LEIS E DESEJOS (Edição Ampliada e Revisada) {PARTE 1}

Da série LEIS E DESEJOS
Um conto erótico de JP
Categoria: Heterossexual
Contém 6610 palavras
Data: 16/06/2025 21:41:23
Assuntos: Heterossexual

⚠️ AVISO DE ATUALIZAÇÃO ⚠️

Este conto foi revisado e ampliado, trazendo uma narrativa ainda mais envolvente e um mergulho mais profundo nos conflitos internos do personagem principal. A história continua carregada de desejo, intensidade e escolhas difíceis, agora com mais camadas e detalhes para quem gosta de sentir o drama junto com o prazer.

Olá, me chamo João Pedro, mas todo mundo me chama de JP. Tenho 1,83, sou negro, gordinho, cabelo raspado e olhos castanhos. Não me considero bonito — nunca fui desses que atraem olhares por onde passam — mas sempre ouvi que tenho meu charme. Um sorriso tímido, um jeito meio desajeitado que, às vezes, funciona mais do que eu imagino.

Quando fiz dezenove, deixei o interior e fui pra capital. Passei numa prova difícil, consegui uma bolsa numa das faculdades mais disputadas de Direito. Na mala, eu trouxe mais medo do que roupas. E comigo, um celular Nokia tijolão, velho e arranhado, que tinha ganhado do meu tio, só pra poder falar com a família. Não sabia o que me esperava ali. Tudo era novo, e eu não podia negar que aquele lugar parecia outro mundo — bem diferente de onde fui criado: uma família evangélica tradicional, de igreja rígida, cheia de regras e cobranças. Isso só me fazia me sentir ainda mais deslocado.

Fiquei num dormitório pequeno, duas camas, uma mesa de estudos capenga e pouca privacidade. Meu colega de quarto era o oposto de mim: alto, bonito, confiante — aquele tipo que chegava numa festa e não demorava cinco minutos pra uma garota grudar nele. Eu? Bem, eu era mais silêncio do que presença.

A gente até se dava bem no começo. Ele me arrastava pra sair, insistia pra eu me soltar. E, numa dessas noites em que venci a vergonha, acabei me surpreendendo: beijei uma garota bonita. Duas, na verdade. Mas, mesmo ali no meio da bagunça, das luzes e da música alta, não consegui afastar a sensação de que aquele não era o meu lugar. Era tudo novo demais. E estranho demais pra quem tinha passado a vida inteira dentro de igreja.

Naqueles primeiros meses, tudo parecia meio fora do lugar. Eu tentava me adaptar, tentava entrar no ritmo da cidade grande, mas tinha sempre aquela voz lá no fundo dizendo que eu não pertencia àquilo. Meu colega, por outro lado, parecia ter nascido ali. As conversas dele, as roupas, a postura... Tudo nele gritava segurança. Eu assistia tudo de fora, como quem olha uma festa pelo vidro e não sabe se deve entrar ou voltar pra casa.

Mas com o tempo as coisas começaram a desandar. Eu era muito dedicado aos estudos e ele, nem tanto. Quase todas as noites, levava garotas para o nosso quarto — o cheiro de perfume barato invadia o ambiente, o barulho da cama rangendo abafava meus pensamentos e atrapalhava meu foco. Sempre que eu tentava conversar com ele sobre isso, ele só ria e dizia:

— Você é muito bobo, cara. — balançava a cabeça, rindo. — Fica aí se matando de estudar, enquanto a vida tá passando.

— Não é isso. Só queria dormir e estudar em paz.

— Dormir e estudar… — ele cuspiu as palavras. — Vai pagar de santo agora? Para com essa pose. Tu se acha melhor do que a gente, né? Só porque lê dois livros?

— Não me acho melhor que ninguém. Só quero respeito.

— Respeito o caralho. — ele me olhou feio. — A vida não vai esperar você não, irmão. Vai continuar aí se escondendo atrás desses livros? Depois não adianta chorar.

— Quem vive se escondendo é você, atrás dessas festas baratas e dessas meninas que você nem sabe o nome. Eu pelo menos sei o que tô fazendo da minha vida. Você pode rir o quanto quiser.

Demorei um pouco para fazer amigos, mas acabei me enturmando com algumas pessoas da minha sala.

Alguns meses depois, um dos professores me indicou para um estágio não obrigatório e remunerado em um grande escritório de advocacia. O marido dele era um dos sócios. Era o maior escritório da capital.

Eu nem tinha roupa pra aquilo. Minhas camisas já estavam velhas e desbotadas — aquelas que a gente ganhava, usadas e cheias de história, mas sempre longe de ser nova. A maior parte das peças no meu guarda-roupa vinha assim, de alguém que não precisava mais, um jeito de driblar a falta de grana. Foi então que esse professor — Paulo — se ofereceu pra me levar ao shopping e comprar algumas roupas melhores. Fiquei meio sem graça, mas acabei aceitando mesmo assim.

Foi nesse dia que conheci o marido dele, Sávio. Os dois andavam de mãos dadas pelo shopping, conversando baixo, trocando olhares tranquilos. Não era preconceito nem choque, mas era estranho pra mim. Não era o tipo de cena que eu costumava ver na minha cidade, criada no meio da igreja, onde essas coisas eram sempre evitadas, se não mesmo condenadas. Por mais que eles fossem discretos, aquele gesto simples de andar de mãos dadas, se beijar de leve... pra mim, aquilo ainda não fazia parte da minha realidade. Naquele momento, percebi que estava mesmo em um mundo diferente.

