O outro capítulo 35 O evento literário

Um conto erótico de Arthur Miguel
Categoria: Gay
Contém 8810 palavras
Data: 18/06/2022 19:19:49
Última revisão: 18/06/2022 19:55:25
Assuntos: Amor, Carinho, Desejo, Gay

Capítulo 35

Recado do autor: Olá, Querides! Neste capítulo trago uma surpresa para vocês. Para quem acompanha o meu trabalho por aqui, sabe que já publiquei uma série com duas temporadas de uma história chamada Borboletas sempre voltam. Então, neste capítulo teremos a participação especial de dois personagens dessa história. Fiquem atentos, pois um pequeno spoiler foi solto sobre a terceira temporada de Borboletas sempre voltam.

Boa leitura 😘

Leandro despertou com o toque do celular. Atendeu sonolento e um pouco assustado quando viu o nome de Júlio na tela.

Estava confuso com as gritarias do ex-marido, que Leandro percebeu que estava muito bravo.

_ Calma, Júlio! Não estou entendendo nada.

Aos poucos, a sua mente se afastava da sonolência e se viu despertada por completa.

Leandro se assustou com o que Júlio acabou de contar. Para ele, era quase impossível que Vanessa teria coragem de ser tão ousada.

Levantou as pressas, indo até ao banheiro para lavar o rosto e trocar o pijama por roupas adequadas para sair de casa.

A sua tensão estava estampada em sua feição, o que foi percebida pelo porteiro.

_ Bom dia, Leandro. Parece preocupado. Você tem algum problema?

_ Na verdade, tenho 2: Uma filha adolescente e um ex marido incompetente.

Leandro chegou na cobertura o mais depressa que pode. Apesar de não haver mais sinal de Pedro, pai e filha discutiam veemente.

Uma hora atrás da chegada de Leandro, Júlio tomou um dos maiores sustos que tivera na vida. Para ele foi revoltante ver a sua filha seminua nos braços de um rapaz no mesmo estado.

Partiu para cima de Pedro, puxando o menino para fora da cama pelo pescoço e desperdiçando socos no rapaz. Devido ao susto, Pedro não conseguia reagir de um jeito recíproco. Apenas cobria o rosto com os braços.

Vanessa tentou separar o pai do amigo, mas recebeu um empurrão e caiu de costas no chão.

As pressas, Vanessa vestiu um roupão e saiu do quarto, descendo as escadas correndo para pedir ajuda pelo interfone.

Minutos depois, dois funcionários do prédio já estavam no quarto de Vanessa segurando Júlio para apartar a confusão.

_ Eu não tenho culpa de nada. Foi a Vanessa que me convidou para vir pra cá. Se você não sabe impor limites na sua filha, a culpa é toda sua.

_ Como se atreve a me dizer isso, seu moleque desgraçado?! Eu vou arrebentar a sua cara!_ Júlio gritava, se debatendo nos braços dos homens que o seguravam._ Ela é menor de idade e você já tem dezoito anos! Eu vou foder com a sua vida!

Júlio foi arrastado para o próprio quarto até dar tempo de Pedro se vestir e ir embora. Mais tarde, o rapaz ligou para Vanessa, como a menina não quis atendê-lo, ele deixou um recado na caixa de mensagem a xingando com a voz brava.

_ Sua maluca! Você me disse que o seu pai não estaria em casa! Porra! Nunca mais fala comigo, vadia.

Bravo, Júlio expulsou os homens da sua casa.

_ Saiam daqui! Eu quero falar com a minha filha!

_ Senhor se acalme! Não vá bater na menina!_ pediu um dos homens.

_ A sorte dela é que não bato em mulheres. Mas que ela tá merecendo uma boa surra! Ah, isso tá!

As ordens de Júlio foram obedecidas. Os homens temiam algum desastre, mas não quiseram arriscar os seus empregos de seguranças contrariando um morador rico.

_ O que você tem na porra da cabeça, Vanessa, de achar que tem o direito de pôr macho dentro da minha casa?

_ Estou sua sob sua influência, papai. Você não botou um qualquer aqui dentro? Então, os direitos são iguais.

Júlio sentiu uma vontade imensa de partir para cima da filha. Mas os seus princípios o controlavam. No entanto, aumentou ainda mais o tom de voz.

_ Direitos iguais é o caralho! Esta porra desta casa é minha! Eu que sou o dono de toda essa merda e faço o que bem entendo! Eu sou o seu pai e você é menor de idade e depende do meu dinheiro para viver! Quem manda aqui e em você sou eu! Enquanto você estiver vivendo sob o meu teto, dependendo do meu dinheiro, deve fazer o que eu quiser!

_ Eu não sou a sua propriedade! Você não me comprou!

_ Ah comprei sim! Comprei e paguei muito caro por você! E agora me arrependo muito!

_ Como assim comprou? O que você está dizendo?

Júlio parou de falar por um instante, sem deixar de olhar com ira para a filha. Mesmo fora de si, percebeu que falou o que não deveria.

_ Quer saber? Eu não vou segurar essa merda sozinho._ Júlio pegou o celular em cima do criado mudo._ Eu vou ligar pro o seu pai! Ele também é culpado por isso. Esse seu comportamento é típico de uma feminista vagabunda...a cara da Valéria...isso é influência dela.

_ A Valéria não tem nada a ver com isso. É influência sua e daquele nojento que você chama de namorado.

_ Vanessa, cala a porra da boca, antes que eu perca o pouco de paciência que me restou e faço o que estou me controlando para não fazer.

Quando Leandro chegou, todos estavam na sala. Vanessa já estava vestida com um conjunto de moletom cinza, com os braços cruzados, sentada no sofá e os olhos vermelhos de tanto chorar.

_ É isso! Essa menina não tem limites! Não respeita ninguém! A língua é mais afiada que uma lâmina! Olha o absurdo que ela cometeu! Trazer um moleque pra dentro de casa! Isso é...eu não tenho palavras para descrever! É uma puta!

_ Júlio, não fale assim! Eu não vou admitir que xingue a nossa filha desse jeito!

_ Ah, agora você vai defender a garota?! Vai aprovar essa luxúria?! Logo você, todo metido a bicha puritana! Aprendeu mesmo com o seu amante!

Leandro sentiu tanta raiva, que o olhou com fúria. Respirou fundo tentando se controlar.

_ Você tem razão, Júlio! Todo mundo aqui é promiscue, menos você, que é a personificação da moralidade.

_ Olha Leandro, não venha de ironia pra cima de mim! Eu não bati na Vanessa por ela ser mulher, mas em você nada me impede.

_ Tenta a sorte, "valentão"._ desafiou Leandro.

Júlio se armou para começar uma briga física, mas Vanessa se levantou imediatamente para impedir.

_ É isso mesmo? Vocês vão sair na porrada na minha frente?

Júlio recuou, socando uma mesa de madeira.

_ Porraaaaa!

_Julio, se acalme! Nós não vamos resolver nada enquanto você estiver fora de si. Em nenhum momento eu disse que a Vanessa está certa. Mas não gosto de ouvir você falar dela desse jeito! Pelo amor de deus! Não é assim que se resolve as coisas.

