O internato - Capítulo 40

Categoria: Gay
Contém 3623 palavras
Data: 09/08/2025 12:54:31

⚠️ Aviso de conteúdo

Este capítulo contém cenas de violência e temas sensíveis que podem ser perturbadores para alguns leitores. Recomenda-se discrição. Se você for sensível a essas temáticas, considere pular esta parte da leitura.

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Capitulo 40 - Tensão

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Bernardo:

Ouvia vozes, mas não conseguia entender uma única palavra do que diziam. Sons confusos que se misturavam com sombras multicoloridas, que dançavam diante de mim, me deixando ainda mais desorientado e nauseado. Sentia algo quente e úmido escorrer pelo rosto, além de uma dor latejante que me impedia de pensar com clareza. O que estava acontecendo? — me perguntava, tentando levar as mãos até o rosto, mas era como se elas não existissem.

“Bernardo!” — alguém gritou ao longe. A voz aguda e desesperada era inconfundível. Théo? — pensei, ainda grogue. Olhei ao redor procurando meu amigo, mas só via sombras disformes se movendo rápido demais. Ainda assim, a visão começava a clarear. Pisquei algumas vezes, engolindo o enjoo que ameaçava subir pela garganta, e finalmente consegui ver o teto branco da sala, com pequenos spots embutidos no gesso. As mãos voltaram a responder, e estavam pressionando o lado direito do meu rosto, que ardia em dor.

Ergui uma delas e vi que estava suja de sangue. Era isso o que escorria: meu próprio sangue. Tudo voltava à mente aos poucos. Gustavo havia me acertado com o soco inglês. Eu lembrava. Lembrava da dor, da queda, da confusão.

Tentei me levantar, mas a dor era tão intensa que não resisti: vomitei no chão da sala. Uma mistura do bife que comi no almoço com sangue vindo da boca, ferida ao se chocar contra os dentes.

— Bernardo! — Théo correu até mim, me abraçando com força. Seu corpo tremia e ele estava pálido, o rosto lavado em lágrimas.

— O que… — tentei perguntar, mas a dor no rosto me calou.

Théo se afastou um pouco, e então vi Mirian sentada no chão, mais distante. Ela apertava o terço que sempre carregava no bolso, rezando baixinho enquanto chorava.

Olhei na direção onde, momentos antes, estava o corpo do Sr. Joaquim. Em vez dele, só restavam partes do crânio espalhadas e uma grande poça de sangue. Havia um rastro vermelho que levava até a janela da sala, agora aberta. A parede próxima estava manchada, como se o corpo tivesse sido arrastado.

— Ele jogou o porteiro da janela — Théo sussurrou, soluçando. — Foi horrível, Be…

Théo chorava como uma criança assustada. Nunca o vi tão vulnerável.

— Cala a boca, seu viadinho! — a voz de Gustavo veio atrás de nós, me fazendo gelar.

Olhei para trás e o vi sentado na poltrona branca da sala, segurando o soco inglês na mão direita e o revólver na esquerda. A arma apontava diretamente para nós. Ele estava ensanguentado — não apenas respingos, mas manchas grandes e vivas cobriam a camisa, os braços e até o pescoço. O louco havia realmente jogado o corpo do porteiro pela janela.

Ele sorriu para mim de um jeito frio, cruel. Era como se estivesse decidindo, com prazer, qual seria a forma mais eficiente de me matar: um tiro? Uma surra? Me atirar da sacada?

Pensei em correr, claro. Mas se foi por ainda estar tonto ou por não querer deixar Théo e Mirian, não sei. A verdade é que permaneci imóvel. O olhar de Gustavo deixava claro: se eu fizesse qualquer movimento, ele puxaria o gatilho.

O telefone da sala tocou. Todos se sobressaltaram. Théo apertou minha mão, e Mirian segurou o terço com ainda mais força. Gustavo se levantou da poltrona e foi até o aparelho ao lado da televisão, sem desviar os olhos de nós, a arma ainda firme apontada para minha cabeça. Atendeu com calma assustadora.

