AMOR DE PESO - 02X10 - JESUS E O MORTO

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Homossexual
Contém 4099 palavras
Data: 12/05/2018 22:55:14
Última revisão: 06/07/2022 19:52:17

NARRAÇÃO: ZEDU

***

Pai,

Eu não estou acreditando. Não paro de pensar que o senhor partiu. Eu queria mais tempo. Eu precisava de mais tempo. Eu não sei o que fazer. Estou perdido.

O Yuri costuma escrever para os seus pais que morreram e pediu para eu tentar. Quero dizer que eu amei o senhor o máximo que pude. Juro, vou honrar o seu nome.

***

Jesus era um homem que fazia milagres, em certo momento, a bíblia nos informa que Jesus ressuscitou um homem chamado Lázaro. O homem estava morto há três dias, e Jesus o trouxe de volta. Nunca fui uma pessoa religiosa, mas o fato de saber que existiu uma pessoa que dava vida aos mortos me impressionava. Afinal, eu era uma criança e acreditava em contos de fadas.

Quando cresci, vi que os milagres de Jesus não passavam de histórias e a morte do meu pai confirmava isso. Onde estava o Senhor Todo Poderoso que curava as pessoas? Por que ele não fez nada pelo meu pai? Eu havia perdido toda a minha fé naquela tarde de agosto.

— Amor. — Yuri me chamou entrando no quarto. — Você precisa descer. — sentando ao meu lado.

— Eu não quero sair daqui. — falei, sem olhar para o Yuri. — Se eu sair daqui e for ao velório, tipo, é a mesma coisa que dizer que ele morreu. E eu não quero acreditar nisso...

— Eu sei. — Yuri respondeu com sua habitual paciência. — Mas sua mãe precisa de você, os seus irmão também. Seu coração dói e vai doer por muito tempo.

— Você já me falou isso. — virei de lado e olhei para o Yuri, que estava acariciando meus cabelos. — Que demorou muito para esquecer a morte dos teus pais.

— Eu não esqueci. — revelou Yuri com sua voz suave e pesarosa, quase me arrependi de fazer o comentário, porque não queria trazer recordações ruins para o meu namorado. — Esse sentimento vive em mim, só que não tão latente como antigamente.

— Obrigado. — agradeci pegando a mão dele e beijando.

— Tudo bem, meu príncipe. Agora vamos tomar um banho? — ele perguntou fazendo uma voz engraçada.

— Eu preciso mesmo?

— Hum Rum.

Cara, o Yuri foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida, sério. Sempre vivi em conflito com a minha sexualidade. Nem preciso dizer o choque que levei quando descobri que gostava de homens gordos. Para me afastar de qualquer pensamento negativo, eu ficava com homens e mulheres. Então, ele apareceu. Com o seu sorriso meigo e olhos verdes. Não precisou muito para o Yuri me conquistar.

Mesmo com preguiça e desânimo, eu o segui até o banheiro. O Yuri tirou o meu pijama e ligou a água. Em seguida, o vapor tomou conta do box. Entrei e a água quente cobriu o meu corpo. De repente, um alerta dentro de mim lembrou da morte do papai. As lágrimas se misturaram com a água que caia .

O Yuri não falava nada. Deixou eu curtir a dor. Ele pegou o shampoo e passou nos meus cabelos. Aquele banho foi muito relaxante. A última coisa que passou pela nossa cabeça foi sexo. Fiquei no banheiro me enxugando e Yuri pegou a roupa que eu usaria naquele dia.

Era uma blusa social ¾ preta com detalhes brancos nas mangas, uma calça jeans preta e minhas sandálias pretas. Ele sabia que eu odiava usar roupas sociais. Vesti as roupas e olhei no espelho. Os meus olhos estavam vermelhos e as olheiras se formaram na parte inferior dos meus olhos. #umcaco.

Demorei a descer. Queria evitar esse momento tão sofrido. Todos os meus familiares estavam na minha casa. A cena era parecida com o dia em que perdemos a minha avó. Uma tia me abraçou e me beijou na testa, o cheiro do perfume dela ficou grudado na minha roupa. Em seguida, a minha mãe me chamou.

— Filho. — a mamãe lamentou, antes de me abraçar. Era a primeira vez que eu a via desde a morte do papai. — Só Deus sabe como o meu coração está destruído, mas precisamos ser fortes. Eu conto com você.

— Eu sei. — garanti, a beijando no rosto. — A senhora viu o Yuri?

