Parte 1 — O Vizinho Novo
A vida em apartamentos sempre me pareceu um dorama mal escrito. Corredores brancos, portas iguais, vizinhos que mal se olham, o som abafado de passos que poderiam pertencer a qualquer um. Eu sempre achei estranho viver cercada de gente e, ao mesmo tempo, não saber nada sobre eles. Cada porta, para mim, era como a capa fechada de um livro que talvez jamais fosse aberto. Até que, um dia, um novo livro apareceu bem diante da minha porta.
Eu sou Letícia, tenho vinte e dois anos e carrego comigo a mania de transformar tudo em cena. É inevitável: desde criança imagino diálogos internos, entradas dramáticas, olhares trocados no tempo exato. Me alimento de histórias, especialmente de romances coreanos que consumo madrugada adentro, enrolada no cobertor. Mas a minha vida amorosa real sempre pareceu o oposto: nada de protagonistas cativantes, nada de encontros improváveis, nada de destino. Só dias comuns, como o cheiro de café que sobe da padaria ao lado do prédio, ou o porteiro resmungando como se o mundo fosse uma eterna segunda-feira.
E foi num desses dias comuns que ouvi o barulho. Caixas batendo, vozes de carregadores, o chiado da fita adesiva sendo arrancada. A porta da frente — sim, bem de frente para a minha — finalmente se abriria para alguém novo.
Eu tentei resistir à curiosidade. Estava na sala, tentando estudar, mas meus ouvidos vibravam a cada som do corredor. Por fim, rendida, encostei-me na fresta da porta entreaberta. Disfarcei como se fosse apenas verificar se o elevador estava livre, mas, na verdade, queria ver.
E vi.
Entre homens suados arrastando móveis, apareceu ele. Um rapaz de cabelo loiro escuro, penteado que dava a impressão de ser ao mesmo tempo arrumado e desleixado. Fones de ouvido enfiados, olhos presos ao celular, como se nada ao redor importasse. Não ergueu a cabeça, não olhou em volta, passou pelo corredor como um fantasma com contrato de aluguel.
Meu coração deu um salto. Foi rápido, só uma visão breve, mas suficiente para que minha mente o encaixasse numa moldura. Eu quase podia ouvir a trilha sonora de um dorama começando, aquela batida suave no piano quando a heroína vê o protagonista pela primeira vez. Ele não tinha feito nada — apenas existia, e ainda assim já era uma promessa.
Fiquei ali, observando mais um pouco. A cada ida e vinda dele, o corpo magro sob a camiseta simples, os passos ligeiros, a concentração no celular, eu criava roteiros mentais. Imaginei-o derrubando uma caixa, pedindo desculpas com um sorriso tímido; imaginei-o me olhando de repente, nossos olhos se encontrando e ficando presos por alguns segundos longos demais. Tudo clichê, mas eu adoro clichês.
Só que nada disso aconteceu. Ele entrou no apartamento, a porta se fechou, e o silêncio voltou a tomar conta do corredor. Eu fiquei com uma sensação estranha — como se tivesse visto apenas o trailer de um filme que eu não sabia se existiria.
Naquela noite, enquanto me revirava na cama, pensei em como poderia quebrar o muro invisível que existia entre nós. Não podia simplesmente bater na porta dele com uma desculpa qualquer; eu não era tão ousada assim. Mas também não queria deixar o acaso decidir por mim, porque eu sabia — o acaso raramente conspirava a meu favor.
Foi então que tive a ideia. Bilhetes. Era simples, era delicado, e tinha um charme secreto que soava muito mais interessante do que mandar uma mensagem de celular. Peguei uma folha de caderno, fiquei encarando o espaço em branco como quem encara um abismo, e escrevi:
“Oi, vizinho novo. Bem-vindo ao nosso andar. Aqui o barulho das tubulações é quase um despertador, e o porteiro nunca está de bom humor. Mas tirando isso, é um bom lugar. :)”
Li e reli, tentando decidir se parecia simpático ou ridículo. Mas dobrei o papel, enchi os pulmões e abri minha porta. O corredor estava vazio. Me agachei rápido, deslizei o bilhete por baixo da porta da frente, e corri de volta como se tivesse cometido um crime. Fechei a porta com força, encostei as costas nela e ri sozinha do meu gesto ridículo.
