Meu Preço - Capítulo Dois

Um conto erótico de Samuel
Categoria: Gay
Contém 2869 palavras
Data: 18/11/2022 12:05:52

CAPÍTULO DOIS

Os preparativos do casamento continuam a todo vapor.

Minha mãe tomou à frente de tudo, porque não estou mais em clima de festa. Parece que estou, na verdade, morrendo por dentro.

Mais ânimo, Sameul! É o que meu subconsciente diz, no entanto, ignoro-o completamente.

Nem vontade de ler eu tenho. A leitura é o meu hobby; amo a forma como me faz viajar por mundos desconhecidos, enxergar possibilidades e ter sempre a esperança de um final feliz.

Minha mãe entra no quarto, trazendo nas mãos o meu almoço, mesmo depois de ouvir milhares de vezes que não estou a fim de comer.

— Não pode ficar assim, querido, vai adoecer.

Ela senta ao meu lado na cama.

— Só queria morrer, mãe. — Choramingo em um momento de fraqueza. Não há esperança para mim.

Os soluços chacoalham meu corpo enquanto ela me envolve, segurandome nos braços até o momento em que adormeço depois de uma crise de choro.

Menos de uma hora, acordo e descubro que não estava sonhando.

Ainda precisarei ir embora com um cara excêntrico e sem piedade. Meu Deus, eu nunca mais veria o Lucas, nem mesmo a minha família. Choro por mais tempo.

Não sei como ainda consigo ter lágrimas para chorar.

***

São 16h, e minha mãe me avisa que se encontrou com Lucas enquanto terminava de resolver alguns detalhes do casamento.

Segundo o que está me dizendo, ele virá ao meu encontro mais tarde.

Não poderia falar sobre o que aconteceu para ele, nem sei se conseguiria em algum momento.

Peço para ela dizer que não estou em casa. Devo terminar com ele o quanto antes, mas certamente não conseguirei fazer isso hoje, mesmo em véspera de casamento.

Estou despedaçado.

— Amanhã você vai se casar, querido. Não vou deixar que desista desse sonho, não posso permitir.

— Melhor terminar com isso, mãe, vai ser melhor e mais justo com o Lucas. Não posso envolvê-lo nessa loucura.

Não o meu doce Lucas.

— Eu sei. — Ela me abraça mais forte.

***

Às 19h, Lucas aparece, e minha mãe faz o que eu pedi. Fico olhando pela janela, apoiando as mãos no vidro, desejando poder tocá-lo, acalmá-lo e dizer que tudo ficará bem; mas não vai. Então apenas o vejo se distanciar da minha casa com o carro do pai dele. Meu coração se parte.

Depois disso, o telefone não para de tocar. Lucas é bastante persistente, não desistiria fácil. Só há um jeito de fazê-lo me odiar e, para que isso aconteça, terei que machucá-lo profundamente.

A dor rasga meu peito, me deixando sem ar, sem brilho.

Eu me sinto vazio.

Minha mãe vem ao meu quarto outra vez, depois de não aguentar mais o telefone. Eu não aguentava mais nada, nem minha própria mãe.

Reviro os olhos quando ela começa a falar:

— Filho, você deveria atender, ele vai continuar ligando. Dê pelo menos uma boa noite de sono ao garoto, ele também não merece essa falta de informação.

Ela está certa, eu sei, mas como vou dar alívio a ele se estou tão arrasado?

— Mãe, mais um dia se foi e o papai ainda não voltou. O que vou dizer? Amanhã é o nosso casamento, nem sei se vamos nos casar. Se eu não terminar com ele agora, não vou conseguir amanhã.

Ela pega a minha mão e vejo suas lágrimas escorrerem pelo seu rosto.

— Odeio o seu pai por ter feito isso com você, acho que nunca vou perdoá-lo se você sair dessa casa com aquele homem...

— Não diga isso, mãe. Se eu for embora, quero ter certeza de que vocês poderão continuar felizes juntos. Pelo menos me darão paz, um pouco de tranquilidade enquanto viver com ele.

— Como serei feliz se eu não souber nada de você, como? — Ela se levanta. — Não aceito. Você vai se casar amanhã. Seu pai vai trazer o dinheiro, você vai ver.

Amo a minha mãe pela força que tem, mas não tenho a mesma capacidade. Estou sem nenhuma esperança.

Ela tem razão. Lucas não merece sofrer antes do tempo. Vou esperar até o último minuto e, se não der certo, acabo definitivamente com todas as coisas que construímos.

O telefone toca, dessa vez eu atendo.

— Alô?