_ E o que você sugere, Leandro? Que passamos a mão na cabeça dela?

_ É lógico que não! Você errou, Vanessa! Errou feio! Mentiu pra nós, foi irresponsável de trazer esse menino para dentro de casa só para se vingar do Júlio! Foi uma atitude idiota, infantil e totalmente intolerável! Olha toda a confusão que você arrumou!

"Eu sugiro que nos acalmamos e pensamos numa punição adequada para a Vanessa. Um castigo que seja decido em conjunto. Apesar de não sermos mais um casal, ainda dividimos a guarda e a paternidade dela."

_ Nós ainda somos um casal sim! Estamos casados perante a lei.

_ Isso não importa! O assunto aqui é a Vanessa. É nela que temos que focar.

_ Ah, vocês nunca conseguem se entender! Vivem as turras e me deixam louca com isso, mas para me ferrar, vocês se unem!

Leandro olhou com seriedade para Vanessa e disse com firmeza:

_ Cala a boca, mocinha! Você já causou confusão demais por hoje! Vá para o seu quarto agora e só saia quando te chamarmos!

Vanessa permaneceu no mesmo lugar.

_ Vá agoraaaaa!_ Leandro deu um grito tão forte e inesperado, que Vanessa, pela primeira vez, sentiu medo dele. Mesmo contrariada, ela foi para o quarto.

_Eu vou ser muito claro contigo, Júlio. Eu estou aqui para resolver o problema da Vanessa. E espero termos uma conversa amigável e chegarmos a um acordo do que vamos fazer. Eu não vou admitir que você me faça acusações, me culpando pelas atitudes dela, falar sobre nós ou qualquer outra coisa que não seja a Vanessa. Caso contrário, vou sair por aquela porta e deixar que você se vire sozinho. Estamos entendidos?

Júlio concordou com a cabeça.

Vanessa foi chamada quase uma hora depois. Ela desceu um pouco mais calma, mas sem deixar de lado a expressão de arrogância.

_ Os "juízes" já decidiram a minha sentença? Deixa eu adivinhar? Vou ficar sem mesada, cartões de crédito e internet?

_ Não só isso._ respondeu Júlio._ Além de tudo isso, acrescente um mês sem sair de casa. As suas férias será dentro de quatro paredes.

_ Tanto aqui, quanto lá em casa, quando passar os fins de semana comigo._ acrescentou Leandro.

Júlio seguiu dizendo:

_ Nós dois conversamos sobre o quanto estamos insatisfeitos com o seu comportamento no colégio. São brigas na porta, reclamações de professores, notas baixas e saliência com os meninos. O que nos levou a decidir que você mudará de escola.

Vanessa arregalou os olhos surpresa.

_ Você precisa de disciplina, Vanessa. Vai estudar numa escola tradicional, rígida e integral.

_ Ah não! Vocês não podem fazer isso! Eu não quero estudar numa escola chata e muito menos ficar o dia inteiro enfiada lá.

_ Pensasse nisso antes de fazer o que não deveria._ respondeu Leandro._ A mudança ocorrerá ainda este ano.

_ E os meus amigos?

_ Se despeça deles._ Leandro respondeu.

_ E se mesmo assim você continuar se comportando mal, seu próximo colégio será um internato._ Júlio disse com firmeza.

Vanessa odiou a punição que recebeu. Ela já esperava perder dinheiro por um tempo, mas nunca imaginou que os pais tomariam tal decisão. A menina implorava chorando para que os pais a perdoassem e voltassem atrás, mas eles foram irredutíveis na decisão.

Ao fim da conversa, Leandro se despediu da filha, e Júlio fez questão de acompanhá-lo até o estacionamento. Ele já estava mais calmo e tinha a voz e a expressão mais doce.

_ Leandro, me desculpe por ter te dito aquelas coisas. É que aconteceram tantas reviravoltas em tão poucas horas. Nem dormir eu consegui direito. Sinto muito pela minha estupidez. Além disso, obrigado por me ajudar. Sem você eu não teria raciocinado sobre o que fazer com a Vanessa. Confesso que é muito difícil cuidar dela sozinho. Você sempre fez isso e sem você eu me sinto perdido.

_ O que é curioso, já que você sempre me acusou de incompetência na educação da Vanessa.

_ Eu estava errado. Foi bom termos tomado essa decisão juntos. Eu me arrependo muito de não ter feito isso antes e deixado toda a responsabilidade pra você.

_ Eu sempre tentei educar a Vanessa, sempre quis dar limites a ela, mas você sempre me impediu. E deu no que deu.

_ É...eu fui um péssimo marido e pai.

_ Foi sim.

_ Mas eu gostaria muito de ter uma oportunidade de poder consertar as coisas. Ser um pai e marido melhor.

_ E você pode ter essa oportunidade. A Vanessa está sob a sua custódia durante os dias úteis e, você pode ser um bom namorado para o Luciano.

_ É...o Luciano.

Leandro estranhou a forma insatisfatória como Júlio se referiu com desdém ao atual namorado.

_ Tem certeza que você não quer almoçar conosco? Seria um prazer. Acho que a nossa separação está fazendo muito mal a Vanessa...seria bom se ela...

_ Júlio, eu tenho que ir. Estou cansado. _ Leandro disse o interrompendo.

_ Tudo bem. Tchau.

_ Passar bem._ Leandro antes de entrar no carro e partir.

...

Foi Marcinha quem recebeu a primeira ligação de Vanessa contando tudo que havia acontecido. No dia seguinte, antes de viajar, a jovem foi visitar Vanessa em sua casa.

Ela foi recebida pela nova empregada de Júlio, esse já estava trabalhando no escritório.

_ Eu vou anunciar que a senhorita está aqui.

_ Não precisa, Valdeia. Eu sei o caminho do quarto da minha amiga._ disse Marcinha subindo a escada.

_ Espere. A dona Vanessa não sabe que a senhorita está aqui e...

_ Não se preocupe com isso. Eu já sou de casa.

Ao ver Marcinha, Vanessa levantou da cama e a abraçou. Ambas sentaram na cama com as pernas cruzadas em formato borboletas, enquanto conversavam.

_ Bichaaaa! Você é loucaaaaa!_ Exclamou Marcinha._ Eu nunca teria coragem de enfrentar os meus pais desse jeito. Com certeza eles teriam cortado a minha viagem para Orlando. Eu ainda te falei para não fazer isso. Eu queria muito que você fosse conosco. Não vai ser a mesma coisa ir aos parques da Disney sem ti.

_ É..eu tava tão puta com a ideia do idiota do Luciano ir na minha festa, que nem pensei.

_ E pelo que fiquei sabendo, amiga, Pedro tá putasso contigo. Falou que nem quer olhar na sua cara tão cedo.

_ Ah não esquenta a cabeça com isso não. Hoje de manhã, mandei um nude pra ele e o bichinho ficou doido._ Vanessa disse sorrindo presunçosa._ Ele já tá de boa comigo.

_ E vocês? Estão namorando?

_ Claro que não!

