Eu e os três, A.B.O. que eu não sabia - pt24-A

Um conto erótico de Hubrow
Categoria: Homossexual
Contém 4212 palavras
Data: 17/09/2018 20:39:39

Já anoitecia quando chegamos do passeio, e foi nessa noite que percebi a real e surpreendente razão de Marcelo não ter me proibido de continuar a transar com Rodrigo e Otávio, mas até mesmo, de certa forma, me estimulado a continuar com aquela putaria. Ao chegarmos, tivemos que tocar a campainha, pois a porta do apê estava fechada por dentro, com o trinco, indicando que havia alguém em casa. Foi Otávio quem nos atendeu. Logo retornou à cozinha, onde depois vi que fazia o café que tanto adorava, para saboreá-lo acompanhado de um bolo comprado na padaria próxima. Rodrigo ainda não havia regressado da faculdade.

Marcelo encostou em mim, por trás, enlaçando-me pela cintura e inclinando a cabeça para dar-me beijinhos. Parecia muito à vontade, em plena sala, embora Otávio pudesse juntar-se a nós a qualquer momento. Eu é que não me sentia tão confortável assim, receoso que ele nos flagrasse tão amorosos poucas horas depois de ele mesmo ter sido tão amoroso comigo. Sabia que Marcelo me comia, mas até ali eu e o príncipe não nos comportávamos como um casal quando não estávamos a sós.

– Vou tomar um banho, meu piquinha.

Ele já havia me chamado assim uma vez. Não sei gostava, embora me excitasse. E era estranho escutar alguém falando assim num clima tão romântico.

– Pensa no que te falei – acrescentou.

– No que? – perguntei, confuso, diante de tantas coisas a pensar após nossa tarde tão cheia de carinhos quanto de revelações inesperadas e, algumas, preocupantes.

– No teu futuro. No nosso futuro. Falei sério sobre você já ir vendo um apartamento pra nós.

– Amanhã mesmo vou começar a procurar.

– Isso. Pra ter noção dos preços.

Silenciei, enquanto ele parecia nunca mais parar de distribuir beijinhos na minha orelha, no pescoço, em tudo que seus lábios eram capazes de atingir estando por trás de mim. Era gostoso, mas um desassossego me veio e logo enrijeci o corpo. Ele percebeu.

– Que foi? – indicou que havia notado, após me dar um beijo mais forte no pescoço.

– Eu tenho medo, Marcelo...

Deu a volta e ficou de frente para mim. Eu estava receoso daquela conversa se desenrolar com Otávio ali ao lado, na cozinha.

– Medo por que? Já disse que eu vou arcar com tudo. Você é meu e vou cuidar de você. Quem não tem condições não pega um cachorrinho pra criar. Se eu te peguei, é porque tenho condições, mesmo que ainda não possa te dar do melhor.

Eu sorri pela associação. Outro talvez se ofendesse, mas eu não: sabia perfeitamente que eu não era um simples cachorrinho para ele, embora soubesse também que, de certa forma, o fosse.

– É que... – titubeei antes de prosseguir. – Essa parada do bareback... Você...

Olhou-me, muito compenetrado, aproximando o rosto do meu.

– Eu sou um risco, Zeca. Esse é um dado. Por menor que seja, eu sou um risco. Disse antes e to repetindo agora – pausou. – Vou cuidar de você, mas não vou deixar de ser um risco, mesmo que muito baixo.

Desviei o olhar.

– Olha pra mim.

Obedeci.

– Você pode desistir, porque tem medo do risco, e até te dou alguma razão por ter medo. Mas não vai; você não vai desistir. Assume isso como você sempre assume todas as tuas decisões, por mais que nem saiba bem porque tá tomando essas decisões. Mas eu sei. E sei também que você quer esse risco. Que me quer. E me quer porque confia em mim. Não vou trair sua confiança.

Deu um tapinha na minha bunda, afastando-se.

– Agora vai lá com o Otávio que vou pro meu banho.

Falou baixo, simulando um cochicho que nem tinha mais razão de ser:

– Vou ficar no quarto; dar uma descansada. Se prepara pra eles dois e depois vem pra mim.

Interrompeu a direção que tomava para o corredor e deu meia-volta, reaproximando-se em um passo e curvando o tronco levemente:

– Algo me diz que você tá carente do teu homem... – sorriu. – A xotinha tá pedindo, não tá?

