PRIMVS

Um conto erótico de Rafael
Categoria: Homossexual
Contém 2351 palavras
Data: 06/01/2013 21:22:33
Assuntos: Gay, Homossexual

"... Eu hoje acordei tão só

Mais só do que eu merecia

Eu acho que será para sempre

Mas sempre não é todo dia."

Oswaldo Montenegro.

Cogito, ergo sum

Sabe aquele momento em que há a necessidade de parar e rever boa parte da sua vida? Pois então, cá estou. Chamo-me Rafael, bom dia/tarde/noite e afins a todos. 1,79 m, branco, mas não muito. Cabelos curtos. Uma pessoa extremamente normal. Rosto normal, cabelo normal, altura normal, cor normal, físico normal. Nada de estranho ou extraordinário. Sou simplesmente normal, pacato, em um mundo normal, pacato. Ao menos era, até que minha vida desse uma reviravolta e o destino resolvesse se vingar de toda a minha normalidade. Sou estudioso, gosto muito de música, preferência? Erudita. Gosto também de MPB, Jazz, eletrônica, adoro dança, amo água. Estar dentro dela me faz bem, renova-me o espírito. Explosivo? Nem um pouco. Sou tranquilo até demais. Sou apaixonado por línguas, dentre elas, o Latim. Por isso o título, primus, primeiro, e assim será sucedido: secundus, tertius, quartus, e assim vai. Não me perguntem o motivo, simplesmente gosto, e, para mim, basta. Ah, quase esqueço, sou apaixonado pelo Oswaldo Montenegro. Chega de mim por enquanto, comecei a falar da tal reviravolta, agora termino.

Em minha cama, escrevo aqui, pensando em tudo que me foi reservado e agora transmito. Não me arrependo de nada, embora se soubesse de tudo, teria feito coisas de outro modo.

Principiarei, logicamente, do princípio. Não desde que nasci, detalhe demais. Mais uma coisa, sou extremamente detalhista. Enfim, desde que a perturbação do meu espírito começou. A mudança. A mudança... Coisa horrível é sair de onde tu nasceste e ir a outro lugar, outro mundo. Ao menos costuma ser. Eu, que nunca tive muitos motivos para idolatrar minha cidade natal, tanto fez. O problema é a adaptação, nunca fui de difícil convivência, mas nunca passei a imagem do estereótipo masculino, nunca fui um tipo biltre, jamais briguei com alguém, sou movido a palavras, e sei usá-las muito bem.

Cidade grande, capital, caos urbano. O ambiente campestre de onde morava me fazia bem. Agora, me restam as fumaças dos automóveis. A troca foi um melhor salário, já que meu pai ingressou num cargo federal. Como era de se esperar, escola nova. Fiquei impressionado com o tamanho. Típico colégio particular. Uma estrutura grande, um imenso portal detalhado em mármore dava acesso a um pátio externo, bastante autorizado e com alguns bancos de ferro com uma aparência arcaica. Era um colégio antigo, elitista e fundamentado no catolicismo. Bastante tradicional e com um número grande de alunos, mas nada exagerado. Após entrar no prédio, um extenso e largo corredor dava acesso às mais diversas estruturas do estabelecimento: almoxarifados, secretarias, enfermarias e diretorias. Tudo era de um tom claro, seja azul, verde ou branco, dando um ar infantil ao local. Depois de um bom espaço percorrido, o corredor acabava de repente e dava acesso a outro pátio. A cantina estava a um canto mais ao fundo, ao lado da quadra poliesportiva. Duas, na verdade, uma coberta e outra não, com um pequeno corredor atrás da quadra coberta. Imaginei os causos que ali se deram entre alunos um pouco mais despudorados. Pelas laterais do corredor encontravam-se duas rampas, que se encontravam mais acima e que acabariam em outro corredor com as salas de aula, dispostas em mais dois andares. No terceiro andar, uma espécie de ponte contava dois prédios. Um, o principal, com as salas, descrito agora há pouco. O outro prédio possuía um complexo destinado às aulas de línguas e também os laboratórios. Mais abaixo, uma extensa biblioteca com um incrível acervo e, mais abaixo ainda, no térreo, havia uma piscina, um campo, uma academia e outras estruturas esportivas.