Enquanto a gente andava pela loja, Sávio me olhou e sorriu, percebendo meu jeito meio travado:

— Ei, relaxa, não precisa ficar assim não. A gente já passou por muito pra chegar aqui. Todo mundo precisa de uma força no começo, pode crer.

Eu dei um sorriso tímido, meio sem jeito.

— É, no começo tudo é meio estranho, né? — Paulo completou, ajeitando uma camisa na arara. — Eu mesmo só consegui chegar até aqui porque um professor me estendeu a mão. Agora faço questão de fazer o mesmo. A vida é assim: quem recebe ajuda, ajuda o próximo.

Sávio assentiu.

— Estamos aqui para te ajudar. Se precisar de qualquer coisa, é só falar.

Eu olhei pros dois e senti que aquela proposta era sincera. Ainda que tudo ali fosse diferente do que eu conhecia, tinha um calor humano que eu não esperava encontrar.

A partir daquele dia, os dois passaram a cuidar de mim como se eu fosse um filho. Sempre perguntavam se eu estava precisando de alguma coisa, ligavam pra saber se eu tinha comido direito e me convidavam pra almoçar nos fins de semana. Aquilo foi me dando uma sensação estranha e boa ao mesmo tempo: era como se eu estivesse sendo adotado por um novo mundo.

Comecei no escritório e, logo, peguei o jeito. No início, tudo parecia estranho — não só pelos sons e cheiros típicos de um lugar assim, mas principalmente pelo ambiente em si: o escritório era chique, muito diferente do que eu estava acostumado. As pessoas andavam impecavelmente vestidas, com roupas de marca, salto alto que ecoava pelo piso de granito polido, enquanto a luz do teto iluminava o ambiente de forma impecável. Era um mundo à parte, quase inacessível para alguém como eu.

O som constante dos telefones tocando, as conversas apressadas nos corredores, o cheiro forte de café fresco misturado ao perfume caro das advogadas. Os estagiários andavam sempre com pastas e pilhas de processos debaixo do braço. A princípio, eu me sentia deslocado ali, como se aquele lugar fosse um mundo muito distante do meu.

Mas, aos poucos, fui entendendo como as coisas funcionavam. O salário não era muito, mas cada pequena tarefa que eu conseguia resolver sozinho parecia uma vitória. Um dia, uma advogada me elogiou por ter organizado um processo complicado, e aquilo fez meu peito encher de um orgulho contido. Trabalhava durante o dia e ia para a faculdade à noite, quase sem tempo pra nada além de estudar e tentar sobreviver.

Um tempo depois, um amigo da turma, que sabia que eu não me dava bem com meu colega de quarto, me ofereceu um cômodo nos fundos da casa da avó dele. Essa senhora tinha três quartinhos no fundo da casa que ela alugava barato para universitários, e um deles tinha acabado de vagar. Aceitei sem pensar duas vezes.

O quarto não era grande, mas, quando entrei pela primeira vez, senti um alívio só por saber que teria um espaço só meu. Já vinha mobiliado com uma cama de casal meio torta, um frigobar antigo, um sofá de dois lugares que afundava no meio e um fogão velho e pequeno, daqueles de acampamento. As paredes estavam lascadas, descascando em alguns cantos, e as cortinas, rasgadas e desbotadas pelo sol, balançavam preguiçosas quando batia um vento. O colchão tinha marcas de uso, e o cheiro do ambiente misturava mofo leve com sabão em pó barato. O banheiro ficava do lado de fora, no quintal, e era compartilhado com outros estudantes. Não era perto da faculdade nem do escritório, mas aceitei na hora. Eu queria sair dali o quanto antes, e a faculdade e o escritório forneciam passe de ônibus.

Foi nesse lugar que comecei a me sentir, finalmente, um pouco mais dono da minha própria vida. As noites eram silenciosas, e pela primeira vez em meses eu conseguia estudar sem ser interrompido por vozes altas, risadas forçadas ou perfume barato impregnando o quarto.

Um dia, precisei chegar mais tarde no escritório porque fui entregar uns documentos para um cliente. Quando voltei, por volta das dez da manhã, o som familiar do elevador se abrindo foi substituído por um burburinho abafado. Assim que dobrei o corredor, vi que uma das salas, que até então estava vazia, estava cheia de gente trocando os móveis. As mesas antigas encostadas num canto, os novos móveis sendo trazidos em carrinhos de ferro, embalados em plástico. Não dei muita importância.

Coloquei minha mochila na cadeira e fui até a copa tomar um café. Assim que entrei, dei de cara com Sávio, o marido do meu professor — que também era meu orientador. Ele estava encostado na pia, mexendo no celular com um semblante fechado, como quem já começou o dia do avesso.

— Bom dia, JP. — falou sem nem erguer o olhar direito.

— Bom dia, doutor. — respondi, tentando disfarçar o nervosismo.

— Toma teu café sossegado. Depois passa lá na minha sala.

O tom era estranho, meio frio. Acenei com a cabeça e fui me servir. O café era forte, encorpado, do tipo caro, como tudo ali. Tomei ali mesmo, encostado na bancada da copa. Não conseguia parar de pensar naquilo. “Passe na minha sala” nunca vinha seguido de coisa boa. A tensão dele estava estampada, e eu sentia aquilo escorrendo pra dentro de mim feito água gelada pela espinha.

