Uma Fantasia de uma Tarde de Primavera - Parte 3

Um conto erótico de Ahygo C. T’vilerrã
Categoria: Homossexual
Contém 7516 palavras
Data: 11/03/2018 03:58:07

Conseguiu o que queria?

Era quase 11 horas da manhã, e eu ainda não tinha pensado no que faria para o almoço. Conversando com a minha mãe, percebi que ela não tinha percebido muito mais do que aconteceu entre mim e o Déreck. Ou pelo menos não quis falar sobre.

Já aviso, ela é um amor! Mas por causa do conservadorismo religioso da igreja dela e da família, não se sentiu muito a vontade pra expressar as próprias vontades... Como, quando queria não baixar a cabeça pra toda vez que o meu pai era autoritário com ela e ordenava em tudo. Se ela podia sair com as amigas ou com os próprios filhos; se poderia usar roupa x ou do jeito assado; se ela podia procurar um emprego pra ajudar na renda da casa... E isso que nem lembrei do fato que em todas as vezes que ela mostrava ser contra a homofobia dele a mim, ele fingia querer bater nela. [Ate suspeito que sim, mas a minha mãe sempre negou e escondeu, usando roupas compridas e com muito pano. {ela sempre disse que é o jeito de “beata” dela, mas eu nunca acreditei... Ou preferi não me meter, já que também sofria homofobia, não queria ser espancado TAMBÉM por tentar ajudar ela.}]

— E como vão o Leandro e a família? — perguntei.

— Eles estão bem. — ela foi um pouco breve ao falar. Talvez porque sabe que estou brigado com os meus irmãos. — O Pedro e o Paulo vão tentar o vestibular pra UFRJ, pra jornalismo e veterinária... — eles têm, respectivamente, 13 e 15 anos. E são muito CDFs, uns crânios, mas não pensam quando o assunto é mulher e sexo. — A Isabela vai fazer 11 anos e mesmo patinando em algumas matérias, tá adorando a escola dela.

— Ela está em que série?

— No quinto ano do fundamental, no D. Laurentiano, perto de casa. — ela falou colocando um pedaço de bolo na boca. Foi nessa escola que fiz o ensino fundamental, e lá não tive muitas memórias boas, já que é uma escola pública com uma diretora medíocre e escrota. — A Maria Eduarda largou definitivamente a escola e agora procura emprego, como faxineira ou o que vier. — Maria Eduarda é dois anos mais velha que eu.

A Maria Eduarda foi a mais cruel. Disse coisas horríveis pra mim quando nosso pai faleceu, sempre me culpou. E saber que ela saiu da escola, depois de passar quase cinco anos tentando passar do primeiro ano do ensino médio, só me fez sentir superior a ela. Porque disse que eu não conseguiria ser feliz sendo gay, não seria nada, não me formaria na escola, não iria conseguir fazer algo de bom! Alem de sempre me lembrar que eu não teria filhos, não iria crescer direito, ser e fazer alguma coisa que preste. E agora é ELA quem não consegue terminar sequer o colégio (?!), não tive como não pensar que o mundo deu voltas.

Quase sorri com esses pensamentos.

— Filho, não ri dela, ela pode ter todos os problemas do mundo, mas sempre...

— Eu sei, eles vão sempre ser meus irmãos. Mas isso muda o sentido das palavras deles? Por acaso, muda o quanto sofri por eles serem tão babacas?

Ela ficou quieta então, porque já havíamos brigado muito com essa discussão. Mudando de assunto, dona Leocádia falou sobre Leandro.

— O Leandro e a Marcelia tiveram outra criança, uma menina. — minha mãe bufou de derrota, e lembrou que faz quase dois anos que não vejo ninguém alem dela. — É linda, parecida com você. — essa parte me surpreendeu tanto que pensei que ela estava se referindo a criança ser gay, então percebi que na verdade era fisicamente. — Vai completar cinco semanas amanhã...

— Como se não bastasse ele — falei do Leandro — não me deixar ver o meu sobrinho, ainda se “esqueceu” de me ligar pra avisar que iria ter outro filho... — fui irônico. A minha mãe não falou nada, sequer pra defender o próprio filho. Pois sabia que eu estava certo.

— Vitor, deixa pra lá... — ela disse então. — Eles queriam dar o seu nome pra ela.

— O que?? — perguntei largando o pires vazio só com farelo de dois pedaços de bolo que comi. — Ah, sim, desculpa. Vai se chamar Vitória, então...

Quase pensei em ficar feliz com essa noticia, então lembrei que provavelmente eles não iriam me deixar vê-la também.

— Qual o nome do menino deles mesmo? Que não me lembro de terem falado pra mim... — perguntei com uma pontada de angustia e decepção.

— É Junior. — disse olhando pra baixo. Consegui fazê-la sentir culpa.

E isso me fez sentir mais culpa ainda, porque ela é minha mãe. E eu não consegui esquecer tudo o que aconteceu, mas que também ainda não passou.

— Quer saber, esquece... — joguei a toalha quando vi que se passaram alguns minutos compridos demais. — Tudo bem, só fala pra eles que fico muito feliz por eles.

— Vitor, a gente te ama, todos eles, inclusive o Leandro e a Maria Eduarda, e ate o teu pai, apesar da forma como reagiram a você ser gay...

Não ia falar nada, não mudariam os fatos. Inclusive o que ELA pensava sobre isso.

— E aí, gente. — fala Roberto entrando em casa e percebendo o clima. — Como vai a senhora? — ele perguntou dando um beijo na bochecha dela, minha mãe respondeu que vai bem. — Amor, trouxe comida, pensei em nhoque. Que tal?

— Mas vai demorar muito pra gente comer agora... — fiquei sem graça, porque vi só depois que ele já tinha comprado nhoque pronto. Era só esquentar, e eu fiquei com ainda mais raiva com tudo aquilo, com essa situação chata de conversa chata. De não saber, poder falar alguma coisa. — Ah, tudo bem. Pode deixar tudo ali na pia que daqui a pouco eu começo a preparar...

