Meu Deus, eu sabia que essa merda ia dar ruim. No fundo, sempre soube. Alguém tinha reconhecido. O estômago embrulhou na hora, um frio subiu pela espinha, minha nuca arrepiou. A primeira coisa que fiz foi pegar o celular pra apagar a foto, mas João segurou minha mão antes que eu conseguisse.
— Não, apaga não. Se apagar, tá assumindo. Me dá isso, deixa que eu resolvo.
Minhas mãos tremiam. Eu não sabia nem o que responder, mal conseguia segurar o telefone direito. João, sempre mais frio, pegou o celular e digitou no meu lugar.
ALoba16: Não, você se enganou. Esse não é meu nome, querido!
Ele levantou os olhos pra mim e deu um meio sorriso.
— Viu? A gente deixa ele na dúvida e ele esquece.
— Jão, não tem nada na foto além da minha bunda e do plugue que você enfiou. Nunca ninguém viu meu rabo, como ele descobriu?
— O lençol. Só pode ser.
Fiquei encarando ele, atônita.
— Porra, então ele só pode ser do seu grupinho de paranoico maluco que repara em lençol! Caralho, quem, em sã consciência, repara em lençol?
O lençol era diferente mesmo. Verde, com uma costura mais escura no meio. Devia ser dos pais dele. Mas, sei lá, deviam existir outros iguais por aí.
ThunderHue: Tudo bem, eu sei que é você, Virgínia. O formato do corpo e esse lençol da cama do João. Mas fica tranquila, eu guardo segredo.
João me mostrou a mensagem com a cara fechada.
— Que viado filho da puta retardado reparador de lençol alheio. Tu comeu o cu dele aqui, né, Jão? Pode falar.
Meu peito queimava de raiva. De frustração.
— Quem é esse merda? Pergunta.
— Se eu perguntar, meio que confirmo que é você. Calma. Vamos levar com jeito.
aLoba16: Meu Deus, menino, você repara nos lençóis da cama dos seus amigos? O que vocês ficam fazendo?_
Ele respondeu
ThunderHue: É que eu já me cobri muito nesse lençol. kkk
João ficou me olhando por um segundo, pensou, franziu a testa. Até que a cara de Eureka veio.
— É o Alfredo. Só pode ser ele. Só ele dorme aqui. Minha mãe não gosta mais desse lençol porque perdeu o kit de fronhas que vinha junto, esgarçou tudo na máquina, aí ela forra minha cama com ele agora.
— E agora, João? Se ele mostrar isso pra alguém, eu tô fodida.
— Eu posso dizer que coloquei uma foto sua sem você saber…
— É, e se isso se espalhar, é você que vai preso?
— Eu preciso pensar, tá bom? A gente pode apostar na incerteza. Ele pode ficar desconfiado, mas vai acabar deixando isso pra lá. No máximo, ele vai ter uma foto que ele acha que é sua.
A notificação pulou na tela.
ALoba16: Tá ok, então!
ThunderHue: Sabe onde você deu mole? Loba = Wolf… Virginia Wolf e 16 = sua idade!
Meu sangue gelou.
— Caramba, o desgraçado é bom. E foi exatamente o que eu fiz.
João me mostrou a mensagem rindo, satisfeito com o próprio amigo e me deixando mais puta ainda.
— Você tá rindo, João? Meu Deus, agora um amigo nosso viu meu cu e minha buceta jorrando porra e essa foto vai correr a escola inteira! Eu vou ter que me matar!
Peguei o celular de volta e digitei rápido, o coração martelando no peito.
ALoba16: Que inventivo, mas pena que você é burrinho! Wolf é lobo e não Woolf. O nome dela é Virginia WOOLF, fugiu das aulas de literatura, né?
ALoba16: E o dezesseis é porque tinha a ALoba15, a 14, a 13…
João soltou um assobio, balançando a cabeça.
— Boa, boa. Essa foi boa mesmo.
— Isso desarma ele, né? Agora ele fica na dúvida se acertou ou não.
— Sim, pelo menos dá uma segurada.
Pensei por um segundo.
— João, pede a foto do pau dele.
Ele me encarou, incrédulo.
— No meio da crise, você quer ver a foto do pau dele?
— Sei lá, faz o que ele espera da gente, né?
— Virgínia, porra. Sério isso? Você quer ver o pau do Alfredo?
João riu como se aquilo não fosse um problema, respirou fundo e me explicou.
— Se eu pedir, ele vai pedir mais também. E aí a gente corre o risco de ele reconhecer pelo lugar. Entendeu? Melhor deixar quieto por enquanto. Só não responder mais.
Ele bloqueou o celular e me olhou.
— Agora a gente espera.
Mas o amigo dele não queria esperar. O celular do João, largado na mesa de cabeceira, começou a tocar. Era ele ligando.
— Atende e coloca no viva voz — ordenei, meu coração acelerando.
João pegou o celular com certa hesitação e atendeu.
— Fala aí, cara!
— O que você tá fazendo?
— Dormindo…
— Putz, foi mal te acordar, man! Pelo menos não te atrapalhei com a Virgínia.
O verde. O desgraçado ligou só pra isso.
Me joguei pra frente, gesticulando desesperada.
— Diz que eu não tô, diz que eu não tô! — sussurrei num grito.
João deu um olhar de “relaxa” antes de responder.
— Não, nada…
O silêncio do outro lado durou um segundo a mais do que deveria.
— Se liga, tá afim de fazer alguma coisa?
Eu arregalei os olhos e bati no braço dele.
— Tá maluco, filho da puta?
João ignorou.
— Pode ser. Passo aí mais tarde tu passa aqui com os livros pra mim, vou só ver se a Virgínia vai querer fazer alguma coisa e te falo.
— Fechado.
A ligação encerrou e eu cruzei os braços, encarando ele.
— Você ficou doido?
João suspirou, jogando o celular de volta na mesa.
— Calma. A gente tem que agir como se nada fosse diferente.
Trocamos a droga do lençol às pressas, caso ele resolvesse entrar no quarto. João puxou um da parte de baixo do armário, um liso, sem nada que chamasse atenção. Enquanto ele ajeitava, eu decidi que ia em casa trocar de bermuda.
Era uma jeans, dessas básicas que todo mundo tem. Eu também tinha um monte iguais. Mas sei lá, eu queria que, se ele me visse depois, visse uma de outra cor. Eu sei que eu estava paranoica, que não fazia sentido, mas a ideia não saía da minha cabeça.
A única coisa que dava pra ver além de mim na foto era o lençol e minha bermuda embolada na calcinha. Ele provavelmente não ia reconhecer a roupa. Mas eu decidi que ia trocar assim mesmo.
Peguei minhas coisas e saí. Só ia voltar pra casa do João depois que o Alfredo chegasse lá.
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