Fiquei encabulado. Nós dois sabíamos que sim.

– Então, deixa eles fazerem o serviço em você e depois vou te dar o que tá realmente precisando.

Encontrei Otávio à mesa, na cozinha, bebericando o café fresco de que tanto gostava, frente ao bolo desembalado e já sem um bom pedaço. Pareceu não ter ouvido nada do que falamos na sala. Abriu um sorriso generoso, quando entrei.

– Foi muito bom hoje, Zeca – disse, baixo.

Seu tom comigo foi cúmplice, coisa que não acontecia antes, quando parecia ignorar que me comia quando não estava me comendo. Tive uma sensação estranha. Uma certa tristeza, porque percebi que não compartilhava daquela cumplicidade que ele insinuava. Parecia que o encanto havia se quebrado; como se, ao me dar o que tanto esperei dele, ele tivesse se tornado outro. Ainda querido, mas bem menos importante do que fora antes.

Era curiosa essa impressão. Ao ter sido homem por completo comigo, parecia que paradoxalmente tinha se firmado como um “parça”, não como um homem da maneira que eu via sexualmente os homens. A transa tinha sido gostosa, deliciosa mesmo; não se tratava disso. Não tinha a ver com algum arrefecimento do carinho que eu guardava por ele. Continuava a ser um cara de quem eu gostava, independentemente da cama. Nem tinha a ver com falta de tesão.

Ainda me atraía, e naqueles momentos na cozinha não pude deixar de admirar o torso moreno enfeitado pelos seus dois ossinhos no alto dos ombros. Tampouco deixei de espichar os olhos e reparar que a abertura do short entre suas pernas, sob a mesa, quase deixava escapar o cacete grosso do qual eu tanto gostava. Mas algo tinha dado errado naquela história toda: uma transa gostosa, linda, longa, tesuda, mas que parecia tê-lo transformado num garoto. Como se não pudesse ser mais o homem que tinha me comido durante todos aqueles meses.

Quando eu saía do banho, encontrei no corredor com Rodrigo, que reiterou o compromisso de mais tarde. Disse que não iria me dispensar, mesmo estando cansado. Concordei, embora não fizesse questão. Não fazia, mas também não era bobo: ele e Otávio eram gostosos, fudiam bem, tinham bons cacetes e havia a vantagem de terem modos diferentes de me pegar, mais ainda agora que pareciam ter posto fim ao jogo que antes faziam entre si. Eles queriam e meu homem permitia; por que não, como um belo aperitivo?

Porque minha expectativa era mesmo estar com Marcelo. Queria completar aquela tarde maravilhosa que havíamos tido; queria estar com seu corpo sobre mim, sentir seu membro me escancarar, ter os orgasmos que só ele sabia me proporcionar e vê-lo gozar satisfeito após me usar do jeito que decidisse. Eu queria Marcelo, não Otávio nem Rodrigo, tampouco os três. Meu Alfa era Marcelo.

Quando entrei no quarto, o príncipe parecia adormecido. O belo corpo nu se estendia ao longo da cama, de lado, e ele mantinha os braços sob o travesseiro. O membro maciço, mesmo flácido, nascia da mata de pelos que se mantinha viril, densa, porque ele preferia assim e também eu, que já há algum tempo cuidava disso para ele. Eu aparava apenas o suficiente para retirar o excesso que pudesse fazer cócegas em meu rosto, e ele aprovava.

O falo pendia sensualmente numa reta, fazendo um leve desvio para que a cabeça, semi-exposta, repousasse sobre o lençol branco. Marcelo, ao contrário de mim, não era circuncidado, mas o prepúcio se mostrava incapaz de cobrir todo o órgão, deixando um pouco sempre à mostra, embora não muito. Parecia alertar que bastaria alguns segundos para abrir-se completamente e revelar a glande poderosa, vermelha, levemente pontuda como se criada para inserir-se de modo mais fluído. E então, aos poucos, alargar a presa para ela pudesse suportar o gradativo aumento do diâmetro que a invadiria.

Deite-me cuidadosamente, para não despertá-lo. Creio que foi a primeira vez que senti mais fortemente o desejo de que Marcelo me permitisse dormir com ele, passar a noite ao seu lado, em seu quarto, e acordarmos juntos como o casal que efetivamente havíamos nos tornado. Era uma expectativa parecida com a que havia alimentado nos primeiros tempos com Otávio, antes de ele decidir me comer em seu quarto, em vez de ficar me agarrando pelos cantos todos do apê. Parecida, mas não era igual.