Não esperava resposta. Talvez ele achasse estranho, talvez ignorasse. Mas no mesmo dia, ao voltar da faculdade, encontrei algo sob minha porta. Um papel dobrado.
“Obrigado pela recepção. Prometo não fazer muito barulho — mas não posso prometer nada sobre o encanamento. ;)”
Segurei o bilhete como se fosse frágil, como se fosse vidro. O sorriso surgiu sozinho. Não era muito, mas era algo.
Naquela noite, sonhei que conversávamos como se nos conhecêssemos há anos. Eu ria, ele me olhava com calma, e havia uma leveza na cena que me fez acordar com o coração acelerado.
No dia seguinte, não resisti. Outro bilhete:
“Se você gosta de pizza, experimente a da esquina. Só não peça a de calabresa — o tempero é criminoso.”
Horas depois, a resposta:
“Valeu pela dica. Mas confesso que sou mais de café do que de pizza. Você conhece algum lugar bom por aqui?”
E foi assim que começou. Portas fechadas, mas papéis atravessando a fronteira entre nós. Pequenas confissões embrulhadas em dobra dupla, como quem escreve um segredo e o confia ao destino.
A cada nova troca, algo em mim florescia. Não era só curiosidade; era uma excitação diferente, como se eu estivesse entrando, finalmente, na minha própria história. Eu ainda não sabia quem ele era de verdade, nem como seria encontrá-lo fora das linhas escritas. Mas já sentia: havia uma centelha acesa, e ela cresceria.
Parte 2 — O Ritual dos Bilhetes
Eu não sabia que o coração podia se acostumar a bater mais rápido todos os dias. Mas era isso que acontecia: cada vez que eu voltava para casa e via um papel dobrado no chão, meu corpo reagia como se fosse encontro marcado, como se alguém me esperasse ali, em silêncio, do outro lado da porta.
Na segunda ou terceira troca, ele deixou escapar algo que fez o jogo se tornar ainda mais real. Escreveu:
“Sou Vinícius. Achei que seria justo me apresentar, já que você abriu primeiro essa porta invisível entre nós.”
Vinícius. Eu sorri ao ler, mordendo o canto do lábio. O nome soava firme, adulto, cheio de presença, como se carregasse história e segredo. De repente, ganhou um corpo na minha imaginação: o vizinho da frente, o rapaz loiro que eu tinha visto na mudança. Eu repeti mentalmente, testando nos lábios, como se quisesse fixar o nome no rosto que já habitava minhas fantasias.
E, a partir dali, tudo ficou ainda mais intenso. O “meu Vinícius” passou a existir por inteiro, dentro e fora dos papéis. O jeito distraído que eu lembrava da mudança se transformou, nas minhas construções, em fachada para algo mais profundo. E a cada nova resposta, eu tinha a sensação de que descobria mais uma camada escondida daquele vizinho enigmático.
O vício tomou conta de mim rápido demais. Eu inventava motivos para escrever: dicas de lugares do bairro, piadinhas sobre o porteiro mal-humorado, até comentários aleatórios sobre o clima. No fundo, pouco importava o tema; o que eu queria mesmo era puxar outra resposta, arrancar mais um pedaço dele. E ele sempre respondia. Sempre.
Mas nunca com leveza juvenil, nunca com a despreocupação que eu esperaria de alguém da idade dele. As frases de Vinícius eram como pedras atiradas em um lago calmo, criando ondas que demoravam a sumir.
Eu escrevi:
“Às vezes fico ansiosa sem motivo, como se estivesse atrasada para algo que nem sei o que é. Estranho, né?”
Ele respondeu:
“Não é estranho. É sua vida te cobrando viver de verdade. O que você sente como ansiedade talvez seja só desejo reprimido.”
Aquilo ficou martelando na minha cabeça. Desejo reprimido. Eu nunca teria colocado em palavras, mas quando li, senti como se alguém tivesse destrancado uma porta dentro de mim.
Outro dia, comentei sobre como amava finais felizes, sobre como chorava em todo dorama quando o casal finalmente ficava junto. Ele devolveu:
“Você fala de finais felizes, mas já parou para pensar se está pronta para o caminho que leva até eles? Felicidade nunca vem sem dor no meio do caminho.”
