Uma aventura sem volta

Um conto erótico de Pedro, o Puto
Categoria: Heterossexual
Contém 1938 palavras
Data: 21/01/2010 21:56:12
Última revisão: 11/08/2010 01:36:44

Como em um transe, contemplei o quarto. Ísis sentada na cama, ainda nua, com as pernas dobradas de lado e o celular na mão. Pouco adiante, meu reflexo no espelho da parede. A sensação era mais ou menos a de acabar de bater o carro em um acidente estúpido e violento. Um descuido, uma distração, e pronto – em menos de um segundo você está na merda, mas em sua percepção aquele momento parece se esticar indefinidamente, como se a partir dali fosse possível voltar atrás. A diferença é que dessa vez se tratava de danos não só irreparáveis, mas anunciados. O casamento que eu tinha idealizado, com a mulher que seria a mãe de meus filhos, jogado fora assim por um impulso, um capricho; e quanto aos sinais que estavam lá desde o começo para quem quisesse ver, eu simplesmente tinha escolhido ignorar todos eles.

Olhei mais uma vez para o cretino na parede. Eu queria sumir, e o pior lugar para se estar naquele momento devia ser um quarto cheio de espelhos. Sem saída, me voltei devagar para Ísis, que começava a se vestir.

– O que ela disse? O que você disse? – enfim perguntei.

Ela sequer se deu o trabalho de responder. Aos poucos, sua boca foi se torcendo num sorriso debochado que mais lembrava uma careta de nojo. Talvez ignorasse o fato de que o fim de meu casamento já era castigo suficiente para mim. Só me encarava e sorria: "você teve o que mereceu, vadio". E então me deixou.

Por alguns minutos, fiquei de olhos fechados. Tentava imaginar quando e como voltaria para casa, o que diria, se haveria a mínima possibilidade de uma segunda chance, até ser despertado bruscamente daquele misto de conjecturas e autocomiseração. Era o toque do interfone. A primeira ideia que me passou pela cabeça ao ouví-lo foi que Ana estivera lá o tempo todo esperando para me dar o flagra pessoalmente. Para meu alívio, eu estava errado, o que na verdade aconteceu foi bem menos dramático do que isso... Não sei se é um procedimento padrão, mas alguns motéis têm essa política de controlar a saída de clientes desacompanhados – se alguém por acaso aparece sozinho na recepção, eles ligam para a pessoa que ficou no quarto, para saber se há algo errado. A atendente me avisou sobre a saída de Ísis e eu disse que estava tudo bem, me sentindo mais só do que nunca. Sim, está tudo ótimo. Depois apaguei as luzes, afrouxei a gravata, me virei na cama e procurei relaxar. Se tiver conseguido pregar o olho por meia hora, foi muito; quando o céu começou a clarear, eu estava na varanda ouvindo o mar e fumando um Marlboro, a única marca de cigarro que consegui encontrar no motel.

Cheguei à entrada do condomínio com uma aparência terrível, uma ressaca fodida e trezentos reais a menos na carteira. O relógio de pulso marcava oito e quinze quando saí do elevador – pelas minhas contas, àquela hora Ana deveria estar tomando café da manhã, isso se estivesse tentando seguir normalmente sua rotina. Toquei a campainha. Cerca de um minuto depois, ela me recebeu com uma expressão tão desolada e exausta que mal consegui olhar de volta. Havia tudo de negativo naquela expressão, menos surpresa. Tentei tocar seu rosto, mas ela se afastou como se tivesse levado um choque e instintivamente ergueu as mãos até a altura dos ombros, tentando demarcar uma barreira invisível entre nós. Não usava mais aliança.

– Ana, eu não te mereço, mas você é a mulher da minha vida. Sei que o que eu fiz não tem justificativa, que sou fútil, fraco, egoísta, sujo. Acontece que não posso viver sem você e queria muito que me perdoasse – eu disse.