Com Otávio, tinha essa esperança apenas pelo desejo de estar mais próximo, de ter alguma intimidade com aquele homem que usava meu corpo mas não me permitia ser totalmente dele. Agora, com Marcelo, era a expectativa de que ele selasse sua propriedade sobre mim mantendo-me ao seu lado enquanto dormia. Ele já havia simbolizado que havia tomado posse de mim logo quando me pegou pela primeira vez, ao marcar meu sexo masculino derramando nele seu esperma de fudedor. Eu já me sentia dele; volta e meia ele mesmo me lembrava que era meu dono. Mas quanto mais sinais disso eu tinha, mais excitado eu me sentia. E protegido. Seguro.

Eu ficaria ali, quietinho, acomodado ao lado daquele homem grande, tão maior do que eu, tão mais seguro e másculo. E durante toda a noite me sentiria sob proteção apenas pela sua presença, apenas pelo fato de ele existir e me manter junto a ele. Apenas pelo fato de Marcelo ser Marcelo e me guardar rente à força que ele emanava e que me faltava; que o simples ressonar de seu sono me transmitiria.

Não me encostei em seu corpo. Talvez dormisse justamente porque tivesse desistido de me pegar àquela noite, mesmo tendo deixado acesa a luminária junto à mesa. Talvez tivesse simplesmente deixado de desligá-la. Aquele era o código que ele havia determinado para que, toda a noite, eu pudesse estar seguro de que ele me queria, já que há muito eu entrava sem bater à porta, com sua permissão. Se a luz do teto estivesse acesa ou se ele estivesse no escuro, é porque me dispensava; mas se a luminária estivesse ligada, eu deveria entrar.

No fim das contas, nunca havia acontecido de ele me recusar. Mesmo quando não quis sexo, me deixou entrar e ficar com ele. Daí, conversávamos, víamos algum filme ou simplesmente namorávamos: os corpos juntinhos em silêncio, beijinhos aqui e ali, cafunés e mimos, um sentindo baixinho o bater do coração do outro.

Mas não era o mais comum. A regra era ele me comer até enterrar a pica com fúria, finalmente esvaziando aqueles culhões que se chocavam contra mim enquanto produziam esperma. Ou, pelo menos, me fazer dar-lhe uma mamada para me encher a boca com a porra que, pela quantidade, eu a contragosto sentia sempre escorrer um pouco pelos cantos.

Quando eu não passava antes por Otávio e Rodrigo, e apenas nesse caso, começava os trabalhos com aquele 69 que fazia como ninguém; a língua e os lábios trabalhando calmamente em meu botão, os dedos que ajudavam nas carícias e iam me abrindo com cuidado para que ele pudesse me linguar mais por dentro. Durante as tardes, quando fazia um intervalo no computador e me chamava para mamá-lo pelo celular, nunca íamos para o meia-nove, apesar de eu não estar galado. No chão seria desconfortável para ele e ir para a cama significava o risco de ele acabar não voltando ao trabalho, tomado pelo tesão. Então, em geral, apenas me punha para chupar de joelhos mesmo, sentado na cadeira, voltando em seguida para seu projeto final da faculdade e eu para o meu, com o gostinho de seu esperma na boca.

Mas, pelo próprio encaixe que o 69 permitia, eu progressivamente ia conseguindo abocanhar mais e mais a extensão do cacete, até que finalmente proporcionava a ele o prazer de penetrar-me a garganta. Engasgava, tossia, mas voltava para agradar meu homem. Então, muitas vezes, ele acabava vertendo o leite diretamente lá. Eu ficava um pouco triste pela decepção, pois engolia sem sentir seu adocicado. Mesmo já tendo bebido à tarde, e frequentemente mais de uma dose, me sentia frustrado.

Às vezes, Marcelo se continha e me mandava afastar seu pau da goela para dar o jorro na boca, de modo a satisfazer meu capricho. Outras, não; deixava correr livremente. Para ele, não era um problema lançar uma esporrada antes de me fuder. Então, deixava sair mesmo que fosse me cravar o cacete depois. Mas não era usual que o fizesse: na maior parte das vezes em que me presenteava com o meia-nove, já que meu canal não tinha sido esporrado pelos rapazes, ele dispensava a cópula.

