O Escolhido de Eldoria ☆ Capítulo 25

Um conto erótico de Tiago e Lucas
Categoria: Homossexual
Contém 1602 palavras
Data: 05/09/2025 08:41:21

✧ O Santuario das Fontes Espelhadas ✧

(Tiago)

Os dias que se seguiram ao despertar de Lucas eram um doloroso paradoxo. Pela manhã, eu via lampejos do homem que amava — um sorriso genuíno, uma piada compartilhada — mas à medida que o sol se punha, uma cortina invisível caía sobre seus olhos. Eram vislumbres breves, um endurecimento da mandíbula ou um brilho gélido que não lhe pertencia, mas que me apavoravam mais do que qualquer monstro. Eu me agarrava à esperança, canalizando minha magia verde-esmeralda em seu peito todas as noites, sentindo o calor da vida pulsar contra a frieza que o invadia. Eu precisava acreditar que meu toque estava tecendo novamente os fios de sua alma, curando as feridas profundas que o veneno de Malakor havia infligido.

Nossa jornada nos trouxe ao limiar do Santuário das Fontes Espelhadas, um lugar sussurrado em lendas como um nexo de purificação e revelação. A própria paisagem parecia sonhar. A névoa leitosa se agarrava à nossa pele, com o cheiro de ozono e terra molhada, e do chão brotavam flores de um azul fantasmagórico, pulsando uma luz suave que projetava nossas sombras de forma alongada e dançante. Ao chegarmos a um portal de pedra, cujos símbolos ancestrais pareciam se contorcer sob o nosso olhar, o caminho se dividiu. No centro, uma placa de pedra erodida pelo tempo trazia uma inscrição enigmática: “A ‘verdade’ se encontra na ‘escuridão’! A ‘cura’ se encontra na ‘luz’!”.

(Lucas)

O ar no Santuário vibrava, uma ressonância de baixa frequência que fazia meus dentes rangerem e a cicatriz em meu peito arder. Malakor se agitava dentro de mim, não mais como um conquistador, mas como um prisioneiro inquieto, sussurrando em minha mente.

“A ‘luz’ é uma mentira para os fracos, Lucas. Uma bela gaiola. O poder está na honestidade da ‘escuridão’.”

Quando o caminho se dividiu, senti uma onda de repulsa física pela trilha da “luz”. Ela emanava um brilho doentio, um perfume enjoativo de flores moribundas disfarçado de pureza. A “escuridão ”, contudo, me chamava com a força de um eco familiar, uma promessa de silêncio e força.

Observei Tiago, seu rosto tenso, o olhar alternando entre as duas rotas como um pendulo de esperança e medo. Eu sabia o que ele queria: me arrastar para a sua luz, para a sua cura, para a sua verdade. Mas não era a minha.

“Precisamos nos separar”, declarei, e as palavras saíram com a dureza do obsidiana, uma determinação que não era inteiramente minha, mas que eu reivindiquei como se fosse. “Eu seguirei a ‘escuridão ’. Você, a ‘luz’. É a única maneira de encontrarmos o que viemos buscar.”

A cada sílaba, sentia Malakor se deleitar dentro de mim, saboreando a fratura entre nós.

(Tiago)

A proposta de Lucas me atingiu com a força de um golpe físico, roubando-me o ar. Separar-nos? Deixá-lo caminhar voluntariamente para a escuridão que eu lutava tanto para exorcizar? Era impensável, uma traição a tudo o que eu acreditava. Mas vi em seus olhos não apenas a influência de Malakor, mas uma centelha de desafio que era puramente de Lucas. Forçá-lo seria quebrá-lo, talvez para sempre. A rendição veio com um gosto amargo.

“Tenha cuidado, Lucas”, minha voz saiu embargada, um fio de som em meio ao meu desespero. “Não deixe que a ‘escuridão’ defina quem você é.”

Nosso aperto de mão foi hesitante, a pele dele fria contra a minha. E então ele se foi.

Quase imediatamente, senti um peso esmagador desabar sobre meus ombros, uma pressão atmosférica que parecia solidificar o ar em meus pulmões. Olhei para minhas mãos, esperando o brilho verde e reconfortante da minha magia, mas não havia nada. Apenas pele e osso, pálidos sob a luz etérea. O Santuário não apenas nos testava; ele nos despojava. A minha magia, a minha essência, havia sido silenciada, deixando-me terrivelmente vulnerável, assustadoramente humano.

(Lucas)

Assim que mergulhei na trilha da “escuridão”, senti o abraço frio e familiar da escuridão. Malakor exultou por um instante, até que um silêncio repentino e absoluto tomou conta da minha mente. A conexão foi cortada. O pânico subiu pela minha garganta como bile, mas eu o sufoquei. Pela primeira vez em meses, eu estava sozinho em minha própria cabeça. Se este lugar anulava toda a magia, tanto a de Tiago quanto a de Malakor, então eu teria que confiar em meus instintos, em minha força.