Terminei o copo em poucos goles e fui até a sala dele. Sávio me viu pela janela de vidro e fez um gesto curto com a mão:

— Entra. Senta aí que já falo contigo.

Obedeci. Ele estava de costas pra mim, andando de um lado pro outro com o telefone colado na orelha, a voz baixa, mas carregada de irritação contida.

— Tá, mas por que tem que ser ele, com tanto estagiário aqui?

Meu estômago embrulhou. Não precisava ser gênio pra saber que estavam falando de mim.

— Vocês que sabem, mas fiquem sabendo que é contra a minha vontade. — E desligou o telefone com um estalo seco.

Ele respirou fundo antes de virar na minha direção. A tensão ainda estava ali, no maxilar travado, mas agora tinha um olhar quase triste.

Na hora pensei: Droga. Agora que aluguei o quarto, vou ser mandado embora.

Ele puxou a cadeira e sentou na minha frente, apoiando os cotovelos nos joelhos.

— Você viu a movimentação no escritório hoje cedo, né? Estava ciente de que iria entrar um novo sócio?

— Sim, ouvi alguns comentários. — respondi, seco.

— Você já deve ter ouvido falar da doutora Solange, né?

— Sim, sim senhor, já ouvi falar — respondi.

— E provavelmente não foram coisas boas, né?

— Não, nada boas.

Ele suspirou e apoiou as mãos na cabeça, coçando os cabelos curtos com os dedos.

— Pois é... é ela que vai vir pro escritório.

E eu conhecia bem a fama dela. Solange era um nome conhecido na faculdade e nos corredores da Justiça. Uma das melhores advogadas do Brasil, com fama de imbatível nos tribunais. Gente que transformava processo em espetáculo. Nenhum funcionário parava com ela, muito menos os estagiários. Era conhecida como Iceberg: fria, rígida e sem paciência para quem estivesse no caminho.

— Os sócios fizeram uma reunião e decidiram que, por você ser o melhor estagiário do escritório, você será o estagiário dela. Eu fui contra — disse, encarando o chão por um instante. — Mas fui voto vencido.

Fiquei parado, sem reação. Só senti medo, insegurança, uma apreensão que parecia crescer no peito a cada segundo. Trabalhar com Solange não era só um desafio — era um risco, uma ameaça velada que fazia meu coração disparar. Eu não sabia se conseguiria lidar com aquilo. Não havia orgulho, nem esperança, só um nó apertado de ansiedade e dúvidas.

Ele respirou fundo, o olhar carregado.

— JP, você sabe que eu e o Paulo te conhecemos há poucos meses, já temos um carinho enorme por você, e peço desculpas, mas não deu mesmo pra te livrar dessa.

Balancei a cabeça devagar, engolindo seco, mas sem conseguir fingir segurança.

—Que isso, doutor? Não precisa pedir desculpas. Eu também... sinto um carinho enorme por vocês.

Ele assentiu, com o semblante pesado.

E ali, naquela sala toda cheia de vidro, móveis caros e aquele cheiro discreto de madeira encerada, eu entendi: minha vida estava prestes a virar de cabeça pra baixo.

Aquela semana escapou pelos meus dedos. Quando percebi, já era sexta-feira. No fim de semana, até tentei sair com os amigos para esvaziar a cabeça, mas não adiantou. Risadas, conversas, música — tudo parecia distante. Minha mente só conseguia girar em torno de um pensamento: como seria trabalhar com a doutora Solange?

No domingo à noite, me joguei na cama cedo, na esperança de descansar. Vã tentativa. Rolei pro lado, rolei pro outro, virei o travesseiro e nada. O sono não vinha, e a inquietação só aumentava.

De repente, a ansiedade veio como um peso invisível no peito, me esmagando devagar, como se um bloco de concreto tivesse sido colocado ali. Quanto mais eu tentava puxar o ar, menos conseguia. O quarto parecia encolher ao meu redor. Levantei no susto, abri a porta e fui pro quintal. Fiquei ali, parado no batente, tentando respirar. A brisa da rua era fraca, mas bateu no meu rosto como um alívio. Mesmo assim, o peito continuava travado, o coração acelerado, o gosto amargo na boca. As mãos tremiam, o suor frio escorria pelas costas, e parecia que a qualquer momento eu ia cair no chão.

Depois de um tempo ali fora, respirando fundo, consegui melhorar um pouco. A respiração foi voltando aos poucos ao ritmo normal. Então voltei pro quarto, ainda meio trêmulo.

Sentei na beirada da cama e peguei meu celular — um daqueles antigos, pesados, com tela minúscula. Naquela época, celular não era como hoje; servia mais pra ligação e mensagem, e o máximo de diversão que tinha era o jogo da cobrinha. Fiquei ali, encarando a tela verde, vendo a cobrinha crescer e bater nas bordas, tentando me distrair daquele sufoco. Mas não adiantava. Era como tentar tampar um buraco enorme com fita adesiva.

Aquela noite demorou pra passar.

Voltei para a cama e tentei dormir novamente, mas não consegui. Quando o relógio marcou quatro e meia, desisti e levantei. Tomei um banho frio, escolhi a melhor roupa que tinha e saí.