Se houvesse sexo, o namoro, os filmes, todo o resto geralmente só ocorria depois dele. E, quando chegava a hora em que queria dormir, me dava um beijinho na testa, ou mais de um em algum outro canto de mim. Carinhosamente, me fazia entender que eu estava dispensado. Eu seguia para o meu quartinho, recheado pelo leite dele e enternecido pelo que estava vivendo. Ele me fazia feliz e eu a ele. Em ambos, era patente o deslumbramento por essa felicidade que havíamos encontrado um no outro.

Ali, ao seu lado sobre a cama, não pude admirá-lo muito tempo. Ele logo abriu os olhos. Presenteou-me com seu sorriso comedido e eu me desculpei por tê-lo acordado.

– Não me acordou, bezerrinho; claro que não. Não tava dormindo; só repousando. Tinha pensado mesmo em tirar um cochilo enquanto você não chegasse, mas não deu tempo de pegar no sono. Hoje, eles foram rápidos.

Abraçou-me, e senti que o caralho crescia.

– Que bom, bezerrinho. Já tava com saudade.

Começou a beijar meu cangote e deduzi que me queria de lado. Fui me virando e abrindo um pouco as coxas para o cacete ir se acomodando, mesmo sabendo que Marcelo não era fã de me comer de lado. Talvez estivesse querendo variar. Ele costumava deixar essa posição, quase exclusivamente, para quando queria me “fazer bico”, como chamava o efeito provocado em minhas bordas após perpetrar uma sucessão de metidas curtas e rápidas, usando apenas a cabeça do caralho. Ele adorava fazer isso, e eu adorava ver nos seus olhos o tesão que sentia quando contemplava o resultado. Virara a cabeça toda apenas para testemunhar seu deslumbramento.

Dito e feito, Marcelo logo me pôs de frente, sem desencaixar-se do meio das minhas pernas. Mas fez com que eu ficasse por cima dele, mesmo sabendo que, agora, era eu quem não gostava da posição em que estávamos. Ficar por cima dava-me a sensação de um controle que eu não desejava ter.

Ele havia percebido essa minha contrariedade uma vez. E confirmei que provavelmente constatara a razão muito rapidamente, porque, em vez de me mandar cavalgar, fez com que eu suspendesse um pouco o corpo para que ele, e não eu, comandasse a penetração. Meteu muito forte daquele jeito, de baixo para cima, e pareceu divertir-se com as expressões de dor que eu fazia a cada vez que parecia me estourar por dentro. Depois que gozei, obviamente sem me tocar mas vergonhosamente deixando minhas gotinhas de esperma gotejarem em seus pentelhos, pôs me de quatro e disse em meu ouvido:

– Não fica preocupadinho. Eu mando até quando parece que não.

Mas, naquela noite após nossa tarde romântica, quis fazer uma molecagem comigo. Sabia que eu estava aflito para levar ferro. Então me deixou por cima durante mais algum tempo, enquanto acompanhava com um olhar brincalhão a minha ansiedade para que me tirasse dali. E ela era tanta que eu já suplicava para que pelo menos ele encaixasse logo, mesmo comigo por cima, em vez de me deixar apenas admirando o cacete duro que se estendia para além de seu umbigo.

Gostava de me maltratar assim, risonho, terminando por fazer um bilu-bilu em meu pênis flácido. Estavam ali, um quase sobre o outro, embora o meu nem por sombra chegasse a tocar no dele, já que sequer ultrapassava meu saco, sobre o qual repousava sossegado. Quando se deu por satisfeito com aquela humilhaçãozinha, puxou-me contra si e logo eu estava de quatro, pronto para recebê-lo. Abri bem as pernas, a bundinha bem empinada, no aguardo. O que eu queria era ser fudido, do jeito que ele decidisse, fosse uma inserção cuidadosa ou uma invasão sem dó.

Mas não recebi nem uma nem outra. Eu não tinha como vê-lo, mas percebia que Marcelo parecia observar meu botão. Havia encostado a pica, pressionado muito pouco, e a afastara logo em seguida. Por um instante, temi que minha higiene não estivesse satisfatória. Mas não era possível, porque meu sexo permanecera intocado desde que havia saído do banheirinho. Como se quisesse confirmar algo, roçou levemente um dedo de baixo para cima, começando do períneo até atingir o meio do rego.

– Eles não aprontaram você? – perguntou, finalmente.

Eu não entendi, e apenas retruquei com um “Ahn?”.

