Capítulo 4 – Espelhos no Escuro
O quarto ainda guardava o silêncio espesso do que acabara de acontecer. O lençol embolado aos pés da cama, os corpos suados, as respirações ainda se ajustando ao novo ritmo. Clara acariciava os cabelos de Marcos, que mantinha o rosto encostado em sua coxa, como se não quisesse voltar para o mundo de palavras.
Ela olhava o teto, sem dizer nada por alguns minutos. Não queria apressar aquele instante. Mas havia algo ali — um gesto que precisava ser nomeado.
Marcos finalmente se ergueu, deitando-se ao lado dela. Seus olhos ainda estavam marejados, mas havia algo diferente neles. Menos defesa. Mais presença.
Clara virou-se de lado, fitando-o.
Com a voz suave, como quem tateia dentro da alma do outro, ela se aproximou, encostou os lábios no ouvido dele e perguntou:
— Como você se sentiu?
Marcos piscou algumas vezes, como se a pergunta o tivesse puxado de um lugar fundo.
— Eu me senti… vulnerável. Pequeno. Mas também… inteiro. Pela primeira vez, senti que fiz algo por você que não era sobre mim.
Ela assentiu, sem julgá-lo. O silêncio entre eles era acolhedor, não mais incômodo.
Então, com os olhos ainda sobre ele, Clara continuou, agora com um leve tom de provocação nostálgica:
— Lembra das vezes que você me pedia pra fazer com a boca e você não durava?
Eu dizia que era como picolé toca os lábios e começa a ceder ao calor. O frio doce escorre pela língua, tingindo-a de sabor. A casquinha estala, o recheio escorre, lento, sensual. Cada lambida é uma despedida. O gelo some, líquido e prazer, até restar apenas o palito úmido e a lembrança.
picolé toca os lábios e começa a ceder ao calor. O frio doce escorre pela língua, tingindo-a de sabor. A casquinha estala, o recheio escorre, lento, sensual. Cada lambida é uma despedida.
— Você gostava, não gostava? — ela prosseguiu, com doçura. — Sentia prazer em ser cuidado, em ser o centro.
— Sim… — ele respondeu, quase num sussurro.
Ela se aproximou mais, deslizando os dedos pelo peito dele, traçando linhas invisíveis.
— Então agora você entende, um pouco, o que eu sentia falta. A sensação de ser lembrada. Tocada. Terminada.
Marcos desviou o olhar por um momento. Engoliu seco. Depois voltou a encará-la, sem máscaras.
— Eu fui egoísta, não por mal… mas por medo. Achava que se eu terminasse rápido, ninguém notaria. Mas você notava… e calava.
— E eu me calava pra proteger você. Mas, no fundo, estava me esquecendo de mim.
Ela o beijou devagar. Não era desejo carnal — era reconciliação. Os dois haviam atravessado um deserto de ausências e, pela primeira vez, encontravam abrigo um no outro.
— Eu quero aprender — disse ele, com sinceridade. — Quero que você me ensine. O que você gosta, como você quer, quando você quiser. Eu não quero mais ser o primeiro a acabar.
Clara sorriu. Um sorriso que era mais do que aceitação. Era começo. Era parceria.
— A gente não precisa terminar junto. Mas precisamos caminhar juntos. Você entende?
Ele assentiu. Dessa vez, sem lágrimas. Só com verdade.
E assim, naquela noite morna, Clara e Marcos deram o primeiro passo para um novo tipo de amor. Um amor que escuta. Um amor que se abaixa. Um amor que recomeça, mesmo depois de tanto silêncio.