Sentia aquilo com todas as minhas forças, apesar de não haver tentado enganar a mim mesmo nem por um minuto. Pelo que conhecia de Ana, ela tinha tomado uma decisão e não voltaria atrás. Sempre fora uma pessoa forte e determinada, com auto-estima demais para aceitar uma traição e ingenuidade de menos para acreditar que eu um dia seria digno de confiança.

– Diz alguma coisa, por favor! – insisti.

– O que quer que eu diga? Você nem me procurou! Passou a noite fora! – disse, me olhando fixo pela primeira vez naquela manhã. Seus olhos estavam vermelhos.

– Achei que você não queria me ver nem pintado. E eu estava transtornado e bêbado demais para não acabar piorando tudo aquela hora.

O terceiro motivo era que eu próprio certamente não me perdoaria se estivesse em seu lugar, mas confessar aquilo poderia matar qualquer chance de reconciliação. Ela suspirou, e então disse o que eu já esperava:

– Pra mim o nome disso é covardia. Como se não bastasse tudo o que você fez. Mas não importa, quero que junte suas coisas e saia daqui – declarou, passando por mim sem esperar resposta.

Logo que ela entrou no elevador, liguei para o escritório para avisar que faltaria ao trabalho porque tinha ficado doente, e não estava propriamente mentindo. Ainda bem que era sexta-feira. De modo quase automático, enchi uma mala com roupas, acessórios e outros pertences e chamei um amigo para perguntar se podia ficar na casa dele até alugar um apartamento para mim. Mais tarde, já instalado, contei-lhe a história detalhadamente. Roberto quis que saíssemos naquela noite para tomar umas cervejas e desanuviar as ideias, mas tinha o jantar de sessenta anos de sua mãe, um compromisso inadiável. Então tentou me arrastar junto. Agradeci, jurando ligar se precisasse conversar; não estava em condições de ser social.

Depois que ele se foi, deitei no sofá e fiquei um bom tempo divagando, embalado pela chuva que começava a cair. A sala de Roberto era bem equipada, com uma cozinha americana ao fundo e um convidativo bar no canto. Convidativo demais; acho que só não tomei outro porre aquela hora porque ainda estava sentindo os efeitos da última ressaca.

O jeito era sair de perto das bebidas. Ia ligar a TV do quarto, mas antes disso o interfone tocou. Atendi desconfiado.

– Boa noite. É a Kate.

– Quem?

– Kate. Roberto me chamou pra te fazer companhia.

Ah, Roberto, eu disse que queria ficar sozinho...

– Olha, não me leva a mal, mas...

– Ele me pagou adiantado e pediu que eu entrasse. Posso? Está um verdadeiro temporal aqui.

Hesitei por alguns segundos e então liberei o portão. Logo depois, apareceu na porta uma garota bastante bonita, de cerca de vinte anos. Tinha os cabelos loiros molhados de chuva e aparentava estar sentindo frio.

– Quer beber alguma coisa? – ofereci.

– Só água, obrigada.

Peguei um casaco para ela, servi a água e fiquei observando.

– Roberto disse algo sobre mim? – finalmente perguntei.

– Contou que você está se separando. Por alto... não entrou em detalhes.

– Ele deve ter falado que ando meio introspectivo – eu disse, mais para criar uma certa distância do que qualquer outra coisa.

– Nada que um pouco de diversão não possa aliviar... – ela sussurrou, chegando mais perto e roçando os lábios em meu pescoço.

– Talvez não – me esquivei ligeiramente.

– Se não tentar, como vai saber?

Sua mão, que já estava sobre meu ombro, desceu até o meio de minhas pernas e começou a me acariciar. A massagem era suave e excitante. Não demorou a me deixar duro, mas não me movi. Foi ela quem me conduziu de volta ao sofá para que eu me sentasse.

– Fecha os olhos – sussurrou.

Sem pensar muito, resolvi atender o pedido e aceitar a surpresa que me esperava. Logo dedos delicados abriram o botão de minha calça, desceram o zíper e puxaram minha cueca para baixo, e então algo percorreu suavemente o comprimento do meu pau, subindo e descendo duas ou três vezes. Difícil dizer na hora se eram dedos ou lábios, mas eu estava prestes a descobrir; cara, no momento seguinte senti o calor da respiração dela lá embaixo...