— Alô?… Sou eu sim — respondeu como se estivesse num dia qualquer. — O que eu quero é matar esse desgraçado que está fodendo o meu irmão — disse, me lançando um olhar carregado de ódio. — Eu sei que tem atiradores de elite nos prédios da frente e que vocês estão subindo… Sinceramente? Não me importo. Não pretendo sair vivo daqui — ele sorriu de maneira doentia. Théo fechou os olhos com força, apertando minha mão — Cansei de falar com você.

Gustavo desligou e veio até mim. Parou ao lado do meu vômito e me puxou pelos cabelos, me erguendo. Gritei de dor. Théo chorou ainda mais, desesperado.

— Solta ele! — Théo implorou, segurando na perna de Gustavo, que o afastou com uma joelhada no rosto.

— O que ele viu em você? — perguntou, olhando para mim com uma mistura de repulsa e curiosidade. — O que você tem de tão especial que fez ele me largar? — Seu olhar perdeu o foco. — Eu fiz tudo por ele! Matei aquele desgraçado que machucou ele, e ele fugiu de mim! O que você tem que eu não tenho?

— Sanidade — murmurei com dificuldade, a voz embargada. — E… pra sua informação… eu não sou namorado dele. Sou amigo.

— Mentira… — ele sussurrou. Então, com o soco inglês, acertou meu estômago com tanta força que voltei a ver aquelas sombras distorcidas.

— O… o namorado dele… tá lá fora… com ele… — consegui dizer, com gosto de sangue na boca.

Gustavo me atirou com força no chão. Minha cabeça bateu com violência, e em questão de segundos, tudo escureceu novamente.

...

Gabriel:

– O que está acontecendo? – Miguel indagou ao tenente Miranda. – O que ele disse?

O tenente olhou para Miguel com hesitação, como se buscasse uma forma mais branda de dizer aquilo que, no fundo, eu já sabia. Desde o momento em que Gustavo jogou o corpo do porteiro pela janela, estava claro o que ele pretendia. Aquilo não era só vingança. Ele sabia que jamais teria algo comigo. Gustavo estava ali para pôr um fim em tudo, mas queria me levar com ele — nem que fosse em pedaços.

– Ele disse que não tem intenção de sair vivo de lá – respondeu Miranda com seriedade.

– E o que estamos esperando, Miranda?! – Miguel se exaltou. – Invada aquele maldito apartamento! Tire o meu filho de lá!

– Não sabemos ao certo como está a situação lá dentro, Juiz Andrade – o tenente respondeu com a voz controlada. Era evidente, no entanto, que aquela calma era apenas uma fachada para a tensão que o consumia. – Se entrarmos à força, ele pode matar todos os reféns antes que consigamos impedir.

– Miguel! – Cristina surgiu abrindo caminho entre os curiosos e repórteres. – Eu vi tudo na televisão! Onde está o Bernardo, Miguel?! Cadê o nosso filho?! – Sua voz se quebrou no final, os olhos marejados. – Diz que ele está a salvo!

Ela desabou no momento em que o marido a envolveu num abraço apertado.

– Sinto muito, Cristina – ele respondeu, a voz embargada. – Nós vamos trazer nosso garoto de volta.

Embora tentasse manter a postura firme, Miguel estava tão abalado quanto ela. Bernardo já havia me contado que sua mãe lutou contra problemas psiquiátricos, agravados pelo alcoolismo, e que chegou a ser internada numa clínica de reabilitação. O temor de Miguel era evidente: que tudo aquilo a desestabilizasse novamente.

Meus olhos buscaram Daniel, que estava ao lado de Samuel — ele havia chegado logo depois do corpo do porteiro ter sido atirado do alto. O corpo agora jazia coberto por um lençol branco, estendido sobre a calçada ensanguentada em frente à entrada do prédio. Um homem inocente morto por minha causa. E se algo acontecesse a Mirian, Théo ou Bernardo... seria igualmente por minha culpa. Daniel e Samuel se abraçaram, tentando encontrar conforto um no outro. A força daquele laço fraternal entre eles me comoveu. Eu sabia que eram grandes amigos, mas não imaginava o quanto. Era o mesmo tipo de conexão que eu havia desenvolvido com Bernardo — profunda, verdadeira, impossível de ignorar.

