Mas antes que eu pudesse fazer algo, ouvi o som de uma descarga no banheiro da suíte. A porta se abriu, e Rafael saiu, completamente nu, o corpo definido brilhando com suor, o pau já duro, empinado para cima, mas balançando enquanto ele caminhava na direção das duas. Meu estômago embrulhou novamente. Naquela excitação do momento, do “flagra”, eu havia me esquecido completamente dele. Broxei de imediato! A excitação que eu sentia virou uma náusea que subiu pela garganta, quase encontrando saída em minha boca. Respirei fundo, me controlando, agora disposto a dar o “flagra” de verdade e transformar aquele espetáculo num show de horrores.
[CONTINUANDO]
Antes que eu assim o fizesse, Marina o puxou para um beijo quente, as línguas se misturando em um frenesi. Elisa, a minha Elisa, se juntou a eles, lambendo a boca de Elisa, enquanto Rafael beijava o pescoço de Marina. Os três se embolaram na cama, mãos e corpos entrelaçados, gemidos ecoando como uma ode à traição:
— Isso, Rafael, me beija... — Elisa gemeu, puxando-o mais para si, os olhos semicerrados de prazer: - Mas vamos ser rápidos, gente. O Tom pode desconfiar...
— Desconfia nada, Li. Ele tá lá distraído com a galera. — Rafael respondeu, rindo, enquanto suas mãos apertavam os seios de Elisa, e Marina chupava o pescoço dela: - Vamos aproveitar. Vocês duas estão com um fogo hoje que é uma delícia!
Uma raiva queimava em meu peito como fogo, dando-me mais certeza ainda de que intervir era o certo. Eu estava pronto para entrar, gritar, acabar com aquela cena, quando ouvi uma risada vinda do outro lado da suíte, um que eu não conseguia enxergar. Meu coração, já combalido, parou de vez. Uma sombra, uma imagem se materializou também sobre a cama: Lucas, o jogador de basquete. Ele também estava nu e com uma confiança que só podia vir do seu corpo alto, musculoso, negro, e com um pau descomunal, grande e grosso, que parecia impossível de existir de tão imponente. A cama rangeu à sua subida e Elisa, com um olhar de puro desejo, o puxou pelo pau, colocando-o de joelhos na frente dela. Eles se movimentaram sobre a cama e ela então agarrou o pau dele com as duas mãos, lambendo a cabeça, tentando engoli-lo, mas mal conseguindo colocar um quarto na boca tamanho era aquele falo. Seus lábios esticados, os olhos brilhando de tesão e uma fala que me desmoronou:
- Isso que é pau, não aquilo que tenho em casa...
— Caralho, Elisa, que boca gostosa. — Lucas grunhiu, segurando o cabelo loiro dela, guiando-a com firmeza.
Eu fiquei paralisado, o nojo se misturando com uma raiva que parecia explodir dentro de mim. Rafael ajeitou Elisa de quatro e passou fodê-la por trás, estocando com força, golpeando o corpo dela para a frente, enquanto ela chupava Lucas, a cabeça movendo-se ritmicamente, os gemidos abafados pelo pau na boca. Marina acariciava sua cabeça enquanto beijava o Lucas na boca. Os gemidos e as palavras de incentivo enchiam o quarto, uma cacofonia de prazer que retalhava meu coração em pedaços irrecuperáveis. Rafael e Lucas trocaram de lugar, e depois a levantaram, posicionando-a entre eles. Rafael metia na buceta dela, enquanto Lucas forçava a entrada no cu:
- Não! Assim não... Vocês vão me arregaçar! – Gritou Elisa, tentando se soltar deles.
Lucas lhe deu um tapa tão forte e que ecoou tão alto que temi que pudesse ter sido ouvido lá embaixo. Foi tão absurdamente inesperado e escandaloso que os quatro pararam por um instante e Elisa reclamou:
- Para, seu idiota! Quer chamar a atenção de todo mundo?