— Não, eu vou fazer! — ele foi meio autoritário ao falar. — Eu que sugeri isso, nada mais justo. Aliás, você não cozinha tão bem quanto pensa... — ele riu aliviando o clima. E eu quase me levantei pra bater nele, mas resolvi entrar na onda.

— Engraçadinho você, heim. — ele me deu um beijo em cima da cabeça. — Idiota.

— Que você ama. — falou colocando tudo em cima da pia. — Ou vai negar? Viu, Lea, ele não sabe viver sem mim. — só ele chama a minha mãe de Lea, ela gosta de ser tratada como uma amiga intima dele — Estaria comendo comida requentada ou em marmita, se morasse sozinho. — ele riu vindo do outro lado da cozinha, não que ela seja tão grande assim.

— Sim, eu sei. E te agradeço muito por isso, Beto. — ela falou empurrando o pires dela na mesa. Eu não tinha entendido direito, mas pensei que ela falou brincando. — E ele cozinha mau mesmo...?

— Não, — o ouvi dizer assim que me levantei pra pegar os pratinhos e colocar dentro da pia — nem tanto assim, na verdade só um pouquinho. Eu é que gosto de provocar ele, né mor.

— É, Coração. — falei demonstrando estar irritado, mas era mentira. Comecei a lavar os pires e depois guardei a forma de bolo com tudo dentro, incluindo a faca e um pano pra cobri-lo, tudo dentro do forno. — E aí, no que deu lá?

— Tenho que ir, já vi como você está, filho, e agora vou pra casa fazer o meu almoço. — ela já ia se levantando. — Vocês são muito fofos juntos, sabiam. — e olhou diretamente pra mim.

— Não, fica sogrinha. Prova da culinária do teu genro favorito.

— Você é o único, ate onde sei. — rimos com essa afirmação.

— Vai, mãe. Fica...

— Tá, mas só mais um pouquinho. — ela se sentou de novo. Enquanto eu tapava o bolo com um pano de prato e guardava-o no forno desligado. — Hum, está bem. Mas queria saber, como vocês se conheceram?

— Como assim, eu nunca te contei...? — perguntei olhando pra ela sentando-me no lado dela de novo.

— Não, só que foi a irmã do Beto que apresentou vocês...

— Ah, né, mãe. A Silvia, ela...

— Eu não tô perguntando, garoto, como vocês fazem amor, nem quem é o passivo. Não preciso saber esse tipo de coisa.

— Mãe... — fiquei vermelho lembrando que o Beto e eu tínhamos transado no sofá na noite anterior. De repente me veio o chupão que ele deixou no meu pescoço e no fato que eu não tinha feito nada pra esconder. — Bem, não foi numa boate, já começando. — a avisei para que não ficasse desconfortável. Mas comecei a mexer levemente o ombro pra mexer a roupa e tentar encobrir um pouco mais a mancha.

— Tá, então como foi?

— Hã, foi há três anos. Eu estudo com a Silvia, irmã do Beto, no mesmo ano desde o final do fundamental. Mas a gente não ficava na mesma turma, e ela foi a primeira pessoa que eu pensei em contar que sou gay. — comecei finalmente.

Ela ouviu a tudo sem me questionar em nada, só concordando com a cabeça. O Roberto também me ajudou em alguns momentos.

— Tinha já terminado com o Douglas, o cara com quem o papai me pegou beijando quando fiz 15 no meu quarto, e eu estava me sentindo só, carente e precisando conversar com alguém, porque tinha muito medo de contar pra você e para o pai. Ate que tudo aconteceu de repente, e ele já sabia, me pegou e viu o que não devia, descobriu do pior jeito.

“Então, procurei a ela pra eu desabafar. Na época, eu nem sabia que ela tinha um irmão. Não tinha conhecido ninguém da família dela. Quando comecei a frequentar mais a casa dela, ir principalmente sempre que tinha que fazer algum trabalho da escola. E numa tarde, a gente tava de bobeira, conversando sobre talvez eu voltar para o Douglas. Ela dizia que eu deveria esquecer ele, e procurar outro cara, mas eu falava que ainda era apaixonado por ele.

— Quando eu comecei a discutir com a minha mãe, porque eu resolvi sair do armário pra ela. — Beto começou de repente. — A recém tinha feito as malas pra mudar de casa, tinha terminado o primeiro ano do médio e pretendia dividir apartamento com um amigo mais ao sul da cidade... — Beto continuou abrindo as embalagens das coisas. — O meu pai achou estranho eu estar com malas feitas na sala, pronto pra ir embora e nem trabalhava ainda. Então ele se levantou do sofá e veio ate mim, perguntou o motivo de eu estar fazendo aquilo e eu falei...

“Ele só disse que já sabia, que sempre soube que sou gay! Confirmou quando eu falei que tinha pegado HIV, mas não queria dizer como ou de quem. E a minha mãe, enfurecida, disse: ‘Não acredito que ele SÓ AGORA se levantou do sofá, e pra ISSO?!’. Meu pai falou então: ‘Não precisa ir embora não, porque, pelo menos EU te aceito e te amo muito meu filho. Sempre vou amar!’. Mas a minha mãe não queria permitir, fez um escândalo tão alto que a Silvia e o Vitor que estavam no quarto ouviram.

— É, a gente nem tava conversando direito sobre aquilo por causa dos gritos, então, lembro que descemos as escadas apressados, imaginando que alguma coisa tinha acontecido e vimos a confusão já armada. Sobrando ate pra mim!

— Ela disse que a culpa de mim “virar gay” é do Vitor. Por ele ter aparecido lá, agindo tão afeminadamente, de forma tão afetada, com “trejeitos” e tudo, me fazendo querer ser igual... — rimos olhando um para o outro. Porque o Beto também é gay [tanto quanto eu, e qualquer outro cara homossexual], mas é do tipo discreto e não afeminado. — E isso que a gente nem tinha começado a namorar ainda...