– Gabriel! – uma voz doce me chamou de longe, arrancando-me de minha espiral de culpa. Ao me virar, lá estava ele: lindo, gracioso como sempre. O meu príncipe. Nick correu até mim e me abraçou com força, transmitindo uma paz que me desmontou por dentro.

– Graças a Deus você está bem – ele disse, chorando junto comigo.

"Graças a Deus?". Repeti mentalmente. Que ironia amarga... Eu era o responsável por aquilo tudo. Eu levei o assassino até ali. Foi minha presença que despertou o inferno. Eu deveria ter morrido naquela primeira tentativa de suicídio. Talvez assim tivesse impedido toda essa tragédia. Mas então... quem cuidaria do Pedrinho? Meu irmãozinho ainda estava ali, abraçado à minha cintura, entre mim e Nick. Ele era o motivo de tudo. Meu sopro de vida. E, sem mim, talvez também estivesse condenado.

– É tudo culpa minha... – sussurrei entre soluços no peito do meu namorado. – Tudo culpa minha...

– Não, Gabriel – Nick respondeu com firmeza. – Isso não é culpa sua.

E ali ficamos, os três, abraçados, por quase uma hora. Enquanto o cerco policial se apertava, tudo que restava a nós era o calor humano e a esperança.

...

Daniel:

– Comam alguma coisa – Fernanda sugeriu, já passava das quatro da manhã.

Minha irmã havia chegado com Guilherme por volta das dez da noite. Juntos, os dois convenceram Samuel e eu a nos afastarmos do prédio — e, consequentemente, de meu irmão e do meu namorado. Sacudi a cabeça em negação, sem tirar os olhos da enorme construção a uma quadra de distância. Samuel estava ao meu lado, igualmente silencioso.

– Vocês precisam comer algo – insistiu Guilherme, apontando para os hambúrgueres comprados numa lanchonete próxima.

– Não tô com fome – murmurei, a voz pesada.

Fernanda sentou-se ao meu lado no meio-fio e passou a mão nos meus cabelos dourados, tentando me transmitir algum tipo de segurança. Mas eu conhecia minha irmã bem demais para não notar que ela também estava morrendo de medo.

– Vai dar tudo certo, Dany – disse com um sorriso forçado. – Você conhece o Théo! Ele é forte. E Bernardo... pelo que sei, também é.

– E se não der certo?! – explodi. – E se aquele desgraçado atirar neles, Fernanda? Eu não vou suportar perder nenhum dos dois!

Virei o rosto para Samuel, que continuava encarando o prédio, como se esperasse que algo ali dissesse que tudo estava bem. Mas nada vinha. Cruzei o olhar com o carro de Miguel, onde Cristina estava sentada com a porta aberta. Pedrinho dormia em seu colo, e minha sogra mantinha os olhos fixos no nada, completamente absorta. No meio-fio, atrás do carro, Nick abraçava Gabriel. Era um gesto de consolo, de amor. Mas nada daquilo parecia justo. Meu irmão e meu namorado estavam pagando por algo que nem era culpa deles.

Era Gabriel quem deveria estar lá em cima. Que Deus me perdoe por pensar assim... mas era ele quem deveria morrer, não o Théo. Nem o Bernardo.

– Está quieto demais lá em cima – murmurou Samuel, quebrando o silêncio após horas calado.

Todos olharam para o prédio, que parecia uma massa silenciosa de concreto mergulhada na noite gelada.

– Era pra ser ele lá dentro – disse, deixando escapar em voz alta o pensamento que me corroía.

– Não era pra ser ninguém – Samuel retrucou, passando a mão pelos cabelos. – E não é culpa do Gabriel. Para com isso.

– Se ele não tivesse aparecido aqui, Théo e Bernardo estariam seguros! – gritei, a voz embargada pela raiva.

– Se acalma, Daniel – pediu Fernanda, tentando me conter.

– Deixa de ser babaca, cara! – Samuel se levantou bruscamente. – Ele só tava desesperado! Sem ter pra onde ir! Procurou o único amigo que tinha!