– Você tá seco. Eles não te lubrificaram – disse, com uma voz circunspecta.

Foi se pondo ao meu lado. Eu me virei para ele, surpreso, intrigado e desapontado.

– Eu me lubrifiquei, sim. A gordura vegetal...

– O que aconteceu?

– Como assim?

– O que aconteceu, porra? – ele alterou levemente a voz. – Te mandei pra lá e eles não te aprontaram pra mim?

– Como assim, Marcelo?

– Aqueles dois nem te fuderam!

– Não... O Rodrigo só me mandou mamar. É que você não gosta nem do cheiro, então eu fiz como mandou, salivei bem e...

– E Otávio?

Fiquei em silêncio.

– E Otávio? – repetiu e em seguida fez uma pausa, ao notar que eu estava encabulado. – Por que essa cara?

– É que... Ele também...

– Fala logo, Zeca – mandou, num tom baixo, mas com uma impaciência mal contida.

– Marcelo, eu...

Olhou-me muito bravo.

– Ele hoje... – pausei, e tomei coragem: – É que ele me comeu hoje pela manhã, quando voltou pra cá depois que saiu contigo.

– E daí?

Não demonstrou qualquer surpresa com minha revelação.

– E daí, Zeca? Porque te fudeu de manhã não consegue te fuder à noite?

– Acho que ele estava cansado que nem o Rodrigo também, ou...

“Ou ele não quis estragar o clima que tivemos pela manhã, me comendo junto com Rodrigo no mesmo dia”!, eu teria dito, se não estivesse com medo pela expressão que ele fazia.

– Mas é o que? Otávio tem setenta anos? Não fode de noite porque já fudeu de manhã? – estava visivelmente irritado, como eu ainda nunca tinha presenciado.

Levantou-se da cama, muito ágil, e, para minha surpresa, tomou a direção da porta, pelado como estava.

– Marcelo, que...?

Com a mesma agilidade, vesti o short e fui atrás dele. Havia saído, nu em pelo, sem nem ligar que exibia aquele cacete todo, ainda à meia-bomba. Não acreditava no que estava vendo acontecer: nunca nenhum de nós transitara exposto assim pelo apartamento. Exceto comigo, nas putarias, mas era na encolha.

Quando cheguei à porta, ele já tinha acendido a luz do quarto dos rapazes. Estava na entrada, de pé, enquanto tanto Otávio quanto Rodrigo abriam os olhos e se apoiavam nos cotovelos, sem entender o que se passava. Possivelmente, estavam ainda começando a pegar no sono, pois não havia muito tempo que os deixara. Posicionei-me atrás de Marcelo, tão confuso quanto eles dois.

– Vocês não aprontaram o Zeca?

Mantinha certa sobriedade na voz, mas era nítido que estava furioso. Marcelo sempre foi muito mais gestual do que verbal, e mesmo a ira não o fazia fugir de seu padrão. Mesmo contrariado, conseguia controlar o tom da fala. Eu comprovaria esse comportamento mais ainda algumas semanas depois, quando a harmonia no apartamento desmoronou num estalar de dedos.

Eu estava amedrontado justamente pela ausência de gritos e palavrões. Sua própria imagem era intimidadora, aquele homem afrontando Otávio e Rodrigo do alto de seus quase dois metros e com a expressão grave, a voz sóbria e aquele cacete descarado. Mas meu medo se devia menos pela fúria que represava do que pela ameaça que aquela capacidade de controle indicava.

– Que? – um dos dois perguntou, meio atordoado.

– Ele não foi galado.

Falou como uma autoridade que aponta o erro alheio, sem alterar a voz. Olhou para o chão, impaciente, e retornou o rosto, cujas feições agora eram incapazes de amenizar a irritação.

– Vocês me mandaram ele sem estar galado.

– Caralho, Marcelo... Eu sou fodão, mas teu bagulho aí... caralho, é das galáxias... – quis brincar Otávio, entre risonho e meio, digamos, espantado com o que avaliava com os olhos.

O príncipe ignorou a brincadeira, ou elogio:

– Se mando ele aqui é pra que vocês aprontem o Zeca. Que história é essa hoje de me mandarem ele sem galar?

Efetivamente, tinha sido a primeira vez que nem um nem outro havia esporrado no meu canal. Pressenti que se qualquer dos dois fizesse um movimento mais brusco ou esboçasse uma discussão, eu veria o lutador de jiu-jitsu em ação sem qualquer aviso prévio. Mas tal só ocorreria efetivamente depois, naquela terrível manhã no apê cujas imagens jamais esqueci.