_ Uh, é! Por que, amiga?

_ E eu vou lá me prender tempo namorando o Pedro?! Foi só sexo. Foi bom, mas nada que vale a pena abrir mão da minha liberdade.

_ Se por um lado o Pedro não vai tirar a sua liberdade, por outro os pais fizeram isso. Ah ninguém merece estudar numa escola careta.

_ Ah nem me fale! Eu tô puta com isso!

_ Mas amiga, eu já falei com a minha mãe e ela concordou em me matricular na escola que você for estudar.

_ Aaaaah, sério, que você fazer esse sacrifício por mim, amiga?!_ Vanessa a abraçou emocionada com gesto generoso da amiga.

_ Claro que sim! Você é a minha melhor amiga!

_ Vai ser menos ruim ir pra escola, já que vou te ter por perto.

_ E pra qual escola você vai?

_ Ainda não sei.

Marcinha deu um sorriso repentino, dando um leve tapinha na cabeça por ter uma boa ideia.

_ Amigaaaaaa, que tal se estudarmos na Lycée Saint Vincent?

_ Ficou louca, Marcinha? Nem pensar. Eu já ouvi falar que essa escola é bilíngue, e que é proibido falar português na escola. O meu francês não é tão bom quanto o do meu pai Leandro. Sem contar que o uniforme de lá é horroroso! Tô fora!

_ Amiga, sabe quem estuda lá e também está no segundo ano?

_ Ham?_ Vanessa murmurou com ironia, demonstrando não ter o maior interesse em saber.

_ Ninguém mais e ninguém menos que Gabriele Fernandes!

_ A filha dos jornalistas?! _ Vanessa perguntou admirada com a boca aberta.

_ A própria!_ Marcinha respondeu dando um tapinha na perna de Vanessa.

_ Me-u-de-us! Caralho! Caralhoooo! Eu preciso estudar lá. Marcinha, essa menina é muito foda! Tipo ela tem muitos seguidores, se eu colar com ela posso ganhar seguidores também e também me tornar uma blogueira famosa como ela! Posso até ganhar meu próprio dinheiro e esfregar na cara dos meus pais! Marcinha, eu preciso ficar amiga dessa menina!

_E eu que já peguei o irmão dela.

_ Sério?!

_ E te contei. Você que não deu a mínima. Mas eu peguei. O nome dele é Patrick. Ele me levou pro quarto dele.

_ Mulher você entrou na casa dos jornalistas mais famosos do Brasil?! Aaaaaah!

_ Entrei e dei muito pra ele! Amiga, ele é tão gostosinho! E detalhe né, quando acordei de manhã e fui na sala, lá estava a Gabriele no sofá!

_ E o que você fez?

_ Tietei uh, é! Pedi autógrafo e tirei uma selfie.

_ Aiiii que foda! Amiga, eu vou ser uma blogueira famosa! Quem sabe eu convide a Gabriele e o irmão para a minha casa em Angra e depois eles me convidam para as festas deles. Meu amor, postar fotos com os pais dela vai me render muitos likes.

_ Ah, ainda tem outra grande vantagem em estudar no Lycée Saint Vincent.

_ Qual?

_ Só um minuto.

Marcinha retirou o smartphone da bolsinha, clicou no aplicativo do Instagram e mostrou a foto de um belo homem loiro, que aparentava ter uns trinta e cinco anos.

_ Mas que que é isso, meu deus?_ Vanessa perguntou admirada com a beleza do homem.

_ Esse é Eric Schneider, o professor de literatura!

_ Nossa que delícia! Gente, é muito lindo! Eu sentava lindamente e nem guindaste me tirava de cima.

_ E eu idem.

_ Mas como é que você sabe que ele é professor da Lycée Saint Vincent?

_ Ah, o Patrick me disse que estudava lá, aí pesquisei no perfil da escola, vi uma foto que eles postaram do corpo docente junto numa confraternização, cliquei na marcação do Eric e comecei a segui-lo._ Marcinha disse sorrindo, orgulhosa da sua habilidade de stalker.

_ É...e eu pensei que seria castigada. Mas eu vou é me dar bem.

_ Tá mas, você não pode dizer para os seus pais que quer estudar lá. Se eles querem te castigar não vão deixar que você escolha a escola.

_ É... você tem razão... já sei! Vou ligar pro Rubens e pedir para que ele dê um jeito.

_ Isso! Boa ideia, amiga.

Imediatamente, Vanessa ligou para Rubens, que a atendeu de imediato. Ele já sabia o que havia ocorrido há dois dias atrás e estava curioso para ouvir a versão de Vanessa.

_ Fala, minha abelha rainha.

_ Oizinho, Rubinho! Estou precisando de um favorzinho seu!

_ Diga, soberana.

Vanessa contou sobre o castigo e pediu a ele que sugerisse para o pai que ela estudasse no Lycée Saint Vincent. Rubens concordou no mesmo instante, prometendo que ligaria em seguida.

Assim que o celular tocou, Vanessa atendeu no mesmo instante. Marcinha pediu para que a amiga colocasse no viva voz.

_ E aí?_ a menina perguntou empolgada.

_ Sinto muito, meu bem, mas o seu pai deixou essa função da escolha da sua nova a encargo do Luciano.

_ O quê?!_ Vanessa gritou._ O que esse filho da puta tem a ver com isso?! Ele não é da família!

_ Mas é o secretário do seu pai. E todos nós já estamos carecas de saber que Júlio não tem a menor paciência para resolver essas coisas e sempre "joga" para os secretários.

Com ódio, Vanessa atirou o celular na cama e deu um grito, deixando Marcinha assustada.

....

_ Menino, que chuva é essa?!_ Patrícia comentou espantada, entrando na livraria e fechando o guarda-chuva.

_ Agora deu uma trégua.

_ Até que enfim, né. Durante o caminho da minha casa para cá estava caindo uma tempestade.

_ Para te animar, acabei de passar um cafezinho e comprei pães frescos. Estão no cantinho do café, lá em cima.

_ Obaaaaa! Vou lá tomar um cafezinho e me preparar para pegar no batente.

Antes de subir, Patrícia deu um beijo no rosto do patrão, subindo contente.

Leandro a observava subir as escadas e sorria. A cada dia mais adorava trabalhar na livraria e ter a companhia de Patrícia.

Ouviu o barulho da porta de vidro se abrindo. Preparou-se para receber o cliente com a mesma simpatia que destinava a todos.

Contudo, seu sorriso se desfez quando notou que era Abner quem entrava portando um buquê de rosas brancas e rosês.

_ O que você está fazendo aqui?

_ O se faz numa livraria?

O sorriso de Abner o irritou profundamente. A presença do ex rival ainda o incomodava. Fitava bem o rosto do cozinheiro, se perguntando como era o verdadeiro caráter de Abner, o que escondia por debaixo da máscara. Já que julgava não o conhecer. Foi por Dimitri que ele se apaixonou, que não passava de um personagem criado e interpretado pelo ex amante do seu ex marido.

_No seu caso, há duas coisas que poderá fazer numa livraria: uma comprar um livro, é o que pessoas normais fazem, ou perturbar a paz alheia, o que é a sua cara.