– Que se dane essa amizade! – respondi, levantando também, os punhos cerrados. Olhei direto para Gabriel, do outro lado da rua. – Se um dos dois morrer, eu juro que acabo com você!

– Já chega, Daniel! – Guilherme me puxou pelo braço – Você precisa descansar. Aqui, agora, não tem nada que você possa fazer.

– Eu não vou a lugar nenhum, Guilherme – falei firme, me soltando dele.

Caminhei pela rua em silêncio, ignorando o chamado de Fernanda atrás de mim.

– Deixa ele – ouvi Guilherme dizer a ela, e ela não insistiu.

Continuei andando até me afastar um quarteirão. Parei na esquina e fiquei observando o prédio, pronto para o pior. O porteiro... Deus, aquela cena ainda estava vívida na minha mente. Ver seu corpo caindo, o som seco do impacto... Foi a coisa mais brutal que já presenciei. E a qualquer instante, poderia ser Théo. Ou Bernardo.

– Você tem razão em dizer que a culpa é minha – a voz de Gabriel me pegou de surpresa. Ele se aproximou sem que eu percebesse. Eu estava tão fixado na sacada do apartamento que não notei sua chegada.

– Eu exagerei – reconheci, mesmo contrariado. – Não devia ter batido em você.

– Você estava desesperado – ele respondeu com serenidade. – Eu entendo esse sentimento. Conheço ele melhor do que gostaria.

Gabriel se sentou no meio-fio, e eu sentei ao lado dele. Ficamos um tempo ali, olhando o prédio. Pela primeira vez, eu o observei de verdade — não o garoto que causou tudo isso, mas o garoto que carregava nos olhos uma dor que poucos entendem. Um garoto que não tinha ninguém. Nenhuma família, nenhum lar, nenhuma perspectiva de futuro. E que, mesmo assim, se agarrou à única mão que achou que poderia salvá-lo.

– Me desculpa – falei, deixando que as lágrimas viessem – Por tudo que eu te disse... Eu tô desesperado, Gabriel. O Théo... e o Bernardo... eles são tudo pra mim.

– Eu entendo – ele murmurou. – Foi esse mesmo medo de perder quem eu amo que me trouxe até aqui. Eu não queria causar problemas. Só queria, por uma vez, me sentir seguro. Será que você consegue entender isso?

– Sim – respondi, ainda que não soubesse realmente o que era viver como ele viveu. Por mais que meu pai tivesse sido ausente e que eu tivesse passado por muita coisa, sempre tive para onde voltar. Sempre tive um lar. Amigos. Família. Gabriel... não tinha nada.

Ele estava prestes a dizer algo quando se levantou de repente, olhando fixamente para o prédio. Segui seu olhar, o coração na garganta.

...

Théo

– Não tô com saco pra negociar com ninguém! – Gustavo vociferou, me arrastando para a sacada por volta das quatro da manhã. – Só quero falar com meu irmão antes de tudo acabar!

O cano gelado do revólver pressionava minha têmpora direita, fazendo meu corpo suar frio. A arma estava destravada, pronta para disparar a qualquer segundo e apagar a minha vida. Olhei para baixo e vi uma enorme mancha de sangue no asfalto — provavelmente o ponto exato onde o corpo do porteiro havia caído. Várias viaturas cercavam o prédio e a multidão de curiosos aumentava desde que Gustavo me arrastara até aqui mais cedo.

– Não tem negociação nenhuma, Tenente! – Essa já era a quinta ligação do dia com tentativas da polícia para convencê-lo a nos soltar.

– Se entrega, Gustavo – Bernardo disse, ainda fraco. Ele havia acordado duas horas atrás, depois de desmaiar por causa da pancada que levou na cabeça. – Não vale a pena morrer à toa.

– Morrer à toa? – Gustavo desligou o telefone na cara do Tenente e me puxou de volta pra dentro. – Eu não tenho mais motivo nenhum pra viver! – Ele soltou uma gargalhada que arrepiava a espinha. – Perdi meu pai quando era criança, minha mãe foi assassinada, e meu irmão me odeia! – Sua risada ficava cada vez mais insana. – Minha vida já acabou faz tempo!