A floresta se fechou ao meu redor, as árvores se retorcendo em formas de garras esqueléticas contra um céu sem estrelas. A trilha se estreitou e, no chão de pedra, surgiram símbolos entalhados. Alguns brilhavam com um escarlate febril, outros com um cinza de fumaça — as cores da minha magia corrompida, as cicatrizes da minha alma expostas no caminho. De repente, um estalo seco, como um osso se partindo. Sem tempo para reagir, o chão sob meus pés cedeu. O mundo se tornou um borrão de queda livre, o cheiro de terra úmida e o brilho sinistro de estacas de obsidiana me esperando lá embaixo.

(Tiago)

A trilha da “luz” era uma mentira bem contada. Inicialmente, um paraíso idílico, com flores cujas cores vibrantes pareciam cantar e pássaros que teciam melodias de pura paz. Mas logo, a ilusão se desfez. O pólen das flores causava miragens de entes queridos me chamando para fora da trilha, e os cantos dos pássaros prometiam um esquecimento doce e perigoso. O ar, antes puro, tornou-se rarefeito, cada respiração uma luta.

A trilha me levou a uma clareira circular onde uma fonte de pedra jorrava água que brilhava como diamantes líquidos. Uma sede atroz queimava minha garganta. A tentação era uma agonia. Mas ao me aproximar, o reflexo na água não era o meu. Era o de uma versão de mim mesmo, décadas mais velho, uma casca ressequida com a pele repuxada sobre os ossos e olhos vazios de qualquer esperança. A fonte não oferecia cura, mas sim o esquecimento eterno; ela drenaria minha força vital, me transformando em mais um espectro faminto a vagar por aquela clareira amaldiçoada.

(Lucas)

Meus dedos se cravaram na beirada do buraco, os músculos gritando enquanto eu me içava para longe das estacas de obsidiana. Sangue escorria por baixo de minhas unhas. A trilha continuava, mais sinuosa e opressiva. Logo, me deparei com um corredor de espelhos negros, polidos como a noite. Cada um refletia uma versão distorcida e grotesca de mim.

Um sussurro serpentinou em minha mente, vindo de todos os reflexos ao mesmo tempo: “Escolha sua verdadeira face”. Um espelho mostrava um homem consumido pela fúria, os olhos injetados de sangue. Outro, um fantoche de carne, com fios invisíveis presos a seus membros. O terceiro, e mais terrível, refletia um monstro com feições minhas, sorrindo com presas manchadas de sangue. Sabia que era uma armadilha para me prender em uma autoimagem de desespero. Mas qual era a mentira? Qual era a verdade? Qual era o verdadeiro Lucas?

(Tiago)

Recuando da fonte, o coração martelando contra minhas costelas, continuei minha jornada. A clareira deu lugar a um labirinto de espelhos cristalinos, que se erguiam como paredes de luz sólida. A minha imagem se multiplicava ao infinito, criando uma cacofonia visual que ameaçava estilhaçar minha sanidade. Os reflexos se moviam com um ligeiro atraso, sussurravam minhas piores inseguranças com a minha própria voz e distorciam a perspectiva, transformando corredores em becos sem saída.

No meio daquele pesadelo de luz e vidro, um espelho se destacou. Ele não refletia minha imagem atual, mas uma cena da minha infância: eu, com sete anos, no jardim de casa, vendo minha magia verde-esmeralda florescer em minhas mãos pela primeira vez, uma explosão de pura alegria e inocência. A tentação de me perder naquela memória, de escapar da dor do presente, era quase avassaladora. Um santuário dentro da prisão, uma armadilha para a alma.

(Lucas)

Aqueles espelhos não eram meras ilusões; eram um julgamento. Um teste para ver se eu me renderia à monstruosidade que Malakor queria que eu fosse. Fechei os olhos, ignorando as imagens aterrorizantes. Em vez disso, busquei a única imagem que importava: o rosto de Tiago, a seriedade em seus olhos, o calor de sua mão na minha. Concentrei-me na sensação de sua magia verde, não como uma cura imposta, mas como uma promessa. Uma promessa de que existia uma fagulha de luz dentro de mim, por menor que fosse, que ainda valia a pena salvar. Essa fagulha... essa era minha verdadeira face. O Lucas que lutava para existir.

Abri os olhos e, com um grito que rasgou minha garganta, esmurrei o espelho do monstro. Com o impacto, ele se estilhaçou, e uma torrente caótica de energia explodiu de meus punhos, não como magia, mas como força bruta. Meus golpes pulverizaram os outros espelhos, dissolvendo as ilusões e revelando a verdadeira trilha: escura, sinuosa, mas inegavelmente real.

(Tiago)

Com um esforço de vontade, desviei o olhar da doce lembrança, do paraíso perdido da minha infância. Meu propósito não estava no passado, mas no final deste caminho, com Lucas. Em vez de tentar navegar pelo labirinto, comecei a destruí-lo. Soquei o primeiro espelho. Cada estilhaço que caía no chão não refletia a mim, mas um fragmento da verdade, um vislumbre do caminho real.

Com paciência e determinação, transformei a destruição em criação, abrindo um caminho através da prisão de vidro. Quando o último espelho caiu, a luz refletida por milhares de cacos no chão se uniu, convergindo para formar uma seta luminosa que apontava para a frente. A última ilusão se dissipou, e a trilha continuou, levando-me mais fundo, para o verdadeiro coração do Santuário, onde eu sabia que o destino de Lucas, e o meu, finalmente seriam revelados.

Continua…

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