- Então, cala a boca e deixa eu te comer! – Disse o Lucas.
- Não! Se quiserem, a gente inverte e você vem por baixo. O Rafael, pelo menos, não vai me machucar.
- Porra! Valeu, hein? – Resmungou Rafael, rindo.
Eles trocaram de posição, com Elisa sentando no pau do Lucas e Rafael forçando a passagem por trás, lentamente, até que ela gritou, um misto de dor e prazer:
- Ai! Ai... Devagar, caralho! – Mas a resistência dela foi vencida aos poucos, talvez movida pelo tesão ou pela necessidade de acabar logo: — Mete tudo, Rafa! Vai... Fode! Mete que eu quero gozar forte. Vai, caralho!
— Isso, safada, aguenta os dois... — Rafael disse, estocando com força, enquanto Marina passava a esfregar a buceta na boca da Elisa, num frenesi digno de um filme pornô bem “hardcore”.
Eu não aguentei mais, mas ao invés de entrar e dar o flagra, decidi sumir. Deu um passo para trás, já pouco me importando se me ouviriam e saí tropeçando pelo corredor, a cabeça girando, o coração partido. Desci as escadas, ignorando as risadas, a música e alguém que pareceu ter falado o meu nome, e fui para a área externa. Peguei uma garrafa de vodca esquecida na mesa da varanda e me sentei numa espreguiçadeira bem longe de tudo e todos, encarando o vale escuro à minha frente. Bebi direto no gargalo, o álcool queimando minha garganta, não um golinho, mas quase meia garrafa, mas não consegui apagar a imagem que se repetia na minha mente, a da minha esposa, perdida entre três corpos, gemendo como eu nunca vi antes. Eu me sentia traído, humilhado, mas a pior parte foi a excitação inicial que ainda ecoava, uma vergonha que me fazia odiar a mim mesmo.
Não sei quanto tempo fiquei ali, afogando-me em vodca e mágoa. O céu estava escuro, as estrelas sumiram, talvez envergonhadas de mim. Meus olhos estavam injetados, o rosto abatido, o coração pesado com uma mistura de ódio e decepção. Foi quando Iara, a escritora do grupo, que estava fumando não muito longe, me viu. Ela estava sozinha, com um copo de vinho e o cigarro na mão, o cabelo preto solto caindo até a cintura, os olhos castanhos cheios de preocupação:
— Tom, tá tudo bem? Você tá com uma cara horrível! — Ela disse, sentando ao meu lado na espreguiçadeira ao lado.
Eu não respondi, nem olhei para ela, na verdade. Meu rosto, os olhos vermelhos, o semblante destruído, se ela me olhasse com atenção, eles falavam por mim. E ela deve ter olhado mesmo, tanto que tocou o meu ombro, com cuidado:
— O que aconteceu, Tom? Pode falar comigo... — Ela insistiu, a voz suave, mas firme.
— Só... me deixa, Iara. Tô precisando ficar sozinho. Pra sempre, eu acho... — Murmurei, virando outro baita gole de vodca, a garrafa já próxima do quarto final.
Ela hesitou, os olhos me estudando como se tentasse ler um livro em outra língua:
— Tá... Tá bom! Mas se precisar conversar, eu tô aqui, certo? Me chama que eu venho. — Ela disse, levantando-se e voltando para a casa.
Eu continuei bebendo, o álcool entorpecendo minha mente, mas não meu coração. A imagem de Elisa com Rafael, Marina e Lucas girava na minha cabeça como um filme que eu não conseguia pausar. Cada gemido, cada toque, cada palavra que ela disse era uma facada. Eu imaginava o que poderia ter feito diferente. Deveria ter entrado no quarto, gritado, parado tudo? Deveria ter desconfiado do Rafael antes, do jeito que ele olhava para ela? Ou da Marina, que sempre parecia ser mais amiga do que aparentava ser? Minha confiança cega em Elisa, na nossa amizade com a turma, me levou a esse abismo.