— Graças a Deus, Samuel, eu iria à sua casa de novo se não me atendesse. Sabe quantas vezes te liguei? Estou preocupado. Aconteceu alguma coisa? — Sua voz me acalma, mesmo ele estando desesperado.

— Desculpa, me distraí com as lembrancinhas do casamento. — Limpo uma lágrima que escorre pelo meu rosto. — Estava na casa de uma amiga, acabei perdendo a hora.

Essa é a primeira vez que minto para ele. Como um bom garoto, nem me questiona. Não sei se conseguiria manter a mentira caso perguntasse mais alguma coisa.

A mentira faz um nó preso na garganta.

— Então quer dizer que não se arrependeu de se casar comigo? — Coloco a mão na boca, abafando o meu choro. — Samuel! Está aí, amor?

Respiro, tentando me recompor.

— Lucas, vou dormir. Estou muito cansado e amanhã vai ser um longo dia.

Preciso desligar antes que eu não aguente mais...

— Tudo bem, é verdade, amanhã será um longo dia. Durma com Deus, meu amor. Só de imaginar que amanhã dormirei ao seu lado e poderei dizer isso a você todos os dias de nossas vidas, já me anima.

Fungo, cobrindo o telefone para ele não escutar.

— Eu te amo.

Pelo menos isso era verdade. A verdade que carregaria para sempre dentro do meu peito.

— Também te amo. Você está bem mesmo?

— Estou sim, só ansioso para o casamento. — Mais uma mentira.

Quando vai parar de doer?

— Também estou, amor. Agora vá dormir e descansar. Queria estar aí para te encher de beijos, mas vou esperar até amanhã.

Ele ri, enquanto eu apenas fecho os olhos, engolindo os soluços que ameaçam me rasgar ao meio.

— Boa noite.

— Boa noite — digo em um fio de voz.

***

Chorei a noite toda, só adormeci quando o dia estava clareando, porém não dormi por muito tempo. Minha mãe me acordou às 8h, a fim de me preparar para o casamento que nem sequer vai acontecer.

Estou com raiva pela falta de sono e muito mais com a insistência dela. Mas a entendo completamente, deve estar se sentindo da mesma forma, porque não deve ser fácil perder um filho dessa maneira em pleno século XXI.

É pela vida do seu pai, Samuel! Meu subconsciente me lembra. Como se eu já não soubesse.

— Mãe, e se o papai não aparecer? Vai ser perda de tempo — digo o óbvio, enquanto ela termina os detalhes do vestido.

— Ele vai, querido, sei que vai.

Não sei como ela consegue ter esperança nessa altura do campeonato.

Passei a parte da manhã no automático. Lucas tentou falar comigo em várias ocasiões, mas minha mãe não permitiu. Estava com medo de que eu não aguentasse e terminasse com o casamento antes do tempo. O casamento será às 13h, e meus nervos já estão à flor da pele pela proximidade do horário.

Fico horas na frente do espelho, olhando o terno ao redor do meu corpo. Minha mãe caprichou, ele é simples, mas perfeito ao meu gosto: todo branco.

Me sinto lindo, como um príncipe, só que meu conto de fadas acabou e eu não vou mais me casar. O meu príncipe não poderá me defender das mãos do ogro. Esse conto de fadas não terá um final feliz.

Conforme minha mãe havia falado, meu pai apareceu, faltando duas horas para o casamento. Quase me jogo no chão com o alívio que estou sentindo no peito; mas dura pouco.

A tensão volta a tomar conta de mim.

— João, graças a Deus, estava preocupada. — Minha mãe corre para abraçá-lo. Sempre invejei o amor deles, sempre sonhei com um casamento igual que, mesmo com as brigas, o amor continua intacto, passando por quaisquer obstáculos unidos como um alicerce. — Você está fedendo, homem. Onde esteve?

Minha mãe se afasta. Posso ver que ele está com a mesma roupa de quinta-feira e uma cara de fracassado.

Esse é o meu fim, a gota d’água.

— Eu tentei, juro que tentei.

Dou um passo para trás, me apoiando na mureta entre a sala e a cozinha.

— O que está dizendo, João? — Minha mãe começa a chorar, com a mão no peito, indo se sentar no sofá.

— Me perdoe, filho. — Ele olha para mim e percebe que estou vestida de noiva. — Oh, meu querido, está tão lindo, pena que estraguei tudo para você. Devia ter deixado ele me matar.

Seu rosto mostra toda a angústia que está sentindo.

— Não, não, você vai se casar e, depois do casamento, vamos chamar à polícia para pegar esse desgraçado. — Minha mãe sugere, se levantando. Está mais perdida do que eu.

— Ele vai nos matar antes mesmo da polícia chegar — digo conformado. — Tudo bem.