— Nem nos conhecíamos direito, eu só tinha visto ele por foto...

— E eu só de vista, quando ele chegava ou quando passava pela cozinha. E mesmo assim, ela quis dizer que tudo era culpa dele, que ele tinha me feito assim, e blá-blá-blá...

— Admito que não esperava por isso, pensei que ela fosse me responsabilizar se a Silvia dissesse que é lésbica. Ao invés, ela me culpou por algo que eu sequer sabia! Nem imaginava como o Beto é ou se ele só queria chamar atenção, se era metido, sei lá...

— A gente nem se conhecia, mas o que ela quis dizer é que, a culpa de um dos filhos dela ser homossexual era de “todo mundo ‘gay’ que aparece na tevê, que anda pela rua, que se ama e é feliz” influenciarem a ele serem assim. Foi isso o que ela quis dizer. Amo a minha mãe, sério, com todo o meu coração, mas às vezes, ela é impossível de se aguentar!

— Verdade, desculpa amor, mas é verdade. — ele fez cara feia pra mim. — Bem, por causa disso, tive que ouvir um monte de coisas por simplesmente ser gay e mesmo assim nem quis me envolver na história. Depois fui embora, porque não queria continuar a receber a culpa de coisas que eu sequer tinha a ver.

— E eu fui para o apartamento desse amigo, fiquei lá por quase um mês. — falou Beto. — O tempo que durou o dinheiro que eu tinha guardado, ate que o meu pai ficou sabendo e pediu para que eu voltasse, e pra agradar a ele eu voltei. Porem, a todo momento a minha mãe falava que, se não existisse gente como a Lady Gaga, a Globo, Vera Verão, ninguém seria gay. E que só Deus, o Senhor e a Igreja poderiam “arrumar” isso...

— Espera aí, mas ela acredita em Deus? — perguntei sério e intrigado, virando-me pra ele na cadeira.

— E não é, não é, desculpa. — ele se enrolou um pouco [ficando tão fofo com carinha de envergonhado] — Porque, Lea, a minha mãe nunca gostou de ir numa missa, culto ou frequentar a Igreja ate pra se confessar, de repente ela se lembra que o cristianismo existe e resolve usar SÓ pra me “curar”?!

— Pois é. — pronunciou-se minha mãe. — Também não entendo isso de algumas pessoas, se dizem ser, como é mesmo...?

— Ateus?

— Isso, ateu, mas quando vê dois gays lembra-se do Senhor pra dizer que é errado; que “o homem foi feito pra mulher” e coisa e tal. — ela disse num tom estranho, tipo, de indignada. — Gente com seletividade religiosa me confunde, me dá raiva porque eu tenho uma religião e não vou lá esfregar na cara de ninguém. E vocês não são um casal que existe pra provocar ninguém, não querem o mau de ninguém. Nem desejariam isso, né.

— Sim, — dissemos ele e eu. — Obrigado, Sogra. — Obrigado mãe.

— Agora, continuem, por favor...

— Tá... han... — falou Beto. — Depois de um tempo, um dia, a minha irmã me viu chorando no quarto, enquanto a nossa mãe brigava com o papai na sala.

“Ela veio ate mim, me abraçou e disse que me amava. E que iria me ajudar com o que quer que fosse. Protegeria-me da mamãe, e foi o que ela fez. — eu não sabia na época, mas ele já não sentia mais raiva ou qualquer sentimento parecido com tristeza ou angustia por sua mãe.

— Foi aí que a Silvia me pediu uma força, ajuda numa coisa. Mas não disse sobre o que era. Ela só falou que tava precisando urgente que eu a auxiliasse numa coisa. Quando cheguei lá no outro dia, ela me contou tudo.

“Explicando-me para o que precisava de mim, porem, não falou o que REALMENTE pretendia. Ela disse que se eu talvez conversasse com o Beto sobre como é difícil no inicio sair do armário e tudo mais, ele poderia pelo menos conseguir alguém pra ouvir ele, alguém que o entendesse, que soubesse pelo que ele passava...

Beto já tava diminuindo o fogo da panela do molho do nhoque pra deixar cozinhar enquanto pegava a outras panelas dentro da geladeira. E continuou fazendo outras coisas, enquanto dava continuidade a sua parte.

— Pois é, eu fiquei meio bravo com a Silvia pelo que ela claramente queria fazer. Sendo que só fazia um mês que eu tinha conhecido outro cara, ficado com ele e ele simplesmente tinha sumido... — dessa parte eu não tinha ficado sabendo, — mas, aceitei conversar com o Vitor. Contei tudo pra ele, ate inventei uma história dizendo que tava ficando com um cara que os meus pais não conheciam, para caso ele desse em cima de mim e eu ainda tivesse chances com o primeiro. Disse também que a minha mãe não me aceitava, que o meu pai me ajuda, mas em algumas vezes ele não conseguia. E essa parte sim não é, e nem era mentira...

— Nem tanto, na verdade, era bem pior mesmo...

— Amor, já disse que não gosto quando cê fala da minha mãe assim...

— Mas é mentira, Beto? Você sabe muito bem que ela nunca gostou da gente como casal, que sempre fala que PREFIRIA te ver casado com uma mulher...

— Sim, sim. E com filho, gato, cachorro, papagaio, periquito e tudo mais...! — ele bufou de olhos fechados. — Eu já sei, tá, de toda essa história. Ficar lembrando que a minha mãe é homofóbica enquanto que eu sou gay, não ajuda em absolutamente nada!

— Desculpa amor. — disse eu quase me levantando.

— É, eu sei... — ele fez menção a eu continuar a história no lugar dele.