As ruas ainda estavam meio adormecidas, carregando aquele cheiro fresco de madrugada misturado com o perfume das árvores molhadas pelo sereno.

No ponto de ônibus, o silêncio era estranho, quase cúmplice. O primeiro ônibus passou lotado, cheio de gente indo trabalhar cedo demais, por volta das cinco e cinco da manhã. Esperei o próximo, que passou cerca de quinze minutos depois, às cinco e vinte. Fiquei quieto, sentindo o frio das mãos nos bolsos. A viagem até o centro durou cerca de uma hora e meia.

Quando desci em frente ao prédio do escritório, eram por volta das seis e cinquenta da manhã. Fiquei um tempo batendo papo com o porteiro — conversa fiada só para espantar o nervosismo. Depois pedi a chave e subi.

Entrei no escritório. Tudo escuro, vazio e silencioso, o eco dos meus passos preenchendo o ambiente. Acendi as luzes devagar, como quem não quer incomodar o lugar.

Fui até minha mesa, ajeitei as pastas, abri um livro de Direito Penal e tentei estudar. Mas a cabeça não ajudava — insistia em vagar por outros caminhos, como se tivesse vida própria.

Aquela ansiedade estranha começou a crescer de novo, quente no peito, formigando nos dedos. Antes que me engolisse inteiro, levantei e fui até a sala dela. Liguei os computadores, alinhei as cadeiras, organizei uns papéis que nem precisavam estar ali. Cada gesto meu era uma tentativa de me encaixar ali, sem saber direito como.

Voltei para a minha mesa. Olhos nas páginas, mente longe. Os dedos tamborilando de leve na madeira, como quem não sabe o que fazer com as próprias mãos enquanto espera o inevitável bater à porta.

Eram quase oito horas quando ouvi o elevador. Achei que fosse algum funcionário chegando cedo, mas o som seco de salto alto ecoando pelo corredor me fez virar a cabeça. A copeira era sempre a primeira a chegar — e ela não usava salto.

A mulher mais bonita que eu já tinha visto na vida. Mas não era só beleza. Era força. Poder.

Caminhava como quem sabia o impacto que causava — e não pedia licença pra passar. Os saltos batiam ritmados no chão, cada passo marcando território, como se o corredor inteiro fosse dela.

Loira. Alta. Uns quarenta e cinco anos, talvez mais, talvez menos. Idade ali era detalhe. O que importava era a presença. Um corpo bonito, quadris largos embalados por uma saia preta justa, uma blusa branca leve e um blazer preto por cima. Cabelos longos, lisos, caindo sobre os ombros com um certo descuido calculado.

Mas o que realmente paralisava era o olhar. Olhos verdes, frios, analíticos, como se medissem tudo ao redor — inclusive eu.

O perfume, discreto e caro, chegou antes da voz. Bonita. Poderosa. Intocável.

E eu ali, pequeno, preso entre o desejo e o medo.

O som dos saltos parou na minha frente. Ela me olhou por um segundo longo demais.

— Bom dia. — Não foi cumprimento. Foi quase um aviso.

Engoli seco. Um calor subiu pelo meu pescoço e pareceu que as orelhas iam pegar fogo. O peso no peito apertou.

— B-b-bo-bom dia... — falei, gaguejando.

Ela arqueou uma sobrancelha, como quem já esperava a gagueira.

— Solange. — Apenas isso. Nome e sentença.

— JP. Prazer. — Tentei sorrir, mas o sorriso morreu no caminho.

— JP? — Ela repetiu como quem experimenta um gosto estranho. — Isso é apelido?

Engoli em seco de novo.

— João Pedro.

Ela fez um aceno mínimo de aprovação, quase imperceptível.

— Melhor. No trabalho, uso somente nomes.

Olhou ao redor com os olhos analíticos, como quem avalia o terreno.

— Minha sala.

Não era pedido.

Virei de costas e fui na frente, ouvindo os passos dela atrás de mim como se estivesse sendo escoltado. Quando abri a porta, ela entrou primeiro. Natural. Aquela mulher entraria primeiro em qualquer lugar do mundo.

Nem olhou muito ao redor. Tirou a bolsa do ombro, colocou sobre a mesa, abriu o zíper e começou a puxar pastas como quem desarma uma bomba com pressa.

— Sente-se. — Sem me encarar.

Obedeci.

— Essas são as pastas dos meus clientes. Vermelhas: importantes. Pretas: muito importantes. Brancas: VIP. — Ela falava como quem recita uma receita decorada e sem paciência. — Se alguma dessas pessoas das pastas brancas me ligar ou mandar mensagem, você me avisa. Não importa o que estiver fazendo. Me avise.

Peguei a pasta, mas percebi que minhas mãos tremiam. Tentei disfarçar, apertando a capa com força demais. Ela notou. Sempre notava. Sempre olhava quando eu gaguejava, tremia ou hesitava, como quem estivesse avaliando um produto antes de decidir se compra ou joga fora.

— Trabalhei muito tempo sozinha. E gosto disso. Mas o Sávio e os sócios gostam muito de você. Não me deram opção. Eles elogiaram muito, mas elogio, pra mim, não significa nada. Prefiro competência. Prefiro entrega. — Só então me encarou nos olhos. Direto. Firme. — Entendeu?

Engoli em seco. A cadeira onde eu estava afundava um pouco sob meu peso, e me peguei ajustando a postura, tentando me encaixar melhor no encosto.