_ Eu vim pela primeira opção.

_ Com tantas livrarias no Rio de janeiro e você decidiu vir justamente na minha? Aí que "honra". Me sinto "lisonjeado."

_ Nenhuma livraria tem um proprietário tão lindo, inteligente e sexy como está aqui.

_ Como conquistador, você é um ótimo cozinheiro.

_ Só um ótimo amante também. Você sabe disso.

O olhar que Abner direcionou a Leandro o deixou arrepiado dos pés a cabeça. Num relance, a memória de Abner dentro dele aflorou o deixando trêmulo de excitação. O cozinheiro mordeu a pontinha do lábio inferior, fazendo com que Leandro desejasse aquela boca.

Há tempos não fazia sexo. A sua fome sexual o levava ao desespero, se aliviando todas noites, na masturbação noturna, o que só o satisfazia momentaneamente. Ele desejava mesmo era o calor de um corpo humano.

Mas Leandro era um homem equilibrado. Dizia para si mesmo que a razão deve imperar sobre o tesão. Não estava disposto a fraquejar.

Abaixou a cabeça, fingindo anotar algo. Queria que Abner se sentisse ignorado.

O moreno se aproximou do balcão. Depositou sobre ele o buquê.

_ O que é isso?!_

_ Você não é cego.

Leandro pegou o pequeno envelope que estava no buquê. Ao abrir, percebeu que dentro havia um mini jornal com a seguinte manchete: " Otário mágoa o coração do amor da sua vida e se arrepende."

Na fotografia, Abner segurava um cartaz em forma de coração que dizia: "Meu amor, sinto a sua falta. Me perdoa?"

Leandro deu um sorriso com o canto da boca. Não porque estava disposto a perdoar Abner, ou estivesse feliz. O motivo do seu sorriso era que estava estupefato com a criatividade absurda de Abner.

_ Você acha mesmo que isto aqui é o suficiente para eu te perdoar?

_ Não. Eu só queria me aproximar de você. Sei que para conquistar o seu perdão vou ter que fazer muito mais do que isso. Eu até pensei em por uma faixa aqui em frente, mas creio que você não gostaria.

_ Não gostaria mesmo. Odeio chamar a atenção. Nem pense nisso.

_ Eu sei. Te conheço._ Abner piscou um dos olhos.

_ Pena que não posso dizer o mesmo de você.

_ Você me conhece sim. É o único que me conhece. Eu fui eu mesmo quando estive com você...menti sim, em muitas coisas. Mas pela primeira vez, pude ser a minha essência com alguém. Eu tenho dois lados, sabia? Cada pessoa tem de mim o que conquista. E você conquistou o meu melhor.

_ Se aquele é o seu melhor, tenho medo do pior... Aliás, eu só quero entender o porquê eu. O que você tem contra mim? Tinha vontade de se casar com o Júlio e me via como um empecilho?

_ No começo sim. Ele mentiu pra mim, dizendo coisas horríveis a seu respeito. Eu acreditei. Mas depois te conheci e me apaixonei por você. Só não contei a verdade antes porque tive medo de te perder.

"Eu quis terminar com o Júlio, mas tinha um cara que queria me matar e a Lorena, sem a minha permissão pediu ajuda pro desgraçado. Ele resolveu o problema, mas mentiu pra mim que o Franklin estava vivo e que se eu não ficasse com ele, me entregaría de bandeja."

_ O que aconteceu com o esse tal de Franklin?

_ Eu soube que ele se matou. Deixou uma carta de suicídio. Mas eu sei que isso não é verdade. Júlio está por trás disso.

Para Leandro era apavorante pensar que não conhecia totalmente o homem com quem compartilhou a vida durante tantos anos. Mesmo depois de todas as decepções que sofrera com Júlio, era estranho pensar que ele é um assassino ou um mandante de assassinato, o que para Leandro não havia diferença.

Viu-se apavorado. Percebeu que Júlio era como um caminho turvo, não se podia ter ideia o que se esperar dele.

_ Acho melhor encerrarmos essa conversa. Quanto mais afundo entro nesse poço, mais sujeiras descubro.

_ Eu entendo...sei que pra você é difícil lidar com isso. Mas eu prometo ser mais sincero com você. Me dê uma nova chance, por favor?

_ Abner, eu tenho mais o que fazer.

_ Leandro, não me tire da sua vida.

_ Eu só quero que você e o Júlio me deixem em paz. Não sou Egito para ter que lidar com pragas. Agora me dê licença? Preciso trabalhar.

_ Você não precisa ser tão grosseiro assim.

_ Se não gosta da minha grosseria, é só usar a porta da rua.

_ Não. Eu gosto da sua grosseria. Eu a mereço.

_ Como você é insuportável!

_ E você é delicioso!

Patrícia desceu as escadas.

_ Patrícia, por favor, atenda esse senhor, porque eu tenho mais o que fazer.

_ Ah que lindo buquê! É seu, Leo?

_ Não. É seu. Eu pedi ao Abner que fizesse o favor de comprar pra você. Claro que dei o dinheiro. Você tá sendo tão boa comigo, que quis encontrar um jeito de ser grato.

Leandro jogou o envelope de Abner na lixeira e entregou o buquê a Patrícia, que entendeu o que estava acontecendo ali, mas preferiu ficar calada.

Abner não gostou nada da atitude de Leandro, que para provocar ainda mais o olhou com deboche.

...

Naquela manhã de segunda-feira, Valéria decidiu passar na livraria para fazer uma rápida visita ao amigo. Ainda não havia chegado nenhum cliente. Eles aproveitaram o momento ocioso para conversar enquanto tomavam café.

_ Gente, essa menina nunca teve limite mesmo!_ Exclamou Patrícia.

_ Eu estou adorando tudo isso._ disse Valéria, causando espanto em Leandro.

_ Uh, é! O Júlio sempre te desmoralizou na frente daquela garota, sempre fez as vontades dela, mesmo que isso te incomodasse, agora ele está colhendo o que plantou.

Patrícia concordou.

_ O que mais me preocupa é o rumo que a Vanessa está tomando. Eu não quero isso pra minha filha. Ela está cada vez mais parecida com o Júlio. Vanessa usou o rapaz para afrontar o pai, mentiu pra mim e pra ele. Sem contar que, na escola, ela é uma péssima aluna. Está se tornando uma garota rebelde e arrogante.

_ Está se tornando não, Bijuzinho. Ela sempre foi. E você precisa se preocupar com outras coisas também. Deixe que o Júlio esquente um pouco a cabeça com essa menina. Você precisa viver, meu bem.

_ Nisso a Val tem razão, Leandro. Você lutou tanto para se libertar do Júlio. Não é justo que ele te arraste para que resolva tudo. Você sempre fez isso sozinho. Eu acho que você precisa sair mais, quem sabe arranjar um namoradinho.

_ Eu namorar? Nem pensar. Primeiro que não estou com cabeça pra isso. Quero focar no meu trabalho. E sem contar que Vanessa está fazendo um inferno na vida do Júlio por ele estar namorando, imagina o que fará comigo?