— Então. Admito, achei-o um tremendo gato desde quando nos vimos pela primeira vez, mas não tinha intenção nenhuma de dar em cima dele. — dissera eu olhando ele de costas, eu percebi depois que ele me cuidava de soslaio. — Sabia que ele precisava primeiro de tempo para digerir tudo o que tava passando; quando a gente é gay ou coisa parecida, e conta isso para a família mesmo sabendo que podemos não ser aceitos, não é SÓ vocês como pai e mãe que precisam de um tempo pra se “acertarem” com a realidade, que precisam entender o que tá acontecendo, e assim se acostumar com o que possa vir a acontecer...

— É, nós como pessoas, também precisamos entender e dar tempo ao tempo pra sabermos como lidar com o preconceito vindo da parte da própria família, — Beto continuou quase me interrompendo. Ele seguiu cozinhando tudo o que faltava, já dava pra sentir o cheirinho gostoso do nhoque pronto e do molho que ele fez [diga-se de passagem, ele gosta de fazer molho de salsicha com bolas de queijo parmesão – fica UMADELÍCIA!] — e esse preconceito, a homofobia no caso, nem sempre é por causa de maldade...

— É, né, mãe. Tipo, quando a senhora sente medo que eu saia na rua e aja de forma muito espevitada, ou desmunheque “muito” ou rebole na rua, e seja espancado ate a morte.

— Ah, meu filho você sabe muito bem que eu não gosto mesmo, sinto medo que as pessoas te maltratem...!

— Sim, mas eu deixar de fazer tudo isso não vai impedir as pessoas de me baterem, ou de olharem pra mim e me julgarem do mesmo jeito...

— Pois é, Lea, as pessoas julgam! E julgam mesmo sem ter “provas”, julgam mesmo quando tudo não passa de fofoca e mentira. — Beto terminou o prato principal e começou a preparar o complemento enquanto apagava o fogo da panela do nhoque. — Por exemplo, um amigo do curso que não tem namorada por querer focar só nos estudos. Tá dureza passar nas provas pra todo mundo, mas SÓ porque o cara deixa de ir pra festa e ficar dando em cima das garotas, toda a turma acredita que ele seja gay...!

— Nada a ver isso; o que os outros têm a ver com a vida dele...?! — minha mãe tomou a defesa do garoto, que ela nem conhece. Eu disse que ela é um amor.

— Sim, concordo completamente mãe. Mas pensa, quantas vezes você pensou que um garoto, não! Melhor, um HOMEM, TAL-VEZ, fosse gay por não namorar com ninguém? Ou que uma garota poderia gostar de mulher por ela ser “muito” masculina?

Ela ficou pensativa.

— Ah, então sou homofóbica por isso agora...?

— Não, — dissemos Beto e eu juntos. — não, mãe. — Não, Lea.

— Mas, — disse Beto com todo o seu tom compreensivo — lembra, quando uma “pessoa de bem” que gosta de bater em viado pensar esse tipo de coisa de alguém, o que é que vai fazer?

— Sim, entendi agora. — minha mãe falou pensando muitas coisas então. — Está bem, continuem que quero ouvir o resto...

— Pois bem, eu conversei com ele sobre os problemas dele em casa, sobre pais e mães, durante duas semanas, mais ou menos. Aí, ele me disse que já estava super cansado disso, de ter que ouvir coisas horríveis dentro do lugar onde morava! — eu falei e não olhei para o Beto, com medo de que ele reprovasse as minhas palavras de alguma forma. — VÁRIAS, várias vezes ele chorou comigo no quarto enquanto os pais brigavam na sala. Nem sei como ele conseguiu aguentar tanto...!

— Do mesmo jeito que você aguentou a vida toda, Vitor! — disse minha mãe com água nos olhos.

Ela sempre soube o que o meu pai fazia, sempre soube das vezes que apanhei dele por ter afinado muito a voz e quando levei uma bofetada por ter rebolado enquanto andava. E isso que ainda nem falei quando imitei a mamãe sentando e conversando com suas amigas enquanto tomava chá.

— Depois de dois meses servindo como “ombro amigo” e consolo para ouvir todo o sofrimento dele, um dia a gente resolveu sair pra tomar um suco numa lanchonete, e depois fomos para uma praça. — falei, mas sem encarar ninguém. A minha mãe começou a coçar os olhos com as mãos e eu achei isso um pouco constrangedor, ficar encarando. — Porque nessa tarde, os pais dele tinham começado a brigar, gritando tanto que nós pensamos que iriam se matar ou acabar quebrando alguma coisa na sala.

— Lembro que fazia muito frio, e eu tinha saído sem um casaco, então pedi pra ele deixar eu me esquentar nele. Estávamos numa praça que não ficava muito longe da casa dos meus pais, e lá ele disse que queria fazer uma coisa, mas que tava com medo de que não pudesse. Então, eu perguntei o que era. Mas ele não quis me responder, e eu só disse: “faz então, mesmo que pareça errado...”

— Eu nem deixei ele terminar e roubei um beijo dele. O Beto só riu dizendo que já sabia o que era, e por isso que me incentivou a fazer...! E em poucos dias, eu já sabia que tava começando a me apaixonar por ele. Mas ainda não tínhamos dado o segundo beijo, pelo menos não um que fosse valer à pena se lembrar.

— Essa parte foi culpa minha, assumo, porque todo tempo que a gente conversava era só sobre mim e os meus problemas. Não sabia se ele era do tipo que procurava namoro, ou que só queria diversão. Mesmo que fosse uma ótima pessoa, ainda tinha essa possibilidade... — ele e a minha mãe sorriram se encarando. — Ainda bem que eu tava errado...!

— É... — a minha mãe riu me olhando.

— E eu também nem tinha cabeça pra lembrar de namorar. Já tinha perdido completamente as esperanças de conseguir me envolver de novo com alguém, quando o beijo aconteceu. — Beto voltou-se para a mesa com panelas em cada mão enquanto eu mexia nos apoios pra por elas em cima e não derreter a toalha nem queimar a madeira. — E um dia, ele tinha me convidado para ir à casa dele, quero dizer, na sua casa, Lea. Ele não tinha me explicado direitinho os motivos, mas praticamente exigiu que eu fosse com ele ate em casa...