Havia chegado muito cedo, então deu tempo de explorar tudo. Tocou um sinal bem sonoro, até um pouco demais, eu penso. Dirigi-me até a minha sala, já me informara sobre onde estudaria. Sentei-me e aguardei o professor. Nesse meio tempo, um ser me chamou a atenção, clissificá-lo-hei não como aqueles seres mitológicos, dispenso as quimeras que recheiam às mentes de outros escritores, em que todos são louros ou morenos divinais, de olhos de cores exóticas ou o que quer que seja. Entrou na sala um tipo chamado Luiz Octávio, como vim a saber depois, com um boné de lado. Feições um pouco rudes, o uniforme um pouco justo, o que me fez pensar que praticava algum exercício físico. Mas o que me despertou curiosidade nele foi de fato o olhar. Não os olhos, mas o olhar. Algo tão extremamente vago que me cativou. A meu ver, não passava nada por aquela cabeça, que aparentava ser bem oca. Ah, doce engano... Não era feio, nem magnífico. Bonito aos meus olhos, era bom perder a vista e esquecer o olhar nele. Sou hétero, sempre fui e pretendo ser sempre, mas sou capaz de reconhecer um homem bonito, nunca tive algum preconceito e sempre o abominei. Sim, ele era bonito. Ele sentou-se próximo. O professor já organizava seu material em cima de uma mesa de mármore. Avistou-me - um senhor de meia idade, olhos azuis claríssimos e cabelo extremamente brancos, que se dizia professor de geografia - e percebeu que era novo. Perguntou-me o nome, e fiz minhas apresentações. Turma média, 25, 26 alunos que, pelo visto, adoravam certa balbúrdia. Conversavam como ninguém. O professor exigiu silêncio, e o silêncio se fez. Ao menos por uns cinco minutos, pois até lá a concertação já fora completamente esvairida e a turma estava completamente dispersa, alheia ao professor. Ele permitiu, e compreendeu o nosso lado. Primeiro dia de aula, ninguém merece... Ainda mais geografia, embora eu seja completamente apaixonado por ela.

Percebi que o único que fazia certo silêncio era o tal menino, Luiz. A essa altura, uma garotinha simpática já me tinha como companheiro e puxava assunto. Fiquei contente por ter feito alguma amizade logo de cara:

- E aí, novato?

- Sim, sim...

- Que achou da escola?

- Bem diferente das de onde moro. Maior, mais imponente, melhor ensino, pelo visto.

- Ah, então és novo na cidade. Rafael, não? Prazer, sou Amanda. Tenho 16 anos, e tu?

- Bom, prazer (nunca me verão fazer brincadeiras tipo "o prazer vem depois". Acho uma boboquice). Tenho 15. E então, como funcionam as coisas por aqui?

- Assim como em todo colégio, é o mesmo esquema das divisões: populares, os que pensam que são, nerds, atiradas, pegadores, emos, barraqueiros e barraqueiras, e por aí vai...

- Então tá, nada de anormal, pelo visto...

Novamente o sinal. A deixa para que os alunos perambulassem pela sala. Permaneci. Sentado, observei o espaço, as pessoas. Amanda, acho melhor descrevê-la: sabem aquelas boquinhas de porcelana que eram comuns antigamente? Pois é, de um aspecto quebradiço, mantinha em sua brancura espectral um ar doce, uma meiguice era guardada em suas bochechas rosadas pela maquiagem, enquanto seus longos e lisos cabelos negros formavam uma cascata que impunha respeito. Olhei mais um pouco, e vi Luiz a me observar atentamente. Ele percebeu, e ficou um tanto sem graça. Acenei e sorri. Levantei-me e fui até ele.

- Oi, tudo bem?

- O-oi... Tudo sim (por que ele estava tão nervoso?)

- Sou Rafael, e você?

- Luiz. Luiz Octávio, mas prefiro que me chamem de Luiz.

- Ok, vou me sentar, já vai começar outra aula. Até depois, Luiz!

- Até depois...

Garoto desconfiado... Quase que instantaneamente, pula um homem para dentro da sala gritando:

- Hello class! Are you ready for another year???