Marcelo olhou rapidamente para mim e, quando virava novamente para os dois, retornou. Percebeu que eu estava nervoso. Sua fisionomia era séria, mas me dedicou um olhar tranqüilizador. Eu correspondi, fingindo que tudo ia bem. Com delicadeza, pegou em meu braço para me por ao seu lado e, então, notou que eu estava trêmulo. Com o mesmo cuidado, aproximou-me mais, como se me protegesse, e me deu um selinho. Todo esse carinho foi muito rápido, mas à vista de Otávio e Rodrigo.

Eles se mantinham calados, não sei se por perplexidade ou por respeito. Marcelo meio que bufou. O cacete balançava, pesado, a cada pequeno movimento que fazia. Tantos meses, quase dois anos, sendo comedido à nossa frente, mantendo-se reservado por trás de suas cuecas justas, e agora expunha sem qualquer embaraço a impetuosidade que desenvolvera em seus anos de putaria e surubas. Realmente, não parecia nem um pouco constrangido com a situação.

Amenizou um pouco a voz, embora com expressão grave, como se desse a bronca por suficiente e estivesse mais preocupado em resolver um problema do que punir os responsáveis por ele:

– Eu vou voltar pro meu quarto. Não quero esperar muito. Resolvam logo isso e me mandem de volta o Zeca amaciado e galado, como deve ser.

Naquele momento, a ficha caiu para mim. Entendi, finalmente, o paradoxo de ele reforçar tantas vezes que eu era dele e, ao mesmo tempo, não se importar que Otávio e Rodrigo me usassem. Era inacreditável a razão daquilo, mas ficou tão evidente que eu não tinha como não admitir. Afinal de contas, e nas suas próprias palavras, ele tinha sido, e ainda era, o “macho da suruba” e “um putão”. Tudo se encaixava.

Eu sabia do passado de Marcelo; ele tinha me contado naquele mesmo dia. Sabia desse seu lado, já antecipado pela cama que tínhamos, pelo seu gosto pela sacanagem deslavada, sua completa liberdade em usufruir do sexo e de mim. Mas Otávio e Rodrigo não; nem de uma coisa nem de outra. Não sabiam que Marcelo era um puto que desfilava pelas surubas pegando tudo que era passivo e, pelo menos até a algum tempo, sendo regiamente pago por esse trabalho. Para eles, muito mais do que para mim, era espantoso o que estavam vendo.

O nerd do apartamento, o cara boa gente que ficava sempre na dele, o hétero que não devia transar tanto assim, mostrava que estava pegando o viadinho do apê com muito mais desenvoltura do que os dois, dando selinhos e carinhos em outro homem sem qualquer culpa ou vergonha. E, com a mesma desenvoltura, apresentava-se daquela forma: um garanhão bem dotado que vinha tomar satisfações de dois merdas sem se importar se os estava acordando ou sequer com o fato de estar nu em pelo.

Era compreensível que, de tão boquiabertos, não tivessem tempo para processar que era dessa forma que Marcelo os estava enquadrando. Daí, não reagirem àquele enquadramento. Mas em poucos minutos, após a saída de Marcelo, eu veria, atordoado, que não era bem isso.

Antes de sair, Marcelo acariciou meu braço e me deu outro selinho. Ali, na frente dos dois, como faz um namorado. Era óbvio para Otávio e Rodrigo que estavam diante de um casal, e não apenas de companheiros de apartamento. Um fudia o outro, como eles mesmos faziam, mas não se tratava de dois “parças”; tratava-se de um casal.

Marcelo, o homem sério do apê, mantinha-se tão sério quanto antes, mesmo dando selinhos em outro homem. E, tal como sempre fizera, impunha o respeito que sua figura sempre inspirou a todos nós. Parecia sentir-se muito bem, sem qualquer embaraço, como o macho do casal; o macho que protege o companheiro de sua própria fúria e que abertamente se mostrava pronto para protegê-lo qual fosse o desenrolar de toda aquela situação tão tensa.

– Não fica nervoso. Não precisa continuar a tremer assim – me disse, com uma voz terna, quando ia saindo.