— Eu queria me declarar pra ele, e não queria correr o risco de levar um toco dele na frente de desconhecidos, se a gente fosse pra uma praça de novo. E também não queria que a briga dos pais dele atrapalhasse a nossa conversa...

— Hum, sim, acho que compreendi... — minha mãe se pronunciou nos lançando um olhar de malicia e ao mesmo tempo vergonha. — Nada melhor do que outro lugar...

— Isso! Então, me confessei. Expliquei o que sentia naquela época, deixando bem claro que queria namorar com ele e tudo o que teria direito. Mas só se ele me deixasse...

—... “Mas só se deixar eu fazer você feliz...!”, foram estas as palavras dele! Lembro muito bem como se fosse hoje... — Beto me encarou com carinho e cumplicidade. Nós demos um beijo, cálido e cheio de amor. Não me importei muito com a opinião da minha mãe nesse momento. Ela adorou, na verdade, disse que achou tudo muito fofo!

— Então, ele me deu um beijo, dessa vez tomando a atitude, e falando que também sentia o mesmo... — falei eu ajudando ele a terminar de por a mesa. — E, me pediu em namoro ali mesmo. Disse que queria fazer tudo direito, por isso que a gente não tinha passado a noite junto ainda...

— Sou romântico a moda antiga, fazer o que...

— Pois é, né... — falei sendo sarcástico. Na época, o que eu mais queria era fazer amor com ele pela primeira vez, e depois dar feito uma puta louca com fogo no útero! Mas não iria contar esse tipo de coisa pra minha mãe, óbvio. — E a gente ficou só namorando, se beijando mesmo, durante um mês ou dois. E nunca rolava sexo ou coisa parecida... Mas desde o inicio já sabia que ele seria meu marido!

O Roberto fez uma careta envergonhada, vermelha, que deixou ele ainda mais fofo.

— Quando a gente resolveu contar pra todo mundo da nossa relação! — falou o Beto primeiro. — A começar pela Silvia, que foi quem nos uniu, né... — disse eu em seguida. — Senão, ela era bem capaz de nos matar, — ele fez graça — Ah é, de hemorragia externa e fratura exposta. — eu continuei com a piada. — Ela ficou super feliz! — meu namorado explicou. — Principalmente porque o plano dela deu certo, com quase seis meses de atraso, mas deu... — terminei e nós todos rimos.

E a gente já tinha colocado três pratos, três pares de talheres [com facas e garfos] e três copos à mesa.

— Pronto! — Beto e eu dissemos referenciando-nos sobre a mesa posta. — Quer que eu te sirva sogra?

— Ah, não, não... — ela falou se levantando apressadamente. — Podem ficar com o bolo, fiz no fogão de vocês... — e soltou uma risadinha, típica dela. — E vocês vão ter de me desculpar, mas o meu feijão tá no fogo, deve estar quase queimando agora...

— Né... — falei eu. E pensei em rir junto dela, mas então lembrei que esse é o tipo de coisa que gente mais velha fala quando quer ir embora de um lugar e não sabe qual desculpa dar. — Mesmo assim, mãe, a senhora sabe que pode vir a qualquer momento almoçar e jantar com a gente, né...

— Sim, é claro, Vitor. — ela me deu um abraço e pediu para o Roberto levá-la ate o portão. — Ate qualquer outra hora, meu filho. — ela me deu um beijo na bochecha e saiu pela porta, seguida do Roberto.

***

Como devem ter visto, ainda existe muita dor; muito sofrimento ressentido e incrustado na nossa história! Ela com o marido machista, idiota, abusivo e falecido, e eu, com o pai homofóbico, egocêntrico, sem noção e antiquado. Ele destruiu a nossa família antes mesmo de mim me assumir gay, e nunca deixou de dizer que EU era quem estava acabando com tudo, por ser homossexual!

Mas naquele momento eu não queria ter de lembrar-se disso. Não queria pensar nos problemas que tinha deixado na casa dos meus pais. Queria só almoçar com o meu namorado-traço-marido e me importar com o motivo de ele ter demorado a voltar...

— Então, como ficou esse nhoque? — perguntei ao vê-lo entrar de volta. — Parece estar uma delícia...!

— Uhum... — ele respondeu sentando-se ao meu lado.

E nós começamos a conversar sobre amenidades do dia a dia, ate entrar no assunto “planos para o futuro”. Ele me lembrou que ainda estava esperando que eu fizesse O pedido...

— Então, né, vamos mudar esse assunto. — ele riu do meu constrangimento. Fiquei mais vermelho. — Como foi lá no teu serviço? O que aconteceu...?

— Nada demais... — ele tentou fazer graça, mas não conseguiu. — Uhm... Um cliente perdeu algumas caixas de encomendas, e pensou que tinha sido o escritório que não havia enviado. Aí, me chamaram lá pra saber o que tinha acontecido, porque fui eu quem tinha sido encarregado de levar as encomenda, né...

— Sim...

— Quando alguém reconheceu a culpa, afirmando que tinha danificado o conteúdo de algumas caixas e tinha tentado repor, mas não conseguiu então quis encobrir pondo todas as encomendas fora... Não preciso continuar pra dizer que a tal pessoa foi demitida, e o meu chefe me pediu desculpas e ainda me ofereceu um aumento e dois dias de folga pelo incomodo.

— Hum, que bom, amor. — falei com a mão na perna dele e lhe dando um beijo com gosto de batata e salsicha com queijo parmesão derretido. — E por que você demorou tanto lá?

— Ora, porque foi uma briga, o cliente estava muito furioso! Gritava com todo mundo, discutiu comigo por causa do meu trabalho, dizendo que eu deveria ter mais maturidade e hombridade de assumir os meus erros... Quase saí de lá com os nervos passando dos limites.

