Amor não é sexo. 02.

Um conto erótico de augustolincon
Categoria: Gay
Contém 1655 palavras
Data: 05/04/2020 22:41:16

Sérgio acordou cedo, organizou-se e cumprimentou seus pais à mesa - a sua irmãzinha já estava de saída para o colégio. Depois de se alimentar um pouco e de se alongar, ele tomou banho e foi à casa do Alberto. Como o dono da mansão não lhe atendeu por telefone, aguardou que lhe dissessem que ele chegara e ficaria à sua espera. O dermatologista ficou vendo coisas pelo celular, enquanto tinham ido avisar que já havia chegado.

A casa de seu amigo era um verdadeiro palacete, tudo tão suntuoso e de grandes proporções; uma edificação isolada, com grande área de jardins; com um grande número de cômodos, piscina, jardim, sistema de segurança sofisticado, espaço para lazer diversificado e equipado, móveis de grife; Um riacho que flui calmamente sob a casa, uma garagem no melhor estilo 007, um closet gigante para roupas e sapatos; uma adega com os vinhos mais caros do mundo.

Mas nada disso conseguirá alegrar o coração de Alberto, não como o calor de seu esposo conseguia.

Instantes após, Sérgio parou de navegar e se virou, ainda sentado, para a pessoa que foi chamar seu amigo de anos.

- O doutor Alberto pediu que o senhor espere aqui, Serginho. Avisei que você já chegou! - Julieta sorria. - Tem certeza que não quer nem uma água? - fala a cozinheira da casa.

Do estofado na enorme sala da mansão, Sérgio falou: - Tenho, Ju. Se eu quiser, vou lá buscar depois.

- Fiquei boa com os remédios que o senhor me receitou aquele dia, nunca mais que aquelas manchas e o ardor voltaram na minha pele. Minhas costas estavam que eu sentia vontade de ficar sem meu uniforme na cozinha! Tava um sofrimento só, doutor Sérgio!

- É bom saber que está bem agora. Pode me procurar sempre, a você eu não cobro, sabe disso.

- E o bolo que levei pra você? Estava bom?

- Muito. Pus ele na mesa na hora do jantar em família.

- Tem outro que sei fazer que fica delicioso! Outra hora preparo e você experimenta!

- O que o Alberto está aprontando no laboratório? Ainda com aquela obsessão por essa coisa de androide?

- Sim, menino... - ela contornou o móvel. - Vou lhe confessar que esse assunto ainda me dá medo. É tão assustador isso. Você também não acha? - perguntou retirando a mão do peito.

Aprumando-se, Sérgio respondeu:

- Claro que acho. Assim como um gasto em vão de tanto dinheiro! Foi ao Japão! - exclamou. - Mas ele não escutou nem a mim. Meu Deus, de que vai adiantar ele ter um boneco do Cris andando por esta casa? Fala sério! É viver pondo o dedo na ferida - comentou achando loucura.

- Ah mas eu concordo com tudo isso aí que o senhor tá dizendo, seu Serginho - disse ainda frente ao braço do sofá.

- Criar um androide igual ao Cristiano não vai ser a solução nem curar nossa dor nem nada. Faz três anos que o Cris desapareceu naquela praia. Sabe, Julieta... Você não acha que se o Alberto tivesse visto o corpo morto do Cris e lhe dado um velório com o corpo... Ele já não teria superado um pouco?

- Ah, talvez, né, vai saber - deu de ombros. - Até hoje eu penso em uma irmã que perdi quando eu era mocinha. Aceitar a morte, alguém pode até tentar, mas acho difícil.

Serginho pensou um pouco e emendou:

- Eu também sinto falta dele... Mas a vida é assim, cruel!... Era tão bom quando nós três saíamos ou ficávamos aqui... Ainda consigo ouvir a voz do Cristiano... Posso vê-lo sentado bem ali… - fitava o outro sofá. - O jeito único e iluminado que ele tinha… - recordava com olhos brilhantes.

- O seu Cristiano era bom... Eu também tenho boas lembranças dele - falou ela subindo o olhar. - Mas Deus sabe de todas as coisas, né, meu filho? Temos que respeitar porque pra muita coisa deve haver um propósito. E o seu Alberto está jovem, pode amar outra vez e ser igualmente amado. A vida tem que continuar, não é mesmo? Fico preocupada com ele enfurnado nesse laboratório.

- Sim. Mas é que… Sentir falta é diferente de sentir saudade. A saudade bate, agonia, estremece... A saudade é a certeza que a pessoa vai voltar. A falta, é o querer ter de volta, mas saber que não vai ter. A morte leva com ela o brilho da alegria, o esplendor de um lar e do ser humano que precisa conviver agora incompleto…

- É, doutor… Acredito que até o jardim desta casa sente saudades do seu Cristiano. Eu o sinto nos quadros, naquelas borboletas do borboletário que era da mãe do seu Alberto… E ainda vejo o seu Cristiano na ausência de sorrisos na face do meu patrão.

- Ah Julieta… Saudades é doce, é suave, é nostálgico. Saudades se sente de gostos, momentos, sons, pessoas, histórias. Saudades é quando você lembra, olha pra cima e pra esquerda com o canto do olho e sorri. Sentir falta é quando dói, dor física. Quando o coração fica apertado. Quando falta a razão. Sentir falta é quando você lembra, respira fundo, olha pra baixo e chora. Dá pra sentir saudades de tudo que se sente falta. Porque pra sentir, tem que querer. Tem que estar vivo. E quem não sente saudades, e muito menos falta, não viveu.