Meu pai assente, concordando comigo. Ele também sabe que aquele homem pode fazer o que quiser facilmente. Com certeza deve ter a polícia nas mãos.

Não tenho mais lágrimas, já chorei demais. Agora preciso ser forte por eles. Preciso mostrar que ficarei bem.

— Consegui uma boa parte do valor. Quem sabe ele aceita e espera mais tempo?

Pelo que vi naquele homem, certamente não mudaria de opinião assim tão fácil. Amanhã serei propriedade dele.

Só que, se ele está pensando que vou facilitar, está muito enganado, pois não vou. Jamais. Terá que se desdobrar para lidar comigo.

— É o casamento dele, João, não podemos permitir. Aquele homem não vai querer negociar mais, ele vai levar o meu menino. — Choraminga, deixando meu pai mais derrotado.

— Me perdoe, filho, me perdoe. — Ele vem na minha direção, se ajoelhando.

— Pai, levante, pelo amor de Deus! — Agacho para olhar em seus olhos verdes, como os meus. — Não tenho nada para perdoar, somos uma família, e é isso que fazemos um pelo outro. Tenho certeza de que já sacrificaram muitas coisas por mim, agora é a minha vez.

Dou um beijo em sua testa e me levanto.

— Acho que tenho que acabar com esse casamento. Mãe, vá buscar o Lucas, diga que preciso falar com ele.

— Filho... — Minha mãe começa a protestar, mas a interrompo.

— Vá logo, mãe, não posso mais adiar isso.

Ela assente e sai derrotada.

Enquanto isso, acalmo o meu pai e peço que tome um banho, pois está bem imundo.

Assim que Lucas entra pela porta parecendo desesperado, quase desisto. Por pouco me jogo em seus braços e imploro para fugir comigo para bem longe, porém, isso significaria envolvê-lo na história.

— Amor... — Ele me vê e fica de boca aberta. —... Uau, nossa... Samuel, você... Você está maravilhoso.

— Obrigado, você também está lindo.

Ele está com um terno cinza, cabelo bem penteado e uma gravata borboleta. Um belo príncipe, só que hoje ele não veio montado em seu cavalo branco para me salvar.

Nunca poderei ser salvo, não quando a vida do meu pai está em jogo.

Sorrio para ele, e uma lágrima faz caminho pelo meu rosto. Ele se aproxima.

— O que foi? Vai me dizer que você acredita no azar?

Nego, tentando fazer as palavras saírem.

— Não sou virgem.

Fiquei horas pensando no que ia dizer e nada faria Lucas me odiar, a não ser uma coisa que neguei a ele por tanto tempo.

— Como? Não entendi direito, Samuel. — Ele se afasta um pouco.

— Eu transei com outro — repito, ouvindo os soluços da minha mãe no quarto. Meu pai deve estar consolando-a neste momento. Queria eu poder ser consolado também.

Minha vontade é de me trancar no quarto e ficar lá embolado numa posição fetal para sempre, mas preciso enfrentar tudo de cabeça erguida.

— Não, isso não pode estar acontecendo. — Ele começa a andar de um lado para o outro, passando as mãos pelos cabelos. — Isso só pode ser um pesadelo, eu vou acordar e será apenas outro pesadelo.

Ele parece perdido.

— Pesadelo? Você sonhou com isso? — pergunto, perdendo um pouco o foco.

— Todos os dias eu sonho que você está me deixando, que se arrependeu de casar comigo. Eu até entenderia, mas isso? — A descrença em sua voz está me cortando a alma.

— Desculpa, não posso me casar com você. — Me seguro para não cair de joelhos e soluçar na frente dele.

— Desculpa? Samuel, o que está acontecendo? Droga! Nós vamos nos casar! — Ele grita, me assustando.

— Não posso me casar assim.

Nessa hora, as lágrimas não cessam.

— Quem é o cara? — Ele dá um murro na mesa. — Quem é ele, Samuel?

— Lucas...

— Você o ama? Preciso saber. — Seu rosto está banhado com as próprias lágrimas. Quero abraçá-lo, mas não posso.

— Não vou me casar com você, Lucas, só vá embora e nunca mais me procure. — Viro-me de costas a fim de que ele não veja a dor em meus olhos.

— Não, Samuel. Droga... Quem é ele? — Lucas abaixa o tom de voz, quase fazendo uma súplica.

— Você não o conhece. — Me abraço, está ficando cada vez mais difícil de me acalmar.

— E você, vocês... Se entregou para ele? Depois de dois anos se segurando comigo? Por que fez isso? Por que, Samuel? Você me disse que... Você queria... Queria esperar... Então, por quê? — Ele está desesperado, ofegando, sufocando-se com a própria dor.

