O NOVO NORMAL - QUEBRANDO TABUS (PARTE 8)

Um conto erótico de Álvaro Campos
Categoria: Heterossexual
Contém 2008 palavras
Data: 20/01/2021 22:28:03
Última revisão: 13/05/2021 10:31:28

As duas levantaram-se da cama e me deixaram na companhia dos meus vazios. Desnudo, a pele sensível, eu não sabia em que pensar. Olhei para o relógio: eram cinco horas da tarde. Faltava uma eternidade para a madrugada. O que fazer nesse intervalo? Não sabia. Não possuía nenhuma ideia de como gastar o tempo.

Comecei a pensar em tudo que havia acontecido: o padrasto da Gê, o senhor careca de mãos extremamente peludas e de um cinismo desmedido; a depilação que parecia ter retirado as raízes mais profundas do meu ser e não havia poupado nenhuma parte, sequer o meu anel; o trauma da Gê, que fazia o meu corpo magro assumir formas mais femininas, mais próximas da sua excitação lésbica; a maneira devassa como as duas ninfas se comportavam na cama, sem medos ou tabus, mergulhando as suas bocas no meu membro até perderem o fôlego; o jeito decidido como a Gê parecia querer me converter para o terreno movediço da bissexualidade: ela havia lubrificado o meu anel com saliva, chupado ele como um pequeno animal e colocado um malicioso dedinho lá dentro. Somando-se a isso, havia o comentário de Bia: “Ela adora chupar um cuzinho antes de comê-lo com a sua cinta. Já fez isso com várias amiguinhas”.

Havia muitas coisas que tinham ocorrido naquela tarde que eu ainda não era capaz de compreender e a principal delas ainda ficava me martelando: como a Gê poderia ser tão devassa e, ao mesmo tempo, acordar no meio da madrugada, em consequência dos abusos sexuais sofridos? Sem conseguir tirar proveito daquelas inquietações, resolvi caminhar pela casa. Ao chegar na sala, vi que as duas garotas, com o laptop sobre a mesa, assistiam um vídeo pornográfico em que uma garota aparecia com uma cinta acoplada a um imenso cacete. No mesmo instante, elas fecharam o arquivo de vídeo. Na hora, estranhei:

– Pensei que vivíamos em um espaço liberal, sem medos ou tabus.

– Não é isso, pai – disse Bia. – Apenas não queremos estragar a surpresa.

– Quero uma noite de núpcias em que a Gê seja a noiva e não eu – respondi.

– Deixa de besteira, Álvaro – falou a Gê. – Não é nada disso que você está pensando.

– Tudo bem, então, vamos fazer melhor – disse, irritado. – Cancelamos tudo e nada de safadezas por hoje.

Sentei-me no sofá, liguei a televisão e tentei desanuviar os pensamentos, mas não consegui. Então, tudo não passava de um jogo: os pesadelos da Gê, a história do padrasto, a depilação, a ideia de que eu seria o primeiro homem da Gê, os dedos e chupadas no meu rabo, tudo isso seria parte de um mesmo jogo? A Gê queria que eu fosse o primeiro homem dela ou desejava que eu fosse mais uma das suas muitas namoradinhas?

Enquanto eu estava perdido nesses pensamentos, a Gê chegou e falou:

– Álvaro, você quer mesmo acabar com tudo por conta de um preconceito besta?

– Não querer ser a fêmea de vocês não é um preconceito besta – respondi. – É uma opção sexual e deve ser respeitada.

– E quem te pediu para ser a fêmea de alguém? – perguntou a Gê.

– Não precisaram me dizer – respondi. – Apenas juntei os pontos.

– Quais pontos? A depilação é algo que muitos homens fazem, não tem nada a ver com bissexualidade. O ânus é uma zona erógena e o fio terra também não tem nenhuma associação direta.

– E a inversão? – indaguei. – Ser a sua fêmea na cama? Isso também não teria? A inversão tem elementos muito semelhantes a uma transa homossexual.

– Tem elementos semelhantes, mas não é igual. Não tem o elemento preponderante da homossexualidade que é a atração pelo mesmo sexo.

– Tudo bem, concordo, quem faz inversão pode não ser gay. – falei. – Mas isso não dá o direito de vocês quererem enfiar algo no meu rabo.

– Não queremos – disse, Gê. – Você só viu apenas uma cena do vídeo. A mulher com uma cinta iria transar com outra mulher.

– Então, a ideia da cinta era para minha filha? – indaguei.

– Sim, seu bobo – disse Gê. – A Bia finalmente concordou em fazermos juntas esse tipo de brincadeira. Faz anos que eu insisto e só agora ela concordou.