_ Vai fazer porra nenhuma!_ disse Valéria irritada, pondo as mãos na cintura._ Você tem que parar de mimar essa garota chata. Ela, quando quer sentar, senta sem preocupar com a sua opinião. Você deve fazer o mesmo. O seu mal é dar muita confiança pra ela. Eu hein!

A conversa foi interrompida quando dois clientes entraram na livraria. Um deles não era estranho para Leandro, que sorriu feliz ao reconhecer o ente querido.

Entravam na loja com o auxílio de um taxista, um jovem cadeirante de cabelos ruivos e uma senhora idosa de baixa estatura, cabelos curtos e brancos, que tinha um sorriso gentil.

_ Professora! Que honra de te rever por aqui!

Leandro recebeu um abraço aconchegante e acalorado. Ele sentiu tantas saudades daquele abraço.

Após concluir o curso de Letras, Leandro ingressou na pós graduação de Lato Sensu em literatura francesa. Mesmo sendo graduado em português/italiano, ele desejava aprofundar os seus conhecimentos em literatura francesa, pela qual era apaixonado.

Apaixonou-se pelas aulas da professora Franscica Almeida Castro, conhecida carinhosamente como Chiquinha. Ela era considerada uma das melhores professoras da universidade federal que lecionava há anos, tendo em seu currículo o mestrado, doutorado e o pós doutorado, sem contar nas preciosas contribuições que presenteou á crítica literária com os inúmeros artigos e livros publicados no Brasil e na França.

Leandro tinha por ela uma admiração imensurável. Além da forma brilhante em que ela transmitia os seus conhecimentos num francês fluente, dona Chiquinha era amável com todos alunos.

Leandro nunca teve o apoio da família para seguir carreira no magistério, era sempre desmotivado pelos pais e o ex-marido que viam a dedicação aos estudos literários como algo inútil. Um passa tempo para um homem desocupado que não tinha nada de interessante para fazer, o que o entristecia muito. Para Leandro, era frustante não poder expressar a sua paixão pela literatura sem ser menosprezado, principalmente por Júlio.

Dona Chiquinha, ao contrário de Júlio, o motivava sempre, fazendo com que Leandro enxergasse o próprio potencial, sendo uma boa professora e orientadora no seu projeto de mestrado, dando além do suporte acadêmico, o emocional.

Quando obteve a aprovação, foi a ela quem Leandro deu a notícia em primeiro lugar. Ficou tão feliz em ver o orgulho verdadeiro que a professora teve dele. Aquele sorriso e o brilho nos olhos dela o fizeram se sentir muito bem.

No entanto, Leandro não conseguiu dar continuidade aos estudos. Ao perceber a evolução do marido, Júlio não mediu esforços para desmotiva-lo com torturas psicológicas e manipulações, até que Leandro trancasse o curso sem concluir o mestrado, fato que ele se arrepende até hoje.

_ É maravilhoso! Vê-la aqui! Como a senhora está? Sente-se no sofá. A senhora quer uma xícara de café?

_ Eu estou bem, meu querido. Vou sentar sim, que não sou mais uma mocinha. E essas pernas já estão cansadas demais de tanto que caminhei nesta vida. Este é um querido amigo, Patrick. Ele também é um leitor voraz como nós. É uma pessoa muito querida, que tenho como se fosse um neto. Patrick, este é o Leandro, um dos meus melhores alunos do curso de pós graduação que eu dava antes de me aposentar de vez.

_ Ah, que bom! Muito prazer em conhecê-lo, Patrick.

Ambos apertaram as mãos, se cumprimentando. Orgulhoso, Leandro apresentou a ex professora as amigas que estavam ali presentes.

Dona Chiquinha contou a Leandro que ficou sabendo da livraria por Patrick. No dia do lançamento do livro da escritora Helena Dinis, o ruivo assistiu uma transmissão via live de uma booktuber que ele acompanha nas redes sociais. Patrick procurou saber mais sobre A livraria das roseiras porque ficou encantado com o local.

Em uma de suas visitas a dona Chiquinha, ele mostrou a ela o perfil do Instagram da livraria e a professora reconheceu Leandro em uma das fotos.

Aquela era uma das manhãs mais prazerosas que Leandro teve durante os últimos meses. Mostrou empolgado a livraria para eles. Além disso, em meio ao assunto sobre livros, descobriu que ele e Patrick tinham gostos literários afins. Trocaram números de telefones, iniciando uma adorável amizade.

Patrick não exitou em gastar muito dinheiro comprando livros e parcelando no seu cartão de crédito, não só por gosto, mas porque se viu animado diante das muitas indicações de Leandro.

_ O meu marido vai me matar, mas vai valer a pena._ brincou Patrick.

_ Como assim "matar"? Ele não gosta de ler?_ Patrícia perguntou.

_ O Matheus até gosta de ler, mas não faz isso com tanta frequência. O que ele implica é com a minha coleção imensa de livros. A nossa casa não é muito grande e ele reclama da ocupação de espaço. Não vou dizer que ele esteja errado, quando tiro dois livros para doações, compro mais oitos. Mas eu não ligo.

_ Ah, mas pra quem gosta de ler é assim mesmo. O Leandro mesmo tinha muitos.

_ Somente nós leitores podemos entender o quão reconfortante é olhar para uma estante de livros e visualizar o "mundo" que nos espera para ser explorado._ disse Leandro.

_ É verdade! E acrescento que é muito legal pegar um livro que já lemos e relembrar todas as sensações que sentimos durante o período daquela leitura._ Patrick acrescentou.

Na hora da despedida, Leandro os convidou para voltarem a livraria sempre que sentirem vontade.

_ Voltaremos sim._ afirmou Dona Chiquinha._ E vocês três também estão convidados para irem á minha casa para um café da tarde. Eu posso até marcar de o Patrick estar lá e apresentar a vocês o meu filho e os meus três netos: o Jonas, a Olivia e o Enzo. Eu adoro fazer uma reunião na minha casa. Amo casa cheia.

Dona Chiquinha e Patrick partiram assim que o Uber chegou. Leandro se sentiu tão bem, o coração tão aquecido, que tinha retirado todo o peso da confusão de Vanessa e Júlio o causou.

_ Simpáticos eles. Gostei dos dois. Parecem ser boas pessoas.

_ São sim, Val. A dona Chiquinha é um dos melhores seres humanos que conheço. Já o Patrick gostei dele.

_ Pena que ele é casado. Seria perfeito pra você. Os dois têm a mesma faxetaria, o mesmo gosto literário.

Leandro olhou surpreso para Patricia.

_ Você tá mesmo se sentindo um cupido não é, Pati?

_ Eu só quero a sua felicidade.

_ Se você fizer mais café já ajuda um pouco.

_ É pra já, Leandro Gilmore._ Patrícia o beijou no rosto antes de ir para a cozinhadias depois, Leandro recebeu com alegria a ligação de Dona Chiquinha.

_ Boa noite, meu querido. Como você está?

_ Boa noite, professora. Estou muito bem. E a senhora?