Cerca de 20 minutos depois, ou talvez uma hora, o tempo parecia borrado pelo álcool, ouvi vários passos vindo na minha direção, correndo, tropeçando. Era Elisa. Ela vinha tropeçando, o vestido verde desalinhado, o cabelo loiro bagunçado, os olhos vermelhos de choro e o rosto banhado em lágrimas. Ela caiu de joelhos na minha frente, as mãos tremendo, sem saber se me tocava ou não:
— Tom, meu Deus, o que... o que você tem? – Perguntou, mas claramente já sabendo a resposta.
Eu a olhei, a garrafa de vodca ainda na mão, e virei outro gole monumental, quase secando o líquido restante:
— Como você pôde, Elisa? — Perguntei, a voz rouca, quase um sussurro.
Talvez ela ainda tivesse alguma esperança de que eu não tivesse visto o que vi. Talvez... Mas ali, naquelas poucas palavras, essa certeza caiu por terra:
— A Iara me encontrou, me contou que te viu assim, que você tava destruído. Eu... Eu não...
- Não vai me dizer que não é nada do que eu estava pensando, né? Essa é manjada demais! – A interrompi, virando o restante da vodca e jogando a garrafa no vale, pois, na minha mão, talvez servisse de arma: - Eu vi, sua biscate dos infernos! Eu vi você trepando igual uma puta com aqueles... aqueles... filhos da puta também.
Horrorizada... Essa é a melhor definição da cara que ela me fez. Tentou esconder a boca com as mãos, os olhos transbordando em lágrimas, os olhos inundados de arrependimento, ou decepção consigo mesma por ter sido flagrada:
- Eu... não sei o que tava pensando, amor. A bebida, a... o... “ecstasy” que o Rafa me deu, o jogo... Sei lá! Eu... Eu... me perdi, amor. Me perdoa, pelo amor de Deus! — Ela disse, soluçando, tentando segurar minha mão, mas lhe dei um tapa.
— “Ecstasy”? Sério, Elisa!? Essa é a sua desculpinha pra transar com três pessoas? Com nossos amigos? — Retruquei, a raiva subindo, misturada com o álcool que queimava minhas veias: - Aliás, amigos não, né? Todos uns bons filhos da puta, traidores do caralho, talaricos do inferno.
— Tom, por favor... Não é desculpa. Eu errei, eu sei que errei. Vamos tentar resolver isso conversando, só nós dois. Não precisamos colocar mais ninguém no meio disso. — Ela implorou, o rosto molhado de lágrimas: - Eu te amo, você é tudo pra mim. Eu não sei o que aconteceu, eu não era eu mesma
— Mas não quero mesmo colocar mais ninguém no meio, mesmo porque o meio é o seu lugar, né, queridinha? – Ela arregalou os olhos e eu continuei: - Ééééé... É isso aí! Eu vi você lá, servindo de recheio para aqueles dois e vou te contar... que fome que você tem, hein? Um embaixo, outro atrás e ainda chupando a Marina. Porra...
Comecei a bater palmas para ela, jocosamente é óbvio, querendo humilhá-la mesmo:
- Amor, por favor... – Ela pediu novamente, escondendo o rosto com as mãos.
- Você gritava de prazer com eles, Elisa. Pedia pra eles meterem mais. Eu vi tudo, caralho! — Falei, a voz tremendo, os olhos fixos nos dela: - Porra! Nem puta profissional acho que teria o seu desempenho. Você deveria pensar em mudar de carreira: atriz pornô de filme pesado. Acho que você se daria super bem...