Eu o li e estremeci. Vinícius — meu vizinho loiro, distraído e misterioso — soava como alguém que já tinha vivido o dobro de vidas que eu. Havia dureza em suas palavras, mas também um calor escondido. Era como se cada bilhete fosse um toque em um lugar secreto, invisível, dentro de mim.
E eu me entreguei. Passei a escrever coisas que nunca confessei a ninguém. Contei sobre meus medos ridículos, sobre me sentir invisível em festas, sobre minha mania de escrever diários que sempre abandonei na metade. Contei que tinha medo de não ser amada de verdade, de acabar sendo apenas figurante na história dos outros.
Ele nunca me respondia com clichês ou consolos fáceis. Cada resposta dele era um espelho que me obrigava a me olhar mais fundo.
“Você não é invisível. Só precisa que alguém te enxergue sem pressa.”
“Ser protagonista dói. Mas é a única forma de não ser esquecida.”
“Não é falta de amor que destrói as pessoas, e sim a ausência de intensidade.”
Eu lia aquilo e ficava horas encarando o teto, sentindo meu corpo vibrar. A cada novo bilhete, eu me apaixonava mais. Não por um rosto — mas pela mente que parecia me ler, me despir em silêncio, sem nunca ter me tocado.
E ao mesmo tempo, o contraste me atiçava: como aquele rapaz que eu tinha visto na mudança podia escrever desse jeito? Como alguém que parecia tão descontraído por fora podia carregar tanta gravidade por dentro? Essa dissonância só me fazia desejar mais. Eu queria ver aquele rosto de perto, queria sentir a voz dele dizendo aquelas palavras. Eu queria confirmar que o mistério era real.
Nunca trocamos telefones. Nunca. Eu poderia ter pedido, ele poderia ter sugerido. Mas nenhum dos dois quis. Havia algo sagrado na troca de papéis dobrados, no gesto de abaixar-se e deixar um segredo deslizar pelo chão frio do corredor. Era clandestino, íntimo, irresistível. Uma tecnologia antiga para um desejo moderno. Eu não queria notificações digitais. Eu queria o bilhete caído no chão, esperando por mim como uma promessa secreta.
À noite, eu reunia todos os papéis no meu colo, deitada no sofá, e lia em sequência, como se fosse um romance escrito a quatro mãos. Eu abraçava os bilhetes contra o peito, sentindo o calor deles como se pudesse atravessar o papel. Eram minhas cartas de amor, minhas provas de que eu não estava sozinha, de que havia alguém do outro lado da porta vivendo comigo uma história.
Foi então que o destino resolveu brincar comigo.
Numa tarde qualquer, atrasada para a faculdade, eu desci correndo as escadas do prédio até o saguão. O elevador já estava aberto, prestes a subir. E ele estava lá dentro.
Meu coração se desfez em disparos. O cabelo loiro escuro, penteado de lado, a mochila no ombro, o celular na mão. Exatamente como eu lembrava. Mas agora não era uma lembrança, era presença. Era carne, era pele, era respiro.
Nossos olhos se encontraram, e eu me senti exposta, nua, como se ele pudesse ler cada palavra que eu já tinha escrito nos bilhetes. O calor subiu para o meu rosto, minhas mãos começaram a suar. Chamei-o em minha mente: Vinícius. Meu Vinícius.
Ele sorriu de leve. Um sorriso pequeno, mas certeiro, que me atravessou inteira.
As portas do elevador se fecharam devagar, como cortina que desce no fim de um ato. Eu fiquei parada no hall, tentando recuperar o fôlego, tentando acreditar que aquilo tinha mesmo acontecido.
Segui para a rua com o coração martelando na garganta. Eu tinha certeza absoluta: era ele. O mesmo Vinícius dos bilhetes, o mesmo Vinícius que me despia com palavras, agora sorrindo para mim no hall. O destino não estava mais apenas escrito em papel. Ele tinha me encarado, e eu sabia: logo iria bater na minha porta.
Parte 3 — O Convite
A rotina dos bilhetes já não me bastava. Por mais que fosse mágico, íntimo, quase sagrado, eu não conseguia mais viver só do som de papel dobrando no corredor. As palavras dele me queimavam por dentro, cada resposta era uma faísca, e eu queria ver o rosto que escrevia aquilo. Eu queria o olhar, o sorriso, a presença.