– Então...

– Amor, deixa eu te explicar uma coisa – disse Gê. – Você sabe que sofri abusos e que isso não me vetou a entrada na vida sexual de forma plena. Mas tem algo de que você não sabe, talvez por conta da minha timidez...

– Timidez, você? – perguntei, incrédulo.

– Sim, amor, timidez – disse, Gê. – Medo de mostrar completamente o meu lado dominante. Eu não sou a fêmea que você acha que eu sou. Acho que os abusos sofridos em casa fizeram que eu desenvolvesse um lado da sexualidade mais dominante. Eu preciso sentir-me no comando. A sua depilação tem a ver com isso, não só com meu padrasto...

– Eu sabia – retruquei.

– Não, você não sabia – falou Gê. – Nunca quis que você fizesse inversão, embora não me oponha. Mas queria sentir o controle da situação. Nossas transas sempre partiam de uma combinação prévia entre mim e Bia. Eu precisava saber, com antecedência, o que iriamos fazer. E a ideia da depilação partiu de mim. Não era só por não gostar de homens peludos, não era só por conta do meu padrasto, eu queria te ver numa posição de submissão, frágil, desprotegido, sujeito às nossas vontades. Dessa forma, poderia me sentir no comanda e aceitaria com mais facilidade a ideia de me entregar numa transa.

– Como assim? – perguntei.

– Acho que existem vários detalhes que você não deve ter reparado ao olhar para os meus modos – falou Gê. – Talvez não deve ter reparado que eu jamais me sento de pernas fechadas, demonstrando recato, ou que desde que eu cheguei aqui a Bia deixou de se dedicar tanto aos afazeres da casa, por um pedido meu.

– E o que isso significa? – questionei.

– Significa que jamais irei repetir a filha da puta da minha mãe – disse Gê. – E que não o aceito como meu homem por conta de uma suposta virilidade. Não, é o contrário, é a sua sensibilidade, a sua capacidade de ceder e de confiar em nós, é isso que faz eu querer ser sua e é isso que faz você ser um homem de verdade.

– Sinto uma certa ironia, agora que te vejo falar o termo homem de verdade, já não tem o mesmo sentido usado hoje de tarde – comentei.

– Só agora você percebe – falou Gê, sorrindo. – Sempre que eu falava homem de verdade, eu olhava de lado para Bia e ela percebia. É que não sou a virgem dos lábios de mel. Em casa, usando um consolo, fiz questão de perder o hímen. Porém, de certa forma, ainda tenho minhas ingenuidades. O medo de me entregar para um homem, o medo de me deixar dominar... tudo isso me aproxima das virgens, mas de um jeito diferente. Não quero a inocência das virgens, não quero a pureza delas.

– Por isso você fez questão de perder o hímen com um consolo?

– Sim – falou, Gê. – Estava lendo um romance de época, e a personagem ficava mal falada porque não havia manchado o lençol na noite de núpcias. Então, a ideia de que a honra da mulher era apenas algo que deveria ser defendido, jamais conquistado, como a do homem, aquilo me deu um asco tremendo. Por isso, peguei o meu consolo e enfiei o máximo que pude, queria sentir a dor das mulheres desonradas, a dor de todas as vadias, e fui enfiando, até que o hímen se rompeu e foi como uma espécie de alívio, de libertação.

– Pelo visto, isso foi uma espécie de entrega, algo muito semelhante a uma entrega sexual – comentei.

– Sim, uma entrega – disse, Gê. – Ou talvez uma homenagem a opressão de todas as mulheres, mas não uma entrega a um homem em específico.

– E, no entanto, você está decidida a se entregar a mim – falei.

– Estou e não pense que é pela depilação – disse Gê. – Prefiro corpos depilados, mas não é isso. Você não tem medo de mostrar a sua sensibilidade, você não julga o nosso comportamento libertino, não nos transforma em vadias, em impuras, e não recuou quando depilamos o seu cuzinho, ou quando eu coloquei um dedo no lugar que vocês consideram tão honroso e nobre, e também deixou que eu, ainda com restos de sêmen na boca, me aproximasse de você e te beijasse.

– É verdade, eu fui deixando vocês me conduzirem, me seduzirem... Não sei se foi mérito meu. Percebo que ainda tenho preconceitos, agora que te escuto falando, vou percebendo. Não sinto tesão pela inversão, mas acho que não deveria ter tanto receio. Talvez o meu medo da inversão e a minha ideia de homossexualidade, talvez eu tenha que repensar...