Ela tentou segurar na minha mão novamente, mas eu a puxei e me levantei porque me passou uma ideia louca de soca-la ali mesmo, na frente de todos. Vi Carol e Iara se aproximarem, mas também ficarem a meia distância. Então vi, ao fundo, um pequeno grupo na porta da varanda nos assistindo e vi mais! Vi o Rafael e o Lucas assistindo todo o nosso espetáculo ainda de dentro da casa. Não resisti:
- Há! Era só quem faltava chegar... – Apontei para os dois e comecei a bater palmas novamente: - Vem cá! Vem pra cá, Rafael. Traz o Lucas também. Afinal, esse momento do casal não seria possível sem vocês, aliás, vocês e a piranha da Marina...
- Meu Deus, Tom, para! – Pediu Elisa, com o rosto escondido nas mãos e chorando mais alto: - Meu Deus, Tom, eu não queria te machucar. Foi a porra daquela droga, a tequila, o calor do momento... Foi tudo! Eu juro, eu nunca quis isso.
— Foda-se! – Falei calmamente e repeti, um pouco mais alto: - FO-DA-SE! Foda-se o que você quer. Foda-se o que você fez. Foda-se o que você queria fazer ou construir comigo. Enfim, FO-DA-SE, Elisa.
Caminhei até a casa, mas Rafael já vinha ao meu encontro, as mãos levantadas e unidas como se numa prece:
- Tom, irmão...
Segui andando até ele que me olhava, uma mistura de preocupação, decepção, medo, ironia. Sei lá! Ele também podia se foder que não me faria diferença:
- Irmão, eu... não sei o que você viu, mas não teve importância alguma, cara. Foi só coisa de momento, uma besteira. Você não vai acabar com anos de amizade por um deslize meu, não...
Não ouvi mais nada. A mão que já vinha coçando de vontade de bater em alguém desde a minha última “conversa” com Elisa, se fechou de repente e voou sem prévio aviso na direção do nariz dele. Foi um único soco, mas foi “o soco”, tão forte e bem dado que ele deu dois passos para trás e caiu dentro da piscina, manchando a água imediatamente com sangue. Não aguentei:
- Esse fica por conta de você ter comido o cu da piranha da minha mulher, seu filho da puta. Aliás, mulher não, ex! Taí!? Se quiser comer ela agora, fica à vontade.
- Tom!? PARA! Poxa... – Resmungou Elisa ainda de onde estava.
Voltei a andar na direção da casa, acariciando a minha mão que agora doía um pouco. Lucas havia sumido. Apesar do tamanho, era um banana, um inseguro, sempre foi, desde criança. Peguei as chaves do carro, ignorando os olhares de pena dos poucos que ainda estavam na varanda e daqueles que fingiam não se divertir com o caos alheio. Dois ou três tentaram me demover da intenção de sair, afinal, eu havia bebido pra caramba, mas quem seria louco de tentar me segurar?
Desesperada, Elisa começou a dar um verdadeiro show, chorando, gritando, correndo atrás de mim e se jogando ao chão aos meus pés, agarrada à minha perna, num verdadeiro show de horrores. Marina se aproximou, tentando conversar, mas eu a enxotei antes da primeira palavra, ousando eu nos termos mais chulos possíveis. Enfim, Carol e Iara se aproximaram e conseguiram fazer Elisa me soltar. Entrei no carro rapidamente, trancando-o, dando a partida e saindo com os pneus cantando. Pelo retrovisor, ainda vir vários dos amigos correndo atrás do carro, mas eu já saía do sítio.
Não consegui rodar mais do que alguns quilômetros, porque um dos pneus furou. Desci chutando tudo o que via pela minha frente. Antes que eu pudesse tirar o estepe do porta-malas um carro parou atrás do meu, do qual desceram Thiago, Carol e Bruno:
- Pode parar, Tom. Você não vai a lugar algum. – Disse a Carol.
- Há! E quem vai me impedir? – Falei sem sequer a olhar.
- Cara... Se for mesmo necessário, eu mesmo. – Disse o Thiago.