- Chega me emocionei, Serginho. Que profundo tudo que o senhor falou… - disse um pouco arrepiada. - Por que não escreve logo seu segundo livro de poesias? Eu amo aquele que o senhor me deu!

Pra quê ela foi dar mais corda? O rapaz se empolgou e recitou mais:

- Sentir falta é pontual, é dor fina, dor de anestesia de dentista. Sentir falta é mais específico. Já a dor da saudade é grande. É infecção generalizada. É uma gripe daquelas. A saudade não te deixa respirar…

Sob o olhar emocionado da cozinheira, Sérgio seguiu dizendo, olhando para um lindo quadro na parede:

- Eu sinto é o misto dos dois. Eu sinto falta de te beijar, mas morro de saudades apenas de esquecer meus olhos em cima dos teus. Eu sinto falta do sexo, mas eu morro de saudades de acordar e te ver ali do meu lado com toda a preguiça do mundo. Eu sinto falta de dizer que te amo, mas eu morro de saudades de entrelaçar os meus dedos aos teus no meio do silêncio absoluto. Sentir falta é ruim, mas sentir saudades é terrível...

Ele fez um breve silêncio e continuou:

- Percebi que o que eu amo em você é tudo aquilo que vivemos no começo de tudo, antes mesmo de nossos lábios se tocarem - seguia recitando. - A inocência, a adrenalina, a primeira vez de tudo, a ansiedade, o momento específico, tudo sempre foi tão intenso e verdadeiro. De amor ao ódio, afinal essas duas coisas andam juntas e eu odeio te amar tanto e não conseguir simplesmente sumir como eu fiz todas as outras vezes com outras pessoas. Com você é tudo diferente desde sempre e é isso que me cativou e me cativa sempre, claro além desse teu sorriso que me prende e me faz de refém - ele encerrou.

Ela olhou para baixo, melancólica. Quantas vezes presenciou os três amigos felizes pela casa! E podia ouvir o barulho de suas vozes e gostosas gargalhadas! Agora falta um.

Ele voltou a olhá-la.

- Ju, preciso ligar pra um paquera que tô conhecendo. Espero que o Alberto venha logo, é chato esperar que ele saia desse laboratório. Parece até aqueles cientistas loucos de filmes!

A senhora sorriu com essa.

- Todo dia ele fala nesse androide. Fique à vontade, querido. Seu amigo já, já vem pra sala. Vou terminar o almoço, que seu Alberto precisa se alimentar. Almoça conosco hoje?

- Eu não sei - passou a mão no rosto. - Vim porque o Alberto insistiu e disse que tem algo muito bom pra me contar pessoalmente. Não faço ideia do que se trata. Tenho um monte de coisas pra resolver durante o dia.

- Está certo. Com licença, senhor.

- Já pedi pra não me chamar de senhor, hein... Tenho só vinte e seis. Chame ele de senhor, o seu patrão tem trinta e quatro. Talvez ele não ache precipitado de tua parte.

- Desculpa, filho. Licença... - e ela foi para a cozinha.

Sérgio se ajeitou, apoiou uma perna na outra, pegou novamente no celular e retornou a chamada perdida do tal paquera.

- Oi, você tá podendo conversar neste horário, Gabriel? - perguntou ao lindo professor de educação física.

- Estou, sim. Finalmente me retornou, ham! Está em casa?

- Eu quase não acho meu celular quando acordei. Olha, eu tô na casa do Alberto.

- Aí tão cedo? Por quê? - indaga bem-humorado.

- Ah... Ele implorou. Vamos conversar sobre alguma coisa da cabeça maluca dele. Você o conheceu naquela festa. O Alberto é pra poucos entenderem.

- Sinto pena dele, cara. Lembra de quando ele falou que pretende criar um robô igual ao esposo? É de partir o coração da gente, Sérgio. A tristeza dele é como se esse Cris tivesse morrido ontem, e não há três anos. Bom, foi o que me pareceu.

- Tenho que concordar. Sim, ele ainda fala nessa ideia pesada. Nem acredito que esse androide poderia convencer alguém de ser como o Cristiano em vida. Que bizarro. Imagine só!

- Ó, quero muito continuar aquela nossa conversa. Pode ser?

- Claro. Pode ser depois que eu sair daqui?

- Passa na academia, vou esperar por você lá.

- Combinado. Eu te dou um toque e aviso.

- Pensou em mim? Porque eu pensei muito na gente.

- Pensei, claro. Também estou encantado por você.

- Ok, gato. Vou te esperar lá. Quero te levar pra jantar hoje.

- Vou adorar. Mas que demora do Alberto! Vou encerrar, Gabriel, a gente se vê logo, logo. Beijão.

- Outro. Seu príncipe.

Sérgio encerrou, sorrindo, e ficou pensando, empolgado. Mas aí ele olhou para trás, debruçou o queixo e franziu a testa, pela demora de seu melhor amigo.

- Por que ele não deixa ninguém entrar lá hoje em dia?... Será que meu amigo já ficou louco? Tomara que não.

Enquanto isso no laboratório de Alberto…

***

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