— Ele saiu com o Fred para comprar mais pão. — ela explicou, enquanto me levava na direção da tia Estela, que adorava apertar minha bochecha.

Lembro da mamãe falando que nunca esqueceria do suporte dos meus amigos e da família do Yuri. Realmente, a generosidade era algo que fazia parte da vida do meu namorado. Enquanto conversava com a tia Estela, ouvi alguém citando que existe um plano de Deus para nossa vida.

Lembrei, novamente, da história de Lázaro. De acordo com passagens da bíblia, a irmã dele ficou brava com Jesus. Ela teve coragem de enfrentar o salvador do mundo e disse: "Senhor, se tivesses estado aqui, não teria morrido meu irmão".

Será que ela estava certa ao fazer isso, tipo, enfrentar uma divindade? E se Jesus ficasse puto e fosse embora? Assim, como fez comigo e a minha família.

***

No caminho ao mercado, Yuri e Fred ficaram em silêncio. Infelizmente, o meu namorado não nasceu com traquejo social. Já o Fred não conseguiu absorver a morte do papai, quer dizer, ele passou em frente ao campo de futebol que sempre jogávamos. A dor da perda o atingiu feio. Fred freiou bruscamente e começou a chorar, por sorte, não atrapalhou o fluxo do trânsito.

— Fred. — Yuri lamentou.

— Eu... eu estou com medo, Yuri. — revelou Fred, segurando o volante tão forte que suas mãos ficaram vermelhas.

— Medo?

— Sim, eu sou o homem da casa agora. Eu não sei administrar a minha vida. Eu vou levar minha família à falência.

— Ei. Você está pensando lá na frente. Fred, o teu pai acabou de falecer. — Yuri percebeu a respiração ofegante de Fred e identificou uma crise de ansiedade.

Sem ter o que fazer. O Yuri tomou uma atitude drástica e abraçou o meu irmão. Ele aproveitou o momento para dizer palavras de incentivo no ouvido de Fred. Para a surpresa de Yuri, o meu irmão se deixou ser abraçado e acariciado.

— Fred. — soltou Yuri, se distanciando e limpando às lágrimas do meu irmão. — Vocês são uma família unida, tudo bem se você tiver medo, afinal, faz parte de ser vivo. O teu pai tinha um orgulho tão grande de vocês, ele morreu sabendo disso. Ele sabia que vocês seguiriam em frente da melhor maneira possível.

— Obrigado. — agradeceu Fred com uma voz rouca, enquanto limpava as últimas lágrimas.

— Pelo menos alguém gosta de mim. — murmurou Yuri.

— Oi?

— Nada... nada... — Yuri tentou desconversar, mas o seu rosto vermelho provou para Fred que não era nada.

— Você começou... pode ser sincero comigo.

— O JL, ele não gosta de mim.

— O JL é um babaca. Yuri, não se importa com nada que ele falar. Está sendo difícil para ele. — Fred afirmou, tentando encontrar justificativas para o comportamento do irmão.

— Entendi.

— Sério. Eu amo o Zedu, eu sempre cuidei dele. O JL estava muito afastado, estranho. Eu fico feliz que o Zedu tenha te encontrado. — garantiu Fred bagunçando os cabelos de Yuri.

— Obrigado. E precisando conversar, conta comigo. — fazendo sinal de positivo.

— Pode deixar, cunha. — afirmou Fred, dando a partida no carro. — Vamos comprar esse pão.

Eu não era o único passando por uma situação difícil, a Ramona, tinha um segredo. Algo do passado dela que muitos não entenderiam. A Ramona era uma grande amiga e me ajudou muito com todo o drama dos últimos meses. Naquela manhã, ela escolheu roupas de cores neutras e esperou Brutus.

— Bom dia. — Brutus a cumprimentou. Ele usava uma camiseta social branca e jeans.

— Bom dia. Só vou pegar minha bolsa. — avisou Ramona entrando em casa.

— Será que eu compro algo? — perguntou Brutus, agindo de forma estranha.

— Como assim?

— Comprar algo para o Zedu, sei lá. Eu não sei o que fazer. — ele soltou, ficando com os olhos marejados e abraçando Ramona. — Desculpa, eu não sei o que fazer. O Zedu é um grande amigo, e eu não sei o que fazer.

— Amor, tá tudo bem. Podemos passar na padaria e comprar algo. Não se preocupe.