– Não, Gustavo – Bernardo disse com cuidado. – Você ainda tem uma vida inteira pela frente. Abaixa essa arma. Se entrega.

Ele tirou o revólver da minha cabeça e me empurrou com força. Caí de joelhos no chão, ofegante. Gustavo olhou para a arma como se estivesse hipnotizado.

– Eu já perdi tudo! – ele gritou, erguendo o braço e mirando em Mirian. Sem pensar, puxou o gatilho.

O som do disparo ecoou pela sala, me fazendo gritar de susto. Mirian soltou um berro de dor desesperador. Olhei, aterrorizado, e vi que o tiro havia atingido sua clavícula. Ela chorava de dor, e o sangue escorria rapidamente pela roupa.

– Desgraçado! – Bernardo gritou, arrastando-se até ela, tentando ajudá-la enquanto eu continuava paralisado, sem saber o que fazer.

O telefone tocou mais uma vez.

– Agora eu vou matar vocês. Mas antes quero que escutem o que a polícia tem pra dizer – disse ele, divertido, como se aquilo fosse um jogo. Atendeu no viva-voz. – Alô?

– Gustavo? – A voz do outro lado fez seu rosto mudar imediatamente. O sorriso sádico desapareceu num segundo.

– Gabriel? É você? – ele perguntou quase em prantos.

– Sou eu, sim – Gabriel respondeu com firmeza, mas com emoção na voz. – Irmão, se entrega. A gente pode voltar a ser como era antes. Só nós dois. Sem mentiras, sem mais ninguém. Não é isso que você quer?

– É... – Gustavo chorava. Suas mãos tremiam tanto que temi que o revólver disparasse de forma aleatória. – Mas agora é tarde, Gabriel. A polícia vai me levar. Vão me prender por ter matado o Jair... e o porteiro.

– Sim, vão – Gabriel disse com honestidade – Mas depois que você cumprir o que tiver que cumprir... a gente vai estar te esperando. Eu, você e o Pedrinho. Como uma família. Eu vou ser só seu.

– Vai mesmo? – ele perguntou, como uma criança carente.

– Vou, irmão. Eu prometo – Gabriel respondeu, agora nitidamente chorando. – Larga essa arma. Se entrega. Por mim.

Gustavo nos olhou, confuso, como se pela primeira vez estivesse realmente entendendo o que estava fazendo. Colocou a mão sobre a cabeça, abatido, e ficou alguns segundos em silêncio.

– Me desculpa, Gabriel... – murmurou, olhando para o revólver em suas mãos. – Mas eu passei do ponto. Não tem mais volta.

– Não, Gustavo! – Gabriel gritou desesperado no telefone.

Mas foi inútil.

Gustavo colocou a arma dentro da própria boca, apontando para cima, e apertou o gatilho....

O som do tiro foi tão seco, tão brutal, que parecia ter estourado dentro da minha cabeça.

Fechei os olhos com força. Não gritei, não chorei — não tinha mais força pra isso. Tudo em mim estava exausto. As mãos ainda tremiam, o coração batia como se quisesse rasgar meu peito e fugir dali.

Silêncio. Um silêncio aterrador. Nem a respiração de Bernardo eu ouvia mais.

Então, passos. Pesados. A porta do apartamento foi arrombada com um estrondo, e homens vestidos de preto, com capacetes e coletes à prova de balas, invadiram o local com gritos e armas apontadas em todas as direções.

Levantei as mãos automaticamente.

— Somos reféns! Somos reféns! — gritei com o pouco de voz que me restava, e senti um dos policiais me puxar com firmeza.

— Está tudo bem agora, garoto. Você está seguro.

Bernardo estava deitado no chão, os olhos abertos, ainda em estado de choque. Um segundo policial se aproximou dele, examinando seu rosto com cuidado. Vi os olhos do meu melhor amigo se encherem de lágrimas, mas ele não conseguia nem chorar direito. Estava anestesiado.

Mirian gemia de dor, pressionando o ferimento no ombro com o lençol rasgado que ela usava como curativo improvisado. Dois paramédicos correram até ela com uma maca.