— Sim, e como foi que o Seu Fernando reagiu a tudo isso...? — lembrei do patrão dele, Seu Nando é muito legal. Super fã da nossa relação, quase sempre sugere que o Beto faça alguma coisa quando brigamos. — Imagino o que ele tenha feito...

— É, ele foi muito calmo. Pedia a todo o momento que o cliente mantivesse a calma e que não gritasse tanto. Não sei como ele conseguia ficar assim naquela situação...

— Cada um com os seus, né, amor. — falei tomando um gole de água, pois ninguém tinha feito o suco. [Assumo a culpa!] — Cada pessoa reage a formas diferentes a cada tipo de situação...

— Sim, mas esse cliente foi totalmente histérico com nós, gritou, xingou, disse o escambau do escritório e quase nos humilhou lá dentro mesmo...

— Nossa! — falei meio assustado.

Ao mesmo tempo em que também ficava com raiva, porque não gosto de gente como esse cara, acha que pode mandar do jeito que quiser em todo mundo e ainda xingar, perder a cabeça e quase humilhar as pessoas. E ainda tratou mal o meu namorado, não gosto de briga, mas quem se mete com alguém que eu amo não sabe do que eu sou capaz!

— Mas ele não quis machucar vocês, né?

— Claro que não, a gente nem teria deixado...

— Sim...

Após essa conversa tensa, o almoço seguiu quase silencioso. Ate eu lembrar que Déreck me beijou sentado ali, naquela mesma cadeira mais cedo.

— Amor, nem lembrei antes de perguntar. Como foi a aula com aquele professor...?

— Hum... — quase engasguei com a comida na boca. — Quem?? — perguntei alarmado. — Quando?

— Ah, hoje, né... — ele riu da minha expressão. — Você disse ontem que ele vinha aqui, lembra...?

— Ah, sim, sim... — tomei um gole de água pra engolir a comida. — Veio aqui sim, me ensinou um pouco sobre álgebra, geometria, um basicão de matemática, sabe...

— Sim, eu sempre fui bom em matemática, lembra. Adoro aquilo tudo de ângulo obtuso, polinômios, área e volume...

Ri, porque tinha esquecido completamente disso. Ele só não quis me dar aula porque é PÉSSIMO professor, apesar de me ajudar bastante nos trabalhos.

— Ai, amor, nem lembrava mais disso... — ri mais e o momento passou, o almoço todo foi lindo só por causa disso [alem do fato do meu namorido ser o melhor, né gente!] — hum, que tal a gente assistir um filme depois?

— Boa! — ele ficou super feliz, tanto quanto uma criança. — Vamo ficar agarradinho... — ele me deu um beijinho na bochecha enquanto passava a mão no meu peito por cima da camisa. — coladinho, bem desse jeito, né... — descendo ele parou a boca no meu pescoço e a mão sobre o meu pau. — Vou adorar ver um romance e te chupar enquanto as cenas passam... — ele falou isso bem pertinho do meu ouvido e isso me deu um arrepio que ate o meu pau subiu! — Aí, óh só! Ele também gostou da idéia...

— Não, não... — falei tentando recuperar o fôlego. — Tava pensando em ir pro cinema...

— E eu em cama, filminho no DVD e você gozando na minha boca! — então ele apertou o meu pau e quase me entreguei a ele. — Vai me dizer que prefere ir pra um lugar público, quando a gente tem a nossa casa, heim...?

— Não, mas... — ele me deu outro beijo no pescoço, bem em cima do pomo de adão, e esse sim foi covardia [porque é um dos lugares onde tenho muita sensibilidade]. — Mas, Beto, queria sair da rotina um pouco de cama, filme, sexo, cama, sexo, filme, sexo, cama, filme...

— Amor, eu to muito cansado. Passei muito tempo de pé lá na empresa do cliente gritão ouvindo tanta coisa que só quero agora ficar aqui com o meu namorado, vai...

— Ta bem, mas só dessa vez.

— Na semana que vem a gente vai, tudo bem?

— Sim, mas só porque você é gato e gostoso. — falei cruzando os braços e fazendo cara de sério. Ele começou a beijar o meu pescoço, apertar o meu pau e alisar o meu peito por baixo da camisa. — e também é meu namorado, lindo, safado...

— Gato, é...? Sou lindo? — ele me provocou.

Obviamente terminamos a tarde na cama, comigo sentado no colo dele! Mas foi ele o passivo dessa vez; e antes de transarmos, eu tive que lavar a louça se eu quisesse sexo. Logo depois, fomos para cama e vimos o tal filme, As Desventuras do Amor. Um filme francês sobre um cara que nunca aceitou o amor na vida dele ate conhecer Corina, uma moça estudante de uma cidade de Camarões, na África. O filme seria lindo senão fosse tão meloso e melodramático.

Depois disso, o domingo passou rápido, mas sem nada demais. A semana seguinte chegou e eu já tinha esquecido o ocorrido na cozinha da minha casa. Déreck me evitou a todo o momento e eu tentava procurar alguém diferente para me dar aula, mas todo mundo estava mais preocupado com as provas de final de ano e em passar de ano. Eu também, por isso queria pedir ajuda em matemática...

— Vai, miga, preciso muito da sua ajuda... — pedi de novo para Silvia. Diferentemente do irmão, ela não gosta de matemática, mas pior do que eu, por nunca ter conseguido tirar uma nota em toda vida. Se passava, era sempre com a média e fazendo o provão no fim do ano. — Por favor, por favor...

— Tô vendo que você tá desesperado mesmo, heim... — ela riu. — Pra vir me pedir ajuda...