_ Como deus manda. Estou bem. Aconteceu algo muito bom na minha vida. Vou ser bisavó. E olha que cheguei a acreditar que morreria sem conhecer um tão desejado bisneto.

_ Ah, que bom! Parabéns!

A conversa fluiu por alguns minutos por dona Chiquinha contar com orgulho a grande novidade que era o motivo da sua felicidade. Em seguida, disse o motivo da sua ligação.

Dona Chiquinha tinha muitos amigos profissionais do mercado literário. Entre eles, o Alberto Ferreira, dono de uma conceituada editora.

_ Esse meu querido amigo tem um projeto de divulgação da suas novas edições de clássicos e lançamentos de autores contemporáneos nacionais. Ele estava a procura de uma boa livraria para realizar o evento. Eu tomei a liberdade de indicar a sua. Ele viu as fotos pelo seu perfil e ficou maravilhado. Posso entregar o seu contato pra ele?

_ Claro! Eu agradeço muito. A livraria estava precisando desse tipo de evento. Muito obrigado mesmo.

_ Sim. Além disso, a editora contratará muitos influenciadores digitais para fazer a divulgação do evento nas redes sociais, o que será muito bom para o marketing da livraria.

Não demorou muitos dias para que Leandro recebesse a ligação de Alberto. O editor marcou uma reunião numa terça-feira a tarde no escritório da sua editora.

A única pessoa com quem Leandro compartilhou essa informação foi com Valéria, quando foi passar a noite na casa dela.

O casal de amigos estavam na sala, bebendo vinho, quando Leandro deu a notícia.

Valéria reagiu com um sorriso de empolgação, batendo leves palminhas.

_ Amigo, isso vai ser tão bom para a propaganda da livraria. E sem contar no dinheiro que você irá receber pelo evento.

_ Tomara, amiga. Mas eu vou te confessar que estou um pouco nervoso. Eu nunca participei de uma reunião de negócios. Nem sei se sei fazer isso. Você tem algumas dicas? Já que está acostumada com essas coisa.

_ Ter até tenho. Mas não posso te ajudar muito, porque não sei como será a proposta dele. Mas posso te dar umas dicas básicas.

A editora ficava localizada num edifício comercial espelhado no centro da cidade. Ao subir o elevador, Leandro sentiu um frio percorrer a espinha. Esfregava as mãos geladas devido ao nervosismo.

A recepcionista o encaminhou até o escritório do CEO, que o recebeu na porta com um aperto de mão.

Alberto Ferreira era um homem de meia idade, baixinho, de pele bronzeada, careca lustrosa e tinha um bigode farto e sorriso simpático.

_ É um prazer te receber, Leandro. Agora não falta mais ninguém.

Leandro estranhou a frase de Alberto. Será que havia mais alguém na sala? Talvez um outro sócio? Outros livreiros?

A sua curiosidade foi saciada quando o editor abriu a porta e Leandro se surpreendeu com quem estava sentado em uma das cadeiras em frente a mesa de vidro de Alberto.

_ Abner!_ Leandro exclamou assustado.

Abner sorriu surpreso, mas não assustado como Leandro e sim feliz por vê-lo.

_ Ah, que bom que vocês já se conhecem!_ Alberto deu um leve tapinha na testa._ Que cabeça é a minha! É claro que se conhecem. Os estabelecimentos de vocês ficam próximos. Então, entre, Leandro. Vamos começar a reunião.

A presença de Abner aumentou ainda mais o nervosismo de Leandro. Para ele foi tenso sentar ao lado do ex amante, naquela situação inesperada. Apesar disso, tentou ao máximo ocultar a apreensão, permanecendo com a expressão séria, sem ser bravo e nunca deixar de olhar para Alberto.

O editor contou que dona Chiquinha também havia visitado a confeitaria e se encantou por ela ser de temática literária, além do excelente atendimento e sabor dos doces servidos. A professora o convidou para visitar o local, e Alberto viu ali um dos locais perfeitos para a divulgação do seu evento.

Alberto propôs que ambos trabalhassem em equipe, Leandro na recepção do evento e Abner responsável pelo buffet temático. Também sugeriu que ambos abrissem as portas de suas lojas para que os influenciadores digitais pudessem gravar vlogs ou stories.

Abner aceitou com empolgação, chegando a dar algumas ideias para os dias dos eventos, que foram aprovadas com gosto por Alberto.

Leandro passou a maior parte da reunião em silêncio. Por dentro, estava irritado com a presença de Abner, pois se sentia perseguido pelo jovem.

_ Então, vamos fechar negócio? Vou pedir a minha secretária que imprima os nossos contratos.

A proposta seria muito boa para Leandro. Os lucros eram satisfatórios, mas o fato de trabalhar com Abner era muito intragável para ele.

_ Espere, seu Alberto. Eu sinto muito, mas não posso trabalhar com o Abner.

Pela primeira vez, Leandro recebeu um olhar raivoso de Abner.

_ Mas por quê?_perguntou Alberto.

_ Nós tivemos desentendimentos e eu não consigo me sentir bem ao lado dele. Mas posso oferecer o espaço da livraria para os seus eventos. Só não quero trabalhar com o Abner.

_ Leandro, o ideal seria os dois estabelecimentos juntos. Foi isso que achei interessante. Não pretendo trabalhar diferente disso. Além do mais, vocês são dois homens adultos e inteligentes. Creio que conseguirão fazer um ótimo trabalho apesar das indiferenças pessoais e de não se gostarem.

_ Não há indiferença nenhuma, Alberto._ disse Abner, um pouco bravo._ E não existe isso de nós não nos gostarmos. Muito pelo contrário, esse homem é o grande amor da minha vida. Eu tomei um tiro por causa dele e tomaria quantos mais fossem preciso para salva-lo. O problema é que eu cometi um erro e ele é orgulhoso e mimado demais para me perdoar.

_ Ah, então quer dizer que você é o herói e eu sou o estúpido rancoroso?! Que cara de pau! Você me enganou.

_ Eu também fui enganado e chantageado! Você não foi a única vítima dessa história, mas se comporta como se fosse.

_ Eu não tenho nada com isso que você fez besteiras com o tal do Franklin e cometeu a burrice de pedir ajuda pro Júlio.

_ Eu não pedi nada! Quem fez isso foi a Lorena.

_ Ah, claro mais uma que passou pela sua cama.

_ É passou sim. Mas o único que colonizou o meu coração foi você!

_ Eu não quero o coração de um mentiroso!

_ Eu errei, porra! Cometi um puta erro! E já pedi desculpas mil vezes, caralho! Mas você se acha superior e se recusa a me perdoar. Sempre que pode, me humilha como se eu não tivesse sentimentos. Pra você é difícil perdoar, né? Você é o senhor perfeito que nunca erra!

_ Não a esse ponto.

_ Leandro, você está sendo ridículo e infantil. Por mais que eu queira muito, nós não vamos transar. Vamos trabalhar, caralho! Dá pra deixar de ser babaca e ser mais profissional? Cresça!

_ Eu tenho que crescer?! Você vive me perseguindo. Montou a confeitaria em frente a minha loja e agora isso?