Quase em uníssono, a turma responde:

- Nooooo!!!

Mui simpático, ele diz:

- I do not care. Shut the fuck up and sit down yourselves.

Um amor de professor de inglês, pelo visto. E ele não deixou que nós vagássemos durante a aula dele, expondo em termos afáveis o que pensa do tipo de gente que interrompe sua aula e o que o está destinado. Finda a aula, intervalo. Corri para o banheiro, já podia sentir minha bexiga rompendo. Pus o amiguinho p'ra fora, motivo de orgulho do papai, e despejei aquilo que estava me matando. Então entra Luiz, pelo visto também apertado. Não se preocupou se tinha alguém, e também pôs-se a fazer xixi. Mais aliviado, percebeu que eu estava do seu lado, olhou para mim, abaixou seu olhar e corou instantaneamente. Percebi isso, e me segurei para não rir.

- Não precisa chorar, o teu também não é pequeno...

Logo aí ele começou a ficar de um tom púrpuro, quase roxo. Engasgou-se. Tentei ajudar, mas tinha-me esquecido de por para dentro e meu pênis tocou no braço dele. O tom passou para algo quase negro. Aí foi, desatou a tossir. Já fora demais, não me aguentei e ri como não podia. Ele riu também, deu um pequeno soco em meu braço e fomos lavar as mãos. No pátio, encontrei Amanda, que me apresentou uma amiga, Kelly. Muito linda, loirinha, olhos bem verdes, foi simpática um pouco em excesso. Correspondi a altura. Via uma boa chance de poder ficar com alguém.

Passado um tempo, fim da aula. Fui me encaminhando para a saída, satisfeito com meu primeiro dia de aula. Então apareceu. Quem? O esperto leitor deve saber, não? Também, depois de ler tantos iguais... Sim. Apareceu-me Luiz Octávio. Não me percebera, então fui até ele.

- E aí, Luiz, mora p'ra onde?

- Descendo por essa rua até o mercado, então dobro para a esquerda.

- Hei, eu também! Posso te acompanhar? (Vi que um pequeno sorriso se formara em seus lábios.)

- Vamos, então.

Conversamos um pouco, e vi que ele morava a menos de dois quarteirões de mim, num belo sobrado verde. Assim passou uma semana, estávamos cada vez mais próximos e seguíamos sempre o mesmo percurso. Até que, depois de uma semana, eu disse:

- Que acha de nós combinarmos algo mais tarde? Passo na tua casa e então nós veremos.

- Falou. Me passa teu número.

Dei. Ele me deu o dele e gravei em meu telefone. Despedi-me dele com um abraço, e ele, novamente, corou. Fui a minha casa. Nessa semana, também fique mais próximo de Amanda e, principalmente, de Kelly. Conheci também outras pessoas, mas o momento agora não convém. A cidade tinha um céu azul muito intenso. Fazia um calor infernal. Por sorte, a rua não era muito movimentada e tinham várias árvores pelo caminho. Cheguei ao portão de minha casa. Mamãe exagerou nessa. Ela é decoradora, quis uma casa simplesmente colossal. Não uma casa, mas um casarão. Um grande jardim rodeado por um alto muro de mármore, coberto por uma hera, possuía um caminho em pedra que conduzia até a casa e um local para festas, com churrasqueira e piscina, por uma bifurcação. A casa era imponente, alta, chegava a ser um tanto medieval por fora, mas por dentro, a decoração deixaria qualquer um de queixo caído. Sempre preferi casas pequenas, dão menos trabalho. Mas, fazer o quê, né? Fui ao meu quarto. Espaçoso, possuía o formato de um hexágono, com acesso a um grande banheiro. Sou filho único, então não tinha espaço para disputar com ninguém. Éramos eu, papai, mamãe e seu irmão, este meu pai não gosta muito. Desci, almocei e fui dormir um pouco. Por aí, o relógio marcava por volta das 13. Acordei cerca de 16 h. Produzi-me, coloquei uma roupa muito bonita, mas, principalmente, confortável. Saí de casa, na qual só havia a equipe de empregados. Enviei uma mensagem para o telefone celular de Luiz, avisando que em breve estaria em sua casa. Cheguei, bati à porta, pois não localizei a campainha. Luiz me abriu a porta e me convidou para entrar, envergonhado, pelo visto também estava dormindo, pois só trajava um pequeno calção. Pude ver que ele era definido. Não muito, era magro, mas tinha divisões na barriga. Observei a casa, muito bonita, aconchegante, embora pequena. Vi um porta-retratos em cima de uma mesa de centro, com a fotografia de uma família aparentemente feliz. O pai, a mãe e dois filhos, um casal. Um casal? E eu a conhecia! Quando eu escuto um sonoro grito:

- PUTA QUE PARIU! LUIZ OCTÁVIO! Já trouxe visita! Vou dizer p'ra mamãe!

Ele olhou para mim, visivelmente constrangido, quando eu a avisto: Kelly. Deslumbrante em um vestidinho de dormir de seda. Ela me viu, e logo mudou sua feição. Assumiu uma pose carismática e me cumprimentou. Eu estava embasbacado com ela. Luiz percebeu, e não gostou. Fechou a cara, e foi para o seu quarto. Indicou-me onde ficava e disse para eu ir quando quisesse. Eu assenti, e ele saiu.

- Quer um copo d'água?

- Sim.

- Então vem cá...

Vi que ia dar besteira, mas eu estava louco por isso. Segui Kelly até a cozinha. Percebi, então, que ela era uma mulher de atitude, pois, do nada, agarrou-me para um beijo, o qual eu correspondi alegremente. Um barulho fez-se na sala, e eu a larguei, pensando serem os pais dela chegando. Não eram, graças ao Senhor. Ela, sem dizer nada, saiu, e eu fiquei por lá, como quem tinha visto um passarinho azul. Resolvi ir ao quarto de Luiz. Entrei, e vi que ele estava escolhido na cama.

- Ei Luiz, o que foi? - Ele chorava compulsivamente.

- N-n-ada não...

Eu tinha feito algo? Pensei um pouco, aí caiu a ficha.

- Puta merda, cara, você é gay? - Perguntei assustado.

Vi que ele me olhou, atônito, como se tivesse sido pego roubando um pedaço do bolo. Não respondeu. Mudou sua feição após um tempo, e falou:

- Agora vai, não precisa mais olhar na minha cara, se assim o quiser. - E ameaçou recomeçar a chorar.

Droga, detesto ver gente chorando. Sentei-me ao seu lado e o puxei para um abraço. Vi que ele encharcou meu ombro, molhado metade da minha camisa.

- Desculpa... - O rosto dele estava inchado.

- Deixa de besteira e sorri, que você fica bem mais bonito alegre.

Limpei seu rosto e o fiz deitar em meu colo, e lá ele dormiu, enquanto eu lhe fazia cafuné. Nunca tive besteiras, sempre fui capaz de demonstrar carinho por todos, sejam homens ou mulheres. Kelly me viu fazendo carinho nele enquanto ele dormia, pois a porta estava aberta. Um pouco pasmada, talvez tenha pensado besteira. Mas limitou-se a sorrir, e eu lho retribuí.

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Comentários

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Adorei também, muito bem escrito, e me identifiquei com você em alguns pontos, não em todos mas em alguns sim. Acompanharei.

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Quando vc disse: " - Nunca fui um tipo biltre, jamais briguei com alguém, sou movido a palavras, e sei usá-las muito bem", vc realmente não estava de brincadeira!! Me vi escrevendo isso!!! kkkkkkkkkkkkkk..... Caramba!!!! O conto está maravilhosamente bem escrito, de coração cara, parabéns mesmo!! Se esta história é realmente verdade, me permita dar minha humilde opinião; vc deveria prestar mais atenção a quem está a sua volta; embora hétero, acredito que você deveria dar uma chance a um cara.... quem sabe a sua felicidade não está com uma mulher, e sim com um homem? já parou para pensar nessa hipótese? Ansioso pelo "Secundus"... (Risos...)

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Muito bom, interessante a sua maneira de escrever, diferente da mesmice que encontramos aqui na CDC, Não ligue para as criticas, apenas para as criticas construtivas, Espero ansiosamente para o próximo capitulo o "secundus" kk's, poste logo a continuação, bjss :*

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