Ela tinha 17 também, sendo só alguns meses mais nova que eu. Com pele num tom de café moído e olhos cor de avelã, cabelos sempre alisados e de um preto brilhoso com um tererê colorido de cabelo com um pequeno apanhador de sonhos na ponta, no meio das mexas. Ela gosta de usar shortinho com camiseta ou regata folgada, mas na escola ela estava usando calça de brim justa com tênis velho e uma camiseta sem mangas e sem estampa. Minha amiga não usa muita maquiagem, só o básico e nem sempre passa muita coisa no cabelo, só um pente pra desenredar de manhã cedo e o tererê.

— Tá, mas só se me contar o porquê não continua tendo aula com o Déreck...!

— Não viu, ele passou a semana toda me evitando. Não sei o que aconteceu...

— Vih, me engana que eu gosto! Sei que tais mentindo...

— Não, Silvia, sério...

— Viu, quando você fala a palavra “sério” e depois começa a coçar a sobrancelha, como tá fazendo agora...!

Essa ela me pegou!

— Tudo bem, eu não vou mentir. Mas só peço que acredite em mim, por favor, não posso mais ter aula com ele de qualquer forma. E se eu não tiver ajuda em matemática, vou acabar rodando de ano...

— Verdade, vou tentar aceitar isso. Porem, também sou péssima nessa porcaria de matéria, mas, criei um grupo de estudo com outras pessoas. E acho que a gente pode deixar você entrar...

— Obrigado, obrigado, obrigado... — pulei no pescoço dela a abraçando forte e agradecendo ainda. — Muito obrigado de novo, Sil.

— Não me chama assim, que apelido horrível...

— Aih, tá legal! — saí de cima dela sorridente.

— Só faz o meu irmão feliz, só isso o que te peço, heim, Vitor!

— Está bem, vou sim, madame.

Então, estava tudo combinado, eu passaria na rua da Silvia as 3 da tarde para ir com ela ate a casa da amiga dela que iria ajudar a estudar para as provas. E tudo ocorreu lindamente! Barbara, amiga da Silvia, com palhaçadas risadas e muita descontração. E eu nem me lembrava mais dos meus problemas de casa, da vida. Já imaginando no final do ano poder me formar no ensino médio.

E assim se passaram as próximas duas semanas – ate esqueci de ir ao cinema, e o Beto também. Semanas essas quais em casa também foram as mais tediosas, porque logo depois que a folga que o Beto havia ganhado terminaram, o Seu Nando passou mais coisas para ele fazer; as provas no IF aumentaram cobrando tanto tempo dele, que quando ele chegava em casa, senão era para estudar mais, era para que ele só dormisse. Nós não transamos por quase cinco meses nessa função. E não saiamos, porque ele também não conseguia disponibilidade tampouco vontade. Então fiquei na seca mesmo...

Porem, o pior só veio no final das duas semanas de estudo na casa da Barbara, quando chegando à escola, vi que havia chegado bem cedo e apenas poucas pessoas já haviam chegado lá também. Então, assim que entrei na minha sala, larguei tudo. Deixei as minhas coisas na sala e fui ao bebedouro tomar água, porque o percurso que fazia de ônibus ate a escola era muito exaustivo e me desidratava rápido por isso. E logo ao lado do local do bebedouro, fica um banheiro masculino e lá estava Déreck saindo ainda secando as mãos, e o meu único pensamento naquele momento foi: “pelo menos ele lava as mãos...”

Ele usava suas calças jeans, que pareciam mais velhas e gastas que o normal e uma camisa preta do Batman com tênis All Star e o cabelo curto como sempre. Assim que saiu, ele me olhou encarando sério. E falou:

— A gente precisa conversar...

— É, acho que sim...

De repente, duas garotas passaram por nós e vão para o banheiro feminino. E um professor se debruça sobre o bebedouro.

— Acho melhor a gente ir para o banheiro. — falou ele e eu não interpretei de forma maliciosa.

— Sim, talvez seja mesmo.

Assim que entramos, ficou um silencio insuportável que só foi quebrado quando um garoto de talvez 14 ou 15 anos, ou menos, saiu de um dos privados puxando a descarga e foi embora pela porta como se sequer estivéssemos ali.

— Ah, aqui tá R$ 120 por ter me dado aula 3 horas. — peguei o dinheiro que tinha deixado guardado no bolso da calça a tanto tempo pensando em pagá-lo. Assim que lhe entreguei, ele só disse um “obrigado”. — Bem, se você não tem mais nada a dizer...

Ele nem me deixou terminar e já foi falando.

— Eu não sei o que aconteceu lá na sua casa, eu não gosto de homem! — ele falou e pareceu querer convencer mais a si mesmo do que a mim, mas eu já havia visto isso antes. O momento da negação! E quanto mais ele sacudia os braços falando quais garotas já tinha “pegado”, ate transado e desejava, eu confirmava as minhas suspeitas que ele era enrustido. E talvez aquilo tudo não passasse de mentira que ele contava para enganar os outros, e talvez ate mesmo tentasse cumprir isso. Entretanto, quem já passou por algo assim sabe, que mesmo tentando, não se pode fugir do próprio destino – sentir vontade de beijar uma pessoa! [Ou não sentir...] — Foi tudo uma brincadeira...

— Tá, vou fingir que acredito, enquanto você finge que é verdade... — e já ia saindo quando ele atravessou a minha frente e parou na porta me encarando, só que de muito perto. — Me deixa sair por favor...

— Não.

— Prometo que não vou...

— Só queria saber se gostou?

— Do que?

— Do beijo...

— Sou comprometido, besta.

— E daí?!

— E daí que... — me perdi em palavras quando olhei pra boca dele. Era vermelha feito um morango, cheia como uma bola e tão linda que quase me inclinei pra tocar. — que...

— Quer repetir pra ter certeza que não gostou mesmo? — ele perguntou sem nem ao menos se importar de se lembrar que o beijo só saiu da parte dele e inclusive foi de surpresa e rápido.