— S-sim… — gaguejei.

Ela continuou me encarando. Sem sorriso, sem expressão. Só aquela análise fria, como quem procura rachaduras em parede recém-pintada.

— Alguma dúvida?

Balancei a cabeça devagar, tentando conter a respiração curta, percebendo tarde demais que estava mordendo a parte interna da bochecha.

— N-não.

Ela inclinou a cabeça um pouco, olhos fixos, estudando. Eu só assentia, sentindo o nó na garganta crescer, o suor começando a escorrer pela nuca, as pernas bambas tentando se firmar.

— Me prove útil, João Pedro. Se vacilar, eu mesma vou cuidar para que sua carreira acabe antes mesmo de começar. Faço questão de destruir seu nome por aqui.

Fechou uma das pastas com um estalo seco.

— Toda segunda-feira tem reunião dos sócios. Não preciso repetir que você deve me avisar, certo?

— C-certo — respondi baixo, com a voz quase trêmula.

— Ótimo. Por enquanto, é só. Se eu precisar, chamo. Não bata na minha porta sem necessidade. Odeio interrupções burras.

Levantei devagar, tentando parecer calmo, mas as mãos frias denunciavam o contrário. Antes de sair, ainda ouvi a última estocada:

— E, se vai trabalhar comigo, pare de tremer. Aqui não tem espaço pra estagiário assustado.

Fechei a porta, engolindo seco.

O escritório já começava a ganhar movimento, mas aquilo parecia distante. Cada passo até o banheiro foi uma luta. As pernas bambas, a respiração curta. O peito parecia apertado por dentro, como se alguém estivesse me afogando com as próprias mãos.

Me apoiei na pia e lavei o rosto com pressa, sem nem sentir a água direito. Levantei o rosto devagar e encarei o reflexo no espelho. Quem era aquele ali? Um estagiário? Um moleque? Um fracasso?

Na minha cabeça, passou um filme: a carreira despencando, Solange destruindo meu nome, eu voltando pro interior com a vergonha pesada no peito, os amigos, a família, todos sabendo que eu não consegui. O medo apertou ainda mais.

O som da torneira batendo no fundo da pia parecia alto demais, irritante. Ou talvez fosse meu coração batendo nos ouvidos. Ou os dois. O mundo inteiro parecia abafado, longe. Só eu ali, trancado comigo mesmo.

E se alguém entrasse ali e me visse daquele jeito? E se eu desmaiasse ali, molhado, patético? E se ela tivesse razão e eu fosse mesmo só um moleque assustado, fora do lugar?

Foi quando vi Sávio pelo espelho. Ele já vinha atrás de mim desde o corredor. Abriu a porta devagar, sem alarde, como quem entra pra cuidar de alguém caído. Não disse nada de imediato — só encostou ali, me deixando respirar.

— Garoto… — disse, baixo, firme, do jeito que só quem gosta de verdade consegue dizer. — Respira. Não precisa ter vergonha disso. Acontece. Mas você não vai desistir agora, certo?

Neguei com a cabeça, mas a garganta travada mal deixava o ar entrar.

Ele ficou ali, comigo. Não como colega. Não como advogado. Como família. Me deixando puxar o ar devagar, sem me apressar. Ficou até as mãos pararem de tremer. Até o peito soltar aos poucos. Até o mundo voltar pro lugar.

Quando consegui, ainda que meio torto por dentro, agradeci com um sorriso fraco. Ele só assentiu, sem precisar dizer mais nada.

Mas, antes de sair, soltou baixo:

— Relaxa. Ela é assim mesmo. Fria feito madrugada em junho. Mas trabalha como ninguém. E, ó… se ela não te quisesse ali, você já saberia. Confia. Voltei pra minha mesa.

Aquele dia passou arrastado e acelerado ao mesmo tempo. Um turbilhão. Ela me chamou na sala dela algumas vezes ao longo do dia — sempre do mesmo jeito: fria, direta. Toda vez que eu saía, era com o coração acelerado, as mãos suando frio e as pernas meio bambas, como se o chão fosse falhar a qualquer momento.

No fim da tarde, quando o relógio bateu 17h30, ela falou meu nome — “João” — e fez um sinal com a mão pelo vidro. Levantei devagar e fui.

Entrei devagar. Ela estava de pé, junto à janela, olhando a rua lá embaixo. Só virou o rosto quando a porta se fechou.

— Percebi que você estava nervoso o dia inteiro, né? — disse, seca. — Aqui eu não quero saber de nervosismo. Aqui eu quero trabalho bem-feito. Não tem espaço pra fraqueza. Só pra resultado.

Fiquei ali parado, tentando decifrar se aquilo era ameaça, conselho ou só mais uma amostra de quem ela era.

— Até amanhã. — Finalizou, já desviando o olhar, como quem desliga uma máquina.

Assenti em silêncio e saí.

Peguei minhas coisas e fui direto para o banheiro dos sócios — um banheiro grande, de mármore, cheiroso, com água quente e toalhas brancas cuidadosamente dobradas em prateleiras de madeira. Recebi a chave dele como um privilégio raro, já que morava longe e precisava me ajeitar antes das aulas na faculdade. Chegando lá, tirei a camisa social e tomei um banho demorado, tentando lavar junto o resto da ansiedade que ainda grudava em mim.

