão Marcos.
Era só que me faltava, morar em frente a casa do senhor perfeição, nossa não tinha castigo pior, já não bastava ter que ver o cara na igreja e na escola quando as aulas voltassem, ainda teria que vê lo na rua da minha casa, era muito azar, agora além de ser o filho do pastor eu seria sempre comparado ao senhor perfeição, o que eu e nem o pastor sabíamos era que Isaac seria o causador da minha ruína.