Será que a família de Lázaro fez um banquete para os seus familiares? Aqui no Brasil, as pessoas gostam de levar alimentos para os velórios. Em Manaus, por exemplo, é comum servir café com leite e o biscoito de água e sal, também conhecido como Bolacha de Motor.

Como ainda era cedo, uma tia fez sopa de legumes. A tia do Yuri comprou litros e litros de refrigerante. A Ramona trouxe bolo de castanha. Fico imaginando Jesus chegando na casa de um defunto e comendo antes de fazer um grande milagre.

A minha casa estava cheia de conhecidos. Só que não consegui parar um minuto. Sempre alguém me chamava, porque precisava encontrar algo, ainda mais na cozinha. Meus amigos chegaram aos poucos. A tia do Yuri trouxe uma equipe da funerária. Eles armaram uma mesa de ferro e enfeitaram uma espécie de arco com flores.

Uma tia fez sopa, a outra café, a tia do Yuri, comprou litros e litros de refrigerante, e o pai da Ramona, bolo. Fico imaginando, Jesus, chegando na casa do morto e comendo antes de fazer o grande milagre. Meus amigos chegaram depois de um tempo, quase não conversei, na verdade não havia clima para conversa. A tia do Yuri chegou, e junto dela, alguns homens da funerária. Eles armaram uma mesa de ferro e enfeitaram com flores.

— Eu não consigo imaginar como vai ser o dia em que os meus pais forem. — comentou Letícia sem conseguir conter às lágrimas.

— Complicado, muito complicado. — Yuri soltou, lembrando do dia em que os pais morreram e suspirou fundo.

— Que merda, hein. O seu Ulisses era o melhor. — afirmou Brutus.

— O Zedu vai precisar muito de nós. Fiquem de olho nele. — pediu Ramona.

— Gente, vou falar com a minha tia. Com licença. — Yuri andou até a tia, que assinava alguns documentos.

A Olívia fez todo o trâmite para que o velório do meu pai fosse realizado em casa, um dos lugares que ele mais amou na terra. Ela é o tipo de pessoa que sabe agir em situações complicadas. Será que é o lado advogado? Eu não sei, mas serei eternamente agradecido.

O adeus seria em casa. O lar que o seu Ulisses prezava. Lembro do dia em que nos mudamos para cá, eu tinha uns 10 anos. Estava chovendo, o papai me carregou nos braços e não se importou com as gotas que caiam sobre nós. A gente passou a tarde brincando para o desespero da minha mãe.

***

— Que horas o corpo vai chegar? — perguntou Yuri, após Olívia liberar a equipe da funerária.

— Daqui 20 minutos. — ela respondeu, olhando para o relógio do celular.

— As crianças estão com o Carlos?

— Sim, prefiro poupá-los disso. E você?

— O que tem eu? — questionou Yuri, dando com os ombros.

— Amor. Você ainda fica muito sentido. Tudo bem. — respondeu Olivia, acariciando os cabelos do sobrinho.

— Não quero fazer isso uma questão sobre mim. O Zedu precisa de mim. — garantiu Yuri.

— Eu entendo. O que você está fazendo é a coisa mais linda do mundo, eu tenho certeza, que os teus pais estariam orgulhosos. — Olivia conseguia enxergar uma beleza no Yuri, a mesma que eu via.

— Aprendi muitas das coisas que sei com a senhora. Sei que não demonstro muito, mas eu sou muito grato pela senhora nos aceitar de braços abertos. — declarou Yuri, abraçando a tia e chorando.

— Vocês são meus filhos. Eu amo vocês.

***

O momento que a minha família evitava chegou. Às 11h, os funcionários da funerária chegaram com o corpo do seu Ulisses. Todos choraram. O Yuri ficou perto dos nossos amigos, e eu abraçado com a minha mãe, ela desmaiou duas vezes. Olivia se ofereceu para levá-la ao quarto.

Uma parte de mim queria chegar próximo ao caixão, a outra implorava para que eu não fizesse isso. Uma mão tocou o meu ombro. Um toque gentil e familiar. O Yuri olhou para mim e acenou positivamente com a cabeça. Segui para o caixão. O meu coração disparou. As pernas tremeram, mas eu segui, o meu pai valia o esforço.

A testa do meu pai estava gelada, será que foi essa a mesma coisa que Jesus sentiu quando ressuscitou Lázaro? Meu coração começou a acelerar e as lágrimas saiam fácil. Eu não conseguia acreditar, meu pai, meu herói, naquele caixão.