Depois passei na copa. A moça da copa sempre deixava meu lanche separado num pratinho, coberto por filme plástico. Ela me tratava bem desde o primeiro dia — talvez pelo meu jeito tímido, talvez por pena.

Saí dali e segui caminhando até a faculdade, quatro quarteirões que pareciam um intervalo entre dois mundos: o escritório dos engravatados e o campus cheio de jovens cansados, tentando fingir que estavam animados para estudar à noite.

Quando cheguei, já vi meus amigos de sempre sentados em uma das mesas da cantina externa, livros abertos, cadernos espalhados, refrigerante dividido por três copos plásticos.

Sentei com eles, tentando entrar no ritmo, mas minha cabeça ainda estava naquela sala de blazer preto e olhos frios. Ainda sentia o cheiro do perfume dela nas narinas, grudado em algum canto da memória. Meu corpo ainda tremia, como se a tensão estivesse grudada na pele. Era como se a carne por dentro estivesse vibrando devagar, pesada, difícil de controlar.

A conversa seguia solta, risadas, brincadeiras, um tentando explicar a matéria pro outro.

Até que ouvi uma voz gritando meu nome:

— JP, seu gostoso!

Olhei e era a Rafa — colega com quem eu ficava de vez em quando. Tinha minha idade, era negra, gordinha, com 1,58m de altura que realçavam sua presença marcante. Os olhos castanhos profundos sempre transmitiam uma mistura de doçura e fogo. O cabelo era crespo, Black Power, preto com as pontas pintadas de loiro, cheio de vida e orgulho, deixando ainda mais bonita a mulher negra que ela era. Tinha seios grandes, fartos, que se destacavam mesmo com roupas simples, e um bundão que chamava atenção em qualquer lugar, balanceando com uma postura confiante e cheia de charme.

Ela veio até mim, me deu um selinho rápido, se juntou à roda e voltamos a estudar até dar a hora da prova.

Depois da prova, ela já estava me esperando, sentada num banco no pátio da faculdade.

Como era dia de prova, a maioria só aparecia pra fazer a prova e ir embora. Eu entrei, fiz a minha e saí logo depois.

Ela já estava me esperando no pátio da faculdade. Quando me viu, abriu um sorriso e veio até mim, balançando o quadril, daquele jeito dela. Me deu um selinho rápido e ficou ali perto.

— JP, a galera vai tomar uma no posto de gasolina, bora? — falou, sorrindo.

— Acho que não… tô quebrado. — Passei a mão na nuca, cansado. — Hoje foi meu primeiro dia com a nova supervisora.

Ela franziu a testa, curiosa.

— Como assim? Você trocou de supervisor? Não era o marido do professor?

— Era. — Suspirei fundo. — Mas entrou uma sócia nova no escritório e eu fui escolhido pra ser estagiário dela. E você não vai acreditar quem é.

— Quem é, garoto? Não me deixa ansiosa! — Ela bateu na minha perna, animada.

— A Iceberg.

Ela arregalou os olhos, animada.

— O quê? Não acredito!

Assenti, meio rindo, meio cansado.

— Pois é.

— Cara, é meu sonho conhecer essa mulher. Ela é uma inspiração pra mim, mesmo tendo a fama que tem. Mas e aí, como ela é de verdade?

Demorei um pouco pra responder. Passei a mão na calça.

— Fria. Fria do jeito que falam. — Respirei fundo. — Tô tremendo até agora. Juro, tô com um medo do caralho... Com a fama dela, pode acabar com minha carreira antes de começar.

Rafa encostou no meu ombro e me olhou com aquele cuidado e cumplicidade que só quem gosta de verdade consegue ter.

— Você tá muito tenso. Vem sair com a gente, vai fazer bem.

Não tava com muita vontade, mas acabei aceitando. Quando chegamos lá, pedimos umas bebidas. Aquilo ajudou a distrair a cabeça. Mas, por volta das 22h30, levantei pra ir embora.

Na hora que me levantei, Rafa puxou meu braço.

— Onde você vai, JP? — perguntou, franzindo a testa.

— Tenho que ir.

— Ah, não... — fez um biquinho, quase emburrada. — Você nem ficou muito.

— Eu sei. Mas amanhã tenho que entrar mais cedo. Se eu perder o busão das onze, tô ferrado.

Ela segurou minha mão, apertando de leve.

— Fica, vai. Por favor — pediu, baixinho, olhando pra mim daquele jeito que eu já conhecia.

— Não posso.

— Larga de ser chato, menino. Eu te levo depois.

— Fica fora de mão pra você.

— E daí? — deu de ombros. — Senta aqui.

— Você é chata demais, sabia? — falei, rindo.

— E você é bobo — ela respondeu, sorrindo também, mordendo de leve o canto do lábio.

— Tá… mas não vou ficar muito.

Sentei de novo. Voltei a beber e conversar com o pessoal. Foi aí que senti a mão dela descendo pela minha coxa, por baixo da mesa. Quando olhei, ela tava com aquele sorriso malicioso, de quem sabia exatamente o que tava fazendo. O tipo de sorriso que me desmontava.

Retribuí o sorriso, pisquei e levei minha mão até a coxa dela também. Como estava de vestido, comecei a subir devagar por debaixo do tecido, sentindo a pele quente, arrepiada.

De repente, ela se levantou.

— Vamos, JP.

— Ué, não queria que eu ficasse mais?