Fiz menção de segui-lo, mas ele me deteve com um abraço no corredor, ainda perto do quarto. Abraçou de maneira muito firme, como se com sua força quisesse aquietar meu corpo, ainda um pouco trêmulo. O caralho se fez presente, maciço mesmo sem ereção, pressionando minha pele. Soltou-me logo.

– É com eles, não contigo, bezerrinho – disse, inclinando a cabeça para mim. – Já me acalmo. Fica e deixa eles te aprontarem; depois, vem pra mim. Daqui a pouco passa e fico bem. Não vou descontar em você quando você voltar.

...

[continua]

[PS1: O segmento B desta parte, mais curto do que este, será publicado amanhã, terça-feira]

[PS2: Pus abaixo, nos comentários, uma breve previsão das próximas publicações]

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Comentários

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Oieee Kra não para o conto não, justamente na reta final parou de postar...

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todos buscam algo que não possuem autoestima elevada e amor.

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Excelente como sempre a parte técnica, vocabulário, correção, ritmo... Quanto a história, o Marcelo mais professoral tá fazendo falta. Não consegui concatenar as ações e reações dele nos últimos capítulos à teoria proposta... E mais uma dúvida, não sei se foi intencional ou coisa da minha cabeça, mas em uma das últimas partes tive a impressão de que o Zeca se referiu a história como se tivesse ficado tudo no passado, inclusive o Marcelo...

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MEIO CONFUSO ESSE LANCE DO MARCELO QUERER PRIMEIRO QUE MARCELO OU RODRIGO COMESSEM ZECA E DEPOIS ELE COMERIA. POR QUE SE SENTE BEM VENDO A PORRA DOS DOIS EM ZECA? ALIÁS TUDO OU QUASE TUDO EM MARCELO TÁ ME PARECENDO MEIO COMPLICADO. POBRE ZECA NO MEIO DESSES TRÊS DOIDOS. RSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS

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Zeca é meu herói, viado tem que ser de outro plante pra aguentar tanta trompa de elefante num dia só, palmas ao Zeca e ao autor do conto, maravilhosos!!!

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cara, eu tinha comentado aquela vez, mas o site modificou e só hoje consegui achar sua resposta, kkkkkk. Bom, a história continua ótima, a escrita como sempre perfeita. envolvente, vocabulário certo para a hora certa, em fim.Estou gostando do rumo que a história está tomando, embora eu tenha ficado revoltado com o jeito de Marcelo para com o Zeca quando disse para ele que ele era pequeno, inferior. Mas hoje entendo e achei muito interessante esse ponto de vista.Eu uso sim um leitor de tela, kkkkk. E para seu alívio e minha punheta, eu sempre uso fone no computador e no telefone. kkk. Abraços e continua, estou adorando, mano!

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Minha ideia é fazer uma publicação todas as noites desta semana, até para compensar esse último intervalo tão longo. Não sei se conseguirei, mas seguramente publico o segundo segmento desta parte amanhã (terça) e a parte seguinte, a 25, na noite de quarta. ► ► ► O A.B.O. do título finalmente será esclarecido na parte 26. Ou seja, muito em breve (na minha esperança, nesta semana mesmo). Creio que para muitos leitores é um enigma, o que acho bem estimulante. Mas também que vários já a decifraram e outro tanto desconfia do que se trata, e nesse caso, provavelmente será a confirmação de uma hipótese. Mas imagino que mesmo para os metidos a espertinhos haverá alguma surpresa, porque vai tudo muito explicadinho, inclusive com um esqueminha para facilitar a compreensão (que estou quebrando a cabeça para bolar como vou representá-lo aqui, já que não temos destes recursos gráficos). Acho (ou espero) que a parte 26 vai clarificar o argumento da trama, o próprio desenvolvimento dela e o perfil, para muitos revoltante, dos personagens. Hehehe, vai ter gente arrancando os cabelos de raiva, indignação e tudo o mais... Mas acho que a maioria vai gostar, ao menos pelo que talvez considerem inusitado e pela coerência que tentei levar à frente. ► ► ► Fechei um planejamento final hoje, e acho que encerro tudo em 30 partes mesmo. Então, se continuar com o ritmo meio espaçado que infelizmente tenho levado, encerro a história em duas semanas. Se for muito, muitíssimo otimista, ao fim da próxima semana mesmo. Vamos ver. De qualquer modo, os mais impacientes podem ficar tranquilos porque estamos chegando ao fim. ► ► ► Obrigado pela leitura e pela persistência dos que acompanham essa história que parece não acabar nunca, rs.

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