E então, olhei pra ele. Gustavo. Caído no canto da sala, sangue escorrendo de sua boca e da cabeça caída para o lado. A arma ainda na mão. Um sorriso estranho no rosto. Como se, no fim, tivesse conseguido o que queria. Mas era só morte. Vazio. Loucura.

Quis vomitar. Mas não consegui. Quis chorar. Mas já tinha chorado demais.

— Vamos tirar vocês daqui — disse um dos policiais, me puxando pelo braço.

Descemos as escadas em silêncio. Os paramédicos carregavam Mirian logo atrás. Lá embaixo, o caos era absoluto — vi luzes, pessoas, vozes misturadas em um turbilhão.

Mas então, no meio de tudo aquilo... vi ele.

— Samuel — sussurrei, e no segundo seguinte ele correu até mim.

Caí nos braços dele como se o mundo estivesse acabando, e talvez estivesse mesmo. Mas naquele abraço, naquela mistura de desespero e amor, encontrei meu fôlego de novo. Meu chão. Minha vida.

— Eu tô aqui... eu tô aqui com você — ele repetia, e era tudo que eu precisava ouvir.

Fechei os olhos no colo dele. A sirene de uma ambulância soava ao longe. E pela primeira vez, em horas, senti que talvez... só talvez... eu ainda tivesse um amanhã.

...

– Acorda, Théo! – Samuel me sacudiu com delicadeza. – Você está tendo um pesadelo.

Despertei ofegante, o coração acelerado, o corpo suado. Mais uma vez, o mesmo sonho me assombrava: aquele momento em que uma arma esteve apontada para a minha cabeça. Três meses haviam se passado, mas as lembranças ainda estavam vívidas, gravadas na minha pele como cicatrizes invisíveis.

Levantei-me em silêncio e fui até o banheiro. Lavei o rosto com água fria, tentando afastar o medo. Encostei as mãos na pia e encarei meu reflexo no espelho. Lá estava eu: aquele garoto loiro, meio bagunçado, mas ainda de pé. Ainda vivo. E isso era o que importava.

Senti Samuel se aproximar por trás e envolver meus ombros com os braços. Seu corpo quente colado ao meu, o queixo encostado no meu ombro.

– Ainda sonha com aquilo? – ele perguntou com ternura.

Assenti com a cabeça. – Acho que sempre vou sonhar. Mas agora, acordo e vejo que estou aqui. Que estou com você.

Ele me virou de frente e nos encaramos no espelho. Havia carinho no olhar dele. Um carinho que me ancorava à realidade, que me trazia segurança e paz.

– Nunca mais vai acontecer de novo – ele sussurrou antes de me beijar com suavidade.

Respondemos ao beijo como se fosse o único no mundo. Um beijo que dizia tudo o que não cabia em palavras: amor, gratidão, alívio. Nos deitamos juntos, e ali, em meio a carícias lentas e olhares intensos, entregamo-nos um ao outro de maneira profunda, mas cheia de afeto.

A conexão entre nós ia além do físico. Era uma intimidade construída em cada gesto, em cada abraço apertado nas noites de medo, em cada promessa sussurrada no escuro.

– Eu te amo, Théo – ele disse, com a voz firme.

Sorri e o beijei de novo, sentindo meu coração enfim descansar. – Eu também te amo, Samuel. Com você, eu me sinto inteiro.

E naquela madrugada tranquila, após o terror vivido meses antes, adormecemos juntos. Dois corações marcados, mas curados pelo amorContinua...

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Comentários

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Em fim acho que o terror acabou. Será? Mas tem tantas pontas soltas. Tantas vidas em jogo. O que vai acontecer com o irmãozinho? Depois de tudo por que passou a última coisa que precisa é ir para um abrigo, vai ser mais dor e sofrimento. A saga é ótima e sua escrita é sensacional mas sinceramente tô sentindo falta das cenas de sexo entre os meninos, não aguento mais tanto terror e sangue. Desculpe, foi só um desabafo.

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Provavelmente o autor original optou por focar no drama. E eu concordo com ele já q não é legal descrever cenas de sexo com menores por mais que sejam fictícias

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