— Lembrei que tenho que levantar cedo amanhã.

— Sei... — respondi, rindo de canto.

Levantei também, nos despedimos da galera e fomos até o carro dela no pátio do posto. Assim que chegamos, ela veio até mim com aquele olhar de quem já sabia o que queria.

— Você é muito safado, sabia?

— Eu não só sei... como também sei te deixar louca de tesão.

Nos beijamos com vontade. A língua dela tinha gosto de cerveja e urgência. Apertei a bunda dela com força, subindo a mão até os seios fartos. Ela apertou meu pau por cima da calça, devagar, sentindo ele crescer na mão dela.

Quando meu pau ficou duro na mão dela, ela parou, apertando mais forte, e me encarou com aquele olhar sujo que ela sabia fazer tão bem.

— Viu? Eu também sei te deixar louco. — A voz saiu baixa, rouca, carregada de provocação.

Ela abriu o carro, e entramos. Ligou o motor, mas eu já descia a mão pela coxa dela, devagar, sentindo o calor subir por baixo daquele vestido. Fui puxando o tecido com calma, só pra expor mais pele. Passei a mão por baixo, arranhando de leve a parte interna da coxa, sentindo os pelinhos finos e a pele arrepiada. Ela soltou um gemido baixo e me lançou um olhar carregado de tesão, mordendo o lábio com força.

Cheguei perto da buceta, acariciando por cima da calcinha. A quentura ali era quase agressiva, como se o corpo dela estivesse em brasa. Outro gemido escapou e ela deu uma leve desviada no volante.

— Ei… presta atenção no trânsito — falei, rindo de canto.

— Você que não presta, seu safado — sussurrou, quase mordendo as palavras.

— Quer que eu pare?

— Não! Nem fode!

Continuei devagar, só provocando. Puxei a calcinha pro lado, e o calor veio de vez. Passei os dedos pela pele molhada, quente, quase escorregando. Ela estremeceu e soltou outro gemido, mais alto dessa vez. Quando toquei o clitóris, devagar, fazendo círculos, ela apertou o volante com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos.

De repente, jogou o carro pra uma rua escura e parou, respirando pesado. Abaixou o banco com um gesto rápido, abriu as pernas e me olhou com os olhos brilhando.

— Resolve isso logo, JP. Agora.

Não pensei duas vezes. Acariciei de novo, agora com mais firmeza, sentindo a umidade escorrer pelos meus dedos. Molhada. Muito molhada. Deslizei até o clitóris de novo, fazendo movimentos circulares, aumentando a velocidade.

— Isso… bem aí… assim… não para! — Ela puxou o vestido pra cima com pressa, como quem não aguentava mais nenhuma camada entre nós.

— Tá gostando, né, sua safada?

— Sim! Me faz gozar, porra!

— Seu pedido é uma ordem.

Ela segurava meu pulso com força, como se quisesse me colar ali pra sempre. As unhas cravadas no meu braço, a respiração descompassada. As pernas começaram a tremer, e um gemido mais alto escapou, abafado pela mordida que ela deu nos próprios lábios.

— Isso… tô gozando… porra… JP… caralho!

Senti as contrações vindo em ondas, a buceta pulsando nos meus dedos. O líquido quente escorreu pelas coxas, molhando o banco. Ela jogou a cabeça pra trás, os cabelos desgrenhados, a boca aberta, tentando buscar o ar que o prazer tinha levado.

Quando os tremores foram passando, ela me puxou pela gola da camisa e grudou a boca na minha, me beijando com urgência, como quem quer devorar.

No impulso, abriu minha calça, enfiou a mão por dentro e colocou a cueca de lado. Meu pau tava duro, pulsando, quente.

Começou devagar, só a ponta dos dedos acariciando, subindo e descendo pelo comprimento. Depois foi acelerando, a mão quente e úmida, deslizando com o gozo dela ainda nos dedos.

— Isso… — gemi baixinho, fechando os olhos — não para…

— Tá gostando, né, safado?

— Tô quase… continua…

Ela apertou mais forte, aumentando o ritmo.

— Goza pra mim, JP. Quero ver essa porra toda.

— Assim… isso… porra… — murmurei entre os dentes, o corpo inteiro tenso.

Gozei forte, sentindo o jato quente espirrar na mão dela, na calça, até na lateral da porta. Ela olhou pra mim e riu daquele jeito sacana, lambendo devagar os próprios dedos, como quem saboreia uma vitória.

Depois abriu o porta-luvas, pegou um lenço umedecido, limpou a mão com calma, depois limpou meu pau, me ajudou a ajeitar a cueca e a calça. Tudo devagar, sem pressa, como quem não queria que aquilo acabasse.

Quando terminou, me olhou de novo, com aquele sorriso de canto.

— Melhor carona que eu já dei na vida.

Silêncio.

Foi aí que bateu.

O vazio veio como um soco no estômago. Não era nem culpa direito. Era um peso, uma raiva de mim mesmo. Eu sentia o corpo leve, mas a cabeça pesada. Parecia que tava sujo por dentro.

Fiquei encarando o painel do carro. Ela ligou o motor, começou a dirigir. Fomos conversando coisas bobas. Mas eu já não tava ali direito.

Enquanto ela falava, minha cabeça foi longe. Pensei nas meninas da igreja da minha cidade. As do interior eram diferentes. Mais quietas. Mais certinhas. Puritanas. Meninas de saia longa, que mal olhavam nos olhos da gente. Até as que não eram tão santas assim tinham um jeito diferente. Mais medo. Mais culpa.