_ Você tá maluco não é? Que mané te perseguindo! Eu não sabia que você abriria uma livraria naquela rua e muito menos estaria aqui hoje.

_ Ah, conta outra, Zé das mentiras!

_ Eu estou falando a verdade, senhor perfeição, o que nunca erra.

_ Cavalheiros, por favor, vamos nos acalmar. Vamos fazer o seguinte, vocês vão pra casa, esfriem as cabeças, pensem com carinho na minha proposta e daqui a dois dias, me dão uma resposta.

_ Pra mim não há o que pensar_ respondeu Abner._ Ao contrário desse playboy, eu não nasci em berço de ouro e nem tenho família rica. Eu aceito a proposta. Sou um homem adulto e responsável, e também sou muito profissional.

_ Você é muito ousado!

_ Ah, é? E você adorava a minha ousadia quando estava pelado na cama comigo._ Abner disse irritado, e arqueando uma das sobrancelhas.

_ Você não tem vergonha da sua imoralidade?

_ Não, não tenho.

_ Seu Alberto, me desculpe por presenciar essa cena e por todo esse constrangimento. Visto que diante de tudo isso, fica insuportável qualquer tipo de convivência com esse sujeito e não posso aceitar a sua oferta.

_ Oh, Leandro. Eu gostei de você. Aliás de vocês. Eu tenho certeza que juntos farão um ótimo trabalho. O que há entre vocês é desentendimento amoroso e isso costuma se resolver. Mas eu percebi também que ambos são inteligentes. Acho que vão mandar muito bem. Não me diga nada agora. Daqui a dois, eu vou te ligar e aí conversamos melhor. Ok?

Leandro concordou e se desculpou mais uma vez, antes de se despedir e ir embora.

...

_ E aí? Como foi a reunião?

Leandro recebeu essas perguntas de Patrícia, assim que retornou para a livraria. Leandro narrou o fato com o tom de voz de irritado. Estava indignado por tudo que vivenciou.

_ Ah, Leandro. Eu não acho que o Abner esteja te perseguindo. Foi coincidência. E ele também foi enganado pelo Júlio.

_ Desde quando você defende o Abner, Patrícia?

_ Eu ouvi a versão dele dos fatos. Dia desses estava chovendo muito e ele me ofereceu uma carona até em casa. Paramos num bar e conversamos um pouco. Até que eu gostei dele. É uma boa pessoa, apesar de ser meio doidinho. Ele te ama muito viu?

_ Pronto, agora uma das minhas melhores amigas também vai ser roubada pelo Abner. Já não cansa o ex marido.

_ Ninguém vai me roubar de você. Você é meu preferido. E Júlio mentiu muito pra ele, manipulava a situação como se você fosse o abusivo da história. Como Abner não te conhecia, ficou com a versão dele no início. Mas depois se apaixonou perdidamente por você. Aquele homem é louco por você, Léo. Sem contar que ele é muito lindo.

_ E sedutor também. Te fisgou direitinho.

_ Como dizem os jovens "eu shipo vocês dois".

_ Deixe de ser ridícula.

_ Leandro, além de tudo isso, a livraria ainda é muito nova. Pense no quão bom seria se esses eventos fossem sediados aqui. Você vai ganhar a grana da editora, vai vender muitos livros e ainda terá uma puta propaganda de graça. Você tem contas pra pagar e uma filha mimada para sustentar. Ah, e não se esqueça que ainda corre o risco de um dia precisar sustentar a sua mãe. Ela não vai poder se aposentar e o seu pai não vai ficar pagando pensão a vida toda.

_ Pensando por esse lado, até que você tem razão. Mas, eu não quero ficar olhando para a cara do Abner.

_ Mas você já tem que olhar para a cara bonita dele mesmo, querendo ou não. Ele trabalha aqui em frente. Pelo menos, você vai ganhar dinheiro pra isso.

_ Patrícia, você tá insuportável de tão persuasiva hoje. Deveria usar essa técnica para vender mais livros.

_ Vou usar sim na semana dos eventos. Ainda tem mais. Aqui somos só nós dois. E não vamos dar conta de tudo sozinhos. Já o Abner tem alguns funcionários, quem sabe, com um jeitinho, nós descolamos ajuda?

_ E você acha que Abner vai ceder funcionários para nós? Deixe de se iludir, Patrícia.

_ Aquele homem faz qualquer coisa por você, Leandro. Ele tem os 4 pneus arriados por ti.

Antes de chegar á livraria, Leandro estava decidido a recusar a oferta. No entanto, depois das palavras de Patrícia, passou o dia inteiro pensativo em dúvidas de qual decisão deveria tomar.

A noite, foi á casa de Valéria jantar com a amiga e contou tudo sobre a reunião.

_ Amiga, o que eu faço? Eu estou tão angustiado com essa dúvida.

_ Aceite. Você tem que pensar no seu bolso. Dinheiro em primeiro lugar.

_ Mas conviver com o Abner...

_ Leandro, você não vai conviver com aquele embuste. Será por uns dias. E você já tá bem crescidinho para ter medo de cara bonita e pica delícia.

_ Eu não tô com medo disso.

_ Ah não? E de que tem medo? Eu te conheço, Leandro. Você tá igual uma freira há muito tempo sem transar. O que eu não entendo, já que é solteiro e deveria estar dando a rodo. Vai trabalhar com um cara que você já transou e gostou muito da pegada. O seu medo é de não resistir em sentar nele. Coisa que eu espero que não faça. Não se esqueça de todas as merdas que ele fez.

_ Obrigado por me deixar ainda mais duvidoso.

Valéria acendeu o cigarro e deu uma tragada.

_ Eu tenho a solução.

_ Qual?

_ Aceite trabalhar com o Abner, engorda a conta bancária e quando tesão bater, se alivia com outro boy.

_ Você fala como se fosse simples.

_ E é, meu amor. A vida é muito simples, vocês homens que complicam.

Alberto ficou muito feliz quando ligou para Leandro e recebeu um sim como resposta.

Mais uma reunião foi marcada, onde assinaram os contratos e acertaram todos os detalhes para os eventos. Abner e Leandro não trocaram farpas dessa vez, mas evitaram ao máximo se falarem, tratando um ao outro com frieza.

....

A primeira reunião que eles marcaram para resolver como seria a gestão do evento foi no fim da tarde de uma sexta-feira, na livraria. Abner chegou depois que Leandro encerrou o expediente.

Patrícia preparou com empolgação uma mesa com um lanche da tarde, com bolos, pães de queijo, frutas, sucos e café.

_ Nossa! Caprichou, hein mulher._ Abner disse dando um beijo no rosto da nova amiga.

_ Não está nada altura de um chefe de cozinha como você, mas fiz tudo com muito carinho.

_ Está tudo maravilhoso, assim como você.

Leandro olhava para os dois com desaprovação. Sentia ciúmes de Patrícia por causa da amizade dela com Abner.

_Ah, meu deus! Esqueci de comprar o açúcar! Que cabeça é a minha!_ observou Patrícia._ Só espere um pouquinho, que vou comprar no mercadinho, que fica aqui perto.