Passei o dia inteiro me atormentando. Rabisquei e rasguei três folhas antes de finalmente me render ao impulso. Peguei uma folha limpa, respirei fundo e escrevi:
“Chega de papéis. Quero ver seu rosto enquanto leio as suas palavras. Hoje à noite, no meu apartamento. 20h.”
Dobrei o bilhete devagar, como quem sela um segredo. O coração disparava quando me agachei diante da porta dele e empurrei o papel para dentro. Voltei correndo para o meu apartamento, fechei a porta com força e fiquei apoiada nela, respirando ofegante. Eu tinha atravessado um limite invisível.
As horas seguintes foram tortura. Na faculdade, não ouvi nada, não anotei nada. Voltei para casa mais cedo, inventando desculpas. Arrumei a sala como se fosse palco: limpei, ajeitei o sofá, acendi uma vela. Tomei banho demorado, lavei o cabelo duas vezes, fiquei perdida entre vestidos, até escolher um que me deixava os ombros nus. Olhei no espelho e quase não me reconheci — parecia que eu estava prestes a atuar em um papel que nunca tinha ensaiado.
O relógio avançava com crueldade. Cada ruído no corredor fazia meu coração saltar. Até que ouvi.
Dois toques firmes na porta.
Meu corpo inteiro estremeceu. Caminhei devagar até a entrada, mão na maçaneta, sem saber se queria abrir. Mas abri.
E congelei.
Não era o rapaz loiro da mudança. Não era o mesmo que eu tinha visto no hall, sorrindo de leve, distraído com o celular. Diante de mim estava outro homem — alto, de ombros largos que quase preenchiam o batente, cabelo escuro cortado rente, barba rala sombreando o rosto. Mais velho, mais firme, mais imponente. Um estranho.
— Você é a Letícia? — ele perguntou, a voz grave, profunda, vibrando pelo corredor.
Meu coração tropeçou dentro do peito. Eu engoli em seco. — Sou… sou eu.
Ele me encarou em silêncio por alguns segundos. O olhar dele era pesado, intenso, como se sondasse tudo em mim de uma vez.
— Posso entrar? — disse.
Eu assenti, sem confiar na voz, e abri mais a porta.
Quando ele entrou, o ar pareceu mudar. O espaço do meu apartamento ficou menor, tomado pela presença dele. O cheiro masculino se misturou ao da vela acesa. Ele caminhou até o meio da sala com passos firmes, depois se voltou para mim.
— Então você é a Letícia dos bilhetes.
Senti o rosto em chamas.
— E você é… Vinícius.
Ele arqueou uma sobrancelha, quase surpreso.
— Sim. Mas… você está com uma cara de quem esperava outra pessoa.
As palavras me atingiram. Minha garganta secou.
— Eu… pensei que fosse você… o rapaz que vi no dia da mudança. Loiro, com fones…
Ele cruzou os braços diante do peito largo, suspirando.
— Esse é o meu irmão mais novo. Victor.
Por um instante, o mundo pareceu girar. A revelação caiu sobre mim como água gelada. O Victor, o loiro distraído, nunca tinha me respondido. Todos os bilhetes — todos — tinham vindo desse homem diante de mim.
Levei a mão à boca, tentando me recompor.
— Então… era você. Desde o início.
Ele assentiu, firme.
— Sempre fui eu. Eu pensei que você soubesse.
Meus pensamentos se atropelaram. Eu tinha criado uma imagem inteira, uma história dentro da minha cabeça, e agora tudo estava em pedaços. E, no entanto, o chão não tinha sumido debaixo dos meus pés. Pelo contrário: cada fibra do meu corpo parecia consciente da presença dele. A voz grave, o corpo imenso ocupando a sala, os olhos que me fitavam sem vacilar.
Confusão e desejo me consumiam ao mesmo tempo. Eu devia me sentir enganada, mas ele não tinha mentido em nenhum momento. Quem tinha inventado o rosto errado fui eu. E agora eu precisava lidar com a verdade: o Vinícius que me despia por dentro com palavras estava ali, de carne e osso, bem diante de mim.