Rafa era outra coisa. Evangélica também, mas da cidade. Bebia, falava palavrão, sentava no banco da igreja no domingo e fazia isso aqui na segunda. Não parecia carregar culpa nenhuma.

E eu? Eu ali. Dividido entre o que tinha acabado de acontecer e o que sabia que devia sentir. Era um arrependimento estranho, confuso. Vontade de fazer tudo de novo misturada com nojo de mim mesmo.

Um buraco no peito.

Chegando em casa, a gente se beijou mais um pouco. Mas eu já tava distante. Ela foi embora, me deixando com o gosto dela na boca e um vazio que eu nem sabia explicar.

E eu ali, sozinho, pensando que, no domingo, estaria sentado naqueles bancos, fingindo ser outra pessoa — tentando enganar a todos, mas, principalmente, a mim mesmo.

Tomei banho e fui dormir

No dia seguinte, acordei às cinco e fui direto pro escritório. A semana arrastou-se tensa, como um fio esticado demais, pronto para arrebentar. Na sexta, a faculdade teria umas palestras, mas decidi faltar. Preferi adiantar a papelada — e evitar a bagunça que minha cabeça já era.

Oito da noite. O prédio inteiro vazio. Só restava eu… e ela.

Vi quando Solange passou pela porta da própria sala e me chamou com um gesto sutil do dedo.

Levantei devagar. Senti o coração acelerar. As mãos úmidas. Fui até lá, cada passo parecendo mais pesado que o outro. Fechei a porta atrás de mim.

— João... não costumo fazer esse tipo de coisa — disse sem rodeios, a voz baixa, controlada, como quem pesa cada palavra. — Mas percebi que você anda tenso. Resolvi dizer: foi uma ótima semana. Fez tudo certo. Se continuar assim, não teremos problemas. Agora vá. Descanse.

Assenti, meio sem saber o que responder. Peguei minhas coisas e fui embora. Ainda tinha trabalho, mas aquele fim de semana escorregou por entre os dedos. Tentei me distrair saindo com os amigos, mas minha cabeça estava lá.

Na segunda, cheguei cedo de novo. Estava com os olhos grudados na tela, digitando relatório atrás de relatório, quando o som do elevador rompeu o silêncio. Ignorei. Até escutar o eco seco de saltos no piso frio.

Não era qualquer salto. Era o dela.

Um arrepio percorreu meu corpo, como se o som arrastasse junto o cheiro. Doce. Amadeirado. Impossível ignorar. Aquela fragrância parecia me atravessar antes mesmo de eu vê-la.

Levantei os olhos devagar.

Solange.

Os cabelos soltos em ondas que pareciam moldadas à mão. Batom vermelho, mais escuro que o habitual. Vestido preto colado, traçando curvas como quem traça intenções. O blazer pendia displicente sobre o braço, revelando ombros firmes e um colo desenhado feito escultura.

Ela passou por mim sem dizer nada, mas o olhar — de canto — quase me parou o coração. Um olhar que parecia despir o que nem eu sabia esconder. Respirei fundo. Foco. Relatório. Trabalho.

Mas aí veio a voz.

— João. Na minha sala.

Engoli seco. As mãos começaram a suar. Levantei devagar, sentindo o coração disparar. Cada passo até a sala dela parecia uma travessia. Fechei a porta devagar, tentando controlar a respiração. Ela estava de costas, encarando a cidade pela janela. Quando se virou, os olhos verdes cravaram os meus. Não tinha sorriso. Não tinha máscara. Só Solange, nua de intenções.

— Está se saindo melhor do que eu esperava — disse, caminhando devagar. Cada passo um ataque. — Talvez eu tenha julgado rápido demais.

O ar pareceu engrossar. O som da respiração, mais alto do que deveria. Meu corpo inteiro estava em alerta, mas não consegui me mexer. Ela avançava. Eu derretia por dentro.

— Obrigado, doutora — consegui dizer, baixo.

— Olhe pra mim, João Pedro.

Levantei o rosto. Ela já estava perto. Muito perto. Tão perto que o calor dela parecia um campo magnético.

— Você parece... tenso.

— Estou bem.

Ela sorriu — mas não foi um sorriso simpático. Foi um aviso.

— Ótimo. Porque aqui só sobrevive quem aguenta pressão.

Virou-se, sentou na cadeira, cruzou as pernas devagar. A fenda do vestido se abriu como um segredo revelado por descuido. A luz que vinha da janela desenhou a curva da coxa. Precisei morder o lado de dentro da bochecha.

— Pode voltar ao trabalho. Por enquanto.

Fui saindo devagar, um passo de cada vez, como quem deixa o corpo ir, mas fica por dentro. Saí da sala, fechei a porta, voltei para minha mesa. Mas a verdade é que eu ainda estava ali. Preso naquela sala, naquele olhar, naquela tensão.

E a sensação era essa: como se uma tempestade estivesse prestes a me engolir. E, por algum motivo, eu queria estar dentro dela.

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 6 estrelas.
Incentive GNS a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.

Comentários

Foto de perfil de brazzya

💋 🔥 💣 Tire a roupa de qualquer uma e veja tudo agora mesmo ➤ Afpo.eu/ekuza

0 0