O meu irmão, JL chegou depois de um tempo e, também, ficou ao lado do corpo. Ele não falou nada, apenas ficou acariciando a testa dele. Alguns tios e primos se aproximaram para prestar uma última homenagem. O seu Ulisses era um homem querido, pela família e amigos.

— Am... — Yuri soltou, parando de falar e reformulando sua frase. — Zedu. Vai dar 12h. Você precisa comer algo.

— Não precisa. Estou bem. — eu menti. O meu corpo tremia e o coração parecia se despedaçar aos poucos.

— Você está tremendo. — ele ressaltou pegando no meu ombro e apertando.

— Eu estou bem, eu juro.

— Só...

— Ele disse que está bem. — falou JL, com uma certa agressividade na voz, mas mantendo o tom baixo em respeito ao pai.

— Vamos... vamos sair daqui. — eu peguei na mão do Yuri e o levei para o outro lado da sala.

— Desculpa, eu não queria.

— Tudo bem.

— Ei, eu te amo. — Yuri se declarou, enquanto acariciava minha orelha direita.

— Eu também te amo.

Não muito longe dali, Carlos precisava alimentar Giovanna e Richard. Os dois irmãozinhos de Yuri estavam chateados por não poderem ir abraçar me abraçar. Carlos era um homem paciente, mas tudo na vida tem limite. Ele encontrou Richard com várias baratas em seu corpo, o pequeno só ria da situação. Com muita dificuldade, o namorado de Olivia conseguiu tirar todos os insetos e os jogou no quintal.

— Isso é nojento. — disse Carlos com uma expressão de pavor no rosto.

— Não é não, crio as meninas desde pequenas. Elas são limpas. — justificou Richard, cruzando os braços e desaprovando a reação de Carlos.

— Você o quê? Sério, Richard? Você sabe que a sua tia morre de medo de baratas e mesmo assim faz isso? Deveria começar a pensar nas suas atitudes. Sabia que elas sempre acabam machucando alguém? Ou você esqueceu do dia em que o Yuri e Zedu se perderam no mato? Você deveria começar a refletir mocinho. — saindo da sala e topando com Giovanna.

— Carlos, não tem tâmaras na minha salada. — Giovanna avisou segurando um prato de salada nas mãos.

— E nem vai ter. — Carlos foi curto e grosso com a irmã de Yuri. — Eu vou sair. Não queimem nada.

— Credo. Grosso. Bem, posso sobreviver sem minhas tâmaras, mas cadê o queijo mais lindo? Adoro queijo de búfala. — olhando para o queijo que estava no prato.

Juarez pegou Mundico em sua casa. Eles decidiram ir juntos para o velório de Ulisses. No caminho, os dois não falaram nada. Juarez estava cada vez mais dividido, ele havia feito uma coisa ruim, mas seu coração começou a se apaixonar por Mundico.

Só que naquela altura do campeonato, a verdade seria uma receita para o desastre. Por isso, o dançarino começou a mudar algumas atitudes, inclusive, abandonou alguns amigos que não gostavam do Mundico.

A nossa rua estava movimentada. Carros estacionados nos dois lados da via. Ao sair do carro, Juarez esbarrou em uma pessoa. Antes que pudesse pedir desculpas, ele soltou um palavrão.

— Alicia? — perguntou Juarez, ainda sem entender os motivos que levaram a minha ex-namorada para o velório do meu pai. — O que você está fazendo aqui? Pensei...

— Fico surpreso com você. — respondeu Alicia, cortando Juarez e soltando uma verdade. Pensei que odiasse o Zedu.

— Odiar é uma palavra muito forte, né? — interveio Mundico, não gostando do jeito de Alicia tratar Juarez.

— E você é quem? — Alicia olhou de Mundico dos pés à cabeça.

— Um amigo. Bem, estou estudando com o Zedu e os amigos dele. — explicou Juarez.

— Olha só. Eu saí e você entrou. Deve tá tentando roubar o Zedu do Yuri. — brincou Alicia.

— O Zedu faz parte do meu passado. O Yuri não tem com o que se preocupar. Só se um monstro oxigenado tentar separar os dois. — ironizou Juarez chamando Mundico para entrar.

— Vamos lá. — Alicia arrumou o vestido florido e olhou para a frente da minha casa. — Levanta a cabeça princesa, senão a coroa cai.

Eu amava a Alícia, não vou negar. Passei quase dois anos com ela, entre idas e vindas, mas a usava como um disfarce, ou seja, não era justo comigo e, principalmente, com ela. Ao entrar em casa, a Alicia falou com a mamãe e meus irmãos.