_ Nada disso. _ Abner retirou um molho de Chaves do bolso e entregou a ela._ Pode pegar lá na confeitaria. Vocês já gastaram dinheiro demais.

_ Ok. volto logo.

Assim que Patrícia saiu, Leandro não resistiu e comentou:

_ Só para deixar claro que a Patrícia não é para o seu bico.

_ Uh, é! Tá com ciúmes?_ Abner perguntou com a cabeça erguida e um olhar de desconfiança, o que deixou Leandro muito irritado.

_ Deixa de ser ridículo.

_ Sei não... até que ela é bonitinha._ provocou Abner.

_ Ela é maravilhosa. Mas não é casada. Ou seja, com ela você não terá um lar para destruir.

_ Continue me provocando assim pra você ver o que te acontece.

_ E você vai fazer o quê? Vai me bater? Ah não faça isso, por favor. Eu tenho muito "medo" de você.

_ Se continuar falando comigo desse jeito, eu não vai mais controlar a minha vontade de te pegar de jeito e dar um beijo nessa sua boca gostosa.

_ Tome vergonha na cara, Abner!

Abner o puxou pela cintura, aproximando a sua boca com a de Leandro. Esse o empurrou com força.

_ Ou você se comporta, ou eu não vou mais trabalhar contigo.

_ Hum! Que delícia! Adoro quando você fica mandão assim.

Leandro revirou os olhos para cima.

_ Vamos começar a falar de trabalho? Eu estava pensando em te sugerir para elaborar o menu com as pratos citadas nos livros que serão lançados. Claro que nem todos são doces, como você costuma trabalhar. Mas não posso negar que de cozinha você entende. E por isso, se sairá muito bem na preparação de pratos salgados também.

_ É... a ideia é boa. O problema será ler todos aqueles livros para descobrir as comidas citadas.

_ Não se preocupe com isso. Eu fiz uma consulta na editora e eles me enviaram esse catálago com os livros que citam algum prato. São apenas 10. Cinco são clássicos que já li. Aí eu anotei os pratos citados e os textos.

Leandro olhou em volta da livraria, em seguida, foi até o balcão e retirou um caderninho, onde fez as anotações.

_ Um deles é Drácula. Veja isso, quando Jhonatan Harker chega a Transilvânia, ele come frango com papira num hotel antes de chegar ao castelo do Conde Drácula. Eu vou ler o trecho pra você: "Para jantar, ou melhor, ceia, comi um frango preparado com pimentão vermelho, muito saboroso, mas que me deixou com sede."

_ Hum! Gostei da ideia.

_ Que bom que você gostou. Para facilitar, além dos pratos e textos, eu pesquisei sites que passam as receitas sobre o prato e deixei os URL anotados no caderno.

_ Huuuum! Que menino eficiente.

Leandro piscou um dos olhos e sorriu.

_ Ah, eu acabei de ter uma ideia, Leandro! Que tal se formamos tipo umas "estandes" estilo da Bienal do livro, só que gastronômicas? Essa de Drácula, por exemplo poderiamos criar um cenário com o jantar do Drácula e Jhonatan Harker e no menu todos os pratos citados no livro.

_ Nossa! Amei a ideia! Mas isso custaria um pouco caro. Nós não temos dinheiro para isso.

_ Essa parte da ornamentação dos cenários fica a critério da editora. Eles têm grana.

_ É verdade! Vai ficar perfeito!

_ Viu? Em pouco tempo de reunião já tivemos ótimas ideias. Nós somos fodas trabalhando juntos._ disse Abner e Leandro concordou com um sorriso.

Ao ouvirem a porta da livraria se abrir, pensaram se tratar de Patrícia retornando com o açúcar. Antes de olhar para trás, Leandro disse:

_ Pati, nós tivemos uma ótima ideia e...

Leandro interrompeu a frase ao olhar para trás e ver o rosto bravo de Vanessa olhando em direção a eles.

Em meio a tantas preocupações profissionais, Leandro se esqueceu que, por ser sexta-feira, era dia de Vanessa ir á sua casa para passar o fim de semana com ele.

Leandro sentiu o seu corpo inteiro gelar. Previa a tempestade que desabaria sobre ele, causada pelo choque do encontro da filha com o ex amante.

Vanessa virou as costas e saiu correndo. Leandro gritou para que ela esperasse e foi atrás.

Vanessa caminhou em direção ao carro de Júlio furiosa. Ao se aproximar, bateu com força no vidro da janela do motorista.

Júlio estava distraído, conversando com um cliente via whatsapp. Abriu a janela no mesmo instante, e Vanessa gritou:

_ Está satisfeito?! Por causa da sua gracinha de esfregar aquele puto do Luciano na cara do meu pai, ele resolveu pôr o Abner dentro da livraria! Que merda!

Júlio perdeu totalmente o autocontrole. Foi dominado por completo pelo ciúme. Saiu do carro movido pela força do ódio. Não conseguia ver mais nada de maneira racional. Tinha sede de sangue.

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Comentários

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No início, manifestei-me bastante céptico sobre este conto. Tudo me pareceu demasiado forçado e com uma imensidão de apêndices narrativos desfocados do tema fulcral, que me parecia impossível amarrar tantas pontas soltas que iam ficando para trás. Mas, chegado ao ponto actual do conto, a minha apreciação inverteu-se 180 graus. O cuidado na escrita é incrível, denotando uma construção narrativa muito sólida, fruto de muitas horas de trabalho em cada capítulo. As tais pontas que ficaram para trás, começam a ser amarradas uma a uma, com o reaparecimento de personagens que tinham ficado esquecidas, como o Procópio, a Irene e o filho Luciano, este último que até já estava em campo há bastante tempo mas que ganha outra dimensão ao descobrirmos que é o filho da Irene. Excelente conto, com muitas referências literárias que um português desconhece, mas que percebe serem o fruto de um autor ávido pela leitura e com uma formação acadêmica muito sólida no domínio da Língua Portuguesa, associada a uma criatividade espantosa na construção das personagens e no desenrolar da acção temática. Ainda não chegou ao fim, mas neste andamento da carruagem já chega para felicitar efusivamente o Arthur Miguel. Uma vocação que já é mais do que uma promessa. Não sei a sua idade mas siga em frente e não desperdice o seu talento, caro jovem.

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Pelo amor, cê tem que postar dois capítulos por semana! Que ansiedadeeeeee!

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Que legal mais uma participação de personagens dos seus contos, saudades de cada personagem

Já aguardo a próxima temporada de Borboletas sempre voltam 3

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Gente, acrescento aqui que sobre a cena em que Marcinha comenta sobre o colégio Lycée Saint Vincent, esse colégio e os personagens citados são da história da minha amiga Ana_Escritora. Quem tiver curioso, dar um clique no nome dela abaixo para conhecer a história.

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Mas esse bate boca entre o Leandro e o Abner quando eles se encontram na reunião foi pior que casos de família hahahahahaha

E claro, nesse final o Júlio como sempre vai estragar tudo.

Muito legal a participação da Dona Chiquinha e do Patrick, adorei.

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