– É por isso que eu gosto de você. Não sente a necessidade de ser o macho viril o tempo todo. Não precisa ficar demarcando território como certos homens-cães que andam por aí, inferiorizando o feminino, mijando em toda parte, desprezando todo o terreno da sexualidade que não seja uma espécie de espelho de músculos, testosterona e órgãos genitais masculinos. É quase homossexual o culto da masculinidade que transforma as mulheres em simples objeto.

– É verdade, Gê – falei. – Os homens que não têm apreço pelas mulheres deveriam se amar entre si, em nome da exaltação da própria virilidade. Seria muito mais coerente.

– Sabia que você concordaria – disse ela.

– Sabe, Gê, ainda tem uma coisa que eu não entendo. Todo o seu comportamento, a sua forma de pensar, não parece com o de quem teve um trauma sexual – comentei.

– Não tenho o trauma da moça virgem – disse Gê. – Não tenho e não posso ter. Mesmo antes do me padrasto aparecer, eu não tinha a cabeça de moça virgem. Eu já era uma adolescente, possuía minhas revoltas e já tinha experiências sexuais. Não era uma criança inocente. Mas o trauma ajudou a modelar a minha sexualidade. O meu trauma é muito mais psicológico do que sexual. Ninguém passa incólume por uma violência familiar. Ninguém. E o meu trauma maior é o medo de repetir a submissão da minha mãe. O medo de viver em função das aparências. Quem vive em função do que não é acaba por correr o risco de perder o fulcro da própria identidade.

– Você esta certa - falei. - Uma pessoa precisa ter caráter, ter personalidade.

– Por mais que a vida em sociedade seja um jogo de máscaras - continuou a Gê. - Tem que existir um ponto nodal, uma base que é nossa e da qual não podemos desistir nunca, senão, perdemos tudo. Tem três coisas das quais não posso ceder: amo o sexo, amo a minha capacidade de escolha, amo não me sentir presa a nenhum homem. Então, esse é o sustentáculo de onde brotam todos os outros desejos. E aquilo que serve para mim tem que servir para todos e todas. Se eu perder isso, viro um fantasma como o da minha mãe, condenada a viver na sombra de um homem, sempre com medo de escândalos.

– Gê, eu pensei numa coisa absurda agora – disse eu. – E se eu publicasse esse nosso diálogo num site cheio de contos pornográficos, com homens que se vangloriam apenas por terem comido várias mulheres e que jamais assumiriam a própria fragilidade e nunca, de modo algum, permitiriam que uma mulher sequer tocasse nas suas nádegas, com medo de perderem a virilidade. Se eu publicasse esse conto num site assim, o que acha que pensariam de mim?

– O mundo está mudando – falou, Gê. – E acho que você tem que tentar para saber.

– Um dia, Gê, ainda vou escrever as nossas intimidades – disse eu. – Quando eu fizer isso, tentarei reproduzir a essência de tudo que conversamos aqui.

– Faça isso e deixe que os outros nos julguem – aconselhou-me, Gê. – Você não deve escrever para todo mundo. Quem estiver aprisionado em preconceitos e medos, que continue agindo como cão sem dono, capaz de acasalar com várias mulheres sem nunca amar em plenitude nenhuma delas. Só aqueles que tiverem mente aberta e coração livre serão capazes de aprender, verdadeiramente, com a nossa experiência.

Caros leitores, comentem e nos brindem com três estrelinhas, caso queiram a continuação desta série.

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Comentários

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Me identifico com seus pensamentos.

Aida desejo ver a Bia, mande fotos por favor. Caiobia7@hotmail.com

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Larissa, obrigado pelos seus comentários. Entendo que você tenha uma motivação como leitora, mas o meu objetivo é criar um texto erótico, em que sentimentos, reflexões, e sexo funcionem como ingredientes de algo maior.

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Vai, Gê, bota essa boca e chupa, gira e me fazer gemer, encontra o meu ponto G. Cuidado com essa Gê.

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As sementes não nascem germinadas, elas precisam de um terreno propício. Toda palavra é como um jorro inútil se não encontra o seu reverso: a escuta que faz germinar.

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Esse assunto de fio terra ou inversão para muitos é desonrroso mais para quem sente prazer de verdd sabe como é bom minha esposa faz nem por Isso perdi minha masculinidade. Antonejunior@gmail.com quiser conversar.

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Melga, obrigado pelos seus comentários sempre precisos e bem colocados. O conto, como você indicou muito bem, é uma crítica a brutalidade e a insensibilidade de uma grande quantidade de homens. Não por acaso, existem tantos casos de feminicídio no nosso país.

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