Olhei para ele e o vi, como sempre, todo sério, compenetrado, provavelmente pronto para tentar me segurar à força. Eu não estava à fim de conversar e fui sincero:
- Gente, só quero ir embora. Não quero, nem vou ficar na mesma casa que aquela biscate. Ninguém merece passar pelo que eu passei.
- Tomás, olha só... Eu não sei direito o que aconteceu, mas já entendi que foi algo muito sério e que envolveu o Rafael, o Lucas e a Marina. Mas eu, aliás, a gente, não quer que você sofra um acidente e se machuque por causa da cagada dos outros. Volta com a gente. A gente arruma um canto só para você. Isso! Se preferir, você fica sozinho e descansa. Amanhã, quando o efeito do álcool passar, você vai embora. – Disse a Carol.
- Não vai rolar... – Resmunguei, voltando a puxar o estepe para fora.
- Vamos fazer diferente então... – Disse o Thiago, colocando uma mão sobre a minha: - Deixa o carro aí. O Bruno e a Carol trocam o pneu e levam ele de volta para o sítio. Eu vou te levar até um hotel ou pousada na cidade aqui perto. A gente fica lá e você descansa.
Olhei para ele e parei por um instante, afinal, a proposta era viável. Carol e Bruno concordaram reforçaram a proposta, apenas alterando para que a Carol, a psicóloga me levasse, e eu concordei. Saí com ela no carro deles e fomos nos hospedar numa pousada simples na cidade próxima:
- Tom, se você quiser conversar... – Falou ela.
Tom ficou em silêncio, os olhos fixos na janela do carro enquanto Carol dirigia em direção à cidade. A noite parecia mais escura do que de costume, como se o universo inteiro compartilhasse da escuridão que engolia seu coração. Carol, com sua formação em psicologia, sabia que aquele não era o momento de forçar uma conversa profunda, mas também não podia deixar Tom se afogar em seus pensamentos. Ela optou por uma abordagem suave, plantando uma semente para reflexão futura:
— Tom, sei que agora tudo parece um caos, mas às vezes a gente precisa de um tempo pra processar. Não precisa decidir nada hoje, tá? Só... deixa a poeira baixar. — Ela disse, mantendo a voz calma, quase maternal: - Ah, e tenha em mente que você não é culpado de nada do que aconteceu. Tudo, simplesmente tudo o que aconteceu, foi uma escolha deles, nada causado por você.
Tom não respondeu, apenas resmungou algo ininteligível, o rosto rígido, os punhos cerrados no colo. A imagem de Elisa com aqueles falsos amigos ainda pulsava em sua mente, cada detalhe gravado como uma tatuagem feita em brasa na carne que ele não supunha ser capaz de apagar. A traição não era apenas física; era uma violação da confiança que ele depositara não só em Elisa, mas em todo o grupo que considerava sua família aumentada. Ele se sentia um idiota, um arquiteto que não viu as rachaduras na fundação do próprio casamento.
Na pousada, Carol ajudou Tom a se instalar num quarto simples, com uma cama simples, uma cômoda de madeira e uma janela que dava para um quintal com árvores apáticas. Ela ficou alguns minutos, garantindo que ele tivesse água e que não faria nenhuma besteira. Antes de sair, ela deixou um conselho:
— Tom, amanhã é outro dia. Tenta dormir, mesmo que pareça impossível. E se precisar de mim, é só chamar. Vou estar no quarto ao lado.
Ele apenas acenou com a cabeça, um sorriso triste nos lábios de gratidão pela preocupação, mas tudo sem olhar nos olhos dela. Quando Carol fechou a porta, Tom se sentou perdido na beirada da cama, o corpo pesado, a mente exausta. Ele não chorou, não se sentia capaz; a raiva ainda era maior que a tristeza. Pegou o celular, olhou a tela cheia de notificações: mensagens de Elisa, de Rafael, de outros amigos, amigas, chamadas perdidas, várias, áudios e mais áudios que ele não teve coragem ou vontade de ouvir. Desligou o aparelho e o jogou na cômoda. O silêncio do quarto era opressivo, mas preferível ao barulho da traição que ecoava em sua cabeça.