Eu respirei fundo, tentando organizar a voz.
— Eu… não sei o que dizer.
Ele deu um passo mais perto.
— Então não diga nada.
Meu coração disparou. O silêncio entre nós parecia vivo, denso, como se tivesse corpo próprio. A vela tremulava sobre a mesa, espalhando sombras que se alongavam pelas paredes. Eu estava em pé diante dele, e tudo em mim gritava perguntas que não sabiam sair em voz alta.
Parte 4 — O Erro Irresistível
Vinícius me olhava firme, braços ainda cruzados. Parecia ler meu caos interior, mas esperava que eu mesma dissesse.
— Então… foi você o tempo todo — murmurei, como se ainda fosse difícil acreditar.
— Foi. — A voz grave dele não vacilou. — Desde o primeiro bilhete.
Senti minhas mãos tremerem.
— Eu… achei que fosse o seu irmão. O rapaz da mudança.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Victor. Eu percebi que você me descrevia como alguém mais jovem, mas pensei que fosse só fantasia sua. Nunca imaginei que você confundisse de verdade.
Baixei os olhos, envergonhada.
— Então eu estava me correspondendo com você, mas pensando em outro rosto.
— Você estava se correspondendo comigo. — Ele disse, firme, dando um passo à frente. — Tudo o que você sentiu, cada arrepio, cada desejo… fui eu quem provoquei. Não o Victor.
Levantei os olhos e o encarei. O peso daquelas palavras me acertou fundo. Ainda assim, a dúvida latejava.
— E como eu posso ter certeza? Como sei que é você quem me fez me sentir assim?
Um silêncio breve. Ele se aproximou mais, agora tão perto que eu podia sentir o calor que emanava de seu corpo. Seus olhos se fixaram nos meus, escuros, intensos.
— Porque só eu sei que você tem medo de não ser protagonista da própria vida. Só eu sei que você chora em finais felizes porque acredita que talvez nunca tenha o seu. Só eu sei que você sente ansiedade como se fosse atraso, quando na verdade é desejo querendo transbordar.
Minha respiração falhou. Cada frase dele era um eco direto dos bilhetes. Eu o reconheci não pelo rosto, mas pelas palavras que me despiram aos poucos, dia após dia.
— É você… — sussurrei, mais para mim do que para ele.
Ele assentiu devagar.
— Sempre fui eu.
Deixei o ar escapar num suspiro trêmulo. O coração batia tão forte que parecia querer escapar pela boca. Ele não era o garoto loiro da minha fantasia. Era o homem que me desarmou com frases que ninguém jamais me diria olhando nos olhos.
Ele ergueu a mão, hesitante pela primeira vez, e tocou de leve meu queixo, me obrigando a erguer o rosto para ele. O toque foi quente, firme, mas ao mesmo tempo delicado.
— Agora me diz, Letícia — a voz grave soou como provocação suave —, ainda quer ver meu rosto de perto?
Eu fechei os olhos por um instante, sentindo o calor da mão dele, e quando voltei a olhar, a resposta já estava em mim.
— Quero.
O sorriso dele foi mínimo, carregado de tensão. E então não havia mais espaço para dúvida.
Ele me puxou devagar, mas sem dar chance para que eu recuasse. Quando nossos lábios se tocaram, um arrepio percorreu meu corpo inteiro. O beijo começou contido, pesado de silêncio, mas logo explodiu em urgência. Minhas mãos foram aos ombros dele, firmes, sentindo a força sob a camiseta.
Ele aprofundou o beijo, quente, voraz, como se estivesse queimando dias de espera. Um gemido escapou da minha garganta, e ele respondeu pressionando meu corpo contra o dele, até que não restasse espaço entre nós.
O calor cresceu rápido, o ar rarefez. Ele me encostou na parede com firmeza, e o frio da superfície contrastou com o fogo que me consumia por dentro. O suor escorria pela minha pele, misturado ao dele, e cada toque era pura fome. Eu tremia, mas ainda tive forças para sussurrar:
— É a minha primeira vez.
Vinícius parou. Um segundo que pareceu um século. Seus olhos fixaram nos meus, a respiração pesada, o peito subindo e descendo. A mão grande acariciou meu rosto, o polegar passando pela minha boca entreaberta.