Depois que tomei uma sopa, subi para descansar no quarto. Deitei e a minha cabeça parecia um vulcão em erupção. Ouvi a porta do quarto abrindo, por um segundo, pensei que era o Yuri, mas me deparei com a Alicia.

— Podemos conversar?

— Alicia? — perguntei, levantando da cama em um pulo. — O que você está fazendo aqui?

— Eu queria te ver. O teu irmão, JL me trouxe. Achei que eu podia...

— Olha, acho melhor. — eu não conseguia falar direito, porque estava colocando uma camiseta. — Acho melhor a gente conversar em outro lugar.

— Zedu. Acho que já vi você pelado. — afirmou Alicia, me deixando vermelho. — Então, eu soube que você está com o Yuri. E até viajaram juntos?

— Sim, fomos para Parintins. — contei, encostando na parede e cruzando os braços. — Mas de verdade, eu acho melhor conversarmos lá fora.

— Eu nunca te esqueci. — Alicia explodiu em lágrimas, correu e me abraçou.

— Alícia. Podemos conversar...

— Eu ainda não entendi, a gente era feliz, né?

— Eu não era, e você também não. Eu gosto de homens....

Enquanto tentava escapar das garras da Alícia, o Yuri ouvia toda a conversa. Ele até pensou em entrar, mas achou melhor não atrapalhar.

— Homens gordos. O Yuri é feio, ridículo...

— O Yuri é doce, a pessoa mais generosa que eu conheço! — gritei, finalmente, conseguindo me soltar e andando em direção a porta. — Ele não é tóxico ao contrário de você. Você nunca me deixou ser eu. O Yuri é lindo. Por dentro e por fora. Agora, por favor, saia do meu quarto.

— Quer saber... eu vim aqui de boa, mas você ainda continua enfeitiçado. Coitado do teu pai, saber que o filho era gay... deve ter morrido...

— Eu juro por Deus, se terminar essa frase eu.... — Yuri entrou no quarto como um furacão e ficou do meu lado.

Atrás do Yuri estavam os meus amigos. Aparentemente, Juarez contou que Alicia estava querendo causar problemas, então, todos seguiram para o meu quarto. Eu sei que o Yuri não é de violência, mas o mesmo não vale para a Letícia, que pegou a minha ex-namorada pelos cabelos.

— Escuta só, projeto de vilã mexicana. Eu até gostava de ti, juro por Deus, que gostava. Só que você vacilou com os meus amigos e passei a ter pena de você. Eu não quero confusão, ainda mais em um momento tão delicado para o Zedu. Então, vamos fazer assim. Você vai pegar esse teu cabelo oxigenado e dar o fora. Não quero mais ouvir o teu nome. A partir de agora, tú vai ficar conhecida como: vaca manipuladora escrota! — ameaçou Letícia, puxando os cabelos de Alicia e a empurrando na direção da porta.

— Vocês são loucos. — disse Alicia, arrumando o cabelo e saindo.

— Eu sinto muito. — lamentei.

Eu estava quebrado. O meu coração parecia ser pisado por uma manada de elefantes. Com todo o carinho do mundo, o Yuri me levou até a cama. Deitei. O misto de saudade e desespero tomou conta do meu corpo. Comecei a chorar. Não foi um choro bonito. Foi triste.

Yuri tirou os sapatos e deitou do meu lado. De repente, a Letícia fechou a porta, depois de se certificar que a Alicia havia partido. A minha cama não é grande, mas todo mundo deu um jeito de deitar. Sete adolescentes. Apartados em uma cama de casal.

— Vai dar tudo certo. — Yuri falou ao meu ouvido. — Estamos contigo.

***

A mãe e irmã de Lázaro mandaram uma mensagem para Jesus. "Senhor, aquele a quem o senhor ama está doente", elas disseram. Ele até foi, mas chegou atrasado para o desespero de todos. Lázaro estava no sepulcro, uma espécie de túmulo, a família já havia chorado e velado aquele homem.

A família de Lázaro, inicialmente, ficou revoltada com a atitude de Jesus, afinal, ele permaneceu mais de dois dias ocupado, mesmo sabendo que o homem se encontrava doente. Em nenhum momento ele temeu, ele enfrentou a situação e conseguiu aquilo que todo mundo esperava.

