O Vício - Obsessão

Um conto erótico de Matheus Azevedo
Categoria: Homossexual
Contém 1260 palavras
Data: 25/06/2017 18:20:42
Assuntos: Gay, Homossexual

Jogue o seu coração a sua frente.

E saia correndo para pegá-lo.

Sou um homem nas garras de uma obsessão. Fico sentado aqui ao lado do telefone (que pode, de fato, está enguiçado), e espero o telefonema dele. Fico esperando ouvir o som da sua motocicleta espalhando o cascalho na entrada de automóveis encurvada. Fico imaginando seu corpo, sua boca zombeteira na minha, seu pau encurvado, e sou uma ruina de desejo e da luta contra o desejo. Não sei qual é o pior... o desejo ou o antidesejo. Ambos me desgraçam, ambos me queimam e me reduzem a cinzas. Os nazistas não podiam ter inventado um crematório mais ardiloso. Esse é o meu auto de fé, minha obsessão, meu vício.

Os amigos me procuram e insistem comigo para desistir dele, me enchem de motivos, e concordo com todos eles. De nada adianta. O que sinto é algo que não reage à razão. Mais antigo do que Pã e os deuses e deusas à espreita nas sombras atrás dele, esta ardência que sinto é, na verdade, a força primordial do universo. Quem pode explicar que optei por liga-la a um menino homem louro que derrama suas mentiras em meu ouvido assim como derrama seu sêmen naquele outro lugar? Quem acreditaria na dependência, na obsessão, na degradação ou no amor? Só quem já sentiu o seu fogo. Só quem também foi queimado naquele fogo e cuja pele rachou como a pele dos mártires medievais.

Porém a maioria das pessoas não tem o luxo de sentir esse fogo. Nem, na verdade, tenho eu. Na minha vida desperta sou um homem bem-sucedido (será que importa no momento o que faço?), conhecido como durão e esperto, um leitor de contratos de olhos de águia, um bom negociador. Tudo o que conheço da vida da outra esfera não me adianta absolutamente aqui. Pode-se até dizer que me deixa mais vulnerável. Pois quanto mais duro sou no escritório do advogado, mais desejo ser terno aqui onda a ideia do seu pau me reduz a cinzas.

Deixe que eu lhe fale do seu pau. É feito garra, é demoníaco, um verdadeiro forcado. Tem uma curva onde deveria ser reto e, em repouso, pende para um lado, o esquerdo. A sua visão política, se ele tivesse alguma, seria o oposto. Pois ele é o fascista, a bota na cara, o bruto. Todos os homens que se vale a pena ter na cama são parcialmente feras. Todo mito que conhecemos nos fala disso: Pã, com suas pernas animais e boca humana, a fera pela qual a Bela abandonou o seu pai, o próprio diabo, com as bruxas alucinadas (as bacantes de Salem) cabriolando ao redor do seu ânus pregueado. E beijando-o. Parte da atração é a degradação, o fato de que somos criaturas nascidas entre o mijo e a merda, e nos nossos momentos mais sombrios recordamos obsessivamente esse dilema.

Se vinte homens fossem enfileirados diante de mim com ereções plenas e a cabeça e o tórax envoltos em saco, eu poderia identificar o meu amor (posso chamá-lo assim?), pela curva de seu pau. Inflamado e vermelho em ereção, circuncidado (não por causa de sua religião, mas por um capricho de sua mãe), curvando-se como um bumerangue que volta sempre ao seu dono, será belo apenas porque me deixa? Será apenas porque posso possuí-lo por breves interlúdios que ele me fascina tanto? Eu o amaria menos se estivesse ao meu dispor o tempo todo?

Não corro esse perigo. Pois eu amo um corredor. Mal ele me chama de seu bruxo, seu bacante, seu cavalheiro, seu amor, e já tem de fugir.