– Está gostoso? – provocou.

– Muito! – respondi, louco para que ela me acolhesse. Devia estar tão perto que poderia me tocar só esticando a língua.

Foi o que ela fez em seguida. Me lambeu inteiro sem usar as mãos, depois segurou meu pau para cima e deu uma chupada de leve na ponta. Gemi. Minha expressão de tesão deve tê-la encorajado a ir além – de repente eu estava quase todo em sua boca, a glande já entrando pela garganta. Quando abri os olhos, a encontrei ajoelhada na minha frente só de calcinha.

– Pára – pedi, antes que acabasse gozando.

Coloquei-a de quatro no sofá, vesti rapidinho uma das camisinhas que ela havia deixado sobre a mesa de centro, abaixei sua calcinha, encaixei o pau na entrada, segurei sua cintura com as duas mãos e meti de uma vez. Mesmo sem estar muito lubrificada, ela arqueou as costas e aos poucos passou a jogar os quadris contra mim, acompanhando o ritmo forte que eu ditava.

– Rebola – falei.

Por alguns instantes, parei de meter. Só ela mexia. Fiquei olhando, as mãos ainda em sua cintura, até que aquele rebolado começou a me lembrar Ísis na boate. De repente eu estava de volta à pista de dança, com as luzes, o gelo seco, o tesão, a confusão e agora a raiva. É, eu de certa forma a culpava, como se não fosse o único responsável por minha própria infelicidade, como se ela não tivesse simplesmente feito o que Ana lhe pedira.

Recomecei os movimentos, menos civilizado do que nunca. Acho que não conseguiria fazer de outro jeito se quisesse. Parecia possuído, mas Kate ignorava e continuava mexendo junto. Em menos de dez minutos, estava terminado; ela se arrumando e perguntando se deveria ficar mais um pouco, eu fazendo que não com a cabeça, atordoado. Foi embora, então. E eu? Fiquei lá sentado no chão, ainda com a camisinha usada. Primeiro dia separado e já tinha trepado com uma mulher cujo nome verdadeiro desconhecia. Minha cabeça girava... Mas, entre todas as coisas que me escapavam à compreensão, uma estava clara: Ana fez a escolha certa ao se livrar de mim.

Aquele foi só o prelúdio de um fim-de-semana de putaria e bebedeira. Na segunda-feira eu descobri que tinha conseguido cumprir meu objetivo: estava realmente destruído. Faltei ao trabalho de novo e fui me arrastando para a análise. Dessa vez não houve espera, pelo menos. Miguel me atendeu às sete em ponto.

– Você não me parece bem – disse ao abrir a porta. – Aquele assunto?

– Aquele e mais outros tantos... E o problema da semana passada, como se resolveu? – perguntei, sem querer muito saber, na verdade.

– Ah, isso... – Miguel começou. Sua súbita expressão de tristeza acabou despertando minha curiosidade.

– O que houve?

– O paciente tomou uma overdose de remédios.

– Meu Deus! Por quê?

– Coisas de família. Foi internado, espero que fique bem – resumiu, decerto para não ter de ferir a ética profissional entrando em detalhes.

Engoli em seco, atravessei a sala e meio que desabei no divã. Aquela história parecia ter acionado algo em meu cérebro. Alguma coisa aconteceu, e então chorei sem parar não sei por quanto tempo. Chorei tudo o que não tinha chorado no motel, na porta do apartamento de Ana e na casa de Roberto durante o fim-de-semana... e o resto da sessão foi para pôr Miguel a par do que havia acontecido desde a última segunda-feira.

De volta ao meu novo e provisório lar, caí num sono ferrado. Minha primeira noite de descanso decente em cinco dias. Em meus sonhos, encontrei Ana... Ana dizendo sim, Ana ouvindo Águas de Março e cantando junto, Ana cercada de crianças na festa de aniversário de meu sobrinho, Ana e aquele sorriso de menina levada que eu não mais veria a não ser em fotografias ou recordações... e Ana... e Ana... E Ana.

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