Só que no fundo, Jesus se sentiu culpado por não estar lá no momento que o homem realmente precisava. A pressão das pessoas em cima dele também não ajudou. Se Jesus abriu os olhos do cego, porque não impediu a morte de Lázaro, questionou alguém. Jesus estaria mentindo para os seus seguidores?

Jesus pediu para que as pessoas o levassem para a gruta onde estava Lázaro. Ele entrou no lugar depois que alguns homens retiraram a grande pedra que tapava o caminho. Na hora, um cheiro ruim exalou no ar, afinal, as pessoas apodrecem,né? Ninguém acreditou em Jesus, ele então com apenas uma frase levantou Lázaro do mundo dos mortos, mas por que o meu pai não poderia ter a mesma chance? Onde estava Jesus no momento em que eu mais precisava dele?

Durante o cortejo, o Fred foi no carro da funerária. Enquanto, o JL nos levou logo atrás. Ele não chorou, apenas lamentava e consolava a mamãe. O cortejo seguiu até um dos principais cemitérios de Manaus. O clima estava quente e não havia uma nuvem no céu de Manaus.

Com todo cuidado, a equipe da funerária levou o caixão do meu pai para o jazigo da família. Eu só chorava. Lembrar que eu não veria mais o meu pai. Que ele não me aconselharia. Eu estava sem chão. Não muito longe, o Yuri acompanhava o meu sofrimento e chorava junto comigo.

— Vamos cimentar a parede. — avisou um dos coveiros, após eles colocarem o caixão do papai dentro de uma das urnas do jazigo.

— Pai... paizinho... te amo... — eu falava, meio que como uma oração.

— Vamos ficar bem. — Fred me abraçou e garantiu que nós iríamos superar todos os obstáculos.

— Meu amor, obrigada por todos esses anos. Eu nunca vou te esquecer. Eu te amo. — minha mãe declarou, sendo amparada por uma das minhas tias.

— Me perdoa pai. Me perdoa por qualquer coisa. — soltou JL, chorando pela primeira vez.

Sim. O meu pai se foi. Ele não teve a mesma sorte de Lázaro. O seu Ulisses morreu e deixou um vazio no meu coração. A minha mãe diz que os planos de Deus tem um motivo, mas qual será ele? Será que vou para o inferno? Esse é o meu destino?

A minha cabeça estava uma completa bagunça. No fim da tarde, fiquei muito cansado e capotei na cama. Acordei algumas horas depois. Durante dois dias, eu fiquei na casa do Yuri. Também tive uma folga do colégio, precisei fazer duas atividades, mas não levaria falta.

No sábado, a gente decidiu ficar no quarto o dia todo. Ainda bem que choveu, ganhei uma desculpa para não ver ninguém. O Yuri estava concentrado em um livro e não percebeu que eu o observava.

— Você sente que o mundo foi injusto com você? — perguntei, chamando a atenção do Yuri, que deixou o livro de lado para me responder.

— Hum...

— Você perdeu os teus pais tão cedo. Sei lá, você não ficou com raiva de Deus?

— Acho que nunca falamos sobre religião, né? Eu sou agnóstico, ou seja, não sei se existe um Deus ou não, porém, quando os meus pais morreram, eu meio que descontei minha frustração Nele. Fora que eu tive um surto, isso não ajudou em nada. — explicou Yuri, dando uma risada nervosa e pegando em minha mão. — Eu penso o seguinte, amor. A vida me tirou, mas também me deu. Eu sei que você está se sentindo com Deus, entretanto, precisamos acreditar em algo. Deve existir uma força maior que nos guia e rege todo o universo. Na hora da provação. Nos momentos que somos testados e humilhados, temos que acreditar em algo.

— Acho que eu vou na missa. — falei, lembrando que a minha família estava planejando a missa de sétimo dia do papai.

— É um começo. — Yuri assentiu com a cabeça e beijou minha mão. — É um começo.

***

Vai que essas histórias sobre Jesus não são verdades? Para Zedu, o que você está falando. Você acredita. Você acredita que alguém a cima de você o protege. Só não pode deixar essa fé se apagar, e não pode deixar o mesmo acontecer com o teu namorado. Precisamos ter fé. Eu preciso ter fé.

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Comentários

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EXCELENTE CAPÍTULO. CADA VEZ MELHOR POR SINAL. SUPER NORMAL ESSES QUESTIONAMENTOS DE ZEDU. AINDA BEM QUE YURI ESTÁ POR PERTO. MAS JL AINDA VAI CAUSAR TRANSTORNOS. SEM CONTAR QUE AINDA TEM LETÍCIA.

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