Apesar de saber que chegaria a hora das perguntas — e esse era o meu maior medo —, eu sabia que precisaria inventar alguma coisa, sabia que o mais difícil estava por vir. Respiro fundo, sentindo o coração se estilhaçar em milhares de caquinhos.

— Não sei, simplesmente aconteceu. — Sinto a frieza na minha própria voz. Tenho que me controlar ou ele saberá de tudo.

— Quando te pedi em casamento, você estava com outro cara?

Me forço a continuar, tenho que fazê-lo desistir de mim. Ele tem que me odiar.

— Sim.

— Então tudo que falamos aquele dia foi uma mentira?

Não! Queria gritar.

— Nem tudo.

Cada palavra que sai da minha boca leva um pedaço da minha alma.

— Samuel, isso não pode ser verdade. Olhe para mim e diga que não me ama. Olhe para mim, Samuel!

Sou obrigado a olhar em seus olhos. Encarar o Lucas é bem pior que aquele homem que destruiu a minha vida.

— Lucas, vá embora, não tenho nada a dizer, apenas palavras que podem te machucar.

— Me machucar? Você está me matando, Samuel. Você está acabando com a minha vida. — Ele se senta na cadeira, pensativo, depois fica de pé e vem em minha direção. Achei que fosse me beijar, mas ele apenas se detém e acaricia o meu rosto. — Diga que não o ama e eu me caso com você. Não importa nada. Só diga que não o ama.

Limpo o seu rosto. Ele pega as minhas mãos e beija meus dedos.

Seria o homem mais feliz do mundo se Lucas fosse meu marido.

Me afasto e tiro o anel do dedo, vendo o brilho dos seus olhos se apagarem. Coloco-o na palma da sua mão.

— Lucas, não mereço você. Dê esse anel a alguém que mereça esse coração enorme que você tem.

Ele fecha a mão, apertando o anel.

— Então você gosta dele?

— Lucas, por favor!

Não consigo dizer isso olhando para ele, não consigo fazer as palavras saírem. Estou sufocando em agonia.

— É simples: eu vou entender. Eu te amo tanto que desejo a sua felicidade e, se me disser que o ama como um dia me amou, então deixarei você em paz. Quero que seja feliz mesmo que não seja comigo.

Oh, Senhor!

— Você é tudo o que eu sempre quis, você sempre será o meu primeiro e grande amor, mas não posso me casar, não depois do que eu fiz. — As próximas palavras o destruiriam, mas seria necessário: — Ele é rico, pode dar uma boa vida a mim.

— Rico? Boa vida? Samuel, quem é você? Onde está o meu Samuel?

Aqui, amor, se afogando em solidão...

Estou preso por uma dívida que não é minha, mas para salvar meu pai, tenho que pagar. Queria deixar as palavras saírem, dizer que é tudo mentira e corrermos para o altar.

— Me perdoe.

— Não sei, Samuel, se serei capaz de te perdoar algum dia. Hoje você me destruiu, nem sei se vou conseguir me reerguer novamente.

— Lucas. — Seguro o braço dele quando faz menção de sair, mas logo solto, com toda a dor do mundo. Tenho que deixá-lo ir embora.

Ele para na porta e me olha. A dor que vejo em seus olhos me faz odiar a mim mesma por feri-lo.

— Só me responda uma coisa: é por amor ou é só pelo dinheiro?

Sinto o nojo de cada palavra que saiu da sua boca.

Fale, Samuel, apenas fale. Tenho o próprio incentivo vindo do meu subconsciente idiota.

— Eu o amo. — As palavras pesam no ambiente pequeno.

Essa foi a minha cartada final. Sabia que ele nunca mais seria feliz na vida, provavelmente se lembraria desse dia para sempre. Destruí o homem mais bondoso que conheci.

Lucas bate a porta da frente, me deixando aqui, sem nenhuma estrutura, completamente sozinho, vazio. Mais uma vez estou de joelhos no chão, chorando descontroladamente.

Meus pais me abraçam e choram comigo até me sentir anestesiado, sem vida. Nem sei que horas vou me deitar.

Minha mãe me ajuda com a roupa, me troca e me coloca para dormir, como fazia quando era criança.

Só sei que mais um dia não preguei os olhos.

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Comentários

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Essa dor de ser obrigado a deixar o grande amor e inda tendo que mentir deve ser imensurável...

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MJGrey, onde lemos o conto de outro mundo que sumiu daqui da plataforma?

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Nossa, episódio partiu meu coração.

Por favor não demore a escrever o conto e não pare pela metade.

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Muito pesado e triste, espero que você finalize a história pq até agora tá muito interessante

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