Na manhã seguinte, o sol invadiu o quarto com uma luz cruel, destacando as olheiras de Tom, que mal dormiu. Ele se sentia mal, apático, um verdadeiro zumbi, um morto-vivo. Sem vontade de mais nada na vida, ele apenas se deixou ficar. Mas foi interrompido tempos depois por insistentes batidas na porta. Era Carol, querendo saber do amigo. Ele a atendeu e ela o obrigou a tomar um banho frio para tentar limpar a névoa do álcool e da raiva. Desceram logo depois para tomarem o café da manhã da pousada. Carol o olhava gentilmente, mas com uma preocupação inegável:
— Conseguiu dormir, Tom? — Ela perguntou, enquanto soprava uma xícara de café.
— Um pouco... — Mentiu Tom, pegando uma fatia de pão, com manteiga e uma xícara de café preto.
- Ela... A Elisa ligou ontem para mim. Queria saber de você... – Tom a encarou, incomodado com aquele nome: “Elisa”, o que Carol entendeu de imediato: - Mas eu não falei nada. Apenas disse que você estava bem e descansando.
Apesar de Tom não querer ouvir falar no nome da esposa, uma curiosidade, quase mórbida o tomou:
- Ela... falou alguma coisa? Tentou justificar o que fez?
- Não, Tom. Ela apenas parecia muito nervosa e bastante arrependida. Eu preferi não aprofundar o assunto, mesmo porque o meu interesse era de ajudar você agora, e não ela.
Tom balançou afirmativamente a cabeça, entendendo as boas intenções da amiga:
— E agora, Carol? O que eu faço com essa merda toda?
Carol respirou fundo, escolhendo as palavras com cuidado. Como psicóloga, ela sabia que Tom estava em um estado de choque emocional, com a autoestima abalada e a confiança destruída. Ela decidiu usar uma abordagem centrada na empatia e na validação dos sentimentos dele, sem forçar soluções imediatas:
— Tom, o que você tá sentindo agora é completamente justificado e válido. Você foi traído, e não só por Elisa, mas por pessoas que você considerava amigos, todos gozando de uma certa confiança sua, em escalas diferentes, é claro. Isso é uma ferida profunda e não vai cicatrizar da noite pro dia. Mas o que você precisa agora é se dar espaço pra sentir isso, sem se culpar. Não foi algo que você causou. Você... não tem... culpa... de nada! – Ela frisou, pausadamente.
— Mas eu devia ter visto, Carol. — Ele interrompeu, a voz carregada de amargura: — Sempre há sinais, fumaça... Porra! Eu confiava nela cegamente. Achava que éramos perfeitos. Eu... Eu morreria por ela! Que idiota eu fui...
— Não, Tom, você não foi idiota! Você amava, confiava, acreditava no que vocês construíram. Isso não é fraqueza, meu amigo, é humanidade. A traição foi uma escolha dela, não um reflexo do seu valor. — Carol falou com firmeza, mantendo o contato visual para reforçar suas palavras: — O que você precisa agora é decidir como quer lidar com isso. Mas não hoje, nem nessa semana, mas aos poucos. Quer conversar com ela? Quer espaço? Quer buscar ajuda profissional pra processar isso? Essas são decisões que você precisa tomar, entende?
Tom balançou a cabeça, olhando para o café que esfriava na xícara:
— Não sei, Carol. Só sei que não consigo olhar pra ela agora. Não depois do que eu vi. E aquelas palavras... — Ele parou, engolindo em seco, uma lágrima chegando a escorrer pela face: — Ela disse coisas que não saem da minha cabeça. Que o que ela tinha comigo não era suficiente. Como eu supero isso?