Ah, creio que existe um pouco disso em todos nós homens... seja lá como o expressemos. A vontade de voltar ao ventre, de ser engolido, de ficar lá totalmente passivo entre os braços do/a amante é tão forte que mal nós nos sentimos cedendo ao poder primordial, temos que correr. Daí a batalha dos relacionamentos: um quer o outro seguro entre as suas pernas para sempre, e o outro, com medo de querer ficar ali, foge.

Para onde foge é imaterial. A guerra. O escritório. O futebol. O bar. A televisão. O espaço sideral. A Fórmula 1. A academia. Las Vegas. Outra mulher. Outro homem. É tudo a mesma fuga.

O homem que eu amo construiu um museu ao machismo na minha garagem. Serra mecânica. Saco de couro para treinamento de pugilistas. Motocicleta. Halteres. Eu o amo em parte porque não consigo domar a criatura selvagem que mora dentro dele. Pois este é outro paradoxo do sexo: aquilo que amamos no outro procuramos matar.

Meu amor é um vigarista, um cavador, um vaqueiro, um paquerador, um viciado, um artista, um dançarino exótico, um almofadinha. Não tem endereço fixo. Às vezes dá um número de telefone fixo, às vezes um número de celular, às vezes um número que ninguém atende, às vezes um endereço que acabou de inventar. Certa vez ouvi-o dizer à mãe que podia ligar para ele em Paris, no Hotel Charles de Gaulle.

- Mas você sabe que não existe Hotel Charles de Gaulle – falei – É um aeroporto. Como pode fazer isso com a sua mãe?

- Se você conhecesse a minha mãe como eu, saberia que foi em defesa própria. Não tive escolha.

Se você conhecesse a minha mãe como eu e defesa própria. Estas são as palavras operantes. Pois ele tem certeza (como só pode ter certeza um garotinho bem pequeno) de que, onde quer que estejamos no mundo, quando começarmos a foder loucamente, a mãe dele nos encontrará e atravessará a parede de nosso quarto como uma vampira num filme dos anos 70. Portanto, sei que é da mãe que ele foge quando ele foge de mim... meu vagabundo, meu feiticeiro, meu tesão, meu vigarista, meu cavador, meu amor mentiroso. No entanto, sei também que quando ele volta é leal, fiel, correto, direito e verdadeiro como aquele pequeno escoteiro que também mora dentro dele. Daria a vida por mim. Andaria sobre o fogo e nadaria no gelo. Abriria caminho na selva com as mãos nuas, morderia fora a cabeça de cobras venenosas, arrancaria o couro de tatus e porcos espinhos. Em resumo, ele é meu homem, e sou viciado no néctar que ele prepara nos seus colhões.

Já que ele não pode ser bom, seria mais fácil se fosse inteiramente mau, para que, pelo menos, eu o pudesse odiar. Porém como posso odiá-lo quando é a maldade nele que o torna tão bom onde conta... na cama?

Ele é tão bonito. Seu cabelo brilha ao sol. Eu queria nunca ter partido, nunca ter o deixado. Ainda queria estar ao lado dele. Às vezes, acredito que tenha sido eu, e não ele, que o tenha abandonado. Ainda me lembro do nosso último encontro. O vento entrelaçando os nossos cabelos enquanto nos abraçávamos pela última vez.

Não me recordo bem do que dissemos. Até parecia que nossas palavras foram levadas pelo vento e nunca mais fizeram sentido. Novamente eu queria nunca ter partido. O rosto dele ainda brilha na minha mente. Ainda conservo o seu olhar, o nosso último olhar antes de nosso adeus.

Para mim, ele brilha como o sol. Para mim, ele é o único. O sol se põe e se vai, mas a beleza do brilho do sol permanece na memória daqueles que sentiram o seu calor, mesmo durante o ocaso da noite. Eu queria que os raios dele continuassem brilhando sobre mim, continuassem preenchendo a minha vida com a sua beleza. Eu queria nunca ter partido.

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