— Então vai ser a única vez que você nunca vai esquecer — prometeu, voz grave, firme, vibrando dentro de mim.
Assenti, e meu corpo se rendeu por inteiro.
Ele me pegou pela cintura, guiando-me até o sofá. Não me deitou de qualquer jeito — foi como se me oferecesse um altar, deitando-me com cuidado, o corpo dele cobrindo o meu. Beijou-me de novo, agora lento, explorando minha boca como se tivesse todo o tempo do mundo. Mas eu não tinha paciência; agarrei seus cabelos, puxei-o mais forte, e senti o riso abafado dele contra meus lábios.
Nossos corpos se ajustaram, e quando ele finalmente me penetrou, ofeguei alto, surpresa pela intensidade. Minhas unhas cravaram nas costas dele. Ele parou, atento, olhos presos nos meus.
— Está doendo?
Mordi o lábio, arqueei as costas, respirei fundo.
— Não… continua.
Ele obedeceu, devagar, compassado. O desconforto cedeu rápido, substituído por um calor que subia das pernas até o peito, pulsando em ondas. Meus gemidos começaram tímidos, mas logo ficaram altos, urgentes.
O ritmo dele aumentou, e cada estocada me fazia estremecer. O sofá rangia sob nós, e o som de pele contra pele preenchia a sala junto com nossas respirações curtas. Eu não sabia mais onde terminava e onde ele começava.
— Vinícius… — gemi, a voz falhando.
Ele mordeu meu pescoço, murmurando grave:
— Mais alto. Quero ouvir.
Obedeci, gritando seu nome, e o som me deixou ruborizada, mas também livre.
Ele me ergueu nos braços sem esforço, como se eu não pesasse nada, e me levou até a parede. Minhas pernas se enrolaram em torno dele, e quando voltou a me penetrar naquela posição, o choque me arrancou um gemido profundo, quase um choro. A parede fria atrás, o calor dele dentro, o corpo inteiro meu tremia.
O ritmo era bruto, animalesco, mas mesmo ali havia cuidado: a mão dele firme em minhas costas, sustentando-me, os olhos presos aos meus, como se me lembrasse de que eu estava segura.
— Você é minha agora — disse, voz rouca, quase um grunhido.
Meu corpo vibrou ao ouvi-lo.
— Sou sua… — gemi, e a palavra saiu como confissão e rendição ao mesmo tempo.
Ele me levou de volta ao sofá, me deitando de barriga para baixo, puxando minha cintura para si. O novo ângulo me arrancou gritos que ecoaram pelo quarto. O som era indecente, cru, mas não consegui me conter. Cada investida me empurrava para frente, minhas mãos agarrando as almofadas, minhas unhas rasgando o tecido.
— Isso… — sussurrei, quase chorando de prazer. — Não para.
O suor pingava de nós dois, o corpo dele deslizando sobre o meu, quente, escorregadio, desesperado. O cheiro era denso, mistura de pele, desejo, vela queimando.
Ele voltou a me virar de frente, descendo beijos pelo meu corpo, sugando meus seios, lambendo o suor da minha barriga. Eu arqueava sob ele, gemendo sem pudor, sentindo meu corpo se dissolver em prazer.
Quando voltou a me penetrar, já não havia hesitação. Eu o recebia inteira, sem medo, com fome. Minhas pernas abertas, minhas mãos puxando-o para mais fundo, meu corpo gritando pelo dele.
— Goza pra mim — murmurou contra minha boca, os olhos febris.
A frase foi o gatilho. O prazer explodiu dentro de mim, atravessando cada músculo, cada nervo, cada célula. Gritei alto, arqueando as costas, tremendo sob ele. O mundo sumiu, só restava a onda quente, interminável.
Ele veio logo depois, enterrando o rosto no meu pescoço, gemendo grave, animal, enquanto seu corpo inteiro estremecia. Senti o calor dele dentro de mim, o peso dele sobre mim, e pela primeira vez entendi o que era ser tomada por inteiro.
Caímos juntos, ofegantes, colados, suados. O silêncio voltou pesado, mas não vazio. Era cheio de nós, da intensidade que tínhamos derramado um no outro.