Seu hálito era quente e tinha gosto de menta, atraindo a minha atenção. E eu só queria lembrar que já tinha namorado. Mesmo assim, me esqueci de tudo! Da aula, da escola, de onde estávamos e ate do Beto... Então me inclinei para frente e lhe dei um beijo nele. Que começou meio duvidoso, querendo e não querendo ao mesmo tempo. Ate que se entregou e me puxou pra ele.

Ele foi bruto ao me pegar pela cintura com força e me prensar na parede ao lado da porta. Ele não parou em nenhum momento pra olhar pra mim ou para ver se estavam vindo ou se tinha alguém nos cuidando. Seus lábios nos meus eram macios e ao mesmo tempo saborosos.

Quando fui eu quem parou desta vez, sentindo o peso da culpa.

— Desculpa, mas isso é muito errado... — falei e saí correndo indo para a sala.

Talvez eu devesse ter dito algo mais, já que ele não fez tudo sozinho. O beijo foi bom, mas eu gostaria de poder dizer que o do Beto é muito melhor e que só seria o ultimo. Mas não posso...

A aula começou e tudo não pareceu ter mudado. Eu tinha completa convicção que ainda amava o Beto, que o desejo e o quero completamente. Mas só a lembrança do que fiz com o Déreck no banheiro me causa um remorso enorme ao mesmo tempo em que me excitava, não sei explicar.

Após dois dias, o final de semana, Déreck voltou a me procurar, querendo pedir desculpas novamente. Porem, desta vez não rolou beijo nenhum, nem mão boba ou sexo. Só saímos dali e cada um foi para sua classe. Em casa, tudo estava o mesmo: Beto continuava muito atribulado, cheio de trabalho e estudo do curso e zero tempo pra nós ou atenção. Nessa noite inclusive, antes dele sair, meio que eu forcei o sexo com ele, só para provar a mim mesmo que não desejava nada com o Déreck. Pois não poderia me apaixonar por outro cara quando já tenho um namorado...

Em três dias, nada aconteceu. Via o Déreck pelos corredores às vezes, mas não sempre. E num dia o vi se agarrando perto dos banheiros com uma garota bem mais nova, quase colocando as mãos dentro da roupa dela. Não senti absolutamente nada sobre isso!

Quando voltando para casa, perdi o ônibus e tive de ir a pé. E numa parte perto da escola há um matagal de uma obra parada há quase dez anos [ate onde sei...], e passando por lá apenas senti um par de braços me puxando pra traz e me soltando.

— Que isso? Moleque, você... — eu disse antes de ver quem era.

— Oi, queria te pedir uma coisa de novo de você? — Déreck falou me encarando de cima a baixo.

— Não, a resposta é não.

— Tudo bem, mas você é quem sabe... — assim que ele parou de falar, o beijei ali mesmo puxando ele pra mim.

É inacreditável, mas os desejos que ele estava despertando em mim, toda a luxuria, todo o fogo, a chama era como se ateassem uma tocha nos meus pés que queimava ate a ponta da cabeça. E o meu pau pulsava dentro da cueca de uma forma louca, querendo que eu tocasse no corpo do Déreck.

— Você tem camisinha? — perguntei, não sabendo o que é que estava dando em mim.

— Sabia que ia precisar...

Agachei-me puxando a calça dele e fiz um boquete pra ele, dando o meu melhor. Sem demora, ele simplesmente me levantou, pegou a camisinha do pacote, revestiu o pau, baixou um pouco as minhas calças e meteu em mim devagarzinho ate que entrou tudo e então ele começou a bombar rápido. Com força, sem me tocar muito, em cinco minutos ele só gozou. Então, tirou o preservativo do próprio pênis, enrolou e jogou longe no meio do mato.

— Hã, não fala pra ninguém, tá... — disse ele levantando as calças.

— Claro que não, né, idiota. Eu tenho namorado dã! — levantei as minhas calças também e já ia embora, quando ele me chamou de volta. — O que foi? Você não teve tudo o que queria? — fui ríspido.

— Não. — então me puxou de novo e me deu um beijo molhado, bruto e sem sentimentos. — Agora sim.

Eu sabia exatamente onde estava me metendo. Mas, aparentemente, eu não conseguia encontrar uma saída... Pelo menos, não uma em que eu me livrava do Déreck e do desejo que sentia por ele. Podendo assim continuar como era antes a minha vida!

Desculpem o atraso, mas agora que as minhas aulas voltaram gente, temo que só possa voltar a postar normalmente muito pra frente de novo... :P

Queria agradecer sempre por pela atenção e carinho de quem lê. Sério, muito obrigado. <3

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Comentários

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agradeço imensamente por tudo, StayRayy!

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Essa história contém muita dor, a realidade crua do que acontece em certas família, esse preconceito imenso... Me doeu mais foi a parte que o irmão não deixa o Vítor ver o sobrinho... ,😞

O conto é bom, de verdade, cheio de detalhes, se eu fosse você chamaria mesmo é de livro . Perfeito ! Sobre a traição, é uma questão que pode render muita discussão, não sou a favor, mas sou capaz de entender o Vítor e to adorando, quero mais !

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bah, eu também não aceitaria traição... perdoar, eu perdoo, mas voltar a namorar quem me traiu, JAMAIS! :P

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nossa! verdade, o traidor na situação é sempre pior do que quem ajudou... nisso eu concordo contigo, VALTERSÓ... muito obrigado pela leitura.

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NOSSA. LAMENTÁVEL. VC TRAIU O BETO. NÃO PERDOO TRAIÇÕES NEM APÓS A MORTE. VC VAI LEVAR ESSA CULPA PRO RESTO DE SUA VIDA. SE AS COISAS NÃO ESTÃO BOAS O DIÁLOGO É SEMPRE A MELHOR SOLUÇÃO, NUNCA A TRAIÇÃO. LAMENTÁVEL, MIL VEZES LAMENTÁVEL DERICK É MUITO SAFADO, MAS COM CERTEZA VC É MIL VEZES PIOR QUE ELE.

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