— Você não supera de uma vez, Tom. É um processo. Mas você vai superar. Eu te conheço, amigo. — Carol respondeu, com um tom que misturava paciência e autoridade: — O que ela disse no calor do momento, sob efeito de álcool, drogas, ou sei lá o quê, não define a verdade do seu relacionamento, nem mesmo o que ela pensa de você. Mas define a dor que você tá sentindo agora. E essa dor precisa ser externada e ouvida, não engolida.
- Cara, não me conformo... Ela chegou a falar mal do meu pau para o Lucas enquanto chupava ele. Porra, meu, que... – Tom suspirou fundo, mas não conseguiu evitar o palavrão: - Que caralho!...
- Tom, ela estava envolvida no momento. O que ela disse, independentemente de estar alcoolizada ou drogada, só reflete o que ela queria naquele momento que era manter o parceiro dela excitado. É uma resposta quase instintiva do ser humano. Hoje, você não entende, mas conforme sua cabeça esfriar, as ideias começarão a fazer mais sentido. Acredite em mim...
Tom assentiu, mas não disse mais nada. O café da manhã seguiu em silêncio, com Carol respeitando o espaço dele. Depois, ela sugeriu que voltassem para a cidade, para que Tom pudesse estar em um ambiente familiar, longe da casa de campo e das memórias daquele fim de semana. Ele concordou, ainda sem saber como enfrentaria os próximos dias. Carol ligou para André e explicou a situação, dizendo que levaria o Tom e pedindo que depois trouxessem suas coisas. Elisa tentou falar com o marido, mas Tom se recusou a ouvi-la. A viagem foi de um silêncio sepulcral. Carol e Tom trocaram poucas palavras, mas as que ela lhe disse, sempre incentivadoras, serviram para lhe trazer alguma paz.
De volta à cidade, Tom foi para o apartamento que dividia com Elisa, mas não conseguiu entrar. A ideia de ver os objetos que construíram juntos, o sofá onde assistiam filmes, a mesa onde planejavam o futuro, a cama onde se amavam, era insuportável. Carol a seu lado, era um apoio constante e graças a ela, ele entrou, mas apenas para pegar algumas roupas, o laptop, enfim, apenas o essencial para existir, e foi para um hotel próximo ao seu escritório. Carol insistiu para que ele ficasse com ela por alguns dias, mas Tom recusou, dizendo precisar de solidão para reorganizar os pensamentos.
Nos dias seguintes, ele se afundou no trabalho, restaurando um casarão do século XVIII com uma obsessão que beirava o desespero. Cada traço no papel, cada cálculo estrutural, era uma tentativa de reconstruir não apenas o prédio, mas a si mesmo. Ele passava horas no escritório, evitando o mundo exterior, mas as noites eram um tormento. Sonhava com Elisa, com os gemidos dela, com os corpos de Rafael, Lucas e Marina entrelaçados, acordando suado, com o coração disparado e uma raiva que parecia queimar suas entranhas. O ódio não era apenas por Elisa, mas pelos amigos — ou melhor, ex-amigos — que ele considerava família. Rafael, com seu sorriso galanteador; Lucas, com sua falsa timidez; Marina, com sua energia manipuladora. Eles haviam traído não só seu casamento, mas sua confiança, sua história, sua dignidade.
Elisa tentava contato insistentemente: mensagens, e-mails, uma carta escrita à mão deixada no escritório. Tom ignorou tudo, mas guardou a carta, sem coragem de abri-la. O ódio pelos amigos, no entanto, era mais visceral. Ele imaginava confrontos, socos, humilhações públicas. Em seus piores momentos, fantasiava vinganças elaboradas: expor Rafael em seu círculo profissional, quebrar o joelho de Lucas para acabar com sua carreira, revelar Marina como a instigadora em suas redes sociais de influenciadora. Mas essas fantasias, embora momentaneamente satisfatórias, o deixavam vazio, como se o ódio fosse um veneno que ele mesmo bebia. Ou será que beber o veneno, em doses pequenas, seria a melhor forma de resolver aqueles "problemas"?
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