Ele ainda me segurava pela cintura, o corpo colado ao meu, a respiração dele misturada à minha.
— Foi especial? — perguntou, voz rouca, carregada de ternura que contrastava com a brutalidade do que acabara de acontecer.
Passei os dedos pelo rosto dele, sorrindo entre lágrimas de exaustão.
— Mais do que eu imaginei.
Ele beijou minha testa, lento, e naquele instante percebi: eu não tinha apenas perdido algo naquela noite. Eu tinha ganho um homem que me devorou com corpo e alma.
Parte 5 — O Depois
A sala estava mergulhada em silêncio, exceto pelo som das nossas respirações ainda ofegantes. O sofá rangia levemente sob o peso dos nossos corpos colados, suados, exaustos. Minha pele ardia, ainda vibrando, como se o calor de tudo que tinha acontecido permanecesse impregnado nos meus ossos.
Eu não conseguia mexer as mãos. Estavam trêmulas, presas à pele dele, como se temessem que, se eu soltasse, ele desapareceria.
Vinícius mantinha a mão firme em minha cintura, o polegar acariciando distraidamente a curva do meu quadril. O gesto era pequeno, mas carregado de algo que eu não sabia nomear — ternura, talvez, ou apenas o reflexo de uma intimidade que não deveria existir.
Nossos olhos se encontraram. Por alguns segundos, só isso: olhar dentro de olhar, como se estivéssemos lendo o que o outro não ousava dizer. Não havia pressa. Não havia desculpas. Só a certeza muda de que não tinha sido apenas físico.
Senti um nó se formar na garganta. Eu queria falar, mas qualquer palavra soaria pequena demais.
Ele quebrou o silêncio primeiro, a voz ainda rouca:
— Você está bem?
Assenti devagar, mordendo o lábio.
— Melhor do que bem. — Meu tom saiu baixo, quase tímido, mas carregado de verdade.
O olhar dele não vacilou. Havia intensidade ali, mas também um peso. Como se ele também soubesse que o que fizemos não deveria ter acontecido.
A vela sobre a mesa estava quase apagando, a chama vacilante, prestes a se extinguir. E, de alguma forma, aquela imagem parecia um reflexo exato do que nos envolvia: um calor prestes a ceder ao escuro, mas que tinha iluminado tudo de forma brutal enquanto ardia.
Vinícius se recostou no sofá, puxando-me para deitar sobre seu peito. O coração dele batia forte, descompassado, e eu fechei os olhos por um instante, ouvindo aquele som como se fosse uma melodia proibida.
Eu sabia. Sabia que nada seria igual depois daquela noite. Não havia como voltar atrás, não havia como fingir que não tinha acontecido. Eu tinha me entregado ao homem errado, e ainda assim tudo dentro de mim gritava que, de alguma forma, era exatamente isso que tinha que ser.
Abri os olhos e encarei o teto. A respiração ainda era pesada, mas já menos urgente. O silêncio entre nós não era desconfortável; era denso, carregado, vivo.
— Isso muda tudo — sussurrei, sem ter coragem de olhar para ele.
A mão dele apertou minha cintura com mais firmeza.
— Talvez mude. Talvez seja só o começo.
Aquelas palavras me atravessaram como uma promessa e uma ameaça ao mesmo tempo. O começo de quê? De algo impossível? De algo que eu não deveria sequer sonhar? Ou o começo da história que eu sempre busquei sem perceber?
Não respondi. Não havia resposta que coubesse ali. Apenas me aninhei mais contra o peito dele, ouvindo o coração que ainda batia forte.
Sabia que o amanhã traria dúvidas, complicações, talvez arrependimento. Mas, naquele instante, só havia a certeza crua de que eu não era mais a mesma. Eu tinha atravessado uma linha invisível.
E, quando finalmente adormeci nos braços dele, entendi: minha vida tinha mudado. Para sempre.
FIM
Autor: Fala, leitores mais safados desse Brasil! Pensando em quem acompanha o site mais pelo celular (como é o meu caso), estou adotando a separação por partes nos contos para evitar que o leitor se perca rolando a página, ou precise retomar a leitura em outro momento.
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Esse conto foi escrito do ponto de vista de Letícia. Logo publicarei a história